Passivo - Obrigações Acessórias




Por Túlio...

Sou Túlio, hoje em dia contador apenas dos mercados do Braz. 

Saí de um escritório contábil, porém esse nunca saiu de mim. Não que eu queira, mas desde que eu casei com ele, Braz permite que eu tenha um horário flex, mesmo sabendo que eu não consigo relaxar se tenho pendências pra resolver.

Para me definir, utilizo-me daquele termo que Morgan Freeman costumava usar para classificar os presos adaptados ao sistema penitenciário: Sou institucionalizado! Porque na minha cabeça, nada funciona se eu não cumprir horário. Não consigo sair da empresa sem dar satisfações àqueles que comigo trabalham. Preciso delegar funções, mas não consigo sossegar se não conferir tudo que é feito, falando agora sobre o que se refere às obrigações contábeis.

Penso que Braz, como empresário precisa de suporte e não, ser o cara que faz as coisas. Se eu digo à ele que algo não está correto ou que algo gera mais encargos ou que uma falha, reflete no meu trabalho, não é por egoísmo, é porque meu trabalho precisa estar certo, de acordo com o que ele faz, de acordo com o que ele adquire e vende e se ele é cabeçudo e não me escuta, em vez de tocar o foda-se, eu fico me corroendo de ódio.

— Oh paixão da minha vida, meu olhos verdes. Tá vermelho porque, Túlio, tu deve ter pressão alta, cuida com esses estresses.

Eu respondo com calma "vai tomar no cu" ou engrosso?

Não, eu vou fingir que nem escutei. Ele me irrita quando me chama no meio de uma negociação grande de panetone, eu ajudo com os cálculos, bem tranquilamente monto a planilha, ele acha a "coisa mais querida" (como ele diz), aí depois, ganha uma bonificação e fica quebrando a cabeça sozinho pra baixar o preço. Me dá patada e tem coragem de dizer: "você é bom contador, mas na formação de preço de venda, não me ajuda muito".

— Túlio, tá muito ocupado?

— Não, estou jogando paciência. — Dou uma encarada pra ver se ele perde a coragem de me perturbar.  — Já te falei de manhã cedo que tinha que ajustar o Bloco H das cinco lojas e simplesmente não fecha o que tenho no Balanço com essa contagem.

Ele sai da sala meio chateado. E eu? Quem vê, acha que ele é a coisa mais perfeita do mundo. Até é um homem maravilhoso, aquele que eu amo, amo demais e... esse bicho peludo só me testa. Depois sai por aí dizendo que eu sou esquentado.

...

— Deu certo? — Ele pergunta no almoço.

— O que? Nada, nunca vai dar certo se não contar os estoques dentro do ano contábil que está sendo encerrado. Você mandou o pessoal contar as mercadorias em janeiro e em fevereiro desse ano e eu tenho que "dizer" pro fisco que é de trinta de dezembro do ano passado.

— Túlio e seus Fados tristes.

— Fica rindo, fica.

— Você não esfria essa cabeça homem. Amor, um pouquinho assim de calma, só um pouquinho, por favor.

— Impossível. Empresários só pensam, "dá um jeito aí contador".

— Contadores só pensam: "preciso ser foda, pelos princípios contábeis que estudei. Em nome do meu CRC, eu te amaldiçoo, seu empresário cabeçudo". Amor... relaxa um pouco. Já viu alguém cumprir à risca e com rigor, tudo, mas tudo o que é pedido nessas leis e decretos que você estudou?

— Eu faço minha parte.

— E eu faço a minha. Os mercados foram fechados um de cada vez. Agora tu tem esse estoque na mão e para de perturbar por isso que te castigo.

— Lá vem você...

— Você não gosta?

Pronto, ele começa a apelar e o brabo é que eu nunca me saio muito bem nessas "brigas". Começa com a voz grave dele, que é amaciada e baixada em vários tons, até ficar no nível carinhoso, mais um pouco é tão sensual que eu preciso optar logo por sair de perto ou me dobro outra vez.

— Vem cá, deixa eu te abraçar. Quer um cafezinho?

Não tem como não ir, há um imã invisível que me puxa e quando chego perto, ele terminou que me servir o café da máquina que temos em casa. Um beijo após o almoço, um golinho de café e um "te amo" ou "amo-te" como ele me diz.

Não é pelo tesão esses momentos, mas pelo carinho e a calma que esse homem me transmite só com o respirar, o riso baixo e o calor...

— Diz pro Braz que ele está bem mais calmo.

— Sim... um pouco. Bem pouco.

— Chato, chato.

— Misericórdia seu Braz, vai acabar engravidando o alemão. Vamos parar com esse amasso aí na minha cozinha.

Porque o Braz acha isso engraçado? Cadê o limite das pessoas?

— Itália, Itália sua vecchia safada. — Braz não parou de rir? — Vai criar vergonha na cara sua italiana boca suja.

— Porquê seu Braz? É tão engraçado ver um homem nessa idade, com quase quarenta anos, ficando vermelho.

— Ainda não entendi a graça. — Tento me fazer notado.

— Respira, começa de novo... acalma essa brabeza, volta aqui que vou continuar te enchendo de manha.

