CICLO VICIOSO
A noite mal dormida era nítida nos rostos dos dois jovens. As olheiras estavam marcadas pela roxidão, os olhos levemente avermelhados, e nem mesmo a cafeína estava fazendo efeito.
— Você está péssima — Adam comentou, segurando a risada.
— Digo o mesmo de você. — A garota sorriu.
As provocações estavam de volta, era bom saber que nada mudou por conta de um beijo. Afinal, aquilo foi apenas atração que sentiram naquele momento. Pelo menos era o que a garota tentava repetir para si, mesmo sabendo que, no fundo, fora mais que isso.
— Preciso ir, tenho que contar a Steve sobre a Oli — pronunciou, levantando-se da cadeira.
Adam confirmou com a cabeça.
— Nos vemos hoje à tarde? A floresta é longe da minha casa, então podemos nos encontrar aqui — sugeriu.
Após ter contado para o garoto sobre a descoberta do local, eles decidiram que seria melhor irem apenas no dia seguinte, pois a claridade os ajudaria a encontrar o que estavam procurando. Belinda até tentou dizer que poderiam ir à polícia, mas Adam negou, dizendo ter muitos problemas envolvidos com a delegacia e que provavelmente não ajudariam em nada, já que as mortes que aconteceram até agora não tinham sequer uma pista que levasse diretamente ao assassino. A garota concordou em relação a isso, seria melhor deixá-los longe.
— Sim, te espero aqui. — Deu um sorriso fraco.
Belinda abriu a porta do trailer, se sentindo triste por deixar o rapaz sozinho, porém precisava dizer o que havia acontecido para o amigo, era melhor Steve saber sobre os perigos que estavam correndo.
Assim que chegou na casa dos Madson's, uma longa caminhada até o local, pois eram sete quarteirões rodeados de árvores, a garota sentia-se aliviada ao observar o lugar. Bateu três vezes na porta, odiava a maneira como Steve sempre demorava a atender qualquer pessoa.
— B... — comentou animado, entretanto, logo seu rosto murchou ao ver a expressão de tristeza na cara da garota. — O que houve? — perguntou confuso.
— Posso entrar? — ela indagou, o que deixou o rapaz ainda mais preocupado, porque desde que se conheceram Belinda nunca havia feito essa pergunta.
— Você sabe que sim. — Deu espaço para a loira passar. — Fiquei esperando você me ligar ontem para dizer o quão horrível foi a sua saída com o rico mimado, e também esperei o telefonema de Olívia dizendo estar com tédio, mas parece que as duas estavam ocupadas demais ontem para ligar para o amigo aqui. — Sorriu despreocupado.
— Antes de tudo, preciso que saiba que sinto muito pelo que houve, se eu soubesse que iria acontecer esse caos, não teria envolvido vocês nisso — a garota disse, encarando o chão.
— Ei! Somos melhores amigos, estaremos sempre juntos. — Abraçou a amiga.
Depois de alguns segundos sentindo o conforto do garoto, Belinda conseguiu criar coragem e contar tudo que aconteceu.
— Steve, acho melhor se sentar. — Apontou para o longo sofá da cor cinza posto na sala.
Ele cumpriu o pedido de imediato, ocupando a maioria dos seis lugares que tinha. O semblante de preocupação ainda estava presente.
— Recebi uma ligação ontem. No começo pensei que fosse algum tipo de brincadeira, porém eu sentia que era de verdade. Então escutei Olívia implorando, e ele disse que me procuraria, foi assustador. — A garota deixou novamente que as lágrimas caíssem, não conseguindo contar tudo direito.
— Belinda. — Steve a abraçou, não entendendo o que estava acontecendo. — Me explica direito, por que a Oli estaria implorando por socorro e alguém estaria te procurando? — pediu com calma.
— O serial Killer, ele está com a Olívia, sabe que eu o estava investigando, que consegui algo.
— Isso não pode estar acontecendo. — O garoto se levantou, sentindo-se frustrado e preocupado. O que aconteceria com a amiga se não a encontrassem?
— Eu sinto tanto por isso, não queria ter colocado nenhum de vocês em perigo. É tudo minha culpa, deveria ter agido desde o começo sozinha. — Ela não conseguia mais falar, o choro intenso não permitia.
Belinda sentia-se devastada, saber que um psicopata estava com sua melhor amiga, era amedrontador. Seu cérebro dava sinais de que nada ficaria bem.
— Isso não é culpa sua, Belinda. — A voz suave de Steve sussurrou em seu ouvido logo após ele a abraçar. — Temos dezoito anos e sabíamos no que estávamos nos metendo. — Apertou ainda mais o abraço.
Após longos minutos tentando controlar o choro, abraçada com o melhor amigo, sentiu que finalmente poderia pensar em algo maior. Traria Olívia de volta, não importa o que custasse.
