Capítulo 26

5178 Palavras

Não sei por quanto tempo cantei, ou tentei, mas tenho certeza de que foi por bastante tempo pelo tanto que minha garganta está seca.

Por sorte, Klauss comprou uma garrafa de água para mim, então já estou um pouco melhor.

Mas não me arrependo, afinal fazer isso valeu a pena. Não só tive a chance de cantar por tanto tempo, como também consegui fazer Klauss perdeu um pouco de sua postura, por mais que agora ele tenha retornado a sua feição calma e firme.

- Então... – Começo a falar, olhando ao redor – Onde vamos primeiro?

- Iremos apenas andar. – Ele responde com total simplicidade.

- Só isso? – Pergunto incrédula.

- Sim. Saberei os lugares que ainda não conhece. – Responde, levando as mãos às costas.

- E como isso? – Pergunto tentando entender como ele fará isso.

- Tudo que preciso fazer, é te observar. Você me dirá os lugares que não conhece. – Explica com tamanha simplicidade, que instiga minha curiosidade em saber como ele fará isso.

A princípio ignoro isso e mantenho minha atenção ao redor, atenta ao detalhes da cidade a minha volta. Já vim a esse lugar algumas vezes, e apesar de não andar tanto ao redor apenas para conhecer, sempre prestei bastante atenção nos detalhes desse mundo.

E agora que caminho por aqui com essa liberdade, me atento melhor a outros detalhes. Apesar da praça dos Ipês ser um local bem arborizado, essa é uma característica de muitas ruas daqui.

Ainda assim, percebo um certo padrão enquanto vago neste lugar. Apesar das construções e casas serem diferentes em suas aparências, tenho uma leve sensação das ruas serem apenas mais do mesmo. Casas e casas com visuais diferentes e cores semelhantes, tendo ou não carros parados. Isso sem contar com portões tão fechados e altos que não é possível ver nada do outro lado. Não entendo isso, parece algum tipo de grande prisão disfarçada de casa.

Enquanto que nas principais avenidas que passamos, algo semelhante acontece. Muitas lojas diferentes, cada uma com um foco diferente, e apesar de encontrar bem mais variedade aqui, ainda não sinto me empolgar como em outras vezes. Não tenho aquele ímpeto de entrar em cada loja para ver mais, pois nenhum desses lugares me parecem interessantes a esse modo, mesmo nunca os tendo visto antes.

As coisas neste mundo, por maior que ele seja, me dão a sensação de serem repetidas. Quanto mais olho, me parecem apenas... Mais do mesmo.

Meu fascínio pelo mundo humano está diferente. Parece... Mais fraco... Ainda existe, mas não mais como foi em outrora.

- Tem um lugar que quero mostrar a você. – Klauss diz de repente, me tirando de meus pensamentos.

Viro meu olhar a ele, e reparo que o anjo está com sua atenção voltada a mim. Sua feição me da uma sensação de que ele estivesse aguardando por alguma coisa, que não sei bem o que é.

- Qual lugar? – Questiono curiosa.

- Veja, bem ali na frente. – Ele diz, e começo a procurar o que ele indicou.

Conforme avançamos, vejo um espaço diferente não muito longe de nós. Ele é amplo, com algumas estruturas de metal bem diferentes de todo o restante ao redor, alguns altos, outros muito mais altos, alguns estão girando no ar em movimentos rápidos não tão bruscos, outros sendo bruscos, e muitos humanos ali, e presenciar tudo isso me enche de empolgação de tão diferente.

- O que é tudo isso?! Por que nunca vi esse lugar antes?! – Pergunto segurando Klauss pelo braço e o sacudindo de leve, não contendo minha própria empolgação nesse instante.

- Creio que você nunca veio para esse lado da cidade antes. Por isso, ainda não conheceu esse parque de diversões. – Klauss explica.

- Um parque de diversões... – Sussurro para mim mesma – Vamos conhecer, não é?

Ele me analisa por alguns segundos, soltando um riso nasal. Nem sei qual deve ser meu rosto nesse instante, mas minha expectativa deve estar clara – Sim, nós vamos.

