Capítulo 25
4564 Palavras
Olho para meu quarto por alguns instantes, refletindo o que posso pegar antes de deixar este lugar. A verdade é que nada aqui é realmente meu, nem mesmo as roupas que estão nos armários, somente as peguei por não ter muitas na casa de Klauss.
Nick sai da cozinha, trazendo uma sacola consigo, com todos os mantimentos que tinha lá, muitos ainda lacrados. – Tudo bem mesmo eu ficar com essas coisas?
- Sim, por mim não tem problema algum. – Me aproximo dele, olhando algumas coisas que ele leva nas sacolas, e pego somente duas coisas – Vou querer ficar só com isso. O restante é seu.
- Eu vou sentir sua falta. – Nick resmunga com uma cara entristecida.
- Você poderá ir me visitar. – Respondo rindo, tentando desfazer essa expressão dele.
- Com ele lá? – O rapaz ergue suas sobrancelhas – Vou morrer de medo antes de chegar.
- Não fica assim, e o Klauss não é ruim. – Explico, notando que isso não tranquiliza Nick de nenhum modo – Irei conversar com ele sobre isso, e você poderá ir me visitar sim.
- Tá, alguma hora eu vou te visitar... – Nick responde – Não sei quando, mas eu vou.
- E eu ainda terei que voltar, quando cumprir meus trabalhos. – Continuo, saltando meus ombros por uma vez – Então, eu também virei te visitar. Prometo isso.
- Você vem mesmo? – Ele pergunta, enquanto pego a sacola com minhas poucas coisas.
- Claro, mas somente se você também for. – Respondo, e ele concorda rindo – Então estamos combinados, virei te visitar também.
- Estarei te esperando. – Nick sai primeiro do quarto, e reparo que ele olha para algo no corredor, e logo em seguida saio, encostando a porta – Diana?
Ouço esse nome, e ergo meu olhar na mesma direção que Nick esteve olhando, e encontro Diana ali, com algumas roupas rasgadas e sujas, faixas amarradas em algumas partes do corpo, e um visual muito menos discreto do que da última vez que a vi.
Ela abre um largo sorriso e vem correndo até nós, com os braços abertos – Mika! Nick!
A garota nos abraça com força e em risos animados, que é imediatamente retribuído por mim e por Nick, rompendo todo o silêncio do corredor.
Nos afastamos devagar, e Nick está olhando para Diana de cima a baixo repetidas vezes, como se não acreditasse que ela está de volta – Como você está diferente Diana.
- Passei muito tempo fora, muita coisa aconteceu. – Ela diz com um sorriso largo – E senti falta de vocês dois.
- Também sentimos sua falta. – Digo, me sentindo aliviada por Diana estar de volta, mas isso só significa que Stefan também está de volta.
- Só preciso descansar um pouco depois de tanto tempo fora, mas antes, eu queria ver vocês e vim visita-los... Mas não achei o Nick, e achei que poderiam estar aqui. – Diana olha as coisas em nossas mãos, e ergue uma sobrancelha – O que é tudo isso?
- A Mika me deu algumas coisas. – Nick diz, me olhando de soslaio – Ela está se mudando.
- Se mudando? – Diana ergue ambas as sobrancelhas – Para onde você vai?
- Estou indo morar no mundo humano. – Olho fixamente para Diana, não sabendo se agora ela faz parte do grupo de Stefan em definitivo ou não, e olhando de soslaio para Nick, volto minha atenção a ela – Preciso aprender mais deles, e conhecer melhor a região que eu atuo.
- Isso... Isso é muito legal, mas... – Diana tem um tom surpreso, que logo assume um ar entristecido, igual ao de Nick momentos atrás. – Você ficará lá de vez?
- Não sei ainda... Mas eu voltarei algumas vezes, e visitarei vocês. – Digo pegando as mãos de ambos e olhando a eles. – Isso eu prometo.
- Mesmo? – Ela pergunta.
- É claro. – Sorrio, e começamos a caminhar ao elevador.