— Recebi uma carta com um enigma, e consegui resolvê-lo. — Fez uma breve pausa. — Tem algo por lá, não que seja Olívia, mas pode ser algo que ajude a encontrá-la. — Limpou as últimas lágrimas que escorriam pelo rosto.
— Ótimo! Podemos ir à delegacia e contar sobre o desaparecimento. — Steve caminhou rápido até a porta principal.
Belinda o encarou, apreensiva.
— Não podemos — pronunciou baixo.
— É claro que sim, eles são os únicos que podem encontrar Olívia — Steve disse confuso, encarando a garota.
— Talvez não — Belinda negou. — Adam Thompson estará conosco, sabe como a polícia o detesta, seria terrível.
— Eles o detestam pelos atos ilícitos que ele comete! — Steve bufou.
— Sabemos que ele não faz coisas tão agradáveis, mas ele é irmão da Olívia. Se existe uma pessoa mais preocupada e desesperada, é ele — comentou Belinda.
A Reynolds não conseguia nem imaginar o seu irmão, Liam, nessa situação, tinha total certeza de que sua saúde mental estaria mais que afetada. Ela o amava mais do que tudo.
Steve a encarou por alguns segundos, parecendo ainda não concordar com ideia de não comunicar a polícia.
— Vamos, Steve, Adam precisa estar conosco. Aliás, você sabe que ele conhece todos os cantos escondidos dessa cidade. — Tentou convencê-lo.
— Tudo bem, mas se algo der errado, voltamos para a delegacia — disse firme, e a garota concordou com a cabeça. — Que horas iremos?
— À tarde. Os polícias estarão reduzidos a esse horário.
— Podemos almoçar aqui e depois nos encontramos com Adam. — Ao falar o nome do rapaz, fez uma careta de desgosto.
Steve detestava o Thompson com todas as forças, não apenas por sempre estar envolvido com corridas ilegais, gangues, uso de drogas e outras coisas que nem imaginava, mas também porque ele era soberbo demais, como se todos fossem seus súditos.
— Seria ótimo, mas preciso ir para casa, não voltei desde ontem — deixou escapar a última parte, e percebeu o desastre apenas quando observou o olhar confuso de Steve.
— Pensei que estivesse em um encontro com o filho de algum daqueles ricos.
Belinda sentiu seu corpo gelar e a mão suar de forma descontrolada, a garganta estava se fechando como se não bebesse água há dias.
— Eu... — Não terminou a frase. Não conseguia pensar direito e aquilo a estava deixando atordoada.
— Você? — indagou o rapaz com a mesma expressão de confusão.
Ela respirou fundo e pensou em algo.
— Quero dizer, não voltei para casa porque, assim que voltei do encontro, recebi a ligação e fui direto para a casa de Olívia, mas Adam não estava. Ele chegou depois de uma hora, então eu esperei do lado de fora e, assim que entramos, vimos o local totalmente bagunçado, procuramos por alguma coisa e constatamos a pista. — Deu uma pausa e encarou o garoto. — Ficamos pensando a noite toda, até desvendar — contou a metade da verdade.
— Por que não veio primeiro aqui? Poderíamos ter ido juntos — Steve comentou com raiva.
Belinda observou o maxilar do rapaz trincar pela indignação.
— Desculpa. Fiquei tão atordoada que o único lugar que pensei que poderia encontrar algo era na casa dos Thompson's. — Tentou dar um sorriso.
— Poderia ter me contado antes, não gosto nem um pouco do Adam — o garoto comentou emburrado.
Belinda suspirou fundo pelo drama do amigo, contudo, não queria que a situação piorasse, então apenas concordou.
— Tem total razão, errei nesse quesito — disse, apesar de acreditar que se isso tivesse acontecido dessa forma, ela não teria feito nada de errado.
Steve deu um sorriso de lado.
— Nos encontramos onde? — o garoto perguntou.
— Na casa do Adam. — Logo viu a careta no rosto do rapaz e emendou: — A floresta é mais perto de lá.
— Certo! — ele exclamou, amenizando a expressão.
— Preciso ir, minha mãe não está de bom humor esses dias. — Lembrou-se da discussão que tiveram, aquela foi a última vez que se falaram.
— Melhor resolver as coisas, nos vemos mais tarde. — Abraçou a garota.
— Até. — Retribuiu o abraço. — Às cinco da tarde lá — falou o horário, e o rapaz concordou apenas com a cabeça.
Assim que chegou na enorme mansão, sentiu ainda um frio percorrer pela sua coluna. A garota ansiava apenas que todo aquele momento que estava passando fosse mentira. A realidade era cruel.
