Capítulo 59 (FIM)

− Não! – grito ao sentir o peso morto da sua cabeça sobre a minha mão. – Aurora... Aurora, não me faças isto!

Passo a minha mão livre pelo rosto ainda quente dela. As pálpebras ainda abertas, os olhos fitos no vazio. Os meus dedos tocam os seus lábios carnudos e ligeiramente entreabertos. E permanecem aí, à espera de um sinal de vida. À espera do momento em que os seus pulmões reclamem para si o oxigénio que a manterá viva.

Um segundo. Dois segundos.

Não, eu não posso ficar aqui apenas a olhar para ela como um inútil.

Inspiro o máximo de ar que consigo e debruço-me sobre o seu corpo sem vida. Aperto o seu pequeno nariz arrebitado que eu tanto amo para evitar a saída do ar que eu preciso que entre no seu organismo a qualquer custo. Colo a minha boca à dela e solto todo o ar, que desce até aos seus pulmões tal como eu pretendia. Sorrio ao ver o seu tórax subir levemente.

Volto a repetir o mesmo procedimento mais uma vez.

Ouço uma risada seca atrás de mim, mas decido ignorar. Nada me vai demover agora.

− Não vale a pena. Isso não vai adiantar de nada – a voz abafada do 2º comandante acende as labaredas crepitantes que ainda saltavam dentro de mim.

Retiro ternamente a minha mão e deixo a sua cabeça tocar finalmente no chão frio. Deposito um beijo casto na sua testa arrefecida e sinto as lágrimas escorrerem-me dos olhos enraivecidos.

Levanto-me de um salto com a energia da cólera a despertar cada pequena célula adormecida do meu corpo exausto. Assim que os meus olhos pousam sobre o homem moribundo sentado no chão junto à parede, o fogo cresce ao ponto de me deixar cego. Lanço o meu pé direito contra o seu corpo fraco e o homem agarra-se às costelas como se eu as tivesse partido. Não parti. Por enquanto. Mal posso esperar para ouvir o som dos seus ossos quebrarem, um a um. Ele arrancou-me o coração e não me parece que haja dor maior que essa.

Volto a chutar com força sobre a mesma zona do seu corpo. O homem desprezível começa um pranto murmurado que nem me esforço em perceber. Vejo-o cuspir sangue e decido que esse será o meu objetivo. Arrancar todo o sangue corrompido do seu corpo maligno. Mas depois lembro-me que foi o 1º comandante que desferiu o golpe final. Foi ele que decidiu injetar o soro na Aurora. Ele também tem de pagar.

Olho à minha volta à procura do sacana que me arrancou aquilo que de mais precioso tinha na vida. Nada. Ele deve ter fugido, o cobarde!

A minha atenção é sugada novamente para o ponto estático onde se encontra o 2º comandante. O aspeto do corpo dobrado num ângulo estranho e a quantidade de sangue em que se encontra ensopado aplaca a minha fúria, por momentos. Poderia espancá-lo até à morte, talvez até já o tenha feito, mas do que isso serviria? Isso não a irá trazer de volta.

Lanço-me novamente na direção do corpo inanimado da Aurora e, carregando-a ao colo, levanto-me do chão. A cabeça dela pende, fazendo com que os inúmeros fios ruivos indomáveis se balancem no ar enquanto avanço até à porta. Ao atravessá-la avisto um grupo de seis guardas a percorrer apressadamente o corredor. Os passos pesados são o reflexo da expressão fechada que todos carregam.

Trago o corpo da Aurora para mais perto de mim e aguardo um confronto para o qual não estou minimamente preparado. Mas, de um momento para o outro, a muralha de homens abre-se num estreito corredor ao centro, e as seis faces fitam-me com pesar. Os seus movimentos tornam-se mais contidos e os dois guardas da frente, um de cada lado, curvam-se numa reverência muda. Os restantes homens de negro apressam-se a seguir o exemplo dos primeiros.

Sem conseguir processar muito bem a estranheza da situação, limito-me a avançar como se estes não existissem. As minhas pernas tornam-se mais velozes depois de ultrapassar as inusitadas filas de guardas.


Uma multidão recebe-me com estrondosos aplausos assim que chego à grande sala central. O cenário apanha-me desprevenido e, mais uma vez, a cabeça da Aurora descai-me do peito, pendendo para trás. A primeira fila de pessoas deixa-se de mover e arregala os olhos em descrença. As aclamações diminuem de intensidade e cessam, poucos segundos depois, dando lugar a um silêncio pesado.

