5
Dificilmente as pessoas prendiam sua atenção, ou despertava-lhe curiosidade. Ele não se sentia atraído por qualquer um, por mais que todos pensassem o contrário, Yoongi considerava-se um tanto seletivo. Talvez fosse apenas coisa da sua mente conturbada, mas estava sempre preso em seu próprio mundo em preto e branco que quase nunca conseguia ver, de fato, os outros ao seu redor. Como se vivesse em uma cúpula, impenetrável, inalcançável. Entretanto, Yoongi sentiu-se extremamente curioso sobre a moça dos olhos azuis, que fugiu de si como o diabo foge da cruz.
Park Daeyang.
Ela usava um crachá de identificação, era jornalista daquela revista que amava escrever seu nome em qualquer matéria que fosse. Yoongi não conseguiu apagar da mente a imagem dela aos pés daquela árvore, bem diferente da noite no carro, o pavor estampado no oceano azul do seu olhar era intrigante. Os olhos brilhantes, a boca entreaberta, as mãos trêmulas, a voz fraca. O que havia deixado-a daquela forma? Quais segredos aquele mar intenso escondia? Eram perguntas que rondavam pela sua mente sem parar, e mesmo no dia seguinte, não conseguia deixar de pensar em Daeyang, nos olhos dela, no ato eletrizante que foi tocá-la sem querer.
Yoongi cutucou o arroz com os Jeotgarak, enquanto lembrava-se do dia anterior. De como ela evitou-o a todo custo, focada no trabalho de transcrever tudo o que via sobre o 4U. Yoongi quis correr até ela, como nunca quis por ninguém, quis desvendar cada mistério que seus olhos oceânicos guardavam, quis saber mais. Daeyang era como um imã, e Yoongi era metal. Iria vê-la novamente? Iria conseguir se aproximar sem que a moça corresse como um animal arisco? Fazia muito tempo que o rapaz não pensava em uma pessoa assim, com tanta frequência, como um vício.
— Hummm, quem é Park Jimin, hein? — a voz maliciosa de Hoseok lhe sugou de volta para a realidade, e ele fitou os amigos sentados em volta da mesa, tentando entender o que acontecia. Jungkook tinha o rosto tão vermelho quanto seu cabelo, e escondia o celular da visão do amigo.
Yoongi suspirou, ainda com a lembrança recente de um par de olhos azulados na cabeça. Sorveu uma colherada do caldo da Galbitang antes de responder a pergunta que nem sabia para quem foi direcionada:
— Alguém muito bom com a garganta.
— Omo, também é cantor? — Namjoon questionou, genuíno e Yoongi encarou-o desejando colocá-lo em um frasquinho e protegê-lo do mundo.
— Ah, é sim... — Min murmurou com dificuldade e soltou uma gargalhada logo em seguida, fazendo os três presentes encararem o músico com cenhos franzidos.
— Ele debutou ano passado pela BK como artista solo. — disse Jungkook, meio receoso. Yoongi soltou outra risada, recordando-se da última vez que esbarrou com o rapaz de olhar mortal e como ele provou ser... muito bom usando a garganta. — Ah, não! Não me diz que transou com ele também!
Yoongi gargalhou com gosto, apenas pela expressão inconformada de Jungkook.
— Infelizmente ficamos só nas preliminares. — ele enfiou uma colherada de arroz na boca e divertiu-se com as expressões chocadas dos seus amigos. Era engraçado como eles sempre agiam como se sexo fosse algo de outro mundo. — Mas o que tem? Tá afim dele?
Jungkook grunhiu em resposta e escondeu o rosto entre os braços, fazendo o rapaz encará-lo com uma expressão confusa. Hoseok soltou um risinho divertido, dando tapinhas camaradas no ombro do rapaz de fios avermelhados.
— Uwa, ele é muito bonito. — Namjoon exclamou, atraindo a atenção do músico para si. Ele deslizava os dedos pelo celular de Jungkook com os olhos brilhantes grudados na tela. Hoseok pediu para ver e logo concordou com o amigo. Yoongi sorriu, realmente a beleza de Park Jimin era indiscutível.