- Antes de você ir, quero perguntar uma coisa... – Diana fita o chão, e ao perceber isso, Nick e eu trocamos um olhar – Perguntar para vocês dois...
- O que seria? – Nick pergunta.
- Vocês... – Ela olha para nós – Ficaram bravos comigo por ter ido com Stefan e o grupo dele?
Torço a boca por um momento, enquanto Nick solta um demorado suspiro – A gente só não entendeu por que você foi com eles.
- Eu não sei, eu só... Quis ir. – Diana responde, e não acho que ela esteja mentindo. – O Stefan perguntou se eu queria me divertir, e... Eu fui...
- Não ficamos bravos com você Diana. – Respondo.
- Mas sentimos sua falta nesses dias. – Nick completa, e paramos em frente ao elevador.
A garota ainda parece ter algo a falar, pela forma inquieta que nos observa, respirando fundo e abraçando a si mesma. – Ele... Me chamou para fazer parte do grupo dele...
Nick demonstra surpresa, e com a careta que faz e ao desviar o olhar, sei que não gostou nada do que acabou de ouvir, enquanto que eu não entendo bem as intenções de Stefan – E o que você respondeu para ele?
- Eu ainda não dei uma resposta. – Ela diz em baixo tom – Falei só que iria pensar.
Diana vira seu olhar para Nick, e nesse instante percebo seu nervosismo. Ela está esperando por algo do rapaz, o que não faço ideia do que seja. Por fim, Nick retorna seu olhar a ela, e assim permanecem por alguns momentos, mas nenhum dos dois diz nada.
- Tudo bem se eu descansar no seu quarto Nick? – Diana rompe o silêncio, e sua pergunta parece deixa-lo um pouco desorientado a princípio.
- Não tem problema, você pode vir. – Nick confirma, apertando o botão do elevador, e então as portas abrem.
- Quero dormir só um pouco. – Ela responde, e entramos no elevador.
- Fica à vontade, você pode descansar Diana. – Responde, sem deixar de olhar a ela – Quando acordar, você me conta como foi enquanto esteve fora?
- Você vai ficar desesperado com o que passei. – Diana o olha de canto, com um meio sorriso.
- Eu não vou ficar desesperado. – Nick responde com uma careta, e Diana sorri de um jeito bem mais leve com a forma que Nick reagiu – Você não perde tempo em?
- Senti falta disso. – Diana responde aos risos, e Nick apenas a olha de canto, apenas fingindo estar incomodado com ela.
- Vocês dois não conseguem ficar sem se provocar. – Dou risada olhando esses dois.
- É ela que me provoca a todo momento. – Nick devolve a fala, e reparo que ele não afasta Diana, e nem mesmo esboça querer isso – Não pode me ver, e já quer me encher.
- Você faz isso comigo também. – Ela se defende, estando mais leve com ela. Nick realmente sentiu falta da Diana nesse tempo, talvez até mais do que eu.
O elevador para seu movimento, e as portas abrem. – É aqui que nos despedimos. – Digo me virando aos dois.
- Você vai mesmo vir nos visitar, né Mika? – Nick pergunta.
- É claro que sim, voltarei muitas vezes. E logo quero que vocês dois me visitem. – Digo passando os braços ao redor deles por um momento e me afasto.
Eles me confirma, e ao nos despedirmos, eles seguem pelo corredor. Respiro fundo ao fechar das portas, e me permito me animar em estar indo para a casa de Klauss, ignorando todo e qualquer outro pensamento que eu tenha nesse instante.
*****
Enquanto faço o caminho até a casa de Klauss, tenho a sensação de que o céu está um pouco mais claro do que antes, e apesar do frio e o céu fechado de ontem, percebo que as nuvens estão dissipando.
Em poucos minutos, paro meu carro em frente ao portão, e recolhendo a sacola com minhas poucas coisas, deixo o carro, com o cansaço começando a recair em meu corpo.
Acho que preciso dormir.
Lembro-me do que deixei guardado no porta-malas, e com as palavras de Verônica em minha mente, recolho o orbe com todo o poder concentrado, tentando mantê-lo bem escondido entre minhas coisas, e vou para a casa.
