Capítulo V - Supremacia

Art by Chey Bunnie

4148 palavras

Império de Indifell

Em um império próspero, onde seu próprio deus era o governante, a vida ali era pacífica, protegida de todos os males pelo deus da justiça. Suas criações o serviam com grande devoção e respeito, e o império, que antes não passava de pequenas terras, ganhou grandes proporções territoriais, e prometia ser o mais imbatível contra qualquer outro.

No entanto, os deuses foram dotados de sentimentos, e ganância tomou conta do deus Indifell, que não se contentou em apenas nas adorações de seu povo, queria ir além, desejava que os quatro cantos do mundo se curvassem aos seus pés.

Indifell traçou planos, reuniu aliados e se fortaleceu. Quanto mais poder obtinha, mais cego se tornava, ao ponto de escravizar os demônios, sua própria criação.

Os indifilenos eram levados às guerras constantemente, lutando arduamente pela conquista de novas terras. A ganância de Indifell chegou tão longe que até mesmo garotos e garotas, assim que atingiam a puberdade eram mandados para guerra, afinal, a conquista era mais importante que preservar seu próprio povo.

O outrora império próspero de Indifell começou a desmoronar. Muitos dos soldados morreram em meio às guerras intermináveis, os demônios estavam prestes a serem extintos por capricho de um deus. Foi então que dois de seus melhores soldados, Genovah e Denoque, decidiram agir contra o seu próprio deus, em troca da liberdade.

A guerra foi árdua e dolorosa. Por anos Genovah e Denoque lideraram a batalha contra o deus, mesmo com opositores de seus ideais e com aliados poderosos de Indifell. Mas em um determinado momento ela chegou ao seu fim com a derrota de Indifell. Estavam libertos, exceto pela maldição proferida pelo deus da justiça.

"Vocês acreditam que podem existir sem um deus para protegê-los e governá-los? Sem mim, vocês não são nada. A terra que vocês tanto prezam será consumida por chamas eternas, e o solo que antes os alimentava se tornará estéril e morto. Homens e mulheres perderão a capacidade de gerar vida, e suas crianças se transformarão em sombras do que poderiam ser. O gado apodrecerá em seus campos, suas carnes se tornaram veneno. As águas, que uma vez foram puras e doces, se transformarão em amargura corrosiva, como o desejo de vingança que arde em meu peito. Vocês irão clamar pela morte, desejarão o alívio do fim, mas ela se tornará sua pior inimiga, recusando-se a libertá-los do tormento eterno que eu lhes imponho."

Essas foram as últimas palavras de Indifell antes de desaparecer, deixando o império à mercê da maldição.

Com o passar dos anos, o império de Indifell foi, contra toda a expectativa, tornando-se uma terra fértil e próspera. Mas nem tudo eram flores, Genovah e Denoque, que foram nomeados como semideuses pelos próprios indifilenos, chegaram a velhice e a morte logo batia a porta. Eles precisavam nomear um sucessor, então passaram a dedicar o restante de suas vidas em busca de um governador digno, pois temiam entregar o império na mão de um tirano e repetir mais uma vez a cruel história de seu passado.

Após a cuidadosa procura entre soldados, guerreiros e sacerdotes, finalmente fizeram uma escolha. O marechal de Indifell, Zomungard, foi escolhido como o próximo imperador. Um homem honrado, disposto a sacrificar sua própria vida pela paz de seu povo, Zomungard agora carregava o peso de um império que, embora próspero, ainda vivia à sombra da terrível maldição de Indifell.

Zomungard se tratava apenas de uma criança órfã, resgatado por uma família de origem humilde, que tomou a responsabilidade de cuidar do garotinho como se pertencesse à família. Zomungard cresceu se tornando grato àquelas pessoas, e prometeu honrar o nome a qual passou a pertencer.

O desejo da pequena criança em se tornar um militar não cessava por um minuto sequer, aquele talvez era seu chamado, decidido, Zomungard dedicou toda sua vida em busca de se tornar um guerreiro prestigiado, porém, não se acomodava no cargo que lhe era dado, ele sempre ia em busca de mais e, de um simples garoto órfão, Zomungard conquistou a patente mais alta do exército se tornando o marechal, e consequentemente foi reconhecido por Genovah e Denoque como a melhor escolha para ser tornar o próximo imperador.

Como cultura em Indifell, homens poderosos poderiam ter vários casamentos, desde que tivessem condições de dar uma vida digna a suas esposas. E como imperador, Zomungard teve ao todo dezessete esposas ao longo de sua vida, e como descendência, teve cerca de quarenta e nove filhos.

