Capítulo 12
São sete meses que eu e o Braz temos nos encontrado às escondidas, sendo que nesse período lhe tenho sido totalmente fiel, crendo que é recíproco e talvez por isso ele tem se apegado à esperança de assumirmos nosso caso perante todos que nos conhecem. Repito incessante: NÃO estou pronto pra isso, embora tenha consciência dos sentimentos fortes por ele.
Deveria esperar que a Iraci em algum momento esbarrasse no Braz ou que me perguntasse sobre, afinal minha filha deve ter comentado que seu pai tem um amigo com a cópia da chave de casa, pois foi o que ela contou à sua mãe.
Tentei agir com naturalidade, claro, afirmei que era um amigo apenas.
— Que bom. — Iraci diz sem tanta importância — Ele tá morando contigo?
— Hã? Não! Só emprestei a cópia da chave.
— O problema é: os meus filhos juntos com um estranho. Não tá deixando as crianças sozinhas com ele?
— Eu cuido da Rafa e do Edu, calma Ira. Até onde eu sei, o Braz é uma pessoa decente... é um amigo...
— Aham — comenta sem empolgação enquanto troca a camiseta comprida do Edu por outra de manga curta, o faz tomar suco e me avisa que ele esteve febril durante a semana em ficou meio resfriado. Depois me cutuca na cintura ao passar por mim e comenta que ganhei peso. — Devia se esforçar pra fazer coisas diferentes. Aproveita essa amizade nova e sai um pouco de dentro de casa. Aquela Jaque... a profi da Rafinha, tá na jogada?
Iraci sempre foi discreta, mas creio que deva ter sentido ciúmes e quem sabe desconfia que eu possa estar me relacionando com a moça. Minto que não estou buscando interesses amorosos ou ter alguém no momento e ela rebate que não estava tentando entrar em minha vida, mas que é natural ficar meio magoada, pois sente que foi insuficiente no casamento, porém não fala em retomar o relacionamento de onde parou e mesmo que nós quatro possamos funcionar como família, eu e ela não funcionamos mais como um casal.
— Eu não tô afim dela...
— Tá indo pra balada com aquele amigo?
— Balada não... — não sei disfarçar tão bem quanto queria — só restaurante... coisa assim.
E no final daquele domingo, Ira se atrasa para buscar as crianças. Não sei se foi de propósito para conhecer o "tio Braz, amigo do papai" ou quem sabe não tinha motivação nenhuma. Como ele havia chegado ao escurecer, ficou surpreso em encontrar meus filhos por ali e teve que refrear a ânsia de me beijar ou cometer uma indiscrição.
— Eu não quero ir pra casa — ressentida, Rafaela me implora, não aceitando cumprimentar o Braz, por ele tomar um espaço que antes era só seu — Eu quero dormir aqui, o papai deixa?
Explico que no dia a seguir eu trabalho cedo e ela faz um pouco de birra, coisa que não é muito comum. Iraci chega e cumprimenta o Braz sem entusiasmo enquanto se desloca por minha casa com naturalidade, sem ver problemas ou possíveis ciúmes dele, até porque nem em sonhos desconfia da real relação minha com o homem forte e charmoso que senta-se no sofá para brincar com meu filho que lhe mostra uma abelha grandona de pelúcia.
— Amor, tô levando as roupas de cama deles pra lavar.
— Não precisa, Ira.
— Deixa quieto. Vou levar as crianças. Na próxima semana você os busca, sem problemas. Eu acho que você precisa sair um pouco, conhecer pessoas, sabe que te adoro e te dou o maior apoio. — Ira beija meu rosto e olha séria para o Braz, despedindo-se com um pouco de frieza.
— Braz, o que você achou? A Iraci é uma pessoa incrível. Quando se conhecerem melhor, vai quebrar um pouco esse gelo.
— Achei estranho ela te chamar de amor. — pior que a reação dele não é das melhores também. — Espero mesmo que quebre o gelo.
— Você não vai implicar com isso, né?
— Achei estranho. — Ele fala seco.
— É porque ela nem imagina que você e eu somos... que nós estamos juntos.
