Capítulo 03 - O ressarcir das ondas

Tenham uma boa leitura!

#ConchasRosas


O caminho de Daegu até Busan foi percorrido em menos de duas horas de carro, isto considerando todos os contratempos, então chegamos antes mesmo do relógio marcar seis da tarde. É um tempo curto, uma viagem pequena para qualquer pessoa, mas quando se tem uma bomba jogada no colo nos quarenta e cinco segundos do último tempo, nada realmente parece curto e agradável.

Passei a viagem toda pensando no que a senhora Min disse, nas fotos e nos vídeos gravados no pendrive, nas lembranças saturadas do fundo da minha mente, absorto na bolha criada por mim. Então, quando cruzamos as ruas principais da cidade, ainda consegui sentir todas as novas informações reverberando em minha mente, causando uma tontura sutil.

"Ele realmente gostava de você, Taehyung. Yoongi ia se declarar e pedir você em namoro no dia em que morreu."

Quase consigo sentir meu coração afundar no peito, atropelando os outros órgãos para descer o nível mais baixo possível e se estagnar lá. Antes, todos os "e se" eram apenas suposições bobas de uma realidade que não existia, mas na verdade, era tudo recíproco.

Era...

Todos os "e se" poderiam ter existido por todos os outros verões, mas não existiram.

一 Está tudo bem? 一 Namjoon pergunta, os olhos atentos às ruas de Busan.

Esqueço da presença dele por alguns minutos, mesmo que ele esteja dirigindo o carro por mim durante grande parte do trajeto após sairmos de Daegu. O silêncio sendo o nosso principal companheiro de viagem.

一 Uhum, está.

Não demorou muito para chegarmos no endereço mandado por Sunha. Há plantas penduradas na parede branca 一 que pareciam ter sido pintadas recentemente 一, as janelas abertas, dando visão para o interior com um tom mais acolhedor e com menos enfeites à mostra do que na última vez que estivemos ali.

Sunha está na porta da frente, o cabelo castanho bem mais claro do que pude ver em Seul há meses atrás. Ela segurava um copo grande em mãos e parecia falar com alguém de dentro da casa.

一 Tae! 一 ela grita assim que me avista fora do carro. Namjoon está estacionando na vaga mais próxima. - Então não precisei chorar ao telefone para você vir? É reconfortante.

Solto uma risadinha com a última parte. Quando estamos perto o suficiente, nós nos abraçamos. Sunha tem cheiro de chiclete e bebida alcoólica.

一 Você chorou nas mensagens, não conta?

Ela ri e solta meu corpo, deslizando comigo para dentro da casa com graciosidade, mas antes de chegarmos até a sala de estar, volto a falar em um tom bem-humorado:

一 Não basta roubar a memória do meu telefone com os gifs de gatinho, precisava alugar a casa do Jimin? 一 brinco, imaginando quais foram os métodos para convencer o mais velho a liberar a casa.

Sunha fica levemente desconcertada, mas então ri, passando os dedos pelo cabelo solto.

一 Quase dois anos juntos, era meu trabalho como namorada tomar o espaço do Ji.

Agora, quem fica desconcertado sou eu, parando assim que ouço a palavra namorada. Como e quando?

Namorada?

Posso ver a alegria de Sunha quando concorda imediatamente. É quase inevitável não sentir a onda de culpa por estar sendo um péssimo amigo e não saber desses pequenos detalhes sobre ela... Sobre eles.

Era como entrar em um redemoinho de informações que antes eu nem poderia imaginar, afinal, em nenhum momento poderia ter pensando neles como um casal em potencial, porque Jimin tinha Seokjin e Sunha não era a grande entusiasta sobre relacionamentos.

Mas isso era há cinco anos atrás.

Yoongi tinha morrido, Seokjin tinha ido embora e agora os que ficaram preenchiam as lacunas como podiam.

"Todos os outros ainda não chegaram", é o que Sunha nos avisa assim que cruzamos a sala para chegar à cozinha e escuto ela reclamar sobre o carro que o mecânico achava ter sido afogado; sobre como se enrolou para preparar tudo enquanto choramingava de não poder está no pub naquele momento. Não vejo Jimin, tampouco Namjoon depois que entro, então considero que estejam juntos no lado de fora da casa.

Momo é a última a chegar, um pouco depois das 20h e trazendo um embrulho a tiracolo em tons de rosa. O cabelo preto está curto e repicado, tão diferente do cabelo que tinha visto nas fotos de hoje mais cedo.

一 Gostei do cabelo. 一 É a primeira coisa que ela diz antes de deixar o presente de lado e abraçar meu tronco. 一 Faz parecer um pintor espanhol que adora as casadas.

Momo faz uma pose engraçada, batendo os pés tentando imitar um passo de tango e surrupiando uma rosa de um vaso próximo para pôr na boca. Isso me faz rir.

一 Parece o tipo de coisa que você faria 一 Hirai diz, tirando a rosa da boca e cuspindo uma folha teimosa.

一 Não, isso é com você e com o Jimin. Eu sou o amigo que registra a situação 一 rimos juntos e ela recoloca a rosa no vaso.

Jimin e Namjoon entram pouco tempo depois, trazendo uma caixa de tamanho médio e bebidas. Espio o conteúdo da caixa por cima dos ombros de Sunha, que está à minha frente, e vejo o nome de uma confeitaria local escrita na caixa, a qual é colocada na mesa que foi arrumada por eu, Momo e uma Sunha muito animada.

