Capítulo 4
3752 Palavras
Mantenho minhas asas bem abertas, e com meus olhos fechados, sinto meu corpo descendo devagar, até que uma brisa fria pega-me desprevenida.
Torno a abrir meus olhos, vendo que já estou na terra.
Percebo se tratar de um novo alvorecer. Ao horizonte, os primeiros raios do sol anunciam sua chegada, tingindo tons dourados no céu com poucas nuvens, antes envolto pelo azul profundo da noite.
A lua já não brilha no céu, mas sua presença está ali, parcialmente coberta. E as últimas estrelas despedem-se, prestes a desaparecer frente à luz do novo dia.
Ergo as mãos frente ao peito e, libertando minha graça, a orbe toma forma entre meus dedos.
A orbe flutua para longe da minha mão, e intensificando seu brilho, começa a rumar para onde meu próximo trabalho será realizado, deixando um leve rastro branco, e prontamente sigo a orbe.
Sigo voando devagar por algum tempo, observando o mundo abaixo de mim. Existem muitas arvores no terreno cheio de altos e baixos, muitos campos abertos e ao longe o que parece ser um rio. Passamos próximos a uma pequena cidade, mas de onde estou, não consigo ver nada com muita clareza.
Por um instante quase cedo ao meu desejo de ir até aquele lugar. Sinto batidas em meu peito e a necessidade de ir crescendo em mim. Mas contenho meu ímpeto, e desviando meu olhar de volta a orbe, que continua seguindo em frente.
Forço-me a manter meu olhar a frente, buscando a concentração para realizar meu trabalho da melhor forma, como sempre fiz, tentando ignorar a cidade cada vez mais distante.
Após algum tempo voando, a orbe cessa seu movimento, e ao me aproximar, a mesma voz de antes ressurge.
- "Anjo boreal Mi'Ka, seu trabalho será manifestar uma aurora com duração de trinta minutos humanos, e fazê-lo dissipar, para então fazê-lo ressurgir após outros trinta minutos, com condições de perdurar ao mínimo quatro horas humanas. Desejamos um bom trabalho."
Algo um pouco mais complexo do que o habitual, entretanto ainda assim é um trabalho fácil. Não levarei muito para completá-lo.
Agora que penso. Quatro horas humanas. Acredito que posso utilizar deste tempo para vagar pela terra, com o argumento de que estarei monitorando a duração da aurora boreal. Sim, é essa a solução!
A orbe imediatamente inicia seu caminho de volta ao paraíso, e sei que esse é o momento de iniciar meu trabalho.
Uno minhas mãos frente ao rosto, concentrando a graça que flui em meu interior como os ventos serenos sopram pelos campos abertos do paraíso, ao qual guio até minhas mãos.
Partículas surgem dos meus dedos, concentrando-se num único ponto luminoso que irradia múltiplas cores. Lentamente esse único ponto cresce formando um pequeno véu esverdeado, tão pequeno que cabe perfeitamente entre minhas mãos, a qual cuido e protejo com todo o carinho que habita em mim.
Esta pequena aurora que acabei de formar, em breve, ocupará todo este céu.
Aos poucos vou a enriquecendo com minha graça, afastando minhas mãos conforme a aurora se expande, rodeando meu corpo e percorrendo ao redor.
Ao momento que a aurora atinge tamanho o suficiente para resistir a uma maior influência da minha graça, estendo os braços e manifesto muito mais de meu poder com um intenso brilho em minhas mãos, fazendo com que a aurora cresça por todos os lados, rumando a atingir suas futuras proporções.
*****
Assisto a aurora emitindo seu brilho colorido no céu. Ao horizonte, o sol já se manifestou completamente, elevando sua presença cada vez mais, e posso sentir seu calor em mim.
Meu olhar se volta na direção da cidade, a qual memorizei a direção. Enquanto cumpria a primeira etapa do meu trabalho, tomei minha decisão.