— Tu é duro. Nossa! Pra falar namorado, tá difícil.
— Que cobrança! Deus do céu.
— Hoje não quero ficar em casa. Preciso extravasar, nem que seja caminhar na areia, colocar os pés na água do mar. Um pouco de paz. Vamos caminhar pela orla?
Não quero me indispor com ele, também não quero sair por aí caminhando com um homem do lado bem no estilo namorado. Vejo que ele tá me forçando e isso tem me irritado bastante.
— Ah, Braz... — Resmungo sem vontade. — Porque começou com isso? Enquanto nós ficávamos só em casa, não aconteciam essas briguinhas. Você quer me levar pra conhecer amigos, quer ir ao cinema, falou até de sairmos pra dançar num clube da capital... vai devagar comigo. Só um pouco de calma.
— Porra, mais calma? Só quero que comece e se soltar. Fiz uns dez convites e só aceitasse UMA vez. Só hoje faz de conta que que somos mais que amantes. Sério. Não é capaz de se defender se alguém achar que somos dois viados?
Quando ele toca nesse assunto meu estômago contrai ao ponto da dor. O problema maior na minha cabeça é sempre: o que os outros vão dizer? No auge de meus trinta anos, eu sei perfeitamente que para eu ser aceito ou pelo menos respeitado preciso me aceitar primeiro. Não sei mais como fazê-lo entender isso. De repente até a Iraci vem nas ideias e apavorado penso que ela possa ter captado algo e que possa afastar as crianças de mim se for o caso, logo agora que estou me esforçando tanto para estar mais presente.
— Tá... vamos fica em casa. — ele de repente cansa, respira e caminha até próximo a janela, onde a cortina permanece fechada. Fico preocupado que ele mude, que esfrie comigo. O abraço, mas seus braços não me apertam dessa vez, ficando caídos do lado do corpo até ele pedir licença para sentar-se frente à televisão.
— Braz, aconteceu alguma coisa?
— Não, não... vou pedir comida. Pode relaxar agora. Toma um banho... faz tuas coisas — ele diz bastante seco — Tem algo que tu não come?
Eu enumero as coisas que não aprecio e que normalmente o faria rir, debochar de mim. Ele não o faz. Também não reclama enquanto lê um cardápio que está disposto na página do Facebook do restaurante dum grande amigo seu, até que eu concorde com algo.
Realmente algo mudou.
O eterno inflexível que sou, se acha a pessoa mais errada do mundo. Quem sabe se eu o abraçasse, se eu tomasse uma decisão, se eu acabasse com a parede de gelo que fui capaz de erguer para me proteger de tanta coisa. Quem sabe se eu fosse menos duro e diferente. Se os padrões fossem menos ditatoriais...
Meu receio em assumir algo estando apaixonado, sem me achar pronto, é não ter condições psicológicas para lidar com a carga que a aceitação me trará. O que eu via era um homem precipitado ao meu lado.
— Quer que eu fique aqui? — pergunta sem me olhar, eu sinto a frieza junto com ressentimento e respondo:
— Lógico.
— Não tô afim de transar hoje.
— Eu não estou te cobrando isso. Só fique comigo. Braz... porque tá falando assim? Hoje é quarta-feira. — tenho um sério problema em não conseguir ser emotivo, também não sei se só assim que as pessoas demonstram emoção, não consigo chorar, mas me dá um aperto tão dolorido no peito que começo a agir mecanicamente.
— Túlio, quer que eu dê um tempo pra você? Te dou um mês, você reflete, conversa com um psicólogo ou com algum amigo. É bom um tempo. Você precisa pensar porque não tá seguro sobre nós.
— Não, Braz. Não somos nós o problema... eu já expliquei. Não precisa ficar longe um mês por isso. Se nós formos com calma, quem sabe um dia...
— Vou trocar de roupa. — Braz que estava tão bem vestido, cheiroso e charmoso, pronto pra sair, me responde com secura e sobe, colocando uma bermuda e camiseta.