Cada um de seus filhos possuíam poderes únicos, com a mescla materna e paterna, se destacando cada qual com suas particularidades.

Porém, sabendo que logo precisaria de um mais novo imperador, Zomungard analisou cada um de seus filhos, decidindo qual deles seria o melhor para assumir o trono. Diferente de outros impérios, em Indifell, o atual imperador não precisava falecer para outro suceder seu trono, apenas partindo de sua vontade, a coroa poderia ser passada independente de ser da linhagem ou não.

E entre esses filhos, os que mais se destacaram foram Ravish, seu primogênito, e Sigrid, os dois nascidos e criados na cidade de Fynera.

Em Fynera, eles tinham o costume de prestigiar seus guerreiros. Esse evento normalmente acontecia próximo ao palácio de Indifell, aberto a todo público.

O evento era um dos mais aguardados do ano, pois os guerreiros faziam uma breve apresentação de seus treinamentos para o público, que se alvoroçaram diante da demonstração da força do exército de Indifell. Era algo que trazia segurança ao povo, ao ver a força inabalável de seus soldados.

Atualmente, Sigrid ocupava o cargo como coronel do exército de Indifell. Seus poderes consistiam em dominar a mente de qualquer indivíduo, podendo controlar o corpo a seu favor, como uma espécie de possessão.

Os soldados estavam com correntes envolvendo o corpo da besta-fera, que balançava de um lado para o outro na tentativa de se soltar. Mairín, um dragão com nada menos do que dezessete metros de comprimento, de pele escamosa e avermelhada, estava mais furioso do que nunca, causando alvoroço da plateia, que temiam que o animal soltasse fogo a qualquer momento, mas aquilo não era nada para Sigrid.

Ao se aproximar do dragão, que por milímetros de distância não agarrou Sigrid, ele o tocou, e aos poucos a mente do animal foi dominada aos comando de Sigrid. A plateia vibrava ao ver os olhos da criatura se tornando um vermelho sangue, demonstrando estar no total controle do coronel.

Os soldados soltaram as correntes quando se sentiram seguros ao saber que o animal não faria mal algum enquanto Sigrid estivesse o domando.

Mairín se moveu conforme as palavras de Sigrid, obedecendo fielmente a cada comando de seu "mestre", que montou na criatura, dando adeus para o público.

Sigrid nada mais era conhecido como "O domador de feras".

Um pouco próximo da arena onde acontecem as apresentações, estava a família real e como companhia outros nomes importantes, o espaço é exclusivo para eles, onde são servidos com comes e bebes à vontade e desfrutam da sombra daquele dia ensolarado, longe da multidão e cercados por guardas.

— É mesmo necessário eu estar presente nesse evento? — Mastert Lili cruzou os braços na altura do peito, ficando ainda mais emburrada como de costume.

— Você ao menos deveria colocar um sorriso em seu rosto e fingir estar gostando — Sulam, a imperatriz, disse entre dentes enquanto sorria, ela levantou a mão acenando graciosamente para o público que ora ou outra a observava. — Não queira parecer ingrata.

— Ninguém merece perder tempo observando um monte de machos exibidos — Mastert brincou com as pontas de seus longos cabelos esbranquiçados.

— Mantenha a calma, o evento já vai acabar.

— Argh! — A garota deixou seu corpo escorregar pela cadeira, entediada.

Mastert Lili simplesmente detestava aquele evento, mas nem sempre foi assim, antes mesmo de se tornar uma altaneira, ela também era um soldado assim como seus irmãos, mas perdeu o gosto quando foi proibida de fazer parte do exército. Aquilo a chateou profundamente, e aquele evento era apenas mais um motivo para ela se entristecer ainda mais.

— Logo mais o seu humor irá mudar quando a grande atração aparecer. — Mastert Lili quase sentiu seu coração parando em sua garganta. Não imaginaria que veria Ravish sentado ao seu lado, e sim entre os soldados na coxia.

— O que você está fazendo aqui? Deveria estar lá embaixo com os outros. — Mastert puxou o seu vestido ao ver que Ravish estava pisando em sua vestimenta.

— Queria ter a visão de camarote das apresentações, por trás das cortinas não dá pra ver nada!

— E como vai chegar lá a tempo?

— Parece que não me conhece. — Ravish apontou com a cabeça em direção onde havia um clone seu, que acenou para ela no mesmo momento.