Paro um momento antes de entrar, com várias coisas recheando meus pensamentos nesse instante, junto a um nervosismo em meu peito. Respirando fundo, entro na casa.
- Klauss? – O chamo ao entrar na sala, vendo um pouco de luz vindo da cozinha, além de escutar um som que não reconheço.
- Estou aqui Mika. – Ouço sua voz, e sigo até ele.
Ao entrar na cozinha, encontro o anjo frente ao fogão, sentindo um aroma agradável de café recém preparado no ar, junto agradável e acolhedor calor presente neste cômodo.
Klauss está com uma aparência diferente da habitual. Hoje ele está com uma calça branca folgada, uma camiseta branca não muito rente ao corpo, os cabelos pouco arrumados, e suas asas e auréolas manifestadas, mantidas bem próximas de seu corpo.
Quando dou por mim, estou parada no lugar por longos segundos, olhando para Klauss fixamente, boquiaberta ao vê-lo de cima a baixo por tantas vezes, como se essa fosse a primeira vez que estivesse o vendo... Ou a primeira vez que o estivesse admirando dessa forma.
Eu vou mesmo morar com ele? Por que meu peito bate tão rápido? O que são todas essas sensações ao ver ele, essa euforia e tamanho nervosismo que me prendem no lugar e me impedem de desviar o olhar dele? E porque eu estou assim?
O anjo volta seu olhar a mim, como se notasse minha presença. Sua atenção vai para a sacola que trouxe comigo, mas logo volta a mim.
- Eu... – Começo a falar, um pouco sem jeito enquanto o observo. – Eu vou guardar minhas coisas... Lá no quarto que dormi antes.
O anjo assente devagar, sem dizer uma palavra sequer, ele retorna sua atenção para o café que está fazendo, enquanto que eu vou em passos apressados ao andar superior, indo direto ao quarto que costumo dormir quando estou aqui.
Ao encostar a porta atrás de mim, escoro as costas e solto um suspiro demorado, encarando o teto por alguns segundos. O que está acontecendo comigo? Por que estou desse jeito? É o Klauss, então por que todo esse nervosismo?
Meu corpo inteiro está tremendo, em uma euforia que é difícil conter, e simplesmente não entendo meus motivos de estar assim.
Tentando me acalmar, decido por deixar minhas coisas dentro do guarda-roupa deste quarto. Pego primeiro a orbe de poder sombrio, e deixo no fundo de uma das gavetas, e nas outras, deixo minhas roupas sem muito jeito.
Acabo optando por trocar minhas roupas, vestindo algo mais leve do que as roupas que uso nesse instante. Pego uma camiseta cinzenta bem folgada, junto a uma calça igualmente larga, as vestindo e finalmente sentindo meu corpo respirar um pouco.
Paro por um segundo, antes de deixar o quarto, pensando em algo. Um pouco receosa, abro minhas próprias asas devagar, observando seu brilho dourado por alguns segundos, e refletindo se as deixo a mostra.
Deixo o quarto e caminho ao banheiro, parando frente ao espelho e olhando meu reflexo em cada detalhe, seja de minha aparência, meu rosto, e minhas asas. Apoio as mãos na pia, e apertando os lábios, recolho minhas asas novamente, e devagar minha aureola se dissipa.
Fecho meus olhos e baixo a cabeça, deixando escapar um suspiro de frustração, e em meio ao silêncio, meus pensamentos se conflitam em uma barulheira sem fim. Sei que Klauss já viu minhas asas, e ele sabe o que sou na verdade, mas... Isso não é fácil.
Não me sinto confortável para mostrar. Ainda não me sinto pronta.
Queria me sentir confortável a deixar minhas asas à mostra, assim como ele faz com tanta naturalidade e leveza. Desejo muito ter seu olhar em mim, sentir novamente o toque suave de suas mãos como naquela vez, mas não consigo... Não quero que ele as veja...
Eu... Eu tenho vergonha das minhas asas.
