Amargo Doce - Parte 02
Eu caí nas mãos daquela rapaziada que infelizmente já está perdida e fui violentado umas vezes. Lá não era como nesses contos que todo munda faz fila pra comer o novo "detento" e acontece a luz do dia, pois lá éramos menores e nos vigiavam enquanto participávamos de atividades e estudávamos. Mas sempre tinha a oportunidade de um ou mais dos rapazes me pegar sozinho. Então era sexo oral o que eles mandavam fazer, era mais discreto e mais nojento.
Essa foi outra fase que devo ter bloqueado, pois me tornei completamente despudorado e exibicionista. Eu sentia um prazer muito estranho em ser tratado como menina numa relação e gostava de ver que meu corpo muito magrinho tinha formas que deixavam os caras loucos e querendo me tocar.
Fisicamente eu tinha e tenho curvas muito femininas, cintura fina, mamilos mais bicudos, quase não tenho pelos no rosto e corpo e os que possuo, tiro com cera desde que me lembro. Sou pequeno, meus pés e mãos são finos, ombros, braços e até o pescoço é bem delicado e sempre me gostei assim. Talvez pelo que a minha psico me disse, que bloqueei os aspectos negativos para não sofrer.
Quando saí de lá, saiu comigo o Deusimar, que era um negão que sempre se tratava no feminino preferindo ser chamado de Deusa. Foi o irmão que Deus pôs na minha vida, porque tudo ficava mais fácil com ele por perto, mesmo que tenhamos "escolhido" a vida para ganhar dinheiro.
Ele era meio musculoso e preferia trabalhar "montado" e eu era o que ele chamava: o "viadinho" pequeno. Poucas vezes bem no começo usei roupas de mulher, mas não me achava interessante.
Fiquei uns meses na rua com ele fazendo esse tipo de programa e conheci muita gente, arrumei emprego de auxiliar de cozinha para trabalhar de dia e a noite tinha meus esquemas. Eu sempre fui bem bonito e um dos clientes me indicou esse lance de acompanhantes de luxo, eu fui atrás e deu muito certo.
Sempre tinham uns caras que pagariam mais por um moreninho cheirosinho, bem vestido e que era muito obediente, topando quase todo tipo de fantasias. Com exceção de scat, zoo e fisting, o resto eu topava e ganhei muita grana.
Eu podia ser meio "burrinho" como todo mundo me chamava, mas tinha a maior vontade de sair fora da vida e guardei cada centavinho. Passei a fazer minhas trufas com a Deusa e vender para mini mercados, padarias, lá no estacionamento da faculdade e na rua mesmo, tipo indo de porta em porta. Afinal eu nunca tive preguiça nenhuma. Aí comecei a pensar sério em largar a vida e viver dos meus produtos.
Depois de tanta coisa que tinha passado eu começava a sorrir de verdade, não era mais nada forçado, eu tava tirando minha máscara e vivendo a vida de forma mais feliz. Pois eu tinha conhecido um cara. Não, o cara.
Esse moço era o mais fino que eu tinha visto e ficado. Ele sempre me dava um pouco além do valor do programa e até me contou seu nome verdadeiro: Valentin.
Nossa ele era lindo! Tinha nome de anjo, príncipe, ah eu nem sei. Como eu estava feliz. Me tornei meio que uma exclusividade dele que tinha muito dinheiro e até pagou a minha quebra de contrato com a agência.
Eu tinha achado um príncipe encantado. Lembro que brinquei com ele um dia e ele sorrindo me deu um beijo. Um beijo! Eu nunca fui beijado, só daquele jeito nojento que os meninos do abrigo davam, cheio de bafo e saliva ruim.
Valentin... eu amava tudo nele, seu nome, seus olhos azuis, seus cabelos escuros, tudo. Eu pensei que ele pudesse estar apaixonado, porque ele me tratava como "princesa". É... ele me chamava assim. Não que eu gostasse, eu não me importava e isso criou uma intimidade maior entre nós.
Eu ficava pensando que não era mais tão legal ser chamado de putinha, viadinho, princesinha, pretinho safado, piranha, bichinha... Eu tinha saído da vida e "meu" homem poderia mudar esse tratamento. Mas não mudou, só piorou.
O primeiro tapa que levei dele, foi seguido de um pedido de desculpa e só. Aí eu perdoei, porque o Valente falava que era por minha culpa que perdia a cabeça.
O que ele queria afinal? Ele não devia me amar, porque eu acho que quem ama não bate no parceiro. Ele também nunca disse que me amava. Só me beijou uma vez e sexo com ele era bem estranho desde sempre. Ele raramente me tocava, eu apenas dançava nu ou me masturbava ou usava todo tipo de brinquedo e flagelo no meu corpo, enquanto ele se tocava por cima da roupa. Só me pegava de quatro e quando estava "chapado" de droga. Por isso comecei a achar que ele não me amava.