Mastert Lili torceu o lábio, não queria admitir, mas Ravish estava ficando cada vez melhor em criar cópias de si mesmo, inclusive não sabia se quem estava ao seu lado era o original ou não.

— Ninguém irá notar a minha falta. — Ravish esticou suas pernas, as colocando na cadeira a sua frente e apoiou as mãos atrás de sua cabeça.

— Filho, tenha modos! — Sulam inclinou seu corpo para frente para Ravish a ver melhor. — Não está vendo que está em meio a pessoas importantes? É dessa maneira que pretende se tornar imperador?

Rapidamente Ravish retomou a postura, enquanto Mastert Lili tampou sua boca para conter a risada com a bronca que seu irmão levou.

As apresentações se perduraram por mais um tempo, dessa vez com apenas soldados simulando uma batalha entre eles, demonstrando todos os atributos que utilizavam, desde seus poderes até o combate corporal e armas brancas, algo que era fortemente reforçado, já que não poderia depender unicamente de seus poderes, mas também de sua força física.

— Por que decidiu se apresentar por último dessa vez? Coronéis, tenentes e capitães são sempre os primeiros — a mais nova perguntou.

— Mudanças são sempre bem-vindas! — Ravish abriu um sorriso, tentando transparecer confiança, entretanto, ele ainda estava se sentindo exausto após sua missão de ir atrás do orbe e ter voltado com as mãos vazias para casa, nesse momento ele precisava do máximo de energia para fazer uma demonstração decente. — Se me der licença, preciso me preparar, serei o próximo. — O rapaz levantou-se, ajeitando a farda para estar bem apresentável.

Já na arena, Ravish caminhava para o centro, observando o público que o encarava em expectativa. No ano anterior, o rapaz havia se frustrado, a reação das pessoas se limitaram a "qualquer um pode fazer isso", "isso não tem nada de impressionante", e saber o que passava exatamente pela cabeça das pessoas o apavorava.

Ravish levantou a cabeça, fechou os olhos e se concentrou unicamente em fazer cópias de si mesmo, todas derivadas das trevas. Esses clones possuíam apenas uma forma sem gênero, semelhante a uma sombra, mas ao tocá-las, era capaz de sentir a densidade, o que também era algo controlado por Ravish.

De uma, acaba multiplicando em duas, depois em dezenas, até ele chegar ao limite máximo de setenta cópias umbracinéticas, a parte mais fácil havia passado, o complicado seria controlar cada uma delas para executar tarefas diferentes.

Mas Ravish havia treinado o suficiente para aquilo, cada uma delas, sem exceção, obedeceu aos seus comandos, e elas lutavam entre si, com movimentos perfeitamente sincronizados e golpes precisos. Ravish sentia por entre seus poros a vibração do público, que apenas se decepcionaram por ter acabado.

E assim se encerrou mais uma das edições do evento.

Ravish voltou cansado, porém orgulhoso de si mesmo por ter se dedicado e ter tido o resultado esperado.

— Acredito que não irá precisar de soldados ao seu lado na próxima batalha, já tem o próprio exército! — o tenente-coronel disse orgulhoso.

— Qual deveria ser seu codinome? O exército de um homem só? — um dos soldados pertencentes ao esquadrão de Ravish elogiou seu superior.

— Não exalte o Ravish dessa maneira, caso contrário, o ego dele vai lá em cima e para abaixar depois será um problema. — Sigrid surgiu entre os rapazes acompanhado de dois chacais.

Um deles era um chacal-de-dorso-preto e o outro dourado, eram fiéis escudeiros de Sigrid, e o acompanhava para onde ele fosse, Ravish não entendia essa tamanha fidelidade desses animais com o seu irmão.

— Não pode ficar feliz pelo seu irmão só um pouquinho? — Ravish questionou.

— É claro que sim! — Sigrid abriu os braço dando um forte abraço no rapaz. — Você nos surpreendeu!

— Sabe o que incrementaria toda essa festança? Se embebedar até esquecer o próprio nome! — Os soldados ali presentes gritaram em concordância com as palavras de Ravish. — E tudo por conta de Sigrid.

Os homens vibraram ainda mais, contentes em finalmente poder fazer algo de seu agrado, saindo um pouco da rotina cheia de regras que tinham.

— Às vezes você extrapola. ⎯ Sigrid maneou a cabeça, descontente. — Esquece que aqui eu deixo de ser seu irmão mais novo para ser seu comandante.