Ainda não estou pronta.
Volto a olhar a mim mesma, em meu reflexo não encontro mais minhas asas, nem mesmo sombra do brilho dourado que elas emanam. E baixando meu olhar, deixo o banheiro e sigo pelo corredor, fazendo meu caminho de volta a cozinha.
Ao entrar, vejo Klauss deixando alguns pequenos pratos sobre a mesa, acompanhados de xícaras e um pote que não dou tanta atenção por não conseguir ver o que está em seu interior.
- Já comeu algo? – Ele pergunta assim que percebe minha presença de volta, indo até a bancada, pegando a panela com o café e a deixando sobre um suporte de madeira na mesa.
- Ainda não. – Respondo me aproximando da mesa – Nem descansei. Acho que estou precisando dormir um pouco.
- Coma algo, e vá descansar Mika. – Ele diz, servindo uma xícara de café para si, e se sentando, Klauss me convida a sentar com um pequeno gesto com a mão, a qual aceito de imediato.
- Acho que é isso que irei fazer. – Respondo me sentando preguiçosamente – Faz umas boas horas que não durmo. Estou precisando muito descansar...
Klauss assente com a cabeça, bebericando seu café enquanto me observa deitar o rosto sobre os braços e soltar um demorado bocejo.
- A gente precisa conversar. – Digo pensativa, com preguiça na voz – Por que me chamou para morar aqui? E... Como serão as coisas daqui pra frente?
- Deixemos isso para amanhã. – Responde, deixando sua xícara sobre a mesa – Temos muito a conversar, e também algumas coisas a fazer. Por isso, quero que hoje você aproveite este primeiro dia morando aqui.
- Ainda estou me acostumando com isso, sabe? – Sussurro sorrindo, olhando ao redor, buscando a certeza que estou mesmo acordada. – Morar aqui? Eu não imaginava isso...
- Entendo, e sei que leva um tempo até se acostumar. – Klauss responde. – Mas saiba que agora, essa é sua casa, da mesma forma que é minha.
- Essa... É minha casa... – Sussurro para mim mesma, refletindo o peso dessas palavras, e não acreditando que Klauss disse isso com tamanha tranquilidade. Algo que antes era somente seu, agora também é meu, e se não fosse meu cansaço, não sei o quão agitada eu estaria. – Você... Demorou muito para se acostumar a morar aqui?
- Um pouco. – Responde, tornando a pegar sua xícara – Eu era acostumado a viver com outros anjos. Quando vim morar aqui, demorei a me acostumar a estar sozinho.
- Demorou quanto tempo? – Pergunto curiosa.
- Um ano humano, no mínimo. – Responde, e estou surpresa com sua resposta.
- Isso é muito tempo... – Digo a mim mesma, mas ainda olhando a ele.
- E agora, estou me acostumando a dividir esta casa com alguém. – Diz, pegando sua xícara e dando um novo gole – Será mais fácil do que quando me acostumei a ficar sozinho, afinal, gosto da companhia que tenho.
Acho que a forma tão natural que ele diz isso é o que me deixou tão sem jeito agora, e não sei se consigo esconder esse sorriso que tenho em meu rosto agora. E a maneira como ele mantém seu olhar em mim, me estudando em cada movimento, como se não quisesse perder nenhum detalhe meu, me deixa ainda mais sem jeito... E com uma sensação muito agradável também.
- Eu tenho uma pergunta... Desde quando você passou a tomar café? – Pergunto mudando o assunto de repente, enquanto esfrego meus olhos e o observo de volta, admirando sua aparência leve sem nem tentar disfarçar.
- Se tornou um costume. – Ele responde, cortando uma fatia de bolo arredondado, que até então estava dentro do pote de antes e eu não tinha dado atenção alguma, e deixando sobre um prato a minha frente. – Experimente.
- Você quem fez? – Pergunto com um meio sorriso.
- Você irá acreditar se eu contar? – Ele devolve a pergunta, ao servir um pedaço a si mesmo.
Aumento meu sorriso, balançando a cabeça em negativo – Não. Eu não vi você fazendo.