一 Posso deixar o número da ambulância no telefone ou ainda é muito cedo? 一 Namjoon questiona, observando a mesa recém-posta com comida.

Sunha se vira para ele indignada e coloca as mãos na cintura.

一 Eu melhorei bastante na cozinha, okay? 一 responde a mulher, com as sobrancelhas juntas e encarando o Kim, arrancando risadas de todos.

一 Pois é, ela melhorou bastante, mas essa comida é do restaurante aqui perto 一 Jimin expõe a namorada e leva um tapa no braço. Suas expressões vão de incredulidade para diversão. 一 O que? Eles iam saber, amor.

Amor.

Olho para todos presentes no cômodo e noto que o único que ainda está surpreso com esse relacionamento 一 não tão recente 一 sou eu.

Todos sentam à mesa, rindo e conversando enquanto a comida encomendada era devorada. Nas conversas, acabo descobrindo que Momo está pensando em fazer uma segunda graduação fora do país, que Jimin foi expulso de três bares em Busan por beber demais 一 prejuízo ao dono do estabelecimento 一 e que Sunha quase, quase, adotou uma cobra construtora, mas nos quinze minutos do último tempo, descobriu que tinha um certo medo de cobras, mesmo que, teoricamente, ela não fosse capaz de matar Sunha.

一 E você, Taehyung? O que tem feito? 一 é Jimin quem pergunta, os cotovelos apoiados na mesa e os olhos direcionados a mim.

一 Bem, sou fotógrafo e... 一 Paro de falar, sem saber exatamente o que dizer a seguir da minha profissão. 一 E trabalho em um estúdio em Seul.

Jimin continua encarando meu rosto, os olhos curiosos para saber mais do que realmente tem.

一 Parece legal 一 responde devagar, arrastando o prato para mais perto de si e voltando a comer. - E os planos de expor suas fotos, Tae? De trabalhar para uma revista?

Fico desconfortável com a menção dos meus antigos planos, mas Jimin e nem os outros parecem perceber, além de Namjoon, que olha para mim com os olhos atenciosos.

一 Não eram planos bons 一 digo sem dar importância e Namjoon engata outro assunto, roubando a atenção de todos.

Com um talher qualquer, futuco a comida no prato e a jogo de um lado para o outro, rindo uma vez ou outra com algum comentário solto de uma história qualquer dos meus amigos. Olhando a mesa, posso notar que todos parecem animados conversando e bebendo, cada um se inteirando como pode sobre a vida do outro.

E mesmo que todos pareçam ter novidades para contar 一 todos, menos eu, é claro 一, algo naquele cenário parecia errado. Como atores que trabalham juntos mas não conhecem suas falas.

Estranhos.

Eles eram estranhos para mim naquele momento.

Namjoon esbarra no meu braço, deixando uma garrafa de água mineral ao lado da garrafa de cerveja cara comprada por Jimin, isso é o suficiente para impedir que a nuvem cinza formada nos meus pensamentos tomasse densidade.

一 Cuidado com a bebida, não quero ter que te mergulhar no mar para curar sua ressaca amanhã cedo 一 ele diz de forma suave, tranquila e tão baixa que apenas eu consigo escutar. 一 E você ainda precisa dirigir até Seul amanhã, não esqueça.

一 Gostaria mesmo de falar sobre isso, Namjoon 一 começo, largando os talheres delicadamente e afastando a bebida quase intacta. 一 Quero pedir que me acompanhe até Seul.

Com as sobrancelhas unidas e os olhos castanhos voltados para mim, a dúvida fica estampada no rosto do estilista.

一 Iremos com o carro que está aí fora, e por isso quero que alguém vá comigo para trazê-lo para Daegu na volta 一 trato de explicar antes que ele questionasse.

Ele assente, mas ainda parece em dúvida.

一 Muito trabalho. Por que não o deixa em Seul? Seu prédio tem uma garagem e você ainda não precisaria correr para o trabalho com ele lá.

Nego com a cabeça.

一 Não gosto de dirigir 一 minto e ele sabe disso, mas como todas as outras vezes, finge acreditar.

一 Certo, vamos dormir aqui ou iremos precisar sair mais cedo para procurar um quarto por Busan?

一 Posso falar com eles mais tarde e ver se há espaço para dormirmos aqui.

Namjoon concorda e afasta o próprio copo de bebida, alcançando a garrafa de água ao lado do prato e sorvendo o conteúdo depois de abri-la.

Ele não bebe mais nenhuma gota de álcool depois da nossa conversa.

Rimos mais que nosso corpo aguentava. Bebemos mais do que o recomendável, mas o momento constrangedor chegou quando brincando, Jimin questionou:

- Quem faltou? Essa mesa ainda está muito silenciosa.

O barulho diminui de forma bruta, fazendo o silêncio habitar à mesa, assim Jimin percebeu o que a pergunta implicava e que ninguém estava disposto a responder.

Limpo a garganta e abaixo o meu copo de bebida.

- Hoseok, ele faltou. - E mais outros três, mas não respondo mais que isso, apenas o nome de Hoseok é o suficiente. - Alguém avisou?

Momo balança a cabeça, sinalizando um sim.