- Mas... Por que chamam de parque de diversões? – Pergunto olhando o anjo – Qual a diferença dele para os outros parques? Não é para se divertir neles? Porque me diverti nas últimas vezes que fui a um parque...

Klauss me olha fixamente, conforme nos aproximamos da entrada – Este tipo de parque é focado em diversão e movimento com todos aqueles brinquedos, enquanto os parques convenciomais são voltados a uma diversão calma.

Acabo assentindo pouco antes de entrarmos – Entendi, cada um com um foco diferente.

- Exatamente. E este aqui tem vários brinquedos diferentes. – Ele pergunta, e confirmo animada.

Meus olhos já encheram simplesmente ao olhar algumas das coisas, e entrar nele me fez explodir de empolgação, de forma que não sei bem para onde olhar, ou para onde ir primeiro.

Escolho um que é uma torre bem alta com algumas cadeiras, e puxo Klauss para vir comigo. Sua surpresa deixa claro que ele não esperava ser puxado para um dos brinquedos, mas a forma como estou animada parece fazê-lo ceder e aceitar me acompanhar.

Pegamos uma pequena fila, que rapidamente vai esvaziando até chegarmos ao brinquedo. Estou quase pulando de animação assim que entramos, e observando as várias pessoas que saem do brinquedo e os risos delas, imagino o quão divertido seja.

Assumimos dois bancos e quando todos se posicionam, ouço o som de algo que parece uma tranca, e começamos a subir lentamente. Estou ansiosa pela experiência, enquanto Klauss está aparentemente neutro, mas seus olhos estão tentando encontrar o chão, e tenho a impressão de vê-lo tentar encontrar o chão abaixo de si.

Ao chegar ao topo, os bancos despencam de uma vez em alta velocidade, e sem que eu perceba estou gritando de tão brusco que foi o movimento, e estar limitada a esse banco me assustou. Meu peito salta com a adrenalina, e por mais que tenha tomado esse susto, eu gostei, e quero de novo, e assim que olho para Klauss, percebo o anjo segurando as travas firmemente, seus lábios contraídos e os olhos fixos para frente.

Tenho vontade de rir ao ver essa cena, não esperava vê-lo reagir assim. Os bancos voltam a subir, mas no meio do caminho despencam novamente, e a surpresa me faz gritar outra vez, mas dessa vez empolgada com isso, junto das demais pessoas que vieram conosco, de forma que até ergo os braços, sem me importar com a trava em torno do meu corpo.

Por última vez, o brinquedo volta a subir, aproximando-se do topo, mas mal alcança o ponto mais alto e volta a descer bruscamente, agora indo sem rumo ao chão. Dou risadas com isso, vendo tudo passando rapidamente e o chão se aproximando, quando por fim para, e estamos de volta no chão.

As travas se erguem, e podemos ficar de pé. Me levanto e olho para trás, Klauss ainda está no lugar, com as mãos sobre os joelhos, me olhando com os olhos arregalados e semblante surpreso. Dou risadas de sua reação, e pegando suas mãos, o puxo para irmos ao próximo.

O anjo ainda parece bem mexido com a experiência recente, e vendo como consegui causar isso, olho em volta, escolhendo o próximo brinquedo. Quando finalmente faço minha escolha, me viro ao anjo com um sorriso travesso e olhar pidão, e quando Klauss entende qual é minha escolha, dá para ver o desespero crescendo em seu rosto.

Sem dar a mínima chance dele negar, o puxo para a fila do brinquedo, que já estava bem pequena, e conseguimos entrar junto das pessoas, pegando lugares um ao lado do outro. Não vi como esse funciona, então será uma surpresa para mim também.

Novas travas prendem em torno de nossos corpos, olho Klauss de canto de olho, e percebo como ele está todo duro no banco. De repente o brinquedo começa a andar, seguindo um tipo de caminho, subindo uma trilha bem alta, que permite ver quase o parque inteiro e todos os brinquedos ao redor, que me dá mais vontade de ir em cada um deles, além de uma parte mais próxima da cidade.