— Pense pelo lado bom, amanhã os rapazes voltam mais relaxados e com foco total ao trabalho. — Ravish olhou em expectativa, aguardando uma resposta positiva.

— Tudo bem — Sigrid cedeu e os guerreiros comemoraram com alegria. — Mas você vai se virar pra dar conta da bagunça depois — Sigrid sussurrou no ouvido do rapaz, que fez pouco caso da situação.

Os guerreiros se dirigiram até uma taverna muito bem frequentada naquela região, lugar que também contava com um prostíbulo, cheio de belas mulheres para agradar todos os gostos e realizar as maiores fantasias.

Não era novidade os soldados estarem presentes no local, já eram clientes fiéis e alguns até conhecidos, exceto pelo tenente e o capitão, que evitavam frequentar locais como aqueles a fim de se proteger de escândalos, porém abriram uma exceção naquele dia.

A taverna era muito bem preservada, as paredes de tijolos dividiam espaço entre o belo jardim e um riacho, que recebia uma brisa fresca. O local era iluminado por lamparinas, dando uma sensação de aconchego, mesas e cadeiras de madeira preenchiam o ambiente juntamente a decoração rústica. E num local como aquele, não poderia faltar boa música e bebidas de qualidade.

Ravish escolheu uma mesa separada dos demais a pedido de Sigrid, não sabia que seu irmão queria se afastar de todos, sendo que aquela noite era exclusiva para reunir seu esquadrão.

— Está preocupado com algo? — Ravish questionou assim que se sentou na cadeira estofada.

— Estou, com o imperador. — Sigrid passou a mão pelos cabelos, desfazendo o penteado e deixando as longas mechas caídas em seus ombros.

— É sobre o orbe que não conseguimos trazer? Isso foi há uma semana atrás, o imperador mal tocou no assunto quando retornamos.

— Mais cedo ou mais tarde vamos ser cobrados.

Ravish achava exagero, Sigrid estava se preocupando demais.

— Não deve ser algo importante, se fosse ele teria nos falado.

— Acha que é coincidência ele ter escolhido justamente um capitão e um tenente? Sendo eles membros da família real, seus próprios filhos?!

— Ele deve estar escondendo algo — Ravish finalmente se deu conta.

— Sim... Por isso disse que era algo confidencial.

A conversa entre os dois foi interrompida quando uma garçonete entregou duas canecas de cerveja para os rapazes.

— Com licença. A primeira rodada é por conta da casa. — A moça deu um singelo sorriso, focando seu olhar principalmente em Sigrid.

— Como eu adoro esse tipo de mordomia. — Ravish deu um longo gole na cerveja, se deliciando com a bebida. Sigrid arregalou os olhos tremendo que o líquido estivesse envenenado, era estranho oferecerem bebida sem nem mais nem menos. — Não tem veneno algum, foi o próprio dono da taverna que ofereceu, não é mesmo? — Ravish confirmou com a garçonete, que se surpreendeu tentando entender como ele sabia daquilo, educadamente ela se afastou dos dois.

Ainda desconfiado, Sigrid cheirou a caneca algumas vezes para se certificar de que estava tudo bem.

— Voltando ao assunto. — Sigrid deu uma relaxada após sentir a bebida gelada passar por sua garganta. — Se o imperador designou essa tarefa para nós dois, é sobre algo muito grande que estamos tratando.

— Ele deveria ter sido claro, assim levaríamos a missão mais à sério.

Sigrid sorriu sem humor, não estava acreditando nas palavras que Ravish acabara de dizer.

— Então quer dizer que você estava apenas brincando?

— Não! Mas acha mesmo que deixaria ser atingido por aqueles malditos raios?

— Isso não vem ao caso.

— E se você tivesse possuído aquela garota desde o ínicio, estaríamos meio caminho andado. — O demônio apontou para seu irmão, em busca de retirar a responsabilidade de suas costas.

— Já te expliquei, eu não consegui! Parecia ter algo... ou alguém me impedindo de invadir sua mente. Da mesma forma em que tiraram os vampiros de meu controle os jogando no lago.

— Acha que foi o orbe? — Os olhos azuis de Ravish encontram os olhos vermelhos de Sigrid, temendo sua resposta.

— Precisamos tirar essa história a limpo com Zomungard.

Tamar, província de Tahagul

A vida após a morte era algo incerto, se realmente existia um paraíso, se a reencarnação era uma possibilidade ou se a alma se tornava inexistente, não havia ninguém para provar, e Ilana também não seria capaz de saber.