- Avisei. Sunha também o chamou e ele deu uma desculpa qualquer para faltar - responde Hirai, balançando os ombros como se não importasse, mas eu sabia que importava. - Quase não nos falamos de qualquer maneira.

Quero perguntar sobre Hoseok para Momo e depois sobre Seokjin, mas não o faço temendo que isso possa desencadear uma reunião de pessoas com os fios tão expostos quanto os nossos; ao menor sinal de água, o assunto poderia se tornar delicado demais e acabar gerando uma corrente elétrica de coisas não ditas.

É pouco mais de meia-noite quando encontro Sunha na cozinha, procurando por mais bebida com o corpo curvando para dentro da geladeira; apesar de tudo, ela ainda parece estar em um nível de sobriedade.

- O que perdeu aí dentro? 一 brinco, encostando meu quadril na ilha da cozinha e observando a mulher virar o rosto na minha direção.

一 Minha dignidade, por acaso ela estava no seu prato?

Sunha sorri ainda com o tronco dentro da geladeira e se afasta, trazendo consigo duas garrafas distintas para o balcão.

一 Não sei, como você perde algo que não existe?

Digo fazendo um falso olhar de confusão e ela gargalha audível com a pequena provocação. Isso em um leve repuxar dos meus lábios diante do bom-humor dela.

一 Ela existiu em algum momento 一 responde, abrindo os recipientes com a destreza de um barman e empurrando uma das latas pra mim. Posso sentir o cheiro adocicado do refrigerante invadir o ar. 一 Soube que está voltando para Seul, o que aconteceu com o trato que consistia em você hospedado em Daegu por pelo menos uns dias?

一 O trato era vir para seu aniversário, Sunnie. Eu estou cumprindo ele 一 lembro-a, levando a latinha até os lábios e bebendo o açúcar gasificado.

一 Não achei que você seria tão sacana e sairia correndo depois da data 一 dramatiza, batendo os dedos no balcão e fingindo uma careta brava. Isso me faz rir ligeiramente. 一 Isso magoa, sabia?

一 Eu tinha planos para ficar aqui, certo? Mas surgiu um evento de última hora 一 começo minha defesa, mesmo que não quisesse ficar na cidade, ainda tinha planos para passar pelo menos dois dias a mais ali em prol das reclamações de dona Minhe, contudo, a ligação do meu chefe tinha caído no meu colo com o pretexto perfeito para fugir o mais rápido dali. 一 Por falar em trabalho de última hora, posso passar a noite aqui? Preciso sair ainda pela manhã bem cedo e passar na casa dos meus pais, e retornar de madrugada para Daegu não é algo que economizaria tempo.

Sunha assente, bebendo a cerveja achada no fim da geladeira. No final, ela emite um barulho de chateação e batuca a latinha na madeira da bancada.

一 Claro que sim, Tae. Ou você acha que eu pediria para vocês virem para Busan e depois enxotaria todos no auge da madrugada para a cidade? Não, não. O plano era realmente vocês passarem a noite aqui 一 Sunha explica, encostando o quadril no móvel assim como eu, cruzando os braços. 一 Momo fica com um quarto e você e Namjoon com outro, sim? Está tudo arrumado de qualquer maneira, nem cogitamos outra solução. É bom ter essa casa cheia depois de um longo tempo.

O último comentário sai em tom melancólico, acompanhado de uma expressão neutra e dedos apertados. Não preciso de muito para saber que ela está lembrando de cinco anos atrás, a expressão distante e olhar alto é o suficiente.

Faço um barulho com a garganta, querendo dissipar o ar frio das lembranças de Sunha.

一 Estou sendo castigado para ter que dormir com o Namjoon? 一 faço graça, encostando no braço fino com um leve empurrão.

一 Talvez. 一 Ela une as sobrancelhas e se afasta da bancada, jogando a latinha no lixo mais próximo. 一 É que o outro quarto de hóspedes está ocupado com algumas coisas... um berço, cômoda e afins 一 explica.

Paraliso.

Berço?

Sunha não parece ligar para o que acabou de falar, ou ao menos não nota a menção feita ao móvel tão comum, mas que só tinha um motivo para sua existência dentro da casa de um casal.

Mesmo que sem querer, arrasto os olhos para a lixeira que Sunha jogou a latinha, por seu abdômen e depois para o rosto despreocupado, sem mais a certeza de que aquilo era realmente cerveja barata.

一 Quer ajuda para colocar suas coisas lá, Tae? 一 solícita como sempre, ela questiona parada na minha frente.

Nego devagar com a cabeça, com medo que uma pergunta intrometida saltasse da minha boca se eu ousasse abri-la.

Pelas lembranças, tento resgatar alguma menção pequena ao assunto ou o menor indício que algo havia mudado com Sunnie, mas nada me vem à cabeça. Sequer uma pequena memória dos anos seguintes ao meu afastamento que envolvesse a mulher à minha frente em diálogos comprometedores o suficiente para que eu saiba algo da sua vida 一 ou ao menos para que eu tenha interesse em saber dela.

一 Não, eu... 一 Tento organizar as palavras em uma frase que não seja um questionamento ao que acabei de ouvir, evitando uma nova menção aos quartos. 一 Estou bem. Irei usar a cama por algumas horas apenas. Não preciso levar as malas lá para cima

Sunha concorda.