Eu irei para aquela cidade.
Retorno minha atenção à aurora, sabendo que está chegando o momento de interromper a manifestação deste fenômeno, e aos poucos vou recuando, sentindo meu corpo ansiando pelo que estou para fazer, e até mesmo recuo no ar, indo na direção da cidade.
Ergo minhas mãos e começo a suprimir a aurora, comprimindo a graça que utilizei para criá-la inicialmente, e aos poucos as luzes começam a apagar.
Devido à grande presença da minha graça que restará aqui, manifestar novamente uma aurora destas proporções será muito mais rápido. Tudo que precisarei fazer, é lançar mais do meu poder para que os tons da aurora cresçam novamente.
Quando por fim a aurora desaparece do céu, e com a empolgação crescendo em mim, viro-me e começo a voar rapidamente na direção da cidade.
Meu rosto carrega um largo sorriso, o vento passa rapidamente pelo meu corpo, e conforme vou me aproximando, vejo a cidade humana cada vez mais próxima. Quando chegar lá, não sei o que farei, mas estou tão ansiosa que não consigo pensar em nada.
Passo os olhos ao redor rapidamente ao redor, e escolhendo um lugar vazio, pouso rapidamente, erguendo uma grande quantidade de vento e poeira assim que meus pés tocam o chão, e nesse instante, não sei o que sentir.
Estou aqui. Realmente estou aqui.
Sinto uma euforia imensa em meu peito, e um misto de sensações me percorre de forma que não sei como consigo abrigar em mim.
Me preparo para isso e, recolhendo minhas asas e com minha auréola dissipando acima da minha cabeça, reúno coragem e me levanto, com incontáveis coisas passando em meus pensamentos simultaneamente.
Olho a mim mesma por uma vez e passando as mãos pelo meu vestido longo, questiono se as vestes que escolhi são adequadas para isso, ou se causarei estranhamento nos humanos que me encontrarem.
Hesito, mas mesmo com meu corpo tremendo, dou meu primeiro passo neste mundo novo.
Um passo cauteloso, talvez buscando saber se essa é uma realidade ou um devaneio dos meus pensamentos. E então um segundo passo, e mais outro, e mais outro. Cada vez mais me convenço de que o que estou experienciando é real.
Ao sair do local onde me escondi, olho de um lado ao outro, estudando o lugar onde estou por longos momentos. Estou em um lugar cheio de dormitórios humanos, todos são muito menores que os locais do paraíso, mas são diferentes.
Tem aspectos e aparências diferentes. Muitas cores diferentes. Ao redor vejo também plantas diferentes, de tamanhos e formatos diferentes, muitas das quais nunca vi no paraíso. Elas são separadas por um tipo estranho de parede alta, e várias portas que lembram muito grades, e placas de cores únicas.
Se me lembro bem, Ion'Alia me contou uma vez que os humanos chamam seus dormitórios de "casa", ou algo muito semelhante a isso.
Conforme avanço com cautela, vejo alguns humanos caminhando, outros saindo de seus dormitórios. Imagino me aproximar, entretanto alguns deles não parecem muito dispostos a conversa, já que avançam apressados para lugares que desconheço.
Encontro um local onde vários humanos estão reunidos, e me permito observá-los, e de imediato estranho o comportamento deles. Todos estão parados, olhando para uma mesma direção ou para pequenos objetos em suas mãos, parecendo aguardar algo.
Percebo um som próximo, e me voltando a origem do som, noto um tipo de estrutura grande e barulhenta se aproximando, e dentro dela alguns outros humanos estão reunidos, e um outro humano parece comandar essa coisa.
Uma porta se abre, e todos ali reunidos entram na tal coisa, que volta a movimentar-se a um destino desconhecido por mim. Humanos usam essas coisas para irem de um lugar ao outro? Eles vão em grupos? Mas se eles estão em grupos, por que não conversam entre si?
Eu não entendo.