− Aurora, minha filha – a mãe da Aurora grita em desespero ao furar a última fila de pessoas. – O que é que te fizeram?

− Temos que a levar para o centro de saúde! – brama o pai da Aurora, logo atrás.

Esforço-me ao máximo para segurar as lágrimas, quando Helena Bacelar deita o rosto choroso sobre o corpo inerte que seguro fortemente entre as mãos. Já é a segunda vez que trago ao colo a filha deles inanimada, só que desta vez...

O pai mede-lhe os sinais vitais e rapidamente chega à mesma conclusão que eu. Sem batimento cardíaco, não há muito que se possa fazer. O homem desfaz-se em lágrimas, agarrando-se ao corpo soluçante da mulher.

− Vamos levá-la para o departamento médico – Helena comunica decidida. As mãos afastam a humidade que ainda lhe escorre pelo rosto, mas os olhos já não vertem nem uma única lágrima sequer. Sinto que quem se encontra agora à minha frente é a médica, não a mãe. – Afastem-se – ordena para a multidão.

E, mais uma vez, um corredor se abre entre duas muralhas de almas unidas numa mesma dor.


− Prepara o desfibrilador – a voz da médica ecoa pela primeira vez no quarto. A Teresa corre até uma máquina num dos cantos da sala, enquanto Helena Bacelar fixa alguns elétrodos sobre o peito da filha. Uma linha completamente reta desenha-se no ecrã perto da cama. – Assistolia – informa, e eu posso sentir o desanimo na sua voz. Fosse o que fosse aquela linha parada, não era bom sinal.

Agarro-me com força à mão fria da Aurora, como se isso a pudesse trazer de volta. Será que ela já me abandonou por completo? Estarei apenas agarrado a um corpo? A uma casa vazia, desprovida de alma?

− Traz o balão – diz a médica ao pegar num longo tubo que jazia numa das gavetas da cómoda. A Teresa apressa-se a correr para o outro canto do quarto. – Não te preocupes – fala para a filha. Depois de lhe abrir a boca, começa a enfiar pouco-a-pouco o tubo no interior. – Eu vou dar-te o oxigénio de que precisas. Tu vais voltar a respirar, meu amor – assegura, passando-lhe a mão pela testa. O desespero cresce-me no peito ao ver que as palavras são da mãe e não da médica. Se a médica já tinha desistido, então...

Helena Bacelar retira uma seringa da mesma gaveta de há pouco, que já vinha com um soro amarelado lá dentro.

− Se fosse a ti não fazia isso – uma voz soa alarmada. Volto-me no meu lugar e dou de caras com o Doutor César junto à porta.

Como é que ele tem a lata de aparecer aqui depois de tudo o que fez? Ele foi cúmplice de todos os assassinatos!

Levanto-me num salto, pronto para o atacar caso ele dê mais um passo sequer.

− Ele insistiu em entrar − o pai da Aurora explica ao aparecer do lado do médico, − disse que tinha uma coisa importante para contar sobre o estado da nossa filha. – Acompanho o seu olhar até ao da Helena Bacelar e as minhas entranhas contorcem ao vê-la acenar afirmativamente. A seringa completamente esquecida na mão dela.

− Não podem dar ouvidos a este homem! – grito enfurecido. As minhas mãos fecham-se em punhos ao lado do corpo. – Ele foi cúmplice desta história toda! Ele é tão culpado dos assassinatos que ocorreram como o 2º comandante.

− Eu estava a ser ameaçado – justifica-se. – Mas agora não preciso de ter medo. A verdade veio ao de cima e eu posso ajudar. Eu quero ajudar.

− Não o ouçam! – grito exasperado. – Ele só nos vai fazer perder tempo!

− Salvador, já não temos nada a perder – corrige-me a Teresa num tom de voz consternado que me remexe as entranhas.

Volto a minha atenção para o corpo inerte sobre a cama. As faces pálidas, os lábios secos, os olhos fechados...cada pequeno pormenor do seu rosto me desafia a encarar a crua realidade.

Suspiro pesadamente e deixo cair o rosto para o chão.

− Injetaram-lhe o mesmo soro que utilizaram nos outros... − o Dr. César informa sem conseguir terminar a frase.