一 Vou avisar aos outros dois sobre o quarto, caso eles também achem que eu seja tão má ao ponto de colocar vocês para fora 一 ela brinca, colocando a língua para fora em zombaria.

Solto uma risada baixinha, vendo-a passar em direção à sala e aos outros que bebiam e comiam. Não demoro muito mais na cozinha com meus pensamentos e dúvidas, logo faço o caminho para o andar de cima, passando pela sala cheia e pelo corredor de paredes pintadas de branco e quadros que antes não existiam ali, chegando até o quarto que antes poderia ser considerado como meu.

E assim como tudo que um dia reconheci como familiar, aquele quarto era estranho para as minhas lembranças.

Tudo era diferente ali.

Das cortinas brancas às paredes de cor marsala até os móveis novos e a roupa de cama em cores neutras. Os porta-retratos de antes tinham sido substituídos por poucos enfeites de porcelana e uma luminária nas superfícies planas; o pequeno monte de revistas não estavam mais ali e tampouco as mini estátuas de peixe que o senhor Park adorava.

Aquilo realmente pertencia à outra casa, a casa de Jimin e Sunha, não a dos senhores Park que é a que permanece nas minhas memórias.

Não mais.

一 Jimin mandou dizer que tem toalhas novas no armário de baixo 一 Namjoon diz, entrando no quarto com duas bolsas a tiracolo. 一 E escovas novas também.

Concordo, um pouco assustado pela aparição repentina do Kim.

一 Não precisava subir com as bolsas agora, Namjoon. Você devia estar lá com eles. 一 Uso um tom de repressão com ele, pegando as bolsas assim que me aproximo. 一 Vamos, desça e se divirta com os outros.

一 Diversão? Ah, não. Jimin achou um baralho perdido e agora estão tentando jogar cartas 一 ele diz, sorrindo. 一 Você sabe como Momo e Jimin são competitivos, não podemos esperar menos que uma agressão verbal saindo daquele jogo.

Gargalho ao imaginar os dois trocando insultos gratuitos.

一 Então é ainda melhor que você esteja com eles, precisamos de alguém diplomático, e sabemos que Sunha não tem bem esse perfil.

Ele sorri, unindo as sobrancelhas e colocando as mãos no quadril como se estivesse indignado.

一 E eu tenho que ficar no meio do fogo cruzado? Achei que essa fase tinha passado 一 resmungando a última parte, ele nega com a cabeça, o que me faz rir mais um pouco.

Namjoon retorna à sala, alegando que era o salvador da pátria por impedir um possível assassinato naquela noite por culpa de um jogo de cartas.

Coloco as bolsas em cima da cama de casal, tomando um cuidado redobrado com a bolsa carteiro e retiro o telefone do bolso, jogando de qualquer maneira no colchão macio depois de fechar a porta do quarto.

Enquanto separo um conjunto fino de short e camiseta 一 ambos cinzas 一 para o banho, penso em todas as novas informações que recebi em poucas horas. A ideia que todos tinham dado continuidade às suas vidas de forma fácil não saia da minha mente, mesmo sem poder culpá-los 一 quem os poderia afinal? 一 não conseguia enxergar as pessoas que um dia conheci. Preso no meu próprio tempo enquanto todos caminham em suas histórias, assisto-os dando as costas para essa parte danificada do passado à medida que eu continuo impedido de dar passos à frente.

Pensar que todas as coisas que um dia conheci poderiam ser apagadas, de alguma forma, deixava meu corpo pesado, como se pequenas bolas de aço estivessem amarradas aos meus músculos.

Com essa sensação, deslizo meu corpo para a água quente do chuveiro do quarto de hóspedes, sem realmente achar importante o calor natural do quarto e do fato de estar em pleno verão, apenas querendo que junto com a espuma de cheiro agradável, minhas tensões e pensamentos sumissem pelo ralo.

Quando o calor fica um pouco menos suportável, entendo que é a hora certa para fechar o registro e sair da sauna que o banheiro tinha se tornado. Não demoro muito para vestir minhas roupas e passar a toalha pelos fios molhados, secando-os com uma das mãos enquanto a outra futuca meus objetos dentro da bolsa, a procura do vidro com os remédios que me fazem dormir.

Dormir... Há quanto tempo eu não dormia bem?

Não lembro a última vez que dormi uma noite inteira sem o auxílio dos remédios ou uma noite atolada de trabalho nos últimos anos. Depois do que aconteceu na tarde que resultou na morte de Yoongi, a calmaria do sono tinha se tornado a minha zona particular de tortura, em que todas as cenas daquele dia se repetiam em minha mente, noite após noite, diariamente, esticando e espetando minha consciência como uma máquina de fazer chiclete.

Até que ela quebrou, e eu cedi aos remédios, procurando conforto no doce vazio anestésico.

Encontro o frasco alaranjado no fundo da bolsa, e com ele, uma camisa com pequenos pokémons que reconheço ser a que Namjoon passou dois dias inteiros choramingando por ter perdido, mas que na verdade, estava no cesto do meu apartamento depois de uma de suas muitas visitas.

一 Seu dono vai ficar muito feliz quando te ver 一 como um louco, comento para o nada e abro o frasco com pouco menos de sete comprimidos, retirando um de lá e engolindo a seco.

Recoloco o frasco no mesmo lugar, e com a toalha cobrindo o cabelo, a camisa em mãos e a roupa no lugar, desço para a sala com o intuito de contar sobre o achado ao Kim.

