Nove - Madison
Helena desbloqueou sua magia.
Escolhi me sentir feliz por isso, de um jeito ou de outro. Mas não consegui parar de pensar que talvez outra coisa teria acontecido se aceitasse conversar com Helena, quando ela chegou no meu ouvido e disse que precisava de ajuda. Não consegui parar de pensar que neguei ajuda para Helena...
O que ela estava pensando tanto, com o que tanto precisava de ajuda. O que tanto passou pela cabeça de Helena para não perceber que estava congelando tudo ao seu redor?!
Todas essas perguntas me corroíam por dentro, sempre acompanhadas com: você não ajudou, você não fez nada, deixou ela sem apoio... E acompanhadas de uma culpa avassaladora.
Procurei Helena pela casa quando Kortry a levou, mas não encontrei. Bem que Lucas me avisou que, enquanto Kortry e Felin faziam a primeira triagem da magia dela, eu não teria a menor chance de chegar perto. Mas mesmo assim, me senti horrível por não falar com ela. A pior amiga que poderia ser...
Contrariando todo o meu mau humor, o dia seguinte estava ensolarado e bonito, o céu limpo, o vento fresco e muita luz. Era um dia típico da Cidade de Touque, sempre bonita e brilhante. Mas hoje, aquele brilho me incomodava profundamente.
Era um dia comum de treinos, como sempre. Tínhamos voltado à rotina com tudo, agora que a próxima missão parecia iminente, todos os dias com exceção de fins de semana, três treinos ao dia, as oito da manhã, uma da tarde, e nove da noite, com as tardes tecnicamente livres. Tecnicamente, porque quatro de nós ainda estávamos em idade escolar, e tinham aulas durante a tarde, mais para justificar o intercambio do que para realmente fazer Helena, Kille, Rosh e Genezis aprenderem alguma coisa (apesar de Kille reclamar que os professores particulares que davam aula para eles, eram exigentes até demais). Não entendia como funcionava os professores, se sabiam do nosso segredo ou não, mas sabia que eles deixavam as tardes bem mais silenciosas naquela casa.
Pensei em pegar Helena pra conversar assim que acabasse a aula, então, decidida, encostei na parede do corredor onde ficava a sala de aula deles, esperando pacientemente. Olhei o celular, vendo que já estava quase na hora deles saírem. Os quatro estavam todos no mesmo ano, o que era um tanto estranho, já que Genezis tinha quase 17, Rosh e Kille 16 e Helena 15.
A porta da sala se abriu devagar, e barulho de conversas explodiu no corredor. Alguém gritou dentro da sala para que Kille não esquecesse o livro da próxima vez, e os quatro saíram, um atrás do outro. Genezis e Kille riam alto, e me cumprimentaram quando passaram. Rosh também, mas só com um aceno de cabeça, enquanto tirava um pacote de bolacha da mochila. Helena veio uns dois segundos depois, e vi seus cabelos armados e completamente cacheados enquanto ela ainda dava tchau para o professor, sorrindo. Se virou para continuar andando, e só uma pessoa que a conhecesse bem saberia que quando parou, o sorriso minguando um pouquinho por meio segundo, mesmo que ela tentasse disfarçar voltando a caminhar mais devagar e abrindo um sorriso maior, estava desconcertada e até um pouco envergonhada com a minha presença.
— Oi Madi!— Sorriu pra mim, parando bem na minha frente. A saia de cintura alta branca, na altura dos joelhos que usava farfalhou baixinho.
— Oi Lena.— Sorri de volta. Respirei fundo por um segundo, decidindo ser direta com ela.— Sobre ontem, eu não consegui falar com você depois daquilo. Me senti mal por você Lena. O que queria falar comigo naquela hora?
O sorriso dela entortou pra esquerda, formando uma careta bem estranha que ela também tentou disfarçar. As sobrancelhas arquearam, e as sardinhas no rosto entortaram quando Helena abriu um sorriso.
— Não era nada muito importante. Eu estava emburrada com...— Ela parece parar para pensar, engolindo em seco. Passou a mão na saia nervosa.— Com coisas que aconteceram na rua, tipo, um cara quase derrubar chocolate quente em mim, sendo que o tempo não está frio para um chocolate quente!
— Tem certeza que era só isso Lena?— Ela concordou com a cabeça.— Não parece uma coisa que você se importaria. Você toma chocolate quente até se estiver saindo ondas de calor do asfalto Helena!
— Bom, isso é verdade.— Ela riu, mostrando todos os dentes. Voltando a caminhar, fui junto com ela até o andar de cima, e ficamos em silêncio até chegar na cozinha, onde Helena virou para mim, o sorriso mais luminoso do mundo no rosto e continuou falando.— Mas chocolate quente é muito bom mesmo, não posso julgar pessoas por beberem! Quer um? Vou fazer um agora, faço pra você também!
Foi minha vez de sorrir. Encostei no banquinho da ilha da cozinha, dando impulso pra sentar, e apoiei nos braços, encarando Lena.
— Você acha que eu perderia você fazendo chocolate quente pra mim?— Arqueei a sobrancelha.— Jamais.
Meus calcanhares escorregaram no corredor limpo e encerado demais do primeiro andar do porão. Estava indo para o treino da noite na Sala de Aço, surpreendentemente não atrasada, acompanhada de Lucas, que foi a grande razão deu não cair de cara no chão.
— Eita