De repente, onde estamos chega bem no topo de uma colina, e depois percorre em altíssima velocidade, segundo todo o caminho em voltas, inclinações e ainda por cima dando voltas tão rápidas que ficamos de cabeça para baixo algumas vezes.

Sei que soltei meus braços da trava a muito tempo e apenas os deixo erguidos, gritando e rindo de diversão com o brinquedo que estamos. Olho rapidamente para Klauss, e a única coisa que consigo ver é o anjo segurando a trava com força, se mantendo imóvel de tão duro no banco, os dentes apertados e sua feição praticamente sem saber como reagir.

Não sei quanto tempo ficamos nesse brinquedo, mas foi algo ao mesmo tempo que pareceram longos minutos, também deu a sensação de serem poucos segundos, e assim que paramos de volta ao ponto de partida, respiro fundo várias vezes completamente eufórica, enquanto que Klauss está olhando de um lado ao outro, completamente incrédulo e boquiaberto.

Estou adorando isso, e antes que ele pense em dizer qualquer coisa quando saímos do brinquedo, já tenho alguns outros em mente para aproveitar, o arrasto ao próximo sem dar a menor chance de escapar.

*****

- Foi ótimo! – Digo gargalhando enquanto caminhamos para longe do parque de diversões, extremamente animada depois de ir em tantos brinquedos, por mais que esteja um pouco tonta.

Klauss acompanha meu passo, tentando ao máximo recuperar sua postura. Entretanto, sua feição está bem diferente da de sempre. Ele está desconcertado, com os cabelos bem bagunçados de tantos brinquedos rápidos, além disso tenho a impressão de tê-lo visto suando de nervosismo por algumas vezes, além dos botões mais altos de sua camisa estarem abertos agora.

- Eu gostei muito de hoje! – Estico bem meus braços acima da cabeça.

- Estou vendo Mika. – Ele responde, praticamente derrotado depois de hoje.

- Nunca te vi assim Klauss. – Digo propositalmente para provoca-lo, sorrindo de canto e com uma sobrancelha erguida – Está tudo bem?

- Foi minha primeira vez em um parque desses... Não sabia que era assim. – Ele responde, mas estou vendo como é difícil para ele manter sua voz nesse instante.

- Imaginei isso, vendo como você ficou nervoso na maioria dos brinquedos. – Digo gargalhando sem me segurar, e ele revira seus olhos, os desviando para o lado com um ar emburrado. É a primeira vez que o vejo dessa forma, e é engraçado. – Achei que já tinha vindo.

- Nunca, foi minha primeira vez. – Ele responde, passando uma mão pela testa. – E acho que será a última. Isso foi horrível...

- Ah, não foi tão ruim assim, admita! – Provoco sem deixar de olhá-lo, enquanto caminhamos a uma praça não muito longe de onde está o parque.

- Você não podia escolher alguma coisa que... – Ele me olha, parecendo tentar encontrar as palavras certas, e então ele faz movimentos circulares com o indicador.

- Que girasse menos? – Pergunto, tentando controlar meu riso.

- Isso, que girasse menos, dessem algumas voltas a menos, e que fossem só um pouco mais devagar. – Ele diz, e sua expressão é tão diferente agora, que é impossível para mim não ficar olhando, já que é a primeira vez que o vejo fora de sua postura.

- É claro que sim... Mas se eu fizesse isso, que graça teria? – Pergunto, e ele me olha um pouco boquiaberto, e suspirando novamente, ele balança a cabeça negativamente, e sei que não terei uma resposta tão cedo.

A tontura ainda está presente, não tanto como em outros brinquedos, mas o bastante para que eu tropece nos pés e quase caia para frente, se não fosse por Klauss conseguir me segurar momentos antes, e me ajudar a me manter de pé.

- Você exagerou hoje Mika! – Ele diz com os olhos apertados, e seu tom é de bronca.