Entretanto, assim que chego nos primeiros degraus do topo da escada, ouço a voz de Namjoon e de Jungkook, desconfortáveis e gélidas, como se tratassem de um assunto fora do comum, mesmo que a conversa parecesse ser cotidiana.

一 E como você está? 一 Namjoon pergunta, hesitante, quase posso ver seus dedos retorcendo do alto da escada.

一 Estou bem. 一 A voz do Jeon soa no ar, abafada e distante de todas as formas.

Namjoon murmura um "que bom" e as vozes se calam. Não escuto passos ou a porta batendo, então espero alguns segundos no alto da escada antes de descer como se não tivesse pego uma parte daquela conversa minada.

一 Ei, era por isso que você estava choramingando dias atrás? 一 Estico a camisa enquanto desço os degraus, parando ao lado do mais velho e observando o embrulho em suas mãos. 一 Você esqueceu no meu apartamento quando dormiu lá 一 explico, antes mesmo dele perguntar.

一 Sabia que você pega minhas roupas para usar, agora vou precisar averiguar no seu apartamento quando uma peça sumir. 一 Usando o tom de acusação, ele bate o ombro no meu em meio a brincadeira.

一 Você que deixa elas pelo apartamento e a culpa agora é minha? 一 resmungo, colocando a camisa no ombro dele e me virando para Jungkook ainda parado na porta.

Mesmo que não fosse uma surpresa a beleza de Jungkook, era surpreendentemente assombrosa a forma como ele podia ficar bonito no decorrer dos anos. Diferente da última vez que nos vimos, agora ele ostentava o cabelo preto e curto em um corte quase militar, os braços fechados em tatuagens negras e duas vezes mais músculos do realmente lembrava.

Ele estava enorme.

一 Oi, Jungkook. Você estão tão bonito 一 comento. Antes mesmo que meu cérebro registre, o elogio que escapa pelos lábios. Dou passos a frente, envolvendo meus braços ao redor do garoto.

Porém Jungkook desvia, dando passos para trás e erguendo o queixo em minha direção. Ele tinha os olhos brilhando com algum sentimento que eu não soube identificar.

一 Ah, desculpe pelo abraço. Eu...

一 Isso é a porra de alguma brincadeira? 一 ele corta a minha fala, erguendo o canto do rosto em um claro sinal de irritação. 一 Caralho, e você ainda disse que eu estava ficando maluco. - Ele aponta para Namjoon, nervoso. Não entendo metade da reação do Jeon, mas ainda tento chegar mais perto.

一 Se bem que não sei porque ainda estou surpreso. 一 Um riso descrente e um pouco debochado deixa os lábios do mais novo, então ele esfrega as mãos nas próprias bochechas. Posso ver sua pele tomar o tom avermelhado quase que imediatamente. 一 É claro que vocês estariam juntos, ainda demoraram muito.

O Jeon dá outro passo para trás quando nota minha proximidade, e de imediato eu junto as sobrancelhas, mais confuso do que segundos atrás com o comportamento do tatuado.

Jungkook era a pessoa mais calma que eu poderia ter conhecido um dia, sempre tendo a cabeça no lugar e sendo diplomático junto a Namjoon em nosso grupo; das poucas vezes que o vi alterado, era algo que o tinha magoado profundamente ou para defender alguém que tinha seu afeto.

Então o ver dessa maneira depois de tantos anos era confuso, principalmente por não entender o motivo dessa reação.

一 O quê? Não estamos juntos, Jun. 一 Dou um sorriso para amenizar a situação, parando na frente do garoto. 一 Nunca estivemos. De onde tirou tal absurdo?

一 Não? Por favor, não estamos mais juntos, não precisa mentir ou esconder agora e ainda mais depois de tantos anos depois da morte do Yoon...

一 Jungkook, chega! 一 Namjoon intervém, botando as mãos nos meus ombros e forçando meu corpo a ir para trás, só então noto que o embrulho não está mais com ele. 一 Não é hora e nem lugar para suas paranoias!

一 Paranoias? 一 outro riso, dessa vez mais estéril que o outro. Os olhos de Jungkook brilharam no que agora posso ver mágoa.

一 Não entendo entendo aonde você quer chegar, Jungkook.

一 Então ele não te contou? Ou você não percebeu ainda? 一 Ele parece ficar mais contrariado com minha confusão, fazendo um suspiro ruidoso surgir a cada palavra, como se tudo fosse uma piada muito sem graça.

Olho de relance para meu amigo, tentando captar qualquer coisa que possa ter feito o tatuado se ressentir dessa forma, principalmente com Namjoon, com quem ele tinha um relacionamento invejável no passado, chegando até mesmo a serem namorados por anos, e mesmo depois que tudo chegou ao fim, o Kim nunca tinha mencionado qualquer desavença com o Jeon, nem o motivo do término tinha sido tema de nossas conversas nesses cinco anos.

一 Jungkook? 一 Sunha chama o moreno atrás do meu corpo, e quando viro para olhar, posso ver Jimin e Momo ao seu alcance, portando uma pequena bandeja de petiscos. 一 Ei, está tudo bem? O que está acontecendo?

Sunha faz uma careta nervosa, parecendo saber exatamente o que estava acontecendo, e com pequenos passos, aproxima-se da porta.

Jungkook dá uma risada irritada antes de continuar.