Itália sai da cozinha, mas a piada ficou no ar e o Braz demora pra esquecer essa merda. Nem à tarde, eu tenho sossego, até porque Davi pegou uma semana de férias e eu surto com a porcaria do telefone que enche o saco. Braz só pra me irritar ainda mais, liga e pergunta se estou sentindo o "desejo" de comer alguma coisa. Ele mesmo que me ensinou o truque, agora que aguente. Seguro o veneno e falo com calma, aproveitando que ele quer brincar:

— Morrendo de desejo de comer uma esfirra aberta e um café com leite.

Vinte e cinco minutos depois, um entregador de lanche bate na porta da sala com minha esfirra e café. O que faço com meu urso? Ele me quebra as duas pernas.

...

— Você não facilita pro meu lado, Braz. — Falo isso quando estamos abraçados na cama, passando um pouco das dez da noite.

— Preciso e adoro ter você calminho. Como tu consegue ser o mesmo chato desde que te conheci? E deita aqui nessa cama que não terminei.

— Eu lá tenho como sair daqui?

Não tem mesmo, porque ele tá em cima do meu corpo e pra escapar, se eu realmente quisesse escapar daqui, teria que ser muito grosseiro.

— Quando você estava no banho, a Rafa te ligou duas vezes. Amanhã cedo, liga pra ela.

— Era coisa grave?

— Não sei. Acho que não.

— Tá, mas ela... amor sai de cima que quero falar com ela. Poxa, como que você me diz, "acho que não"? E se... — Minha filha demora pra atender, quando eu já coloquei a cueca e ia me ajeitar pra ir na casa da Iraci. — ... oi Rafa. Eia, calma! Não sabia que você estava dormindo. Eu sei, dá pra responder com educação?

Isso me deixa puto de raiva, quando a Rafaela com seu humor instável de adolescente aliado ao fato de que tem muito do meu jeito, me dá patada. E me irrito muito mais, é com o Braz rindo da minha cara.

— Tá bem, te amo. Era só isso? Achei que o Braz tinha inventado essa ligação. Amanhã eu te ligo então...

— Ah senhor alemão Schneider, eu ouvi a penúltima frase. Porque achou que o teu ursão ia inventar uma ligação? Vem aqui, chato.

Caio na cama e deixo ele me abraçar apertado, me dar vários beijos e vários eu te amo ou amo-te, me chamar de chato, outros tapas na bunda que detesto e logo caímos naquele sono gostoso.

— Puta que pariu! — Reviro-me na cama pela milésima vez, porque perdi o sono pensando no caralho do Bloco H. Cuido pra não acordar o Braz, mas é meio impossível. E depois, ele é a pessoa que mais se preocupa comigo e meus excessos. Acaba sendo ele, a pessoa mais atingida quando tenho minhas explosões.

Vou até a cozinha, tomo água e logo ele me surge com olheiras, mas sorrindo e perguntando se eu estou bem.

— Oh amor... desculpa. — Me retrato e abraço-o com força. — Te acordei. Não fica preocupado comigo, é só um cansaço normal.

— Você é o tipo de cara que precisa apanhar no rabo. Desliga de tudo e não traz o SPED pra cama...

— Eu sei, mas hoje não consegui fechar...

— Shh! Ontem, você quis dizer. Hoje, você vai sentar naquela cadeira e os seus saldos vão fechar, todos.

— Tá... — Falo com muito sono e quando caio na cama, sinto o cheiro do Braz ao esfregar meu nariz no peito cabeludo. Tanto sono e tão poucas horas pra dormir, pois são quase três horas.

..

Tá vendo porque eu me irrito?! São onze horas e onze minutos. O que eu estou fazendo na cama a essa hora? Tenho um monte coisas pra fazer, minhas obrigações e prazos, e... O que estou dizendo? A contabilidade não sai de mim mesmo. Acabei de comentar que tenho cinco empresas pra cuidar, quando antes eu tinha que chefiar uma contabilidade com quase quatrocentos clientes, uma pá de funcionários.

Minha irritação foi tão grande na hora em que me acordei, que liguei para o número do Braz e ele não me atendeu enquanto eu pensava em dar uma bronca nele.

Porém, ele retorna e eu lhe digo algo que é devido.

— Bom dia, amor... obrigado por ter me deixado dormir um pouco mais.

— Não precisa agradecer meu alemão, eu vi que você precisava descansar, dormiu muito? — Eu sorrio e repondo que acabei de acordar. — Relaxa mais um pouco e de tarde você vem, vou atender uma "bucha", beijo.

Que homem!

Engraçado que a Rafa me ligou só para falar algo parecido, me cobrando que eu fosse mais light e que só o "tio" Braz que tem saco pra me aturar. Preciso reinventar meu jeito, tentar ser leve, levar com mais calma e aproveitar um mínimo mais a minha vida.

...

— À tarde fecharam os teus SPEDS? — Ele me pergunta quando deitamos na noite seguinte.

— Todos... me concentrei e tirei a porra do telefone da parede.

— Então me deixa dormir que estou cansado, ontem não foi fácil com esse crianção revirando do meu lado.

Poxa, agora minha consciência até pesou, coitadinho do meu urso.

....

Por Braz...

Preciso dar uma dura no meu olhos verdes vez ou outra. Estão vendo como amansa? 

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Mais um capítulo prontinho, hoje com Túlio pessoa mais doce, kkkk Beijos♥



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