- E você fica divertido desse jeito. – Rebato sua bronca, tocando a ponta do dedo no seu nariz, o que novamente o deixa bem desorientado.

- O que quer dizer? – Ele pergunta olhando para o lado, como se não conseguisse me olhar diretamente neste momento. – Desse jeito... Como? Estou como sempre estive...

- Não está não. Você está todo desconcertado, e nunca te vi assim. – Digo, descendo o dedo do seu rosto ao seu peito, e ele torna a me olhar de soslaio nervosamente – É bem melhor do que sua cara séria de sempre.

Ele solta um suspiro, outra coisa que nunca o vi fazendo, e devagar vai me soltando e endireitando sua postura, mas finjo uma nova tontura e pendo o corpo para frente, caindo sobre ele e o fazendo se desequilibrar um pouco para me segurar, enquanto dou risadas.

- O que está fazendo Mika? – Ele pergunta ajeitando as mãos em torno da minha cintura, e suas sobrancelhas sobem ao ver que simplesmente não paro de rir.

Passo os braços em torno de seu pescoço, respirando fundo para conter minhas risadas, e olho fundo em seus olhos, que estão cheios de confusão – Foi legal... Gostei de hoje.

Klauss me olha fixamente enquanto sorrio sem parar, e sua expressão suaviza após um demorado suspiro – É, eu também gostei. Foi legal mesmo.

- Não tinha dito que foi horrível? – Pergunto rindo baixinho.

- E foi. Não quero voltar a pisar em qualquer um daqueles brinquedos. – Ele responde, me puxando para mais perto de si, e seus dedos tocam meu rosto lentamente – Mas não significa que eu não tenha gostado.

- Que contraditório! – Pontuo, com as sobrancelhas erguidas.

Ele me observa, e deixando um pequeno riso escapar, ele me sorri – Eu sei.

Assim permanecemos, com olhares conectados e corpos unidos, diante de um silêncio que de forma alguma é incômodo, e devagar nosso abraço aprofunda, enquanto deito meu rosto em seu ombro, e sinto seu corpo ao meu. Estar assim é confortável, agradável, me transmite um acolhimento que me deixa tão leve, que nenhum problema parece existir.

Abro meus olhos por um momento, e vejo uma pequena de cabelos dourados e bem ondulados, sentada em um banco não muito longe de nós. Ela nos observa com um par de olhos curiosos, balançando seus pés para fora do banco.

Me afasto devagar de Klauss, olhando fixamente para a menina, que mantém seu olhar em nós ainda bastante curiosa, e percebo que ela me parece muito familiar.

A menina se levanta do banco, e vem caminhando até nós devagar, e conforme ela se aproxima, mais tenho a certeza de que ela é familiar, mas não me lembro onde posso ter visto essa pequena antes.

Ela para perto de nós, e seu olhar azulado está em mim – Mika? – Ela diz, e sua voz suave e tão agradável desperta as minhas memórias.

A tanto tempo atrás, eu conheci uma menina humana no dia que decidi explorar o mundo humano, contrariando o que deveria fazer. O primeiro humano que conheci e interagi, foi uma criança humana de cabelos dourados bem ondulados, que exalava tamanha inocência e pureza que nunca vi igual em nenhum outro, e agora que me lembro disso... Percebo que essa menina, é aquela que vi a tantos anos atrás, e seu nome me vem em mente.

- M... Mel? – Sussurro me aproximando e abaixando devagar a sua frente, não acreditando que a estou vendo novamente – Mel? É... É você?

Seus olhos se iluminam em um brilho único, e um belo sorriso surge em seu rosto, e ela salta em minha direção, envolvendo seus pequenos braços ao meu redor – Mika!

- Eu não acredito, é você Mel! – Correspondo ao abraço com força, feliz de rever a pequena após tanto tempo, tanto que ainda não acredito ter reencontrado essa pequena.

- Que saudade de você Mika. – Ouço ela sussurrar – Eu fiquei pensando que nunca mais te veria de novo, que você já tinha me esquecido, e achei que tinha sido um sonho, mas eu sabia que não! Sabia que você era de verdade!