Observou a imagem de Elena Reynolds debruçada sobre a poltrona marrom que ficava em frente à enorme lareira preta com mármore branco. A mulher estava chorosa, sua pele normalmente branca agora estava avermelhada.
— Querida, é você? — indagou, se levantando depressa para ir em sua direção e secando as lágrimas.
— Sim, mamãe — respondeu, a abraçando. Mesmo se sentindo magoada com a mulher por causa da última vez em que se viram, ela detestava alguém chorando, principalmente da família. — Aconteceu algo? — questionou, se separando do abraço e a encarando.
Sabia muito bem que seu pai poderia ser bruto quando perdia o controle de suas emoções.
— Não, meu amor. — Sorriu amarelo. — Irá sair mais tarde? Vi que saiu muito cedo hoje de manhã, não a encontrei na cama. Pensei que poderíamos ir ao Lila's, seu restaurante favorito.
Aquilo doeu em Belinda, porque a mãe nem ao menos notara que ela passou a noite fora, no entanto, precisava mentir como sempre. A mentira é um ciclo vicioso que cada vez se torna mais frequente.
— Quis fazer uma corrida matinal, estava me sentindo um pouco sedentária, e sabe que gosto de me manter em atividade. — Tentou dar o seu melhor sorriso. — Irei apenas terminar um trabalho na casa do Steve, mas às oito seria ótimo para jantarmos.
Ela não poderia mais fugir de todo esse caos que eram os seus pais, ou eles notariam que a garota estava escondendo algo. Eram espertos o suficiente, ainda mais com sua filha.
— Claro, querida. Te vejo mais tarde, preciso ir me encontrar com seu pai. — Beijou suas bochechas pálidas e saiu pela porta principal.
Belinda sabia que ela estava se sentindo mal pela última discussão que tiveram, porém não poderia pensar nisso, não agora com a sua amiga nos braços de um assassino.
Subiu as escadas pulando de dois em dois, e quando chegou ao seu quarto, debruçou-se na cama cor de rosa, à qual detestava, mas que após as implicâncias de sua mãe, permitiu que a mulher comprasse naquela cor. Deixou-se ser levada pelo barulho de relógio, entrando no transe. Se concentrou em cada passo que fez na noite da corrida, se tinha algum rosto à sua volta que estava estranho demais, entretanto, nada vinha à sua mente, a não ser os malditos olhos azuis de Logan Hills e toda a sua prepotência.
Seus olhos pesaram após o cansaço intenso destes dias, então ela quis ter paz, mesmo se sentindo egoísta porque sabia que sua amiga não poderia tê-la.
Ao fechar a porta de casa, encarou o jardim bem cuidado e caminhou a passos rápidos em direção à casa de Adam, seria uma caminhada longa.
Ao chegar perto dos trailers, observou os dois garotos à sua espera. Adam vestia sua jaqueta de couro preta e uma blusa do AC/DC, acompanhadas com uma calça jeans de lavagem escura, com uma aparência fechada. Steve estava escorado em seu carro, com um jeans rasgado e moletom, seu rosto tinha a mesma expressão de Adam.
Belinda suspirou fundo, vendo que não seria nada fácil ter que estar com os dois ao mesmo tempo, ainda mais gostando de seu melhor amigo e tendo beijado o Thompson.
— Podemos começar? — Adam perguntou nervoso, assim que Belinda chegou ao seu lado. A garota apenas confirmou com a cabeça, depois olhou para Steve para ver se o amigo estava pronto. — A floresta é muito grande, então vamos nos dividir, um vai para o sul, outro leste e outro norte, nos encontramos no oeste — direcionou, apontando para cada região.
— Eu acho isso uma idiotice. Estamos lidando com um serial killer, e se ele estiver em algum lugar desses esperando apenas alguém sozinho aparecer? — Steve rebateu.
A garota teve que concordar, não poderia saber sobre tudo na mente dos assassinos em série, contudo, se lembrava exatamente de como eles gostavam de vítimas solitárias. Ir para um local onde ele mesmo mandou, sozinha, seria suicídio.
— Tem alguma ideia melhor? — indagou Adam, ácido.
Antes que seu amigo pudesse responder o alfinetando, ela preferiu interferir.
— Que tal seguirmos juntos para cada lugar que Adam citou, assim não corremos tanto risco.
— Que seja! — o Thompson respondeu e saiu na frente, indo em direção às enormes árvores que estavam a um quilômetro dali.
— Você sempre foi muito esperta, B. — Steve a abraçou de lado.
E pela primeira vez na vida, Belinda quis concordar com Adam para que ele se sentisse bem, porém sabia que seu plano era falho.
Adam sentiu um incômodo ao ver o garoto a abraçando, e a sensação de querer arrancá-la dos seus braços era quase incontrolável. E Steve percebeu isso pela expressão em seu rosto.
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