A primeira surra que levei dele, não lembro muito, pois ele me chutou bem lá no meu saco e eu desmaiei de dor. Quando cheguei em casa, Deusa implorou para eu denunciar, mas eu tinha medo. Medo de que? Valente me metia medo. Eu vivia um mistura de coisas, amor e medo pela mesma pessoa.
Medo da sua agressividade quando ele se drogava, mas amor por saber que ele se abria comigo. Ele dizia que não gostava da vida que levava, mas sua família não o deixaria sair dos negócios. Sem dar nomes ele contava coisas muito assustadoras que a "família" dele fazia, mas eu achava que podia ser apenas contos de terror, pois ninguém podia ser tão mau assim. A não ser o tio Epa.
Um dia, ele estava ainda mais estranho me disse:
— Tu é o meu HD, por isso preciso te proteger. Sabe de todos os negócios da minha "família" e se mais alguém deles souber, te eliminam... Aí a minha preocupação...
Meu coração chegou aquecer ao ouvir que ele se preocupava com minha integridade, mas...
— Minha preocupação é que abri demais o bico contigo, quando ficava "alto". E vai saber o que tu andou comentando por aí... Você parece tão burro, mas vai que é esperto...
Ele se preocupou que talvez eu tivesse também o que ele chamou de "HD", pois ele falava um monte de merda quando drogado e eu achava que nem eram verdades, logo fui saber que ele tava dentro de um esquema criminoso, máfia mesmo, daquelas que agem dentro da polícia, saúde pública e mais um monte de coisa que não lembro. Digamos que eu era o cara errado pra quem ele abriu o bico, ou não...
As surras que ele me dava era justamente pra me manter assustado, mas eu juro que o Valente quando me batia me olhava dentro dos olhos, assustado também. Mas houve numa das surras que ele quase me matou. Mas ainda assim não o denunciei. Eu estava igual a mulher de bandido. Amarrado e apaixonado.
Pensei que não podia piorar, mas piorou quando ele me levou pra tia Rosa, porque numa maldita coincidência eles eram amantes. Me lembro da cara surpresa dela, captei um olhar de ódio quando ele me levou pra ela.
— Olha o que eu achei, amore. — Ele chamava ela assim. — É esse o moleque safado? Vi ele numa foto lá no terceiro andar e tive que rir: que mundo absurdamente pequeno.
— Sim. — Ela respondeu e riu. — Achei que já tinham te matado. Senta, toma um chazinho com a mamãe.
As lembranças dessa mulher até hoje me arrepiam, mesmo que já esteja "tomando chazinho" com o diabo.
***
— Ei, minha vida. — Francisco me acorda desse pesadelo horrível. — Teve outro sonho ruim?
— Sim. — Respondo e me agarro no corpo grande e forte do meu Chicão, meu homem, a melhor pessoa desse mundo. Ele me olha preocupado e seca minhas lágrimas.
— Já passou. Eu tô aqui pra te ajudar a viver no presente, entendeu? Mas o seu passado não vai te largar. Vai ter que lidar e ficar bem forte, mais do que você sempre foi.
Ele termina de falar as últimas palavras com a voz "de choro" e assim me dá mais um beijinho na minha cabeça, na verdade vários beijinhos.
Esse reconforto me ajuda a dormir bem o restante da madrugada onde meus pesadelos não voltam mais naquela noite.
Na manhã seguinte enquanto faço o café, Chico coça a cabeça do nosso gatinho, aquele que adotei antes do final de 2016, depois me olha sorrindo e diz:
— Eu te amo.
Aí não dá... eu caio no choro e ele me dá bronca.
— Sim, o que é isso Carlos? É tão ruim assim ouvir isso de manhã?
Sei que ele está brincando.
— É que tenho tanta sorte de você ser meu, Chico.
— Bobo. Ei, ei... tem bolo?
— Tem sim. Mas é de laranja, aquele bem "simplinho".
— Melhor bolo do mundo, foi por culpa desse bolo "simplinho" que estou casado hoje.
Começamos a rir juntos enquanto ele me serve café, eu corto bolo pra nós dois e assim começamos mais um dia juntos.
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Esse é um momento atualizado do Carlinho que luta muito para vencer os "fantasmas".
No começo lembra um céu carregado com nuvens densas, raios e ventos perigosos, mas esse vento passa e fica aquela chuvinha gostosa, com o sol querendo aparecer também para abençoar tudo e eis que aparece um arco íris e a beleza disso nos leva a sorrir e superar a negatividade do tempo que anteriormente estava ruim.
Abraços e toda a alegria do mundo em suas vidas!
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