- Não me esqueci de você Mel, mas as vezes também, também cheguei a pensar que tudo tinha sido um sonho. – Sussurro me afastando devagar dela, com meu coração pulando de alegria enquanto olho a pequena humana que está radiante, como da primeira vez que a vi – Você cresceu? Está maior do que antes?

- Eu cresci, e adivinha? – Ela ergue sua mãozinha a mim – Eu fiz cinco anos, sabia?

- Não sabia, quando fez cinco anos? – Pergunto, entretida com sua animação.

- Eu fiz... – Ela para, pensando, pensando, e pensando, contando em seus dedos – Faz bastante tempo, eu não me lembro, mas foi muito legal. A mamãe fez uma festa pra mim e convidou todos os meus amigos da escola, eu queria que você também fosse, eu queria mostrar você pra todo mundo, mas a gente não sabia onde você morava, então não pudemos te chamar para meu aniversário... Eu fiquei triste porque você não pode ir, tinha muito bolo e estava gostoso, você ia gostar Mika, mas agora estou muito e muito feliz por te ver de novo!

- Também estou feliz de te ver de novo Mel. – Respondo toda sorridente – Não podia estar aqui, estava muito longe.

- Eu sei, você estava no céu fazendo auroras. Eu lembro quando você me levou e mostrou a aurora bem de perto, você lembra? – Seus olhos brilham ao contar daquele dia, e dou um sincero sorriso ao lembrar daquele momento que tive sua companhia no céu – Sabia que eu sempre ficava olhando o céu tentando ver se você iria fazer uma nova aurora? Ninguém acredita quando eu contava que você é um anjo, nem a mamãe acredita.

- Tudo bem não acreditarem Mel. – Sussurro com carinho – Você sabe que sim, te mostrei minhas asas, lembra?

- Lembro, nunca esqueci das suas asas. Elas eram tão bonitas, sempre me lembro delas, e eu já desenhei muitas vezes, sempre desenho, mas acho que nunca fica tão bonitas quanto as suas. Você tem que ver, eu desenho muitas coisas, mas sempre gosto de desenhar as suas asas, quero te mostrar meu desenhos Mika. – Ela diz empolgada, e adoro isso nesse pequena, e não fazia ideia de quanta falta eu sentia disso.

- E eu vou gostar de ver seus desenhos Mel. – Respondo sorridente, quando a pequena vira seus olhos para algo atrás de mim, e devagar acompanho seu olhar, encontrando Klauss assistindo a cena toda, sem ter dito nada até então.

- Quem é esse moço, Mika? – Ela pergunta curiosa.

- Esse é o Klauss. Eu moro com ele. – Digo observando o anjo.

- Você mora com ele? – Mel pergunta com seu jeito inocente – Ele é seu namorado?

Pisco algumas vezes, olhando para a menina, e então para Klauss, que está nos olhando com uma sobrancelha saltada – Meu namorado?

- Vocês dois estavam se abraçando tanto, e a mamãe me disse que todo mundo que é mais velho que se abraça tanto namora. – Ela diz de seu jeito doce, e volto a olhar para ela.

- Eu... Eu não sei... – Respondo pensativa – Acho que ele é meu namorado sim.

Mel se afasta de mim e, em passos não tão tímidos quanto imaginei que seriam, ela se aproxima de Klauss e o olha, com certa admiração pela figura que, mesmo desarrumada depois do passeio no parque de diversões, consegue manter sua presença e acho que até certo charme.

- Oi, eu sou a Mel. – Ela se apresenta, com sua pequena mãozinha esticada a ele.

Klauss dá um sorriso sincero e suave, se abaixando frente a menina e segurando sua mão devagar – Oi Mel, me chamo Klauss.

- Você é um anjo igual a Mika? – Ela dispara sua pergunta sem demora, e preciso segurar meu riso com o ar surpreso de Klauss. Ele não esperava uma pergunta tão repentina.