Na noite da última esperança, a qual se tornou um pesadelo, Ilana jurava que após aquela árvore cair sobre ela, moendo cada osso de seu corpo, lhe trazendo uma dor lancinante, sua vida havia chegado ao fim, achava que estava entregando sua alma de uma vez para sua criadora, entretanto, a morte sussurrou contra seu rosto lhe dizendo "Não chegou a sua hora".

Talvez fosse delírio, não sabia, pois ao longo da semana, mesmo estando desacordada, ouvia alguns burburinhos distantes. E, após finalmente ter aberto os olhos, só era capaz de ver um breu e o silêncio se tornava torturante.

Mas ela ainda tentava se situar do lugar onde estava, tocou um de seus braços que estava por inteiro, em seguida o outro, depois o seu rosto e ao tentar tocar seus pés, sentiu uma dor aguda, como uma ferroada por todo o seu corpo, e ali teve certeza que estava viva, mortos não poderiam sentir dor, ou poderiam?

Ilana percebeu um pequeno facho de luz que se expandia aos poucos e, junto dela, um ranger tomou conta do ambiente acompanhado de algumas passadas. Ela voltou para a posição que estava, fechando os olhos, mesmo curiosa em saber quem era o dono dos passos.

Aparentemente, quem estava ali não pretendia ir embora tão cedo, pois o ambiente se iluminava cada vez mais, e alguns sons metálicos preenchiam o lugar.

Sua curiosidade lhe venceu, a tentativa de fingir estar desacordada foi falha, de canto de olho, Ilana tentou descobrir quem estava fazendo aquela barulheira toda.

Um rapaz andava de um lado para o outro, era alto e magro, porém seus braços nus demonstrava um pouco de definição, seus cabelos escuros estavam meio bagunçados, e a pele alva faziam as tatuagens em seu corpo ficarem ainda mais destacadas.

Ele remexia em algumas panelas, despejando um líquido duvidoso em uma tigela, estava focado no que estava fazendo, ou era o que Ilana pensava.

— Achei que você não iria despertar mais.

Ilana se assustou, mas precisou fingir que não, voltou rapidamente a fechar os olhos e se fingir de morta.

— Não adianta fingir que não escutou — insistiu o rapaz. — Eu percebi que estava me olhando.

Se sentindo contrariada, Ilana abriu seus olhos mais uma vez, encarando diretamente o par de olhos esmeraldas, que lhe causam um desconforto.

— Sinto muito! Deve estar confusa... — o rapaz continuou a conversar, mesmo sem respostas. — Meu nome é Andras, muito prazer!

Apesar de ter uma feição séria, um olhar assustador e uma voz grave e imponente, o sorriso de Andras se tornava acalentador, talvez só parecesse uma pessoa ruim, mas não era. Ilana não se deixaria ser enganada.

— Fique à vontade se quiser perguntar sobre qualquer coisa. — Andras se aproximou da cama onde Ilana se encontrava e esticou a tigela na direção da garota, que tentou recuar, mas suas pernas a impediram. — Isso vai te fazer bem, é pra diminuir a dor da suas pernas, você acabou perdendo o movimento delas quando aquela árvore caiu sobre você.

Ilana soltou um grunhido, estava desesperada, como iria embora dali sem poder andar?

— Calma, é temporário! — Andras balançou uma de suas mãos, tentando acalmar a garota. — Téça fará o possível para você voltar a andar em breve. Só tomar um pouco desse remédio enquanto ela não chega.

Ilana olhou para a tigela em seguida para Andras. Será que aquele líquido roxo e pegajoso era o que estava a mantendo desacordada?, pensou, não poderia confiar, mesmo com dor, ela recusou.

— Você consegue falar? Ou será que a pancada foi tão forte que levou esse sentido... — Andras tentou tocar no rosto de Ilana e foi recebido com um tapa. Logo, ele parou de insistir na conversa.

— Em que lugar estou? — Finalmente Ilana decidiu falar, mas o que ela queria mesmo eram respostas.

— Está em Tamar. — Ilana franziu o cenho, tentando buscar nas suas memórias que lugar era aquele. — Fica em Tahagul, é o lugar onde tem a maior concentração de feiticeiros. Bem, talvez você não saiba já que veio de Montuália, e tendo em vista a cidade que estava, o conhecimento é escasso naquele lugar, então não te julgo por não saber, não que eu estivesse te julgando antes...