São dúvidas crescentes, as quais não encontro nada que me dê uma resposta, e nem mesmo tenho um outro anjo aqui para me explicar. Mas não tem problema algum, creio que em breve entenderei.
Continuo andando pelo lugar, não sabendo ao certo como me sentir. A euforia é imensa por finalmente estar aqui, por estar envolta a tantas coisas novas, e ao mesmo tempo, sinto-me um pouco deslocada por não saber de nada sobre este mundo.
Mais à frente, vejo algo que se assemelha um pouco aos cenários do paraíso. Ao me aproximar, constato que o lugar parece ser um tipo de jardim, com grades baixas em formas curvadas, alguns bancos de pedra, e diversos arbustos com flores em tons rosados, e algumas poucas árvores cortando a luz do sol e criando um contraste de iluminação e temperatura ao corpo.
Paro meu caminhar, olhando as flores. São pequenas, mas todas elas exibem a mesma tonalidade, e me atrevo a dizer que elas me encantam muito, e não consigo desviar meu olhar delas.
Abaixo-me devagar e fico olhando as flores, aproximando minha mão de uma delas – Você não pode pegar elas moça. – Ouço uma voz doce perto de mim, o que ainda assim me assusta a princípio.
Viro-me para a dona da voz, e vejo uma pequena criança humana. Uma menina de longos cabelos dourados e bem ondulados, bochechas redondinhas, olhar profundamente claro repleto de inocência, e um tom de pele muito semelhante ao meu. Trajando um vestido branco, calças e sapatos escuros, e uma veste por cima maior e com muitos pelos perto do pescoço, além de um adorno branco na cabeça e algo amarelado e brilhante preso à orelha.
- Ah, eu... – Tropeço em minhas próprias palavras, por não esperar uma pequena falar comigo de forma tão repentina. – Não iria colhê-las.
- Não pode colher elas. – A menina repete, chegando mais perto e abaixando ao meu lado, e acho impossível não me encantar com a doçura de sua voz – Mamãe me diz que se colher, elas morrem... E não gosto que as flores morram.
- Eu também não gosto, por isso não se preocupe. Não irei recolher estas flores. – Respondo sorrindo sinceramente ao ver o olhar da menina se iluminar.
- Você promete? – Ela insiste, me olhando fixamente. Ainda não sei o que significa essa palavra. – As flores ficam feias quando morrem, e não gosto quando ficam feias. Elas sempre deveriam ser bonitas, por isso nunca recolho elas nem do jardim de casa.
- Entendo... Eu prometo, não irei colher nenhuma delas. – Continuo sorrindo sem parar, e devagar afago os cabelos da menina enquanto olho ao redor, não encontrando mais ninguém próximo – Você está aqui sozinha?
A menina balança a cabeça negativamente – Não, estou com minha mamãe.
- Mas onde ela está? – Pergunto, continuando a procurar algum humano próximo.
- Eu... – Ela hesita – Eu... Não sei... Me perdi dela, e vim esperar ela aqui na praça. Ela fala que é o lugar onde ela e o papai se conheceram, e gosta muito daqui. Pensei que vindo pra cá, encontraria ela.
- Ela ainda não está aqui. – Digo e seu olhar vai ao chão, um pouco insegura – Mas ficarei com você, até ela chegar. O que acha?
- Você fica? – A menina me olha desconfiada, e eu confirmo com a cabeça.
- Podemos ficar ali e esperar ela chegar. – Digo apontando para um banco próximo, e estendo a mão para ela – Vamos?
Relutantemente a menina segura minha mão, e nos levantamos, indo na direção do banco indicado. Olho ao redor por mais uma vez, buscando por um humano que seja semelhante a essa pequena, porém não encontro ninguém próximo.
- Como você se chama? – A menina me questiona de repente.
Reflito por um instante, sem saber se falo meu nome ou não. Decido que não existe real problema em falar meu nome para esta menina. – Meu nome é Mi'Ka.
