Prólogo lacrimejante

A névoa densa e lágrimas nos olhos impedem que Melissa veja o que tem ao longe, mas ela não precisa enxergar, sabe exatamente o caminho, já esteve lá muitas vezes. Talvez tenha escolhido aquele local em períodos mais agradáveis, mais especificamente na primavera, quando as pétalas das flores se abrem, o frescor do vento agita seus cabelos compridos, e o sol aquece sua pele. Mas dessa vez é diferente.

Agora não é um vento agradável, e sim ventos gélidos, desses que fazem assobios e sons assustadores, e levam as pessoas a rangerem os dentes, se encolherem e estremecerem embrulhadas em seus casacos. Não tem flores nem sol, as flores murcharam e o sol está escondido por nuvens cinzentas. As árvores estão nuas sem suas folhagens verdes, parecem com mãos magricelas que estão saindo diretamente da terra e os galhos são dedos estendidos eternamente, parecendo desejarem agarrar algo no alto mas que não conseguem alcançar. Não existe cor, tudo está cinza, afinal é um inverno chuvoso, em que tudo morre e só retorna na primavera. 

Não seria maravilhoso se a vida fosse assim como a natureza? Se as pessoas fossem embora e retornassem sorridentes como se nada tivesse acontecido? Na natureza as flores somem e depois florescem de novo, mas com pessoas é diferente. Elas vão embora, e só as encontraremos se irmos também, mas ninguém deseja ir antes da hora, é assim que funciona.

Melissa conseguiu chegar no local que tanto desejava, era o único lugar onde poderia ficar só, sem pessoas com olhares de pena, sem aqueles abraços que surgem do nada, sem frases do tipo "eu sinto muito", "isso vai passar", "ele está em um lugar melhor agora". Agora tinha paz para chorar e visitar aquele lugar pela última vez.

Sim, última vez, pois ela pensava que jamais conseguiria estar ali novamente, tinha memórias demais, e não suportaria o peso das lembranças do passado.

Ela retirou seus óculos, enxugou as lágrimas com suas mãos geladas, e tentou limpar as lentes em seu cachecol, mas continuaram meio embaçadas. Respirou fundo e pôde observar o local. Estava em cima de uma ponte de madeira que atravessava um lago.

Naquela ponte tanta coisa aconteceu, e parecia que tudo terminaria ali. Colocou suas mãos nos bolsos para que fossem aquecidas, ajeitou o cachecol em seu pescoço, e ficou em pé ali, pensativa, paralisada. Imaginem uma bela estátua, pintura ou fotografia. Imaginaram? Ela poderia facilmente ser confundida como essas coisas se houvesse um espectador vendo-a nesse momento. Melissa estava tão estática que até as esculturas de um museu pareceriam ter mais vida do que ela própria.

Minutos depois houve um movimento, ela retirou de um de seus bolsos um pedaço de papel dobrado ao meio. Sabia o que estava escrito, mas decidiu reler.

"Amor, logo estarei aí para te beijar, sei o quanto sentiu minha falta, mas lembre-se daquela escritura em *Doutrina e Convênios 4:2-3. Eu escolhi embarcar, precisava fazer isso, você sabe o quanto eu desejava servir. Não se preocupe, logo o barco vai voltar para o porto, daqui a um mês nos veremos, e nunca mais irei me separar de você. Te amo eternamente, até logo"

Era um trecho de uma carta, a única coisa que sobrou dele, o último contato que teve com ele. Ficou esperando, até que a triste notícia chegou, e descobriu que seu companheiro não retornaria mais. 

Lágrimas caíram novamente, e ainda chorando Melissa pegou aquela última carta, dobrou em um formato de um barquinho, colocou na superfície do lago, e deixou que o vento levasse.

Olhando o pequeno barquinho de papel flutuando na água e sendo engolido pela névoa, se despediu sussurrando:

_ Até logo, amor. Nos veremos do outro lado.

****GLOSSÁRIO****

Doutrina e Convênios é um dos livros sagrados de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. Contém revelações de alguns profetas modernos, foi escrito entre os anos de 1823 a 1847, com acréscimos de conteúdo respectivamente em 1890, 1918 e 1978.

Doutrina e Convênios 4:2-3 (Portanto, ó vós que embarcais no serviço de Deus, vede que o sirvais de todo o coração, poder, mente e força, para que vos apresenteis sem culpa perante Deus no último dia. Portanto, se tendes desejo de servir a Deus, sois chamados ao trabalho)

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