− Isso nós já sabemos – protesto fulminando-o com o olhar. A raiva começa a toldar-me a visão. Fecho os punhos numa tentativa de recuperar o autocontrolo.

− O soro tem duas funções, – continua, sem parecer afetado pela minha interrupção explosiva, − a primordial é eliminar os glóbulos brancos, fragilizando o organismo e colocando-o à mercê de microrganismos potencialmente nefastos para o ser humano. – Faz uma pausa. O silêncio que recebe parece incentivá-lo a prosseguir a explicação. – A outra é reduzir ao máximo a atividade do organismo, possibilitando uma atuação mais rápida e eficaz dos químicos injetados, colocando o ser humano num estado de sono profundo. O coração cessa a sua atividade de imediato e a sua função é executada por uma substância que permite o sangue continuar a circular. Já a atividade cerebral é mínima, permitindo apenas que o organismo não entre em total falência.

− O que é que isso significa exatamente? – questiono, olhando alternadamente para os dois médicos presentes no quarto. O semblante da Drª Helena transmite-me uma certa tranquilidade e percebo que talvez a esperança não esteja totalmente extinta.

− A Aurora não está morta, apenas aparenta estar – assevera o Dr. César. Mesmo sem saber se posso confiar nele, agarro-me àquelas palavras como se de oxigénio se tratasse. Viro o rosto novamente na direção da cama e sorrio timidamente, com o medo ainda no controlo dos meus músculos. – O sistema imunitário dela está bem debilitado e ela vai precisar de alguns cuidados especiais, mas não se encontra em risco de vida, disso vos garanto.

− Não percebo – desabafo com a confusão a toldar-me os pensamentos. Por muito que eu queira acreditar naquilo que me diz, começo a denotar uma certa incongruência entre as informações que eu já detinha e estas novas. − Mas não foi esse mesmo soro que o 2º comandante utilizou para matar as pessoas que se meteram no seu caminho?

− Foi, sim. – Perscruto-o desconfiado. Se ele estiver a brincar com a situação, a implantar-nos falsas esperanças só para nos ver sofrer mais, ele bem que pode rezar para que alguém me impeça de lhe saltar para cima. – Eu explico − acrescenta, dando um pequeno passo em frente. Eu avanço também em resposta, deixando claro que não irei permitir que ele encoste um dedo sequer na Aurora. Captando a minha mensagem, ele estaca. − No planeta Terra, um dos principais problemas de saúde nos cinquenta anos precedentes à vida na nave era o vírus Ryss. O Ryss era um microrganismo altamente contagiante que se propagava através do ar e que uma vez chegado ao sangue era capturado pela maioria dos glóbulos brancos existentes, tal como acontece no caso de outros agentes estranhos que invadem o nosso organismo. No entanto, rapidamente se percebeu que o processo de fagocitose não ocorria com este vírus, ou seja, os glóbulos brancos não se conseguiam autodestruir. E, assim, permaneciam os dois na corrente sanguínea: os glóbulos brancos e o inativo, mas vivo Ryss. Ao organismo era transmitida a mensagem de que eram necessários mais leucócitos, que depois de produzidos poderiam facilmente captar mais desta partícula viral através da atmosfera contaminada.

− Esse vírus está na nossa catalogação – interrompe a mãe da Aurora. A sua confirmação dos factos descritos abala toda a minha réstia de certezas. − Se não ocorrer intervenção médica, os glóbulos brancos atingem o chamado nível de saturação, fazendo com que o organismo utilize um plano B para uma eliminação em massa de todos os leucócitos.

− Exato. Claro que dessa forma, o Ryss tinha a tão esperada oportunidade para atuar, visto que este segundo processo eliminava os glóbulos brancos, sem conseguir destruir as partículas virais, que se espalhavam rapidamente pela corrente sanguínea. Devido ao seu amplo espectro de atuação e rápida proliferação, todos os órgãos eram afetados, existindo falência geral em menos de 12 horas.