一 Nada. Nada do que vocês já não soubessem está acontecendo, não é? Anos sendo apontado como louco por ter dito o óbvio e agora veja isso, eles tão bem na sua sala de estar. 一 Ele aponta para nós, enrugando o nariz na mais pura irritação.

一 Jeon, por favor. Eles não... 一 Sunha tenta, mas é interrompida pelo garoto parado à porta quase no mesmo momento.

一 Falamos tanto sobre isso, tantas vezes e de tantas formas para sempre ter você negando qualquer coisa que eu dissesse sobre eles, para no fim você apenas acobertar eles?

Jungkook mira toda a atenção em Sunha com um olhar ferido, como se ela tivesse cometido uma traição grave à amizade deles.

Então entendo toda a situação, como se de repente pudesse ver além daquela cortina de acontecimentos que só eu não tinha conhecimento.

Namjoon gosta de mim.

Ou pelo menos é o que Jungkook acha.

一 Jun, apenas escute. Namjoon não sente nada por mim, tudo bem? Isso é coisa da sua imaginação.

Ele solta um ruído alto, como se minha fala tivesse o irritado mais ou fosse algo muito absurdo.

一 Ele não sente? Por favor, Taehyung! Namjoon abandonou tudo, literalmente tudo para te apoiar quando você fugiu para Seul! 一 Ele se aproximou de mim, agora parecendo duas vezes mais alto do que realmente é. 一 Ele abandonou tudo, mesmo estando igualmente de luto como você estava, ou melhor, como todos estávamos, mas mesmo assim você acha que é apenas uma impressão minha? Ou está muito ocupado afundado na própria merda para entender que você não foi o único que perdeu alguém naquele acidente?

Não consigo responder os questionamentos do garoto, a garganta sendo bloqueada como se uma bola tivesse se instalado ali com a menção do acidente, então apenas prendo os lábios em uma linha fina, ignorando qualquer reação do meu corpo àquelas palavras.

一 Todos perdemos o Yoongi naquele dia, e porra, ninguém lidou bem com isso, e não, as coisas não estão indo bem, e adivinha? Até hoje ninguém seguiu em frente direito 一 ele despeja no meu rosto, as mãos em punhos ao redor do corpo para conter todas as emoções que seus olhos transbordam. 一 Sabe o motivo de ninguém falar dele? Ou o motivo da memória dele ser evitada? Porque engolimos nosso luto, enfiamos essa merda na garganta para não machucar você, Taehyung!

Com os músculos rígidos, não posso fazer mais nada que engolir o bolo que se forma no começo da garganta e unir as sobrancelhas, evitando qualquer líquido que quisesse saltar para fora dos meus olhos.

Doía como o inferno!

一 E sabe o mais impressionante, Kim? É saber que mesmo depois de cinco anos, você continua nessa bolha, sofrendo por algo que você acha que só há no seu interior e ignorando os sentimentos de todos ao seu redor, daqueles que um dia foram seus amigos. 一 "Um dia", isso não passa despercebido por mim, nem por ele que parece dizer o certo para atingir minha alma. 一 O Yoongi, ele teria vergo...

Jimin é rápido para calar o amigo, agarrando seu braço de forma rude e soltando um assovio irritado para ele calar a boca.

Chega, Jeon! 一 ele diz sério, as sobrancelhas e o queixo erguido.

Eles se encaram por um minuto inteiro, Jungkook ainda é uns centímetros mais alto que o Park, mas isso não faz Jimin menos autoritário do que parece agora.

Com receio que uma briga física aconteça entre eles, Namjoon dá um passo para interferir, mas quase na mesma hora Jungkook cede, afastando-se de Jimin.

一 Feliz aniversário de qualquer forma, Sunha.

E então ele se vai, batendo a porta.

• • • 🐚 • • •

Momo e Jimin tem como missão animar todos depois da discussão com Jungkook, chamando-nos para jogarmos cartas em dupla e com apostas de uma pequena quantidade de wons, mas isso não parece fazer efeito.

Mesmo depois que sento à mesa improvisada ao lado de Sunha para jogar, não consigo abandonar as palavras ditas pelo Jeon e nem seu olhar magoado em nossa direção.

Eu realmente sou tão egoísta como nas palavras dele?

Essa dúvida começa a corroer meus pensamentos, trazendo uma onda gélida de mal-estar, fazendo meus dedos tremerem. Não consigo ficar mais tempo ali, aproveitando minha derrota pela dupla formada por Momo e Namjoon, dou uma desculpa qualquer sobre sono e descanso antes de arrastar meu corpo para trás e conduzir meus passos até o quarto de hóspedes.

O relógio marca 01:45 da manhã quando entro no quarto, sendo recepcionado pela tela brilhante do aparelho moderno disposto de maneira visível.

A primeira coisa que eu penso é em dormir, porque preciso; porque quero esquecer o desastre de hoje; porque logo meus remédios terão efeito sobre meu corpo, mas mesmo deitado na cama com a cabeça coberta pelo travesseiro fofinho, não consigo realmente descansar.

Todos os pensamentos sendo levados aos acontecimentos de hoje, desde as doces 一 e pertubadoras 一 palavras da senhora Min até às cruéis de Jungkook de meia hora atrás, essas duas que se juntam em um destino comum - Yoongi.

