Capítulo 5
Vou processar esse maldito, esse filho da puta. Tarado. Vagabundo. Canalha. Como que pode um cara daquele tamanho, ser um...
Pior! Como que eu deixei acontecer uma coisa dessas? E como eu reagi? Deus. Eu vou ficar louco. Eu não paro de sentir esses arrepios. Um homem me masturbou. Um homem me seduziu. Um homem pegou no meu... Aquele bandido vai tomar um processo por assédio. Eu não posso contar isso a ninguém. Eu ejaculei na mão do traste.
Todo esse desabafo é tão somente pela vergonha das reações de meu corpo e minha entrega àquele homem.
Meu telefone residencial toca e como presumo, descubro que é Rafaela e Iraci que cansaram de ligar em meu celular.
— Alô.
— Pai, o pai não vem me buscar?
Meu semblante suaviza ao ouvir a voz da minha filha.
— Oi amor... pai não tá muito bem, Rafa. Amanhã o papai vai cedinho buscar vocês, combinado? — Ela não responde, fazendo eu me sentir pior. — Entendeu amor?
— Tá — é sua resposta seca e econômica antes de desligar na minha cara.
— Te amo filha. — falo ao vácuo e chateado comigo.
Eu estava fazendo das tripas o coração para não deixar de cumprir o compromisso com minhas crianças e falhei. Juro que ainda naquela semana tentei pedir se Iraci ainda tinha esperanças de ficarmos todos juntos, porém ela foi decisiva e com isso formalizamos o divórcio.
Na primeira noite em que estou legalmente livre do casamento, talvez eu devesse sair com amigos ou até mesmo sozinho. Naqueles momentos senti mais vontade de extravasar do que o normal. Eu não estava conseguindo me recuperar daquele acontecimento com Braz e junto com o divórcio era peso demais. Calculamos o estoque com o que já tínhamos: inicial mais compras menos as vendas, ai sei lá, não estou com cabeça. Nada fixa, nada parece ter sido feito com atenção o suficiente.
Ele não entrou em contato depois daquilo. Um pouco de alívio com o passar de dois meses. Março chega e o calor ainda irrita. Se eu procurava manter-me focado antes daquele "negócio", cheguei ao limite de escrever a punho o meu pedido de demissão. E amassar antes de rubricá-lo. Seu Camilo na maior cara de pau, pergunta-me se eu estou me entendendo com o Braz e fica indignado quando lhe conto que exigi do empresário algumas informações que ele nunca solicitou.
— Que que é Túlio? Calcula o estoque dele e não fique importunando. O rapaz tem mil coisas na cabeça. Tá com medo de assinar a contabilidade dele. Use meu CRC e deixa na mão do Mauro.
— Seu Camilo, eu não faço as coisas no chutômetro, não invento valores. Não vem se estressar comigo. O escritório é seu, mas 98% das empresas, sou eu quem assina. Eu coloco a cabeça no travesseiro tranquilo porque não faço gambiarra. Se o senhor passar mais uma das suas empresas para a minha equipe, ele vão ser bem ajustados. — seu Camilo nem olha na minha cara e chama de abusado.
— Por isso que confio em você de olhos vendados. Essa meia dúzia de clientes que eu cuido não aceita pagar um centavo de imposto, acostumei mal esses... só o filho do Joaquim que é mais correto, aí eu passei pro Mauro.
Eu cruzo meus braços indignado e meu patrão diz que sou um chato. Iraci já me chamou assim. Minha filha um dia também já me disse isso e eu a censurei. Amigos, ex-colegas de faculdade e uma ex namorada, a Jaqueline que foi adiante na área da Educação e hoje é professora de minha filha. E eu achando que ser correto é o principal, quando os demais me olham como a uma pessoa engessada de comportamento inflexível. Defendo meu jeito de ser e não vou me mover só para agradar a opinião alheia.
— O senhor quer analisar alguns balancetes?
— Tá fazendo isso agora?
— Sempre fiz. Preciso contratar alguém que toque o Societário com autonomia.
— Dentro do piso.
— Não consigo ninguém experiente pelo piso da categoria.
— E o Juninho? Vai fazer dezesseis anos... quero que ele comece a ter responsabilidade. Ano passado eu sei que não foi fácil a convivência de vocês, mas agora que tu se separou vê se consegue se entender melhor com o meu menino. Ele estava meio revoltado...