"1/3 da população terrestre morreu vítima deste vírus, sendo que apenas as pessoas abastadas tinham dinheiro o suficiente para proteger as suas casas deste mal e receber o apoio médico necessário para a renovação do sangue, antes mesmo de existir a incontrolável saturação dos leucócitos. Porém, todas as pessoas que embarcaram na nave têm na sua corrente sanguínea alguma percentagem desta partícula viral, nuns casos mais do que noutros. Claro que vivemos numa atmosfera livre desse organismo, o que faz com que apenas uma percentagem ínfima dos nossos glóbulos brancos esteja ocupada com o Ryss. Uma percentagem tão reduzida que não existe qualquer risco de saúde, pois o organismo não é estimulado a produzir infinitas quantidades de leucócitos. Só que o Ryss está lá, vivo e pronto para atuar à mínima brecha. E é o soro, que percorre neste momento o sangue da Aurora, − fala, apontando para um ponto atrás de mim, − que permite que isto aconteça. Ao eliminarem-se todos os glóbulos brancos, o Ryss é libertado e, por muito ínfima que seja a sua quantidade, replica-se velozmente e invade qualquer célula que encontre pelo caminho. Mas sendo que ela nasceu na nave, − acrescenta acenando com a cabeça na direção da cama, − não corre qualquer tipo de risco. O Ryss não se encontra no seu organismo."

Vejo o sorriso cúmplice que os pais da Aurora trocam e percebo que tudo não passou de um grande susto. Os meus músculos relaxam e solto uma enorme quantidade de ar, soltando um suspiro de alívio. A Aurora vai ficar bem!

− Posso, então, tratar dela?

Analiso-o dos pés à cabeça, tentando procurar pelo mínimo vestígio de que ele continua a não ser de confiança. Mas a minha racionalidade obriga-me a confessar para mim mesmo que o Dr. César não tem nada a ganhar enganando-nos. Consigo perceber nos seus olhos esverdeados a angústia interna que se debate dentro dele. Ele apenas quer redenção. Não sei se agora não será demasiado tarde para isso, mas tenho que o deixar tentar aliviar a dor que sente agigantar-se dentro do seu peito. Além do mais, ele é um médico competente, que parece saber exatamente como proceder no caso da Aurora.

Afasto-me dois passos para a esquerda e aquiesço. Só espero não me vir a arrepender disto mais tarde. Não me perdoaria se esta minha decisão me desviasse de vez da hipótese de voltar a ter o amor da minha vida do meu lado, feliz e saudável.


Os meus olhos seguem o percurso do fluxo vermelho que invade o interior do tubo. O fio escarlate parte da dobra interna do meu cotovelo e sobe para um depósito translucido que de um lado suga-o e do outro o expele por um novo fio, que apenas parece a continuação do anterior. Talvez o seja mesmo. O sangue desce então até o antebraço que jaz colado ao meu sobre o colchão. A viagem é grande, quando o destino se encontra tão perto de mim. Dois corpos unidos por um simples e longo fio.

Ergo um pouco a cabeça e umas faces rosadas, emolduradas por lustrosos caracóis ruivos, apanham-me desprevenido. Os lábios fechados, ainda secos, parecem também ter sido um pouco influenciados pelo líquido que o organismo recebe. Sorrio, o tratamento está a fazer efeito tal como o Dr. César me havia garantido. O meu sangue está a restabelecer as forças de que ela precisa para recuperar.

Quando soube que tínhamos o mesmo tipo raro de sangue, ofereci-me de imediato para ser o dador. Na verdade, impus que assim fosse. O Dr. César tentou convencer-me de que tal não era necessário, pois tinham reservas mais do que suficientes para fazer a transfusão. Mas para mim era óbvio que tinha de ser o meu sangue a trazê-la de volta. Não poderia ser uma coincidência o nosso tipo sanguíneo ser exatamente o mesmo.

Eu já não acredito em coincidências. Tudo o que aconteceu até aqui, tudo aquilo por que passámos, tinha de estar escrito em algum lado. Foi o destino que nos juntou e esse mesmo destino quer nos continuar a ver juntos. A expressão "almas gémeas" nunca me pareceu mais adequada do que agora.

Vejo o fio estremecer e percebo que uma mão se agita, subtilmente, ao lado da minha. Sem perder tempo, agarro-a ternamente, os meus dedos massajando a sua pele suave. Levanto os olhos e vejo os dela a entreabrirem-se. Um azul cristalino recebe-me prontamente, fazendo com que uma lágrima escorregue pela minha face.

− Porque choras? – questiona-me num tom de voz fraco.

Aperto um pouco mais a mão dela para ter a certeza que isto é real. Ela olha à volta e a sua atenção é capturada pela máquina imponente que tem do seu lado direito. As subidas e descidas da linha começam a ficar mais acentuadas.