O anjo fica em silêncio alguns segundos, quando então olha para mim por alguns segundos, parecendo até esperar alguma ajuda minha, mas tudo que faço é erguer os ombros. Com isso, Klauss volta seu olhas a ela, e até imagino que ele irá dar uma resposta negativa – Sim, também sou um anjo.

- Mesmo? Você mora com ela, né? Sabia que a Mika consegue fazer auroras? Elas são lindas, a Mika me levou para ver uma quando a gente se conheceu, fiquei com muito medo porque era bem alto, mas eu vi as luzes de perto e eu fiquei sem medo nenhum, me senti bem segura porque eu estava com a Mika, você já viu as auroras que a Mika faz? – Mel dispara em falar, de forma que para somente para retomar seu fôlego, enquanto que Klauss fica um pouco sem palavras com tamanha empolgação da pequena.

- Sim, já vi as auroras da Mika. Mas nunca cheguei a tempo de vê-la fazendo uma. – Klauss responde, e então olha para mim – Tenho vontade de presenciar algum dia.

- Você vai adorar Klauss, porque é muito bonito tão de perto. São muitas luzes e elas ficam dançando no céu e de pertinho é bem melhor que de longe, da ora ver onde as luzes estão indo, mas de longe também é muito lindo por poder ver tudo cobrindo o céu. – Ela diz cheia de animação, e não consigo não me derreter com seu jeitinho.

- Mel, onde está sua mãe? – Pergunto olhando ao redor – Você está aqui sozinha?

- Não, a mamãe está em uma loja aqui perto, ela tinha que fazer alguma coisa importante e me pediu para ficar aqui esperando ela. Ela faz isso sempre, sabe? Ela me pede para esperar, as vezes demora um pouquinho, mas a mamãe sempre volta e aí vamos para casa, ou então vou para a escola. – Ela explica pensativa.

- E hoje, sua mãe está demorando muito para voltar? – Klauss pergunta.

- Um pouquinho, mas a mamãe já demorou bem mais outras vezes. – Mel responde prontamente.

Olho para o anjo ao meu lado, um pouco preocupada – Tudo bem se ficarmos aqui e esperar a mãe dela voltar Klauss? Não quero deixar a Mel sozinha...

- Tudo bem. Também não quero que ela fique sozinha. – Ele diz, se levantando novamente.

- Vou ficar aqui com você até sua mãe voltar, ta bem Mel? – Digo segurando suas mãos, e ela me confirma com a cabeça, enquanto fico de pé novamente – Vamos ali para o banco? Foi onde você combinou com sua mãe, né?

- Foi sim. – Ela diz toda animada.

Caminhamos de volta ao banco onde ela estava antes. Mel se senta e me sento ao seu lado, enquanto Klauss aparenta estar pensativo com algo.

Mel está com as mãos sobre os joelhos, me observando fixamente, o que acho bastante curioso.

- Ei Mika... Posso te pedir uma coisa? – Ela diz de repente.

- Claro, o que é? – Pergunto curiosa.

- Eu... Quero ver suas asas de novo... Faz bastante tempo, e eu queria ver elas mais uma vez. – Ela pede em seu jeitinho tímido.

Olho surpresa para a menina, e então volto minha atenção a Klauss. Ele nada pronuncia, e na verdade, também parece esperar por uma resposta minha.

- Acho... Acho que sim... Klauss? – O chamo, esperando por uma opinião sua.

O anjo passa seu olhar ao redor por algumas vezes – Não vejo humanos próximos daqui. Acredito que não tenha problemas.

Para mim, sua resposta valeu como um sim. Ele concorda e não irá me impedir, e isso ficou claro.

Um pouco nervosa, assinto e devagar abro minhas asas, ao mesmo tempo que minha auréola surge devagar. O olhar de Mel permanece em mim, com um brilho semelhante de quando as viu pela primeira vez, mas certo espanto pois, claramente, estarem tão diferentes de antes.

- Elas... – Mel sussurra – São tão bonitas quanto imaginei, mas...