O relógio marca 02:00 da manhã quando sento na cama, derrotado pela falta de sono. Até penso em tomar mais um comprimido para dormir, mas descarto a ideia meio segundo depois, desejando que os remédios durem mais alguns poucos dias.

Doutor Han não cederia uma nova receita, não depois que fui contra todas suas recomendações ao aumentar a ingestão dos comprimidos e reduzir a duração do frasco de dois meses para menos de 18 dias.

一 Oh, você está acordado... 一 Namjoon diz, parado na porta, como se esperasse que eu estivesse dormindo. 一 Pensei que tivesse subido para descansar.

一 Estava apenas esperando o sono me alcançar 一 conto e ele concorda, entrando no quarto um pouco desconcertado e sentando ao meu lado, os ombros caídos e as mãos no colo, em um espelho da minha própria posição.

一 Não sei ao certo se devo te pedir desculpas, porque não é algo que eu posso controlar, mas ainda sim, peço desculpas por mim e por Jungkook.

Maneio a cabeça, concordando como uma criança ressentida.

一 Jungkook, ele- nós... 一 Namjoon respira fundo, parecendo procurar uma forma de organizar os pensamentos. 一 Ele acha que tenho sentimentos por você há algum tempo, e por isso terminamos.

Balanço a cabeça mais uma vez.

一 E você tem? 一 questiono baixinho, olhando imediatamente para o rosto bonito do meu amigo.

Um pequeno lampejo de pânico passa por seus olhos.

Não 一 ele diz depois de segundos inteiros, a voz falhando na pequena palavra.

一 Então por que nunca me contou isso? Se você tivesse contado antes, eu teria o ajudado com o Jungkook.

一 Jungkook estava muito decidido quando terminou nossa relação, Tae. Não acho que isso daria certo, e também, o que você tinha com o assunto? Nada. Não poderia te envolver em algo assim.

Suspiro.

Claro que eu tinha algo com o assunto, afinal, eles terminaram por minha culpa.

As amizades se definharam por minha culpa.

一 Entendo, tudo bem...

Namjoon fica mais alguns minutos ao meu lado em silêncio, posso ver sua resistência em iniciar outro tópico nessa conversa, mas logo ele desiste do possível diálogo, levantando da cama e bagunçando meu cabelo antes de pegar algumas coisas e ir para o banheiro.

Ele sai um pouco mais de vinte minutos depois, vestido com um pijama fresco e reclamando sobre um calor que eu não sentia. Não demoramos muito para deitar, familiarizados em dividir a mesma cama e desejar boa noite um para o outro.

À medida que Namjoon relaxa e dorme, ressoando levemente por dormir de bruços, eu mudo de posição a cada segundo, sentindo a pele doer com o contato contra o colchão e a cabeça latejar contra o travesseiro.

O relógio marca 03:22 quando desisto de dormir aquela noite. Mesmo com os movimentos um pouco mais lentos pelo cansaço, levanto da cama para não acordar o outro Kim e pego minha bolsa carteiro junto ao telefone para levar até o carro.

Conhecendo cada degrau da casa, vou até o carro estacionado do lado de fora sem grande alarde e com as chaves em mãos. Ele está estacionado ao lado do carro que considero ser de Jimin, mas ao invés de fazer o pequeno caminho até o automóvel, apenas desvio para o fim da rua, encarando a esquina que se dobra e ali posso ver um vislumbre de um Yoongi muito vermelho correndo atrás de Jungkook, Namjoon e Momo em um dia de verão qualquer, logo após eles colocarem bronzeador no pote de protetor solar.

As risadas altas, o cheiro do bronzeador barato e o aroma do mar daquela tarde invadem meus sentidos.

O mar.

Yoongi amava o mar.

De repente, estou andando naquela direção familiar. Descendo a rua e virando esquinas à noite, procurando o som característico das ondas quebrando nas pedras, e quando finalmente encontro, paro na faixa que divide o cimento da cidade com a areia da praia.

Não posso evitar fazer uma careta quando areia entra em contato com meus pés, formigando com leveza nos meus dedinhos e entrando em partes do calçado que serão um incômodo alguns minutos mais tarde, mas isso não é realmente importante quando fragmentos de pequenas memórias ressurgem à minha frente, bem ali naquela praia vazia.

Quero guardar todos aqueles momentos agora, capturá-los com a minha lente e expor no mural do meu antigo quarto.

Eu apenas queria algo que não posso mais ter, porque tudo passou, mas ainda é uma bagunça pouco harmônica em que cada um faz sua pose, seu próprio enquadramento e sua própria lente.

E eu não estou participando de nenhum quadro.

Não mais.

一 Ainda posso me contentar com uma bela paisagem, não é? 一 Dou uma risada sem humor, abrindo a bolsa carteiro e tirando de lá minha câmera. 一 Uma boa foto de um lugar bonito deve ser o suficiente para nós.

Balanço a câmera com graça, referindo-me a ela ao falar 'o nós' e olho para a extensão azul, perguntando-me o melhor jeito de captar tudo que queria.

Olho ao redor e um pouco mais distante, vejo um amontoado de rochas em um nível acima da praia. Considerando que ali daria uma visão mais ampla do cenário, arrasto meus pés preguiçosamente até lá. Não demora muito mais do que cinco minutos, mas parece uma eternidade até chegar lá em cima pela parte mais baixa.