− Eu... − hesita. O seu rosto volta-se na minha direção e eu consigo ver um brilho de entendimento no azul dos seus olhos. – Eu não morri?

− Apesar dos teus esforços para isso, não. – Sorrio. A mão dela aperta a minha de volta. – Tu não morreste, Aurora – confirmo. Os meus ombros ficam bem mais leves quando ouço as minhas próprias palavras.

− Mas e o soro que me foi injetado? Não percebo...

Explico-lhe calmamente, da melhor forma que consigo, todas as informações de que me recordo sobre o vírus Ryss e as funções dos químicos que compunham o soro desenvolvido por António Caetano. Durante todo o esclarecimento, a Aurora mantem-se em silêncio, mas de olhos bem abertos, totalmente inebriada pelas palavras que lhe dirijo. Como eu amo a sua curiosidade, penso ao vê-la inclinar-se um pouco para a frente, com os músculos ainda doloridos a dificultar-lhe os movimentos.

− E o 1º e o 2º comandante, eles...

− Calma, − interrompo-a ao ver a sua agitação, − eles estão presos. Os dois. – Pelo canto do olho, consigo ver a máquina a registar mais tranquilamente as oscilações na linha. – Eu e o teu pai temos tratado de tudo, a comunidade ficou um pouco caótica depois de tudo o que aconteceu. Foram muitas informações e mudanças num tão curto espaço de tempo.

− Tu e o meu pai? A trabalharem juntos?

− É assim tão difícil de imaginar?

A Aurora fita-me intensamente e finge ponderar a questão. O meu coração acelera com o seu sorriso travesso.

− Não. De todo.

− Temos até trabalhado muito bem em equipa. Sempre que necessário vamos nos revezando, para que consigamos estar os dois aqui contigo.

− Há quanto tempo estou aqui?

− Não muito. Passaram-se cerca de 24 horas. Porém, segundo as indicações médicas, terás de ficar internada durante mais alguns dias, para evitar o risco de infeção.

− Tudo bem. Desde que o meu herói fique aqui comigo, suponho que não será um grande martírio.

− Eu? Um herói? – Largo a mão da Aurora e subo a minha até ao seu rosto delicado. – Na altura em que eu queria fugir, tu arregaçaste as mangas e preparaste-te para continuar a luta. Enfrentaste o 1º comandante, sozinha. E ainda te mostraste disposta a morrer no meu lugar. Tu sacrificaste a tua vida para nos salvar a todos. Existe um herói neste quarto, sim, mas esse herói não sou eu.

Sem conseguir resistir, inclino-me sobre ela e estaco a milímetros de colar os meus lábios aos dela. A sua respiração torna-se pesada e a boca entreabre-se num suspiro que me percorre o corpo todo.

− Do que estás à espera? – interroga ofegante, num simples murmúrio.

O meu corpo estremece de antecipação e avanço sem conseguir esperar mais um segundo sequer. Beijo-a avidamente e arquejo quando ela me responde com a mesma intensidade. Uma das coisas que aprendi com tudo isto é que a vida é efémera, mas, se tivermos com quem a partilhar, cada segundo brilha mais do que qualquer estrela do Universo.

Pois é, chegámos ao final! Mas, calma, ainda vai haver o epílogo, que tentarei colocar ainda esta semana.


Agora uma explicação importante sobre este capítulo.

"Nem tudo é o que parece" é a linha condutora de toda a obra, por isso narrar na primeira pessoa, na perspetiva da pessoa que perceciona essa disparidade entre aparência/realidade: a Aurora. A visão deturpada da protagonista sobre a realidade que a cerca ajuda nesta caminhada de descoberta que o leitor faz junto com ela. Por isso também a escolha do tempo presente nos verbos.

Decidi narrar este único capítulo através dos olhos do Salvador, por um lado, para seguir a máxima do livro "Nem tudo é o que parece", e por outro para termos um pouco a noção da perspetiva do Salvador sobre a Aurora e toda a injustiça que os cercava.


Quem aí não duvidou nem por um segundo de que a Aurora estivesse viva, que se manifeste, por favor  kkkkkkkkkkkkk

Deixo o booktrailer novamente para que agora o possam ver à luz da história completa. Reconhecem alguma das cenas que eu quis retratar no vídeo? Aviso que nem todas as cenas encaixam, mas tentei que correspondessem o máximo possível.

https://youtu.be/Hc240RnOPb4


Espero que tenham gostado. Vemos-nos no epílogo.

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