Prejuízo e Lucro (Resultados não Contábeis) - Parte 01
Relações são complicadas, pais e filhos, profissionais, amorosas...
O ser humano é egoísta e tende a desejar que as pessoas a sua volta concordem com seu jeito de pensar, sendo raríssimas as exceções a essa regra, que encontramos pelo caminho. Eu não acho que sou uma pessoa complicada, sou simples e honesto demais com aquilo que me perturba, não costumo sufocar por muito tempo o que me faz mal e viver o que vivo tem sido uma prova difícil: Minha relação com Braz.
Tem dias que me pego a pesar e medir o que vale ou não a pena. Se me abro com as pessoas ou se deixo o assunto guardado. Eu gosto demais desse cara, não fosse isso já tinha tomado uma decisão.
- Não sei o que é pior, você me falando sobre quem foi caso seu ou descobrir por terceiros.
- Olha, Túlio. – Braz diz espreguiçando-se pela manhã. – Meu passado existe e não tenho como fugir ou apagar alguma coisa. Me diz se você, apagava só a parte errada e ruim que tem no seu passado?
- Esquece isso, tenho um leão para matar hoje. Se bem conheço meu patrão vai me levar de arrasto para pedir desculpas ao seu ex-puto. Converso com você na quarta-feira. – Braz comenta sem cerimônia alguma, os casos que teve e isso me incomoda. No meu caso, além de Iraci, jamais comentei com ele que namorei uns dois anos a filha mais velha de seu Camilo, a Patrícia.
- Não comento mais nada, melhor assim? – Ele fala alto comigo querendo perder a calma. – Porra, você não foi casado?
- Melhor nem falar mesmo.
Ele me puxa e beija com certa fúria, gosto desse jeito meio agressivo as vezes. Braz chupa minha língua com força, eu retribuo mordendo seu lábio inferior que lhe tira sangue. Ele tenta se soltar, mas minha boca não permite, pois é viciada na sua. Posso sentir o sabor da menta do creme dental misturado com sangue.
- Porra cara, meu beiço. – Braz reclama. – Isso aqui todo mundo vai ver.
- Mas só vão saber que foi uma mordida se você contar. Isso é para marcar meu território. – Mal me viro e sinto o peso de sua mão em meu traseiro. – Seu filho...
- Cara, não xingue a dona Maria. Meus pais estão chegando ao Brasil, vai se preparando.
- Eles sabem de você?
- Eu tenho trinta e quatro anos, Túlio, minha idade de pedir a opinião deles já passou faz tempo. Vê se você fica mais calmo. – Ele me olha chegando perto de novo e diz ao meu ouvido. – Se me irritar essa semana, eu te castigo e se reclamar, te castigo mais.
- Eu virei criança, agora? – Fico puto. – Tenho trinta e um anos, lembra?
- Então se comporta. – Ele dá-me mais um beijinho e sorri com o lábio cortado. Essa boca gostosa que é só minha.
***
Quando estaciono na lateral da contabilidade, vejo o carro do patrão e meu estomago aperta. Seu Camilo não vai aliviar comigo, já foi benevolente com minhas explosões e aconselhou-me a tirar férias sob ameaça de advertência.
Kelly em seu posto me olha com seus olhos castanhos, bem maquiados que me lembram das Meninas superpoderosas de tão arregalados. Tenso. Ela está tensa. Eu fico tenso.
- Bom dia, Kelly. Seu Camilo está por aí, não é?
- Sim, está todo nervoso que dá medo de olhar.
- Vou ficar na minha sala esperando por ele.
- Ele está na sua sala, o seu Camilo não quis tirar a concentração do Júnior.
Meu patrão está perto da janela quando eu entro e fala sem se virar:
- Túlio, Túlio. Valentin ligou-me e tivemos uma grande discussão por sua causa. Antes de mais nada, você vai consertar isso, marquei com ele uma reunião para as nove e já estamos saindo.
- Seu Camilo, eu não vou me humilhar na frente de cliente nenhum, prefiro pedir minha demissão. Acho que a contabilidade já me sugou demasiado. – Antes que meu patrão diga algo, dou-lhe as costas e saio batendo a porta. Tenho trinta e um anos, novo demais para esse tipo de explosão, mas para um cara que se doou totalmente a empresa, desde os dezenove anos é tempo demais.
No caminho para casa me sinto um idiota desempregado, tenho tido algumas atitudes infantis ultimamente e sequer me reconheço. Sempre fui estressado, mas agir da forma que tenho agido é algo anormal para mim.
Fico horas no sofá só pensando em minhas ações e faço todo tipo de exame de consciência. Quando eu me levantar, alguma coisa diferente tem que acontecer comigo.
- Alô. Fala seu Camilo, estou em casa, sim. – Atendo o celular e o homem me diz que vem a minha casa e que estava preocupado.
Mais tarde meu patrão chega a minha casa.
- Já passou da hora de conversarmos, Túlio, você é meu braço direito, mas quando atende a qualquer cliente, não representa só a mim ou o escritório, mas nossa classe contábil. Preciso da sua ajuda, mas antes vou te ajudar e pelo seu próprio bem. Vai ficar essa semana em casa. Você já lidou com coisa pior que o Valentin. Ele me disse que sua grosseria está relacionada com o filho do Joaquim.