Sabe, eu penso que o silêncio é mais valioso que o ouro às vezes. Se o patrão decidir, seu filho vai integrar sim a esse quadro de funcionários e eu vou virar uma espécie de tutor outra vez de um guri mimado que não respeita à própria família. O que eu devo esperar? E sinceramente, verdadeiramente e tranquilamente, isso me mantém ocupado e cheio de estresses e por consequência com os pensamentos longes daquela memória maldita de 9 de janeiro de 2010. Ou seja, minha apatia e os problemas do trabalho compõe minha zona de conforto.
No início da separação, pelo menos para eu, tive a sensação de ter um fantasma me seguindo pela casa. Os vultos da minha companhia, mulher e crianças com quem desfrutei tão economicamente. Meus fantasmas incomodam. Eu chego a cogitar a ideia de sair de casa na sexta-feira à noite e buscá-los para fazermos algo juntos. Iraci fica feliz quando os surpreendo fora dos dias estipulados judicialmente e meus filhos não me largam desde minha chegada até que eu precise devolvê-los. Eles têm conseguido o feito de me manter longe do trabalho que trago para casa nos dias que partilhamos juntos, porém hoje não posso fazer isso.
Na minha cabeça vem a memória do pedido de demissão da Regina do DP, que foi convidada por dona Sônia, ex esposa do Leonardo Camilo para ser chefe do RH de sua loja de móveis. Inclusive, minha ex patroa fez-me uma boa proposta também.
Com azia a queimar outra vez, eu abro uma lata de cerveja e a bebo com sede sem parar para respirar. Gelada, deliciosa e bem maltada. Um refresco e uma opção nova para relaxar. Sem que qualquer atração televisiva me atraia, eu coloco num canal de áudio da TV à cabo e chuto que seja Britney Spears quem esteja "miando" e que pouca diferença faz quando abro mais uma lata e bebo com a mesma sede, sendo agraciado pelo amargo sabor e a leve tontura que o álcool ocasiona num organismo sem alimento sólido desde o meio dia. A alteração provocada pelo torpor alcoólico desperta coisas adormecidas em meu corpo, como aquela memória insana... Meu corpo reage de imediato com um arrepio gostoso e a vontade de me tocar ou ter alguém que me toque.
— Sai da minha cabeça!
Morando sozinho, nós temos isso de falar sozinhos. Foi o que fiz e aproveitei para esculachar comigo. Onde já se viu. Acabei de sair de um casamento, tenho só trinta anos e não vou surtar. Eu não sou uma bicha! Eu não gosto de homem. Por quê aquilo aconteceu? Onde eu estava com essa porra dessa cabeça? Se aquele, aquela coisa, aquele homem estranho comentou essa merda com alguém, eu sou capaz de fazer uma besteira. Deus não permita que ele me exponha. Será que seria o caso de eu implorar a ele ou ameaçar, para que esse segredo morra conosco?
Na terceira lata, e pela falta de costume de beber, me sinto meio valente a ponto de decidir que basta de ser escravo da profissão. Chega dessa relação masoquista. Corajosamente eu penso em pedir demissão e ao mesmo tempo viajar para a Disney com meus filhos. Como seu eu fosse fazer isso.
Aumento o som que continua sem me dizer nada, até porque não faço ideia de quem canta essas músicas "do momento" e mais uma cerveja, que já entra forçada. Ali é onde a solidão cutuca um pouco. Falta de um beijo, um abraço ou somente ouvir alguém compartilhando coisas da sua rotina comigo. Empurro o resto da cerveja e mesmo sem gostar de destilados, misturo gim com energético e bebo fazendo uma provável careta de desagrado de moleque.
— Ah lembrei... — Falo para a porta do guarda roupa de onde tiro umas peças para usar após o banho. Na verdade eu não quero me lembrar de porra nenhuma.
E quem é que faz análise tributária numa sexta à noite para um cliente que está com três honorários em atraso? Além de tudo o homem é um cara de pau que me ligou cinco vezes após às dezoito e como essa bosta de consciência me incomoda, eu o informo que segunda-feira nas primeiras horas sentarei para colocar seus dados numa planilha. Legal, ele nem agradece por meu tempo cedido além da minha jornada. Mereço mesmo. Mudando de ideia ligo o notebook e acesso o servidor da contabilidade e decido encarar algumas simulações para saber o que fica mais viável no caso dessa empresa do setor varejista hortifrúti. Real ou Presumido? Zero concentração. Vamos para a conciliação bancárias de algumas empresas?