Klauss solta um riso nasal, e balança a cabeça em negativo – Então, não irei te contar.
- Klauss! – Reclamo com uma careta, e ele me observa de volta, da forma mais calma e desentendida que já vi nele. Ele está mesmo me provocando, e nem disfarça isso – Eu quero saber!
Ele apoia o rosto sobre a mão, e nos olhamos fixamente, e devagar vou me erguendo, tateando a mesa e pegando meu pedaço de bolo e dando uma mordida, sem deixar de confrontar seu olhar por um instante que seja.
- Eu que fiz. – Klauss diz finalmente.
- Eu não acredito. – Resmungo num sussurro, que ele ouviu bem elo silêncio a nossa volta, e erguendo bem meu olhar ao seu, salto ambas as sobrancelhas – Eu não vi.
- Então eu comprei. – Klauss muda sua resposta sem mudar sua feição, mordendo mais um pedaço de bolo, ainda me olhando.
- Eu sabia que tinha comprado! – Paro um momento e aperto meus olhos, me dando conta das repostas contraditórias dele, e pendendo meu corpo para frente, não resisto a curiosidade de perguntar – Mas Klauss... Você fez ou você comprou?
Ele não responde a princípio, e é justamente nesse momento que mais estou querendo uma resposta sincera. Minha curiosidade pede por isso, e ver o pequeno e bem discreto sorriso se formando no canto de sua boca me causa mil sensações e pensamentos diferentes.
- Eu comprei. – Ele morde o último pedaço, dando uma nova bebericada em seu café – E eu fiz.
- As... As duas coisas? – Pergunto boquiaberta, me vendo mais sem respostas do que antes. – Mas... Como isso?
- Deixo isso para sua imaginação. – Ele responde, e fico boquiaberta com sua resposta. E olhar em seu rosto deixa claro o quanto Klauss está adorando minha confusão – Qual será a origem deste bolo? Eu fiz, ou eu comprei?
Minha curiosidade me traiu de um jeito que eu não esperava, e Klauss saiu ganhando dessa vez. – Tá bom, eu não sei...
- Até mais tarde você descobrirá. – Ele responde, se servindo com mais um pedaço de bolo.
- Tem certeza? – Ele assente com a cabeça – Porque eu não faço a menor ideia...
- Não tenho dúvidas quanto a isso. – ele responde.
Aperto os olhos, parando o bolo perto do rosto antes de dar uma nova mordida – Não tem dúvidas que descobrirei, ou que não faço ideia.
- As duas coisas. – Responde, e faço uma nova careta.
- Às vezes você é irritante, sabia? – Resmungo desviando o olhar dele.
- Não tinha esse conhecimento. – Klauss se levanta, e caminha até a porta da cozinha, focando seu olhar em algo fora da casa com bastante atenção.
Balanço a cabeça algumas vezes, terminando meu pedaço de bolo, e então me levantando. Klauss está me olhando sobre o ombro, e então retorna sua atenção para o lado de fora da casa, o que vai me deixando curiosa.
- O que está olhando? – Pergunto me aproximando e parando ao lado dele, vendo o sol surgindo no horizonte, começando a iluminar o céu com seus tons dourados, afugentando silenciosamente o sombrio azul escuro da noite. Seu olhar concentrado no horizonte até parece brilhar por um instante, enquanto serenamente assiste ao nascer de um novo dia, e com o que vejo, deixo um sorriso surgir em meu rosto – Acho que já entendi...
- É um belo alvorecer. – Ele diz com um sussurro.
- Concordo... – Sussurro encostando minha cabeça em seu ombro, observando o nascer de um novo dia, junto de uma sensação estranha, mas muito agradável.
Não sei ao certo o que é, mas observar esse cenário que se compõe no céu me transmite uma sensação única. Algo que não lembro ter experimentado antes, e que sequer sei explicar o sentimento que este momento causa em mim.
- Ei... – O chamo, e devagar viro meu rosto ao dele, em uma proximidade que não sei se já estivemos antes. – Onde poderei dormir?