— Você não cansa de falar? — Ilana interrompeu a fala do rapaz que sorriu sem graça.

— Desculpe, é difícil me controlar, são muitos pensamentos que passam pela minha cabeça em segundos.

A garota lobo continuou encarando Andras, ele não parecia ameaçador, mas não havia conquistado sua confiança, eventualmente não confiaria, feiticeiros nunca eram confiáveis.

Andras esticou mais uma vez a tigela para Ilana, na tentativa de convencê-la a tomar.

— O que tem nisso?

— É um mix de ervas, entre elas, erva- baleeira, mulungu e sálvia. Ela ficou dessa cor por conta das dálias negras, é para amenizar o gosto amargo.

Ilana não se sentia segura para tomar aquele líquido, seja qual milagre fizesse, e recusou novamente.

Andras percebeu que não seria fácil ganhar algum tipo de intimidade com Ilana, já que a garota demonstrava resistência para se abrir, entretanto não iria forçar nada, poderia ser apenas questão de tempo para poder se aproximar, ou talvez Téça conseguiria com mais facilidade por ser mulher. O que lhe restava era ficar em seu mundinho, voltando à tarefa que fazia antes dela acordar.

Ilana virou para o lado oposto, mordendo seus lábios para não gemer de dor, não queria dar o braço a torcer e implorar para que Andras lhe entregasse o remédio, mas queria poder arrancar suas pernas a fim de se livrar da dor.

Seus olhos derramaram um pouco de lágrimas e ela enxugou rapidamente, não queria demonstrar fraqueza. Ilana tocou em seu peito sentindo um objeto incomodá-la, ao pegá-lo na mão, ela notou que a aliança que Filippo havia lhe dado estava presa a uma corrente em seu pescoço, como aquilo havia parado ali? Era um mistério, já que no momento que ela se transformou em um lobisomem a aliança havia ficado para trás junto às suas roupas.

Filippo, que fim havia levado? Teria mesmo falecido?

As memórias daquele dia fatídico voltam à tona, quem foi o responsável por ter matado seu amado de maneira tão cruel?

Ilana voltou a encarar Andras, teria sido ele? O rapaz teria causado toda aquela confusão, disparado aqueles raios e colocado criaturas demoníacas e vampiros atrás deles? E agora estava pagando de bom moço em troca de quê?

A garota sentiu seu peito apertar, e o gosto de bile subiu sua garganta. Seu pai, seu irmão, estavam sem notícias suas, talvez pensassem que Ilana estava morta, e como eles estariam? Será que partiram para o destino ou estariam juntos com os outros passando frio e fome?

A dor de suas pernas se tornou suportável comparado às dores que envolviam seu peito, ela já não conseguia respirar, e a Ilana forte e racional havia desaparecido, dando o lugar para uma Ilana desesperada e frágil.

Ela começou a gritar na tentativa de aliviar suas dores, o que deixou Andras preocupado, ele deixou tudo de lado, indo dar suporte a Ilana.

— SAIA DAQUI! — Ilana deu um berro, se tivesse qualquer objeto próximo a cama dela, teria atirado em Andras sem pudor.

— Se acalma, ninguém aqui vai te machucar. — Ele tentou mais uma vez se aproximar dela, mas de nada adianta, pois ela não parava de gritar.

Angustiado e sem saber o que fazer vendo a jovem ter um ataque de histeria, Andras criou um estrondo de um trovão alto o suficiente para cessar os gritos de Ilana.

Ilana voltou a respirar e o silêncio tomou conta novamente.

Andras decidiu sair do recinto, talvez sua presença tivesse sido o motivo de ter a feito surtar, esperaria Téça chegar em casa e resolver o que faria com a garota, ele já havia feito sua parte.

Ainda sem entender nada, Ilana se abraçou na tentativa de se auto confortar, nunca esteve tão sozinha em sua vida como estava naquele momento.

Revisado por @Arabella_McGrath Projeton 

Olá queridos leitores, como estão?

Como puderam ver esse capítulo apresentou bastantes personagens, mas garanto a vocês que são personagens bem importantes para a movimentação da trama, espero não ter confundido vocês com tantos nomes.

Acabei fazendo uma pequena mudança no capítulo de "Informações - Quanto aos impérios". Em resumo, alterei o motivo em que os anos passaram a ser contabilizados, achei mais coerente os acontecimentos terem sido datados após a rebelião dos deuses, pois esse evento causou muitas mudanças no rumo do universo.

Por enquanto é isso, até logo!

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