— Pois é! — Jungkook choramingou, ainda com o rosto escondido. — E ele me chamou para sair...
— Então você se deu bem, seu tapado! — Hoseok sacudiu-o pelos ombros, forçando o menino a se levantar da mesa, mas sua expressão era desolada. — Por que o chororô?
— Ele ficou com o Yoon, isso é esquisito.
— Esquisito é você. — Yoongi ralhou, com a boca cheia de comida. — E daí se ele chupou o meu...
— Eu concordo com o Yoon. — Kim cortou-o, com um sorriso nervoso. Min bufou, enfiando um pedaço de carne generoso na boca. — Não vejo problema de você sair com um cara que ficou com seu amigo.
— Abra sua mente, Kookie. — Hoseok completou, com um tom fofo na voz.
— E abra bem a boca também porque...
— Min Yoongi! — os três gritaram em uníssono, fazendo o músico rir.
— O que é? — ele se virou para o rapaz de fios castanhos e sorriu maliciosamente, fazendo Namjoon engolir em seco. — Joonie, amigo, você não concorda que se não abrir bem a boca...
— Tá, chega desse assunto constrangedor. — Namjoon levantou-se, com o rosto vermelho e Yoongi soltou uma gargalhada gostosa, que ecoou pela sala e contagiou os outros, que acabaram por rir também. — Temos muito o que fazer antes de ir ao Borahae.
Ele saiu da sala, deixando os amigos aos risos. Yoongi limpou a boca com o guardanapo, finalizando sua refeição e fez um tsc com a língua ao notar os rostos vermelhos dos dois sentados em volta da mesa.
— Não entendo porquê é tão dificil para vocês falar de sexo.
— Ya! — o rapaz de madeixas alpinas exclamou, com o rosto tão vermelho quanto um tomate maduro. — Não fale essas coisas assim!
— Aish — ele cruzou os braços, e encarou o menino de cabelo vermelho do outro lado da mesa. Jungkook tinha o rosto corado, digitando ferozmente algo no celular. — Jungkook — chamou, fazendo-o encará-lo no mesmo instante. — Pênis.
— Aish! Ficou doido? — ele ralhou, levantando-se da cadeira e arrancando uma gargalhada de Yoongi.
— Vocês são adoráveis. — ele riu e observou Jeon lançar-lhe um olhar feio antes de sair da sala pelo mesmo lugar que Namjoon passou minutos atrás. — Ya, volta aqui! Como espera conquistar Park Jimin assim?
Yoongi perseguiu-o, ainda implicando com o rapaz e rindo das bochechas vermelhas dele. Se sentia bem, sentia-se em casa, rodeado de pessoas que amava e rindo com elas. Isso fazia seus dias serem menos piores, fazia-o deitar a cabeça no travesseiro com um sorriso, pois sabia que nos quartos ao lado, havia três garotos que sempre podia contar. Seja para falar sobre assuntos constrangedores, ou abraçá-lo em meio às crises da sua mente conturbada.
E isso era reconfortante.
[...]
Batidas fortes na porta ecoavam por todo o quarto. O rapaz tapou os ouvidos e se encolheu na cama, rezando para que sua mãe voltasse logo, que aquele homem sumisse das suas vidas, ou que um herói vestindo uma armadura brilhante surgisse ali como nos filmes e o salvasse do cara mau. Lágrimas banhavam o rosto delicado e os pequenos olhos castanhos estavam vermelhos e inchados. No pulso esquerdo, uma marca roxa denunciava o que aconteceria se aquele homem entrasse por aquela porta.
Por que sua mãe estava demorando tanto? Ele estava com muito medo...
As batidas na porta se intensificaram, ao ponto de parecer que iriam derrubá-la. Yoongi arregalou os olhos, encarando a madeira escura com pavor. Doyun ia entrar, ia machucá-lo novamente, ameaçá-lo caso contasse para Seri, ele ia tocá-lo... Yoongi não podia deixar ele tentar fazer aquilo de novo, tinha que contar para sua mãe, tinha que fugir com ela para longe dali. A porta se abriu em um estronto, fazendo o rapaz dar um sobressalto para trás. O homem tinha o olhar distante, o rosto vermelho e um sorriso maquiavélico. Yoongi se encolheu ainda mais, como um caracol dentro da concha.