- Mika? – A menina pergunta novamente, sem desviar o olhar de mim. – Mika... De Mikaela?
Por algum motivo sinto-me surpresa olhando a menina, considerando curioso ela ter dito meu nome de uma forma diferente – Mikaela é bonito... Mas não, é apenas Mi'Ka.
- Hm, só Mika... – Ela repete para si mesma, e novamente me encanto com o jeito desta pequena, não me importando dela falar meu nome de maneira errada – Eu te entendo, sabe, fiz a mesma coisa com meu nome... Meu nome é Mel... Na verdade, é Melissa, mas gosto muito mais que me chamem de Mel. Acho muito mais bonito do que Melissa, igual você, que deve gostar muito mais de Mika do que de Mikaela. Acertei?
Dou risada da linha de pensamento da menina – Sim, você acertou Mel. Posso te chamar assim, né?
Ela assente com a cabeça com animação – Pode sim Mika... Hm... Você é nova na cidade?
- Como sabe que sou nova por aqui? – Questiono, me permitindo ceder a curiosidade, e um pouco intrigada pela menina ser tão precisa em sua suposição.
- Nunca te vi antes, e nunca esqueço uma pessoa. A mamãe me diz que sou ótima em lembrar das pessoas, e às vezes lembro de pessoas que não vejo a muito tempo. – Mel para e se perde em seus próprios pensamentos, tornando a me olhar – Então, não é mesmo da cidade. Que legal, nunca conheci ninguém de fora... Já conheci familiares que moram longe, mas acho que eles não contam por serem da família... De onde você é Mika?
- Eu... – Paro diante de seu olhar curioso. Creio que o melhor seja não contar a esta menina de onde venho, ou o que sou – Sou... De longe... Muito longe.
- Muito longe? – Ela repete, piscando algumas vezes seus belos olhos azuis.
Assinto com um sorriso – Sim, muito longe. Cheguei a pouco tempo, e em breve irei embora.
- Mas por que? Não gostou daqui? – Mel continua com suas perguntas.
- Pelo contrário, Mel. Estou gostando muito daqui. – Digo sinceramente, afagando seu cabelo e recebendo um sorriso dela – Mas não posso ficar. Logo preciso ir embora.
Um momento de quietude se prolonga entre nós. Seu olhar vai ao chão um instante – Então... Acho que você volta algum dia Mika...
- Acha isso? – Pergunta contendo meu riso.
- Uhum, você gostou daqui. – Ela diz inocentemente – E a mamãe diz que nós sempre voltamos para aquilo que gostamos...
Sempre voltamos para aquilo que gostamos. Essas palavras ecoam em meus pensamentos, e em meu interior, anseio que tais palavras sejam verdadeiras a nós anjos.
- Sua mãe parece alguém muito sábia. – Digo admirada com essa pequena, e deixando uma agradável sensação crescer em mim. – Desejo conhecê-la em breve.
A menina aperta seus olhos – Você fala de um jeito engraçado.
Não seguro meu riso de sua fala tão repentina. – Por que?
Ela continua com seu olhar apertado – Ninguém aqui fala como você Mika. É bem diferente, mas acho que gosto disso.
- Bem, sou muito grata. – Respondo aos risos, e apesar dos olhos apertados, Mel ri comigo.
Nesse curto momento, notei que realmente nos expressamos de formas distintas.
- Sabe Mika, pensei outra coisa. – Ela diz me olhando – A gente é muito parecida.
- Como? – Pergunto, sem saber o que responder de fato. A menina coloca a mão em um espaço de sua roupa, e logo tira algo estranho – O que é isso?
- Um espelho. – Ela diz como sendo a coisa mais óbvia, e após olhar para ele fixamente, Mel me entrega o objeto – Olha, somos parecidas mesmo.