Quando chego ao quarto com intenção de tomar banho, ele desce e diz que o pedido de comida deve estar chegando. Também não afrouxa quando estamos comendo ou na cama, onde meus assuntos o aborrecem. Na verdade ele não teve disposição nem pra discutir.
— Te adoro — ele diz ainda de costas pra mim. O abraço por trás querendo carinho, seu beijo...
— Eu também. Muito.
— Vamos ficar uns trinta dias sem nos ver, aí você pensa se somos algo que vale a pena.
— Claro que vale, Braz. — se eu chorasse... mas não consigo... dói a garganta. — Você quer se afastar porque...
— ... porque longe é melhor pra avaliar, entendeu? Eu gosto de você... Dorme agora, tô cansado.
— Não vai embora não.
— Depois converso contigo.
— Não quero ficar longe...
— Muito menos eu. Boa noite. — daí o Braz se vira, me aperta nos seus braços, beija minha cabeça e isso dissolve um pouco da tristeza, me dá paz e permite refletir que ele é uma das melhores coisas que a vida me permitiu e que não quero perde-lo. Preciso ter certeza do que vou fazer porque minha vida pode mudar de uma forma negativa se eu vir a assumir um relacionamento homoafetivo perante a sociedade.
Pela manhã eu não o encontro, não houve despedida. Ele nunca fez isso.
Enquanto meu café desce lento na cafeteira penso nos aspectos que serão afetados: família, amigos e trabalho. Eu vivi algo com intensidade por sete meses e como já apontei, estou certo dos meus sentimentos por ele, o que parece não lhe bastar. Sinto muito, mas para eu, o egoísta era o Braz.
Numa ponta do cabo de guerra havia um homem assumido que já peitou o mundo e se sentia-se seguro. Na outra ponta havia outro homem que até os trinta anos nunca se imaginou passando por algo parecido. Meu pai é totalmente intolerante a isso, os meios em que vivemos não dão a liberdade de apenas sermos. Não estava com medo de uma risadinha, de ser chamado de viadinho, isso não era tão incomum devido aos trejeitos que já comentei que possuo e que tanto me alertaram aos gracejos debochados. A proporção era maior. Era mais sério do que eu imaginava, mais grandiosa e profunda era a questão. Até a parte espiritual estava sendo afetada, pois como um homem cristão, passei a ter medo de Deus desde quando iniciei essa relação.
Tudo isso é demais na contrapartida de viver um romance com um homem?
Não acredito que ele ficará um mês sem aparecer. Não vou aguentar. Ou se for capaz de suportar, quem sabe não foi melhor assim? Decido deixá-lo em paz e desta forma terei chance de me refazer aos poucos. Refazer o quê? Sou um amontoado de cacos de um vidro vazio. Estou sozinho e não consigo mentalizar a palavra: "terminou" porque me falta a vontade de existir diante disso.
Faço de conta que ele não pôde aparecer na minha casa na segunda-feira, mas ligo no seu celular para ser ignorado. Na terça, na quarta e na quinta daquela semana, a mesma coisa. Na sexta, ele envia mensagem informando que indicou nossa contabilidade para seu melhor amigo e que o cidadão quer agendar horário. Eu ficaria feliz e aqueceria meu coração se o Braz intermediasse para eu achar que ele ainda tem ciúmes. Justamente por isso, ele me passa por e-mail o telefone do cara, enquanto colecionam minhas mensagens ignoradas no Skype.
Não foi fácil vencer a primeira semana. Sete dias sem ouvir sua voz, sem saber se o afastamento físico também era pelo rompimento dos sentimentos dele e claro, sua presença forte, calor, carinho e paixão.
Na segunda-feira bem cedo, percebo apenas quando vou ao banheiro do escritório que tenho olheiras fundas e não fiz a barba desde sábado. Pior que tenho reunião com um empresário na área de bares e restaurantes, o tal amigo de Braz com quem agendei o horário.
Braz, seu nome me faz doer a garganta outra vez.
— Kelly, quando o Raul Martins chegar, me liga, fazendo o favor.
— Tudo bem com o senhor?
— Tô no celular. Vou ali na mecânica cobrar um honorário do Sousa e deixar o carro do escritório.