Estou cansado demais e meio zonzo... No meu caso só banho e cama e deu por hoje.
O som de um trovejar me desperta no meio da madrugada, seguido pelo barulho de uma chuva forte e refrescante de meia estação cujo frescor me arrepia por inteiro. Minhas mãos obedecendo a algum comando sobrenatural descem lentamente por meu tronco pousando em uma ereção repentina. Ondas estranhas de prazer me percorrem, me contorço e me liberto da cueca, toco meu membro descendo lentamente a pele que cobre minha glande cujo orifício faz brotar o líquido lubrificante que forma uma gotícula cristalina que se acumula o suficiente para escorrer por minha pulsante rola. Isso é bom. É ótimo sentir isso. Tesão desgraçado que se propaga em ondas internas aliadas aos arrepios de prazer. Há tanto tempo que eu não me tocava... Não preciso pensar em alguma fantasia para erotizar ainda mais meu momento de prazer solitário, mas o pensamento é intrusivo. Aquele homem e seu cheiro, seu tamanho, masculinidade e seus pelos selvagens... o homem que tocou no meu pênis que agora está duro e quente na minha mão com meu desespero para me libertar numa gozada...
Que se foda se meu drama é exposto exageradamente, eu não estava preparado para lidar com tal situação e é até hoje a coisa mais bizarra que me ocorreu.
Não posso pensar nisso, mesmo que fantasias nasçam e morram nos confins de uma mente. Eu me proíbo e interrompo o ato. Estou finalmente ao ponto de chorar. A noite fresca foi absolutamente deliciosa, mas meus sonhos e devaneios penderam para os pesadelos e minha manhã começa às cinco horas já que obviamente não dormi direito. Preocupações pularam como carneiros com dentes pontiagudos no sonho doido. Eu lutei como um gladiador para expulsar da mente o homem peludo que tentava me foder a força.
Merda! Processo! Foda-se! Vou processar! Eu acho que vou ligar pra esse cara e implorar... meus pensamentos e ideias com relação ao assunto não me libertam e com certeza o "cidadão" inominável nem deve se lembrar de nada.
Por fora eu pareço um cara vazio que faz tudo no automático. Aquele que levantou-se, fez café e abriu o e-mail do trabalho na mesa da sala. Ainda pareço o mesmo Túlio aparentemente calmo de sempre. Aquele que tem fama de estressado, mas que não demonstra isso de maneira exaltada e é admirado por essa atitude comportamental.
Me esforço para ficar minhas crianças naquele sábado e Iraci me abraça comentando que estou muito magro e minhas olheiras deixam meus olhos saltados. Depois ela ri da minha expressão séria e tenta me cutucar para fora de minha "caverna secreta". Tudo o que eu falo é relacionado ao trabalho e ela revira os olhos várias vezes durante o almoço que preparamos. Aperta meu coração pensar que não faço mais parte dessa cena cotidiana de família feliz. Não me vejo merecedor e não sinto mais o pertencimento. Ira alivia na conversa e aconselha a ser menos exigente comigo.
— Túlio, se você adoecer do seu trabalho, seu patrão vai colocar outra pessoa em seu lugar e a vida continua. É uma realidade que não muda. Muitas pessoas entram em depressão, têm crises de pânico que caracterizam doença ocupacional, pode crer que se o Camilo um dia perceber isso, ele vai forçar sua demissão.
— Acho que não dá pra ser somente pessimista.
— Realista no mundo capitalista não é ser pessimista.
— Não dou motivos pra ele me perturbar.
— Meu amor, eu sempre tive um pé atrás com o seu Camilo. Ele achou legal quando você sugeriu ficar sem salário no começo para receber só o percentual dos honorários, mas agora que a contabilidade está com mais de trezentos clientes, ele deve pensar diferente. Com metade dos seus recebimentos, ele contrata um outro gerente.
— Porque tá tentando me desanimar?
— Alertar. Pode viver pro seu trabalho, mas não esquece que tem mais coisas nessa vida. Eu te adoro muito, te adoro tanto Túlio. Eu me preocupo.
A sensação que me dá repentinamente, é que nunca assinamos qualquer papel de desquite que me desvinculou dessa família. Somos amigos antes de tudo e de minha parte quero que ela fique bem.
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abraços e pelinhos de gato na "brusa" KKKK
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