Ouvi apenas o filho do Joaquim e nenhuma palavra além disso.
- O senhor se refere ao Braz?
- Claro, o Joaquim só tem ele de filho. O Braz é gay e não é segredo para ninguém, no passado eles tiveram um caso, que quase virou caso de polícia... e agora fiquei sabendo... – Ele respira fundo. – Esse negócio que você vive com ele não pode afetar minha empresa, entendeu? Não tenho nada contra o que cada indivíduo que trabalha pra mim, faz fora da empresa.
Olho para a minha TV, achando que vou desabar a qualquer momento.
- Quem disse para o senhor? – Não sei por que, mas não estou nervoso como achei que ficaria quando começassem a descobrir.
- Não faz nenhuma diferença, mas prefiro achar que é boato ainda e torço muito para que você volte a razão e termine uma coisa dessa antes que os danos fiquem maiores. Você tem uma família, pense neles, pense em Iraci quando souber disso, o quanto vai se sentir mal, seu pai lá do interior se ouvir um rumor desses, imagina a vergonha que vai sentir.
- O senhor me demitiria se fosse verdade?
- Demitiria se isso viesse a afetar o seu profissionalismo, antes impecável, hoje completamente afetado por questões pessoais. Como fato isolado, esse "negócio", não seria motivo para ser dispensado. Descanse, reflita e de preferência, ponha um ponto final nas coisas que podem estragar sua vida.
- Obrigado, seu Camilo. – Ele nem mesmo abraça-me como sempre fazia e posso sentir o quanto pesará a decisão de manter Braz em minha vida. Preciso ficar só, por hoje.
Depois que meu patrão se vai apenas ajo sem pensar e ligo para o Braz.
- Fala meu contador.
- Acabou. Não fale comigo nunca mais. – Desligo na cara dele e preciso desabafar, chorar ou matar alguém.
Chorar é algo que não flui comigo então sento na beira da praia e fico olhando as ondas até achar que estou relaxado. Por volta de onze horas da noite volto para casa com aquela sensação de que Braz vai estar lá e não está. Nem na quarta ele vem.
Penso no lado positivo de não ter me aberto ao mundo sobre o relacionamento que tive com um homem, quero ter forças para apagar isso de minha vida e seguir em frente. Mas sinto tanta dor ao passar de uma semana para outra.
Ao voltar à contabilidade, meus funcionários me recepcionam com uma pequena confraternização e sorrio querendo chorar.
- Túlio, o seu Braz do supermercado ligou cedo e agendou um horário no inicio da tarde aqui, tem problemas?
Eu não quero falar com ele, pois me sinto mal com a minha decisão.
- Ah Kelly, fazer o que? Ele que venha. Tem mais algum recado?
- Sim o seu Carlos agendou amanhã na primeira hora. No mais estamos conseguindo levar.
Quase duas semanas sem Braz, não consigo almoçar com medo de passal mal, isso por toda a ansiedade.
Às treze e vinte quando chego, ele já está na recepção e me olha sério.
- Boa tarde, Túlio.
Apertamos as mãos na frente de Kelly e mais uns funcionários e então o conduzo a minha sala. Mal ele senta eu desabo:
- Não vou voltar atrás com minha decisão, Braz. Quero minha vida como era e com você não consigo viver.
- Só me escuta com calma, isso se resolve pessoalmente e não por telefone. Mas eu respeito. Apenas fique ciente de uma coisa, não traí você nenhuma vez, não por falta de oportunidade, mas porque realmente gosto de você, chega a me doer de tanto que gosto. Quando quiser conversar me procura.
Conversamos de um jeito tão formal que dói no meu peito olhar nos olhos dele. Eu tenho que superar, voltar a viver, se é que vivia antes.
Ele chega bem pertinho e eu estremeço inteiro e me beija de levinho, o suficiente para sentir sua respiração em meu rosto, o sabor da boca que eu amo, o perfume que ele emana, a maciez dos lábios do meu homem.
- Já pensei bastante. Tomei a decisão.
- Sexta na minha casa, seu fresco. – Ele decide por nós. Cara irritante.
Quando ele vai, Kelly entra na sala e me pega com aquela cara de pastel.
- Túlio, está tudo certo? Sempre ouvi dizer que esse Braz é um cara bem grosso, fiquei preocupada quando te vi olhar para ele com medo.
- Tranquilo, Kelly tem alguém me aguardando? – Não me sinto bem.
- É a dona Rosa. Quer que eu fique aqui, por segurança?
- Claro, mas ela pode constranger você.
- Túlio, eu não fiquei constrangida naquele dia. Um pouco só.
Dona Rosa entra e avalia-nos.
- Hum, olha esse chefinho. – Ela olha para Kelly que fica vermelha. – Descobri que o Camilo teve uma conversa daquelas com o Valentin. Depois ele até me ligou para vermos a situação da sociedade. Decidimos que vou comprar a parte dele, pago as dívidas e fica tudo certo. Você ficou no fogo cruzado de uma separação complicada e por isso vim te pedir desculpas secausamos algum dano.
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