— Túlio tem cinco minutos?
— Kelly, durante o dia tá. Agora pela manhã é complicado. — respondo seco antevendo que ela vá me pedir demissão ou queixar-se do marido. Não estou com paciência pra isso.
Nos reunimos com o Raul que provavelmente tem a idade do Braz. Reparo na sua face, algumas marcas de acne que formam pequenas cicatrizes.
Acho legal que ele parece muito ciente de toda a contabilidade de seu restaurante, inclusive me mostra coisas chamativas no DRE, como despesas que ele crê não terem sido lançadas. Depois de um entendimento tranquilo, apertamos as mãos e Raul se torna cliente nosso à partir do mês seguinte quando efetuar a transferência de responsabilidade. Desta vez Mauro ali esteve e facilitou minha conversa com o cara, já que eu estava ao ponto de desabar.
— Quem indicou o cliente foi o Capitão Caverna?
— Maldade, Mauro...
— Cara, daquele tamanhão é gay, tu sabe né?
Eu travo na hora. Azia e desconforto. Saudade e vazio.
— Ai, ai... muda de assunto. Fala dessa porcaria de time que vai jogar com o Palmeiras no domingo.
— Mas credo! Uma caixa de Skol — ele aposta — Quatro a um pro Grêmio. Segunda que vem, tu me aparece chorando aqui com minha caixa de Skol garrafa, não esquece?
— Não aposto com Skol. — tiro sarro e provoco — Se fosse um fardinho de Budweiser, ia pensar no caso. (posteriormente o Palmeiras ganhou do Grêmio e ele me pagou com Skol mesmo)
Uma semana passa e não me sinto melhor. Meu semblante é de desânimo, quase de pesar e tanto Ira quanto meus filhos me vêm daquele jeito quando sento em uma cadeira na cozinha da casa onde vivi com eles.
— Rafa, filhota lava a mão do teu irmão e venham pra mesa. Túlio, já é quase meio dia, fica por aqui mesmo e almoça. De novo tá assim por causa do seu trabalho? Não consigo deixar de me preocupar com você, precisa reagir, onde tá sua energia?
— Ah Ira, tenho vontade de foder com tudo e desaparecer.
— Então chuta tudo. A vida tá passando... precisa de uma namorada bem maluca que te agite um pouco.
— Não tenho cabeça pra isso.
— Verdade. Se for pra não se dedicar à pessoa e cometer os mesmos erros, melhor ficar mais tempo sozinho até perceber que precisa mudar algumas coisas na sua vida. Eu não estou buscando isso também, não abri o coração, mas quando encontrar alguém que "fecha" comigo, vou tentar de novo e as crianças são pequenas, exige atenção e cuidado.
— Eu estraguei tudo...
— Tolo, — Ira me abraça do nada — vai ficar tudo bem. Nós temos sorte. Tem tantas separações traumáticas em volta e olha pra eu e você, estamos aqui... Agora de verdade, eu tô preocupada contigo. Teu olhar tá muito caído. Eu posso fazer alguma coisa?
— Ira... eu ainda não consigo falar sobre isso.
— Ué?
— Só preciso de um tempo pra pensar e tomara que eu não demore...
— Pelo menos te ouvir eu consigo, mas não sou boa conselheira não. De coração, eu te quero bem demais. De verdade.
— Obrigado, Ira. Ai como você é demais.
Mesmo assim não tive coragem de me abrir.
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oiiii pessoal querido♥ a gente se afasta, acumula o serviço e quase surta de novo kkkkkkk. isso nunca muda. só mais um dia no paraíso. hoje nossa conversa real nossa abaixo:
eu: "acredita que ainda ficou um sped pra passar e amanhã é o último dia"
ele: "ai não... não quero saber não"
eu: "tive que parar td pra apurar o IR das empresas, daí eu..."
ele: "tá, tá, fala de outra coisa, chega, não muda, tá loko"
eu: "então não vou falar mais nada até domingo, nem me deixa terminar o assunto, precisa interromper?"
ele só começa a rir e diz: "ai que drama!". vê que absurdo.
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