Aguardo suas palavras, que mesmo tão inocentes, não escondem sua surpresa de algo tão diferente daquilo que viu antes. Tenho medo que minha aparência de agora a assuste.

- Elas estão tão diferentes... – Ela continua, com suas mãos se aproximando, querendo tocá-las, mas hesitando por si só – Eram brancas e brilhavam... Por que elas mudaram de cor Mika?

- É... Porque... – Tento escolher minhas palavras, mas nada me vem em mente.

- Mika está cansada. – Ouço Klauss dizer, para minha surpresa.

Ergo meu olhar a ele. Klauss permanece parado, também com seu olhar atento em mim, aparentemente aproveitando o momento para olhar minhas asas por mais uma vez, e por um instante me lembro do momento que as revelei para ele. Lembro da forma que ele me olhou, e o quão sem reação ele aparentou estar, e também seus toques tão cuidadosos, que afugentou boa parte do nervosismo que senti naquele momento.

- Cansada? – Mel pergunta curiosa, tendo sua atenção voltada a Klauss.

- Sim, quando nós anjos estamos cansados, nossas asas ficam dessa forma. – Ele toca meu ombro de leve – Mika teve dias muito cheios e ainda não pode descansar como precisa. Por isso, suas asas estão dessa maneira.

Agradeço mentalmente por Klauss conseguir pensar em algo, pois eu não tinha nada em mente. – Sim, estou bem cansada. Muita coisa aconteceu.

Mel parece aceitar bem nossa desculpa, e devagar, Klauss se aproxima de mim – Melhor guardar suas asas, outros humanos podem aparecer e te ver.

- Tudo bem, é o melhor. – Concordo, e devagar vou recolhendo minhas asas mais uma vez – Desculpa guardar elas Mel, mas estou bem cansada mesmo... Minhas asas estão feias, né?

- Não estão, elas são muito bonitas. Estão amarelas, mas ainda brilham, e você está cansada. – Ela diz com um sorriso doce e sincero. – Mas você tem que descansar, a mamãe sempre me diz que preciso dormir e descansar para poder crescer. Vocês anjos também crescem, né? Vocês precisam dormir para crescer também?

- Eu não sei. – Respondo rindo – Não sei se ainda vou crescer, mas eu ainda preciso dormir. O Klauss não dorme, sabia?

- Ele não dorme? – Ela pergunta surpresa, e se vira ao anjo – Por que você não dorme?

- Eu descanso de um jeito diferente Mel. Não preciso dormir. – Responde com bastante leveza.

- Não precisa dormir, e também não precisa comer nada, acredita? – Digo, e Mel fica perplexa.

- Não precisa comer, e é grandão assim? – Ela pergunta surpresa, e Klauss não reprime um riso.

- Então, eu tenho que convencer ele a comer qualquer coisa que seja. – Digo rindo junto, enquanto Klauss apenas ri, balançando a cabeça em negativo.

- Mel, desculpa demorar tanto! – Escutamos não muito longe, e vejo uma mulher familiar se aproximando em passos apressados. Pelo suor que cai pelo seu rosto, ela parece ter vindo correndo de algum lugar.

- Mamãe! – Mel pula do banco e corre para o lado de sua mãe, que a recebe com um abraço apertado – Mamãe, olha quem está ali? Lembra da Mika?

Mulher ergue seu olhar a nós, parecendo demorar para me reconhecer – Espera, você... A moça de um anos atrás...?

Dou um aceno discreto – Desculpa, vi a Mel aqui sozinha, e não queria que ela ficasse sozinha.

- Eu agradeço muito... Não queria deixar minha filha aqui sozinha, mas preciso resolver algumas coisas, que podem ser demais para a Mel... – A mãe diz, afagando a cabeça da filha com carinho, e reparo em um semblante cansado nela.

- Não tem problema, foi ótimo rever a Mel depois de tanto tempo. – Digo com um sorriso.

- Eu gostaria muito de poder conversar, a Mel sempre fala de você... A menina que é um anjo para ela, mas não posso ficar. – Ela diz com um sorriso leve – Espero podemos conversar melhor em outro momento.