Klauss mantém sua atenção em mim, e seu rosto iluminado pelos primeiros raios de sol é uma imagem que quero guardar na minha mente – Onde quiser Mika.
- Onde eu quiser? – Ergo uma sobrancelha. – Pode ser na sala? Ou no quarto que fiquei antes?
- Aceitou morar aqui. – Ele responde – Por isso, pode descansar onde preferir.
Meus olhos procuram a rede, que está no mesmo lugar que a vi da última vez. Até arrisco dizer que está intocada, e com um rosto pidão, volto a olhar a ele – Pode ser ali?
Ele assente levemente com a cabeça, e nem mesmo acredito nisso – Sinta-se à vontade.
Me afasto de Klauss, e vou animada para a rede, me deitando de uma forma que ela reage, balançando bem devagar, e meu olhar vai ao horizonte. Desde a primeira vez que acabei dormindo nessa rede, sempre quis fazer de novo, e agora tenho essa chance.
- Tudo bem mesmo se eu dormir aqui? – Pergunto me aconchegando, observando Klauss permanecendo ao lado da porta. Ele apenas confirma com a cabeça, voltando sua atenção para o horizonte logo em seguida.
Me sentindo confortável e muito leve, fecho meus olhos, me permitindo finalmente adormecer, sem qualquer preocupação na minha mente.
*****
Desperto lentamente, um pouco agoniada pela claridade em meu rosto, e devagar abro meus olhos, tendo a cidade como minha primeira visão ao acordar.
Bocejo demoradamente, me sentando com as pernas para fora da rede e me espreguiçando. Estou bem mais descansada agora.
Fico de pé, e arrastando os pés descalços, entro na casa silenciosa. Apesar de não ouvir nada, percebo a luminosidade presente na sala, e sei bem que Klauss está ali.
Ao entrar na sala, vejo Klauss em sua poltrona, mergulhado em sua leitura. Pelo que vejo, o anjo está bem próximo de finalizar o livro, já que não restam multas folhas para ler.
- Dormiu bem Mika? – Ele pergunta, virando levemente seu rosto a mim.
- Até que sim. Dormi muito bem. – Digo, me sentando no braço da poltrona e quase me debruçando por completo sobre Klauss, sentindo algumas plumas de suas asas fazendo cócegas no meu braço.
Ele mal se move, mas está me olhando sem parar. Agora que percebo o quão perto estamos um do outro, e tenho a sensação de que, fisicamente, parece que estamos nos aproximando mais e mais a cada dia.
Nesse curto instante nos olhamos, e consigo sentir que além da proximidade física, estou próxima dele de uma outra forma, a qual não entendo bem e nem sei explicar. É algo que continua me dando nervosismo e sensações estranhas em meu ser, mas são sensações que, apesar de desconfortáveis... É de uma maneira boa. Como isso pode ser possível?
E também, não sei quem se aproxima mais, mas é certo que esse é um movimento que ambos estamos fazendo, nos aproximando mais e mais...
Ele não me afasta em momento algum... E simplesmente não tenho vontade alguma de afastá-lo. Na verdade, quero saber o quão mais posso me aproximar dele.
Do jeito que estamos nos aproximando, logo estaremos perto... Muito mais do que já estamos agora, a uma distância quase inexistente. Mas quando isso acontecer... O que irá acontecer?
- Tenho uma pergunta... – Digo finalmente, rompendo o silêncio com minha voz que me traiu ao sair falhada.
- Qual pergunta? – Diz sem alterar seu tom e nem mesmo alterar sua expressão, retornando seu olhar ao livro.
- Por que nunca te vi ouvindo música em casa? – Apesar de não me olhar, tenho a impressão de que sua atenção está em mim – Sabe, essa casa é sempre tão quieta... Você não gosta?
- Eu gosto. – Responde – Mas costumo ouvir músicas quando dirijo para a cidade.
- Mas o silêncio não te incomoda? – Pergunto curiosa.