O local parece muito visitado, já que consigo enxergar pequenos objetos descartados pelas partes tomadas pelo verde, assim como alguns desenhos escondidos em uma pedra maior, parecendo terem sido feitos de forma improvisada e corrida, então, considero-me sortudo por subir ali sem esbarrar em alguém às três da manhã.

Próximo a borda da pedra, observo o mar bater violentamente lá embaixo e isso causa uma onda gélida em meus ossos, mas que logo trato de afastar, balançando a cabeça e enfiando as chaves do carro - junto com o telefone - na bolsa carteiro ainda presa ao meu corpo.

Meus dedos esbarram em algo tão gelado quanto a sensação de segundos atrás. Curioso, busco o objeto para fora e reconheço ser a moeda dada pela senhora Lee, apenas alguns dias atrás.

Mesmo considerando um presente para lá de peculiar - até mesmo porque passei anos sem ver a senhora -, acabei aceitando em um acenar de cabeça e um breve comentário sobre o objeto vindo da senhora Lee.

"A moeda de kairós não é um pedaço de cobre, Taehyung! Ela te deixa mais perto daquilo que sente falta, daquilo que seu coração mais ânsia em estar junto"

Não demoro muito com a moeda na mão, colocando-a no bolso do short para só então voltar a apontar a câmera para a paisagem cada vez mais convidativa de ser capturada.

Tiro mais fotos do que posso registrar no curto tempo que estou ali, mas logo sinto a sensação que outras partes também devem ter o direito das lentes antes que o sol nasça e as pessoas cheguem, então, virando de forma lenta pelas partes da praia, retorno meu trabalho de registrar aquele momento.

Em uma parte mais perto dos barcos de pesca, posso ver duas figuras grandes movendo algo das redes para o barco. Eles parecem animados apesar do horário, mas julgo que este seja o melhor horário para velejar e pegar alguns peixes antes que todos os outros cheguem.

Miro a câmera para eles, tendo ciência que precisaria censurar seus rostos caso fosse expor em algum lugar além das poltronas do apartamento, mas não resisto a cena que se desenrola à minha frente.

Com um pouco de zoom, posso ver os rostos dos homens 一 um deles estrageiro, o que achei incomum 一 e suas roupas nitidamente. Entretanto, algo em suas mãos chamam minha atenção mais do que os traços dos indivíduos. Em suas mãos, um corpo vantajoso e verde emaranhado às redes de pesca.

Uma tartaruga.

Isso me deixa alerta, focando a lente da câmera nas mãos dos homens para ver se era isso. E estava lá, claro como o dia 一 uma grande tartaruga marinha presa às redes, assim como outras tartarugas da mesma espécie, todas sendo colocadas no barco de qualquer jeito por seus caçadores.

Não posso deixar de amaldiçoar as gerações daqueles homens, tampouco de tirar fotos dos seus rostos e das pequenas tartarugas colocadas no barco, tendo em mente que precisaria de provas para qualquer denúncia feita ao raiar do dia.

Chego mais perto, querendo pegar uma posição melhor para tirar uma foto ao todo 一 dos rostos e das tartarugas nas mãos deles 一, e por um momento de descuido, o mundo gira aos meus olhos.

Acontece tudo lentamente, de repente não sinto mais o solo embaixo dos meus pés e no momento seguinte estou caindo, completamente desesperado, tendo um grito preso na garganta; mas assim que a queda acontece, os acontecimentos se aceleram. Solto um grunhido mudo quando meu corpo atinge a água, mas não há tempo do que reclamar porque a onda no momento seguinte atinge minhas costas, fazendo com que meu corpo voltasse para baixo.

Uma queimação branda começa no lado esquerdo do pulmão, sinalizando que preciso buscar ar, mas é difícil chegar à superfície, o desespero puxando mais que a correnteza do mar, e quando chego lá, há apenas um segundo para respirar até outra onda surgir.

Mexo os braços e pernas, tentando sair daquele emaranhado de ondas, sentido a pouca água que entrou em meu corpo incomodar dolosamente as vias nasais até que uma dor se alastra por toda minha cabeça, latejando violentamente.

Até que minhas pernas e braços, já muito cansados, param, e o pouca ar restante escapa deliberadamente por meus lábios.

Dói.

Queima.

O pânico atinge minha consciência, fazendo durar mais do que necessário. Parece uma eternidade até os olhos cederem e o corpo afundar, sendo guiado pela correnteza.

Até que não há mais dor.

E no último segundo de consciência, vejo algo reluzente se afastar para o fundo, sendo sugado por toda a força do mar; o objeto vai até o fim das águas junto comigo.

🐚

Oi, como estão? Ainda dá pra desejar feliz ano novo? Haha, espero que o final de ano tenha ocorrido bem para todos.

O que acharam do capítulo de hoje? E do nosso Jungkook? Acham que ele tem um pouco de razão ou é tudo paranóia da cabeça dele?

Esse é o último capítulo com Taehyung no presente, o próximo já será com ele no passado dando início oficialmente a nossa querida Até o fim das águas ✨

Lembrando que AFDA agora tem uma hashtag no twitter que é #ConchasRosas, usem sem moderação.

AFDA agora será atualizado duas vez ao mês aos domingos (domingo sim e domingo não) então sem mais sumiços.

Bebam água, se vacinem e não esqueçam do votinho, galera. Até o próximo domingo 💜

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