- Eu também espero isso. Estou feliz em ver vocês outra vez. – Digo sorrindo.

- Também fico feliz que pode ver a Mel outra vez. Desculpa, mas agora eu preciso ir. – Ela diz, um pouco apressada, se afastando de nós aos poucos – Até uma próxima vez.

- Tchau Mika! Tchau Klauss! – Mel diz, acenando para mim com bastante animação.

Aceno para Mel com o mesmo sorriso e a sensação agradável que tive em meu peito a tantos anos atrás. Não imaginava o quão boa era a sensação, e fico extremamente feliz em ver essa pequena criança depois de tanto tempo.

- Ela é uma pequena encantadora. – Klauss diz.

- Sim, ela é mesmo. Achava que nunca mais veria ela... – Respondo sorrindo a mim mesma – Por que me ajudou quando ela perguntou sobre as minhas asas?

- Senti que era importante para vocês duas. – Responde – Então, pensei em algo que explicasse suas asas não estarem como ela viu antes.

Assinto devagar, agradecida por isso, quando me lembro de algo, que já mexeu muito com meus pensamentos – Ei, Klauss?

- Sim? – Ele me olha.

- Você é meu namorado? – Pergunto.

- O que? – Ele pergunta, com uma sobrancelha erguida.

- Você ouviu, a Mel me perguntou isso, e eu disse que sim, mas... – Paro e reflito sobre isso, já que nunca ouvi isso antes e estou curiosa – Você é?

- Você sabe o que significa um namoro, Mika? – Ele pergunta, sem deixar de me observar, e minha resposta é um balançar de cabeça em negativo – Tá legal, em resumo, namoro é o nome que dão a uma relação entre dois humanos que se gostam muito, e que querem permanecer juntos e assumem um compromisso.

Paro e começo a refletir sobre o que acabei de ouvir, unindo alguns pontos em meus pensamentos – Então... Nós namoramos?

Klauss aperta seus olhos por um momento, mas não diz nada.

- Bom, não somos humanos, mas eu gosto muito de você, e eu quero ficar junto de você... Então, eu acho que sou namorada... Mas eu não sei se você é namorado. – Digo pensativa, o que Mel disse realmente entrou nos meus pensamentos. – Você é?

Klauss baixa seu olhar por um momento, refletindo sobre isso. – Antes de dizer, precisarei te explicar melhor o que é isso, pois não é tão simples. Somente então, creio que poderei te dizer se sou ou não.

- Tem mais coisas para saber? – Pergunto e ele responde com um leve aceno, como quem diz que tem muito mais do que eu imagino – As coisas não podem ficar no simples? Se tem tantos detalhes complicados, não podemos fingir que eles não existem, e deixar tudo simples?

- Até podemos, mas... – Eu o interrompo.

- Se podemos, acho que é mais legal assim, e se tiver detalhes quero pensar neles na hora. – Digo, enquanto Klauss me observa com as sobrancelhas erguidas em espanto – Então... Acho que sou namorada... E você, o que é?

Klauss não diz nada a princípio, quando por fim confirma com a cabeça – Acredito que vendo dessa forma, talvez eu seja seu namorado sim.

- Então, acho que somos sim. – Digo risonha.

- Humanos pedem uns aos outros em namoro dessa maneira? – Ouço Klauss questionar, mais a si mesmo do que a mim.

- Humanos pedem uns aos outros em namoro? – Pergunto curiosa.

- Normalmente, acredito que sim. – Ele responde pensativo – Alguns outros devem ser de jeitos diferentes.

- Não imaginava que precisava pedir algo assim. – Respondo ainda pensativa.

- Deixemos para pensar nisso em outro momento, vamos continuar a andar? Ainda temos muito para ver. – Klauss diz em uma leveza bem aparente.

Assinto rindo, e enquanto minha mão busca a de Klauss e ao que percebo, a dele também busca a minha, em conforme nossos dedos se enlaçam, seguimos nosso passeio pela cidade, aproveitando deste dia agradável.

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