- Apesar de agradável e permitir algumas reflexões, sim. Por vezes, o silêncio me incomoda. – Ele responde.
- E o que você faz quando isso acontece? – Continuo perguntando e nem tenho vontade de parar.
- Eu ouço músicas enquanto dirijo para a cidade. – Klauss responde.
- Pois então Klauss, saiba que eu estou bastante agoniada com todo o silêncio daqui. – Digo, levando a mão ao seu rosto e o virando para mim, recebendo um olhar quase surpreso do anjo. Dou um sorriso por conseguir essa reação dele, e quase me esqueço da minha própria surpresa por virar seu rosto a mim como fiz – Vamos para a cidade?
Ele abre a boca, mas nenhuma palavra pode ser ouvida. Quando o solto, Klauss acaba se ajeitando na poltrona – Tudo bem... Onde quer ir?
- Em qualquer lugar. – Respondo rindo – Eu ainda não conheço muita coisa da cidade, tem lugares que ainda não visitei.
Até penso que Klauss irá se negar, já que ele não fala nada. Mas ao contrário do que esperava, ele fecha seu livro e torna a me olhar – Tudo bem. Podemos ir.
- Agora? – Salto as sobrancelhas, e ele concorda.
- Se assim quiser. – Ele responde – Apenas se agasalhe, creio que irá esfriar mais tarde.
Me levanto empolgada, e sem demora subo ao meu quarto em passos largos. Ao entrar, rapidamente escolho algumas roupas e as visto, lembrando de pegar uma blusa para mim.
Quando retorno, encontro Klauss ainda sentado em sua poltrona, mas suas roupas já estão trocadas. Não sei como ele fez isso, e na verdade nem penso nisso agora.
- Podemos ir. – Anuncio me aproximando, e o anjo se levanta – No meu carro ou no seu?
- Pode ser no meu. – Ele responde, enquanto seguimos para fora da casa.
Dou um sorriso travesso enquanto entramos em seu carro.
O anjo liga a rádio assim que dá a partida no carro, e deixo escapar um pequeno riso. Klauss me olha com uma sobrancelha erguida assim que me ouve rir, mas nada diz.
- Então... – Começo a falar bem brincalhona, ouvindo alguns toques da música que ele acabou de deixar tocando – Agora é o momento das músicas...
- É sim? – Ele me olha novamente, ainda sem entender.
Paro alguns segundos, atenta na música que estás tocando na rádio. Não sei bem se consigo decorar o que está sendo cantado, mas sei que consigo decorar o toque, e após alguns segundos ouvindo e sentindo o olhar de Klauss em mim – Tararã Rararã Tatanana Tararã...
- O que está fazendo Mika? – Ele pergunta, e vejo claramente como Klauss não esperava por isso.
- Estou cantando. – Respondo brincalhona, aproveitando da expressão de espanto do anjo – Escuta, eu vou cantar mais.
Tento cantarolar o toque da música do melhor jeito que consigo, sem me importar se estou me saindo bem ou não. Olho para Klauss de relance, ele está apertando o lábio e esfregando o rosto devagar, tentando manter seu olhar a frente. Mas alguma coisa me diz que ele está se segurando para não rir.
Em certo momento, com a mão cobrindo a boca e fechando os olhos por um segundo, Klauss parece estar se entregando a um riso silencioso. Está claro para mim que ele não consegue cobrir o sorriso, a única coisa que ainda tenta conter, é seu riso.
- Klauss! – O chamo, fazendo uma careta ao vê-lo da mesma forma – Você está rindo de mim?!
- De forma alguma. – Ele responde, ainda tapando a boca, mas logo deixando seu rosto livre. Ele está se esforçando para permanecer sério.
Cerro meu olhar a ele, decidida a continuar provocando esse lado dele que sequer sabia que existia – Pois fique sabendo, que continuarei cantando, até chegarmos na cidade... Está preparado para isso?
- Acredito que não. – Ele responde sincero.
- Muito melhor assim. – Devolvo, me preparando para voltar a minha cantoria, e desmontar a postura sempre séria de Klauss.
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