— Ya! — Doyun exclamou, exibindo sua clássica voz de bêbado. — Por que trancou a porra da porta, hein, merdinha?
Yoongi encarou a figura carrancuda a sua frente, sentindo as lágrimas descerem pelo seu rosto dolorosamente. O que havia feito de tão errado para merecer ser tratado daquela forma? Em alguma vida passada, talvez tenha sido um assassino cruel, um traidor, ou o próprio Judas. Pois apenas isso justificava aquele olhar desprezível sobre si, aquelas mãos ásperas e pesadas que machucavam-no constantemente. Era sua culpa?
— Acho que vou ter que te dar mais uma lição... — ele começou a desabotoar o cinto e Yoongi sentiu o pânico crescer dentro de si como uma bexiga, prestes a estourar a qualquer instante.
Doyun iria machucá-lo novamente...
Não...
Ele encarou a porta, esperançoso e nem pensou ao sair correndo. Yoongi não era mais um garotinho, mas sentia-se intimidado por aquela figura e tudo o que ela representava. Por isso, sentia como se tivesse dez anos novamente, naquele treze de março, correndo de um homem cruel e violento. Contudo, ao chegar na escadaria, não foi Doyun que o puxou com brutalidade, mas sim uma garota com uma faca na mão e olhar sanguinário. Yoongi tremeu, viu seu reflexo na lâmina e sentiu mais lágrimas descerem pela sua bochecha ao visualizar aquele sorriso sinistro.
— Você é só meu, Suga... — o aperto no seu pulso doía, o medo de Doyun aparecer era enorme, mas a faca na sua frente era ainda mais assustadora.
Ele tentou falar, gritar por socorro, ou até mesmo sair correndo, mas não conseguiu. Sua voz ficou presa na garganta, seus pés fincaram no chão, e o mundo se tornava cada vez mais nublado ao encarar aquela garota assustadora. Onde estava sua mãe? Onde estavam os meninos? Ninguém iria salvá-lo?
A moça de olhar medonho largou a faca no chão apenas para grudar as duas mãos em seu pescoço e o rapaz encarou-a com olhos esbugalhados, enquanto sentia o oxigênio se tornar cada vez mais escasso para si. Ele tentou se afastar, mas o aperto se intensificou, sua visão ficou turva e ele nunca sentiu tanto medo na vida como naquele momento. Iria morrer, aqueles dois iriam matá-lo. Como se pudesse ler seus pensamentos, a garota sorriu largamente como o Gato Cheshire, enquanto Yoongi lutava para se afastar do aperto em seu pescoço.
— Não percebe? Você não merece ser feliz... — ela ainda sorria enquanto falava. — Então, morra, maldito.
Ela empurrou da escada, e Yoongi gritou como nunca fez antes, como deveria ter feito a dezessete anos atrás.
— Mamãe!
O rapaz sentou-se na cama abruptamente, ofegante, suado e em prantos. As lágrimas molhavam seu rosto, o cabelo negro grudava na pele e as mãos trêmulas agarravam o edredom com força. Yoongi encarou-as aos soluços. Havia sido apenas um sonho, um pesadelo, ele estava bem, ninguém poderia machucá-lo mais. Ele estava seguro, estava a salvo, Doyun estava preso. Respirou fundo, contou mentalmente até cinquenta e conseguiu se acalmar, contudo, as lágrimas ainda escorriam copiosamente pelas bochechas rosadas do músico e ele não sabia o que fazer para pará-las.
Algum dia os pesadelos deixariam-no? Algum dia ele superaria aquele dia maldito? Ou perderia o medo irracional de fãs? Recordou-se da última frase da garota no sonho, ele não merecia ser feliz? Por quê? O que havia feito para receber tanto ódio assim? Do país, de Doyun, dos fãs... Yoongi era mesmo um garoto mau como diziam? Algum dia poderia ser feliz? Ou continuaria naquele ciclo vicioso infinito, de beber e esquecer todos os sonhos pelos quais lutou tanto?
Que porra ele estava fazendo com a sua vida?
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