Sem entender, pego o objeto de sua mão com cautela e me permito olhar a ele. Um rosto aparece no objeto, a qual me deixa imediatamente surpresa. Uma aparência feminina, de olhar azul bem claro, fios de cabelos dourados, longos e lisos, pele com alguma cor, bochechas pouco fofas, e uma boca pequena mas grossa.
Olho para ele por alguns momentos, esticando o braço e o afastando devagar, reparando que tudo que faço, o rosto faz exatamente igual. Viro o rosto de lado, pisco, abro a boca, toco os dedos o rosto, tudo se repete no tal espelho.
- Essa... – Consigo dizer, e a surpresa cresce em mim quando finalmente entendo – Essa... Sou eu?
- Sim, é você Mika. – A menina diz, parando ao meu lado, e seu pequeno rosto aparece bem ao lado do meu. – Nós duas somos parecidas, não acha?
É a primeira vez que posso ver a mim mesma. Em tanto tempo sempre me perguntei como sou, e nesse instante finalmente tenho tal conhecimento. Saber como sou me tira as palavras, e por muito tempo permaneço me olhando, sem conseguir acreditar que essa sou eu.
Apesar da minha surpresa, olho bem para a menina no espelho, e então para mim mesma uma última vez, notando tal semelhança que ela viu em nós duas. Entrego o espelho de volta, e prontamente a menina o guarda. – De fato, somos muito semelhantes.
Ergo meu olhar ao alto, atenta nas nuvens movendo-se lentamente no alto. Vejo alguns animais voando pelo céu, enquanto que os sons ao redor são praticamente nulos.
Começo a refletir que em breve devo retornar ao meu trabalho. Sei que devo ir, mas ao mesmo tempo não quero ir, tanto por este momento na companhia da pequena Mel me agradar, como também por não poder deixá-la sozinha.
Volto a olhar para a menina, que está com fios de seu cabelo entre os dedos, mergulhada em seus pensamentos e pequeno sorriso sereno. Como posso fazer isso?
- Mel? – A chamo, e a menina ergue seu olhar para mim – Eu... Tem algo que preciso fazer.
- O que é? Você... Vai me deixar sozinha Mika? – Ela pergunta com olhar surpreso, e talvez... Um pouco decepcionado. Tenho a impressão de ver seus belos e puros olhos azulados sendo manchados com aflição pela possibilidade de ser deixada sozinha.
- Não. Não, de jeito algum farei isso Mel. – Digo a acalmando, mas ainda não encontrei uma solução para isso. – Prometi que te farei companhia, até sua mãe retornar... E vou cumprir com o que prometi.
Aperto o lábio e baixo meu olhar ao chão, refletindo como posso retornar ao meu trabalho sem deixar Mel sozinha. Sei que fazer a aurora ressurgir no céu é algo que levará muito pouco tempo, entretanto, não sei quanto tempo levarei até ir até ela e retornar.
Pode não ser seguro deixá-la sozinha, por isso, tomo minha decisão.
- Tenho um trabalho a cumprir. – Digo a menina que continua me olhando – Mas não irei te deixar sozinha... Irei te mostrar uma coisa sobre mim, mas não poderá contar a ninguém.
- É um segredo? – Mel pergunta, e sinto-me confusa. Não sei ao certo o que ela quer dizer com isso. Não conheço esse termo "segredo" nem o que ele significa. Acredito que isso seja algo que envolve manter sigilo sobre algo, e então assinto. – Sim, é um segredo. Promete não contar a ninguém?
- Prometo! – Ela confirma com um misto em seu olhar.
Nesse instante, creio que acabei de compreender o que significa "prometer".
Fico de pé, olhando ao redor por alguns instantes. Não vejo humanos próximos por nenhum lado, nem nada que esteja olhando em nossa direção. – Certo... Peço que não se assuste.
Olhando fixamente a menina, devagar liberto minhas asas que crescem ao meu redor, e minha auréola surge sobre minha cabeça, e a menina tem um olhar tomado de surpresa a mim.
Abaixo frente a menina, que não diz nada, mas está boquiaberta olhando para mim. Seu olhar não foca em apenas uma coisa, ela olha para minhas asas, minha auréola, e por fim ao meu rosto, e esse ciclo se repete por várias vezes.
Estendo uma mão a ela e ofereço um sorriso. – Será rápido Mel. Logo retornaremos, e esperaremos por sua mãe.
A menina segura minha mão, e devagar a seguro em meus braços, e ela passa seus pequenos braços em torno do meu pescoço com firmeza. Seu corpo é pesado, mas não é nada que realmente me incomoda. Pelo contrário, a sensação que tenho difere de tudo que já experienciei.
Abro minhas asas num bater forte, saímos do chão e seguimos ao céu. A menina me segura com firmeza, e correspondo a mantendo bem próxima ao meu corpo, e vendo a cidade ficando cada vez mais distante, retorno ao local da aurora, onde realizarei a segunda e última etapa do meu trabalho.
Levo alguns poucos momentos voando e reconheço o lugar, junto a presença da minha graça, e com isso vou diminuindo meu movimento até pairar no ar. O vento passa por nós, de forma que sinto minhas vestes e cabelos voando.
Reparo como a menina me segura e esconde seu rosto em meu pescoço, e percebo também como sua respiração está apressada – Mel? Algum problema?
- Mika... Eu... – Ela responde com a voz abafada e trêmula. – Tenho medo de altura...
- Fique tranquila Mel, está segura. – Digo com carinho, afagando seu cabelo lentamente tentando lhe transmitir segurança – Não permitirei que nada aconteça com você. Pode confiar em mim.
A menina não responde, mas sinto como ela vai se acalmando aos poucos, e sua respiração suaviza.
- Vou fazer meu trabalho. Poderá assistir, se assim desejar. – Digo com a voz sussurrada.
Olho ao redor, e ergo uma mão lentamente, tornando a manifestar meu poder. Aos poucos, as luzes tornam a ressurgir, tons verdes percorrem o céu, crescendo a cada momento de acordo com a influência da minha graça.
Percebo que Mel virou seu rosto, e apesar de não conseguir ver sua feição com clareza, consigo sentir a surpresa crescendo na pequena ao assistir o véu luminoso da aurora surgindo no céu.
Assim que termino meu trabalho, tornando a aurora forte o suficiente para perdurar as quatro horas humanas, torno a segurar a menina com ambas as mãos, lhe dando melhor apoio, e percebo como seus olhos brilham – Terminei. Gostou?
- É muito bonito... – Ela diz baixinho e me olha – Você que fez?
- Sim, esse é meu trabalho. – Respondo sorrindo de sua reação, e diante de tudo que já mostrei a esta pequena, sei que já não faz diferença esconder o que sou. – Sou um anjo boreal.
- Um anjo... – Ela diz baixinho, e volta a olhar para a aurora.
A menina relutantemente estende sua mão na direção de uma das várias luzes que percorrem o céu, até que seus dedos conseguem tocar a aurora envolta pela minha graça. A menina olha maravilhada para o que para ela deve ser um espetáculo visual, e seu sorriso mostra seu encantamento.
Não quero romper a experiência que a menina está tendo, e por mais alguns instantes, deixo Mel aproveitando ao máximo as luzes da aurora boreal, e me perco com o brilho de seu sorriso, tão radiante quanto a própria luz do sol.
- Vamos voltar. Precisamos esperar sua mãe. – Digo, atraindo a atenção de Mel – Creio que ela esteja te procurando.
Ela assente com a cabeça, e tornando a firmar seus braços em torno do meu pescoço por mais uma vez, bato minhas asas e começo a voar de volta à cidade.
Notas Finais
1º - Os anjos são capazes de manifestar e recolher suas asas livremente, e esse ato independe de suas graças. Suas auréolas acompanham a presença das asas, e sempre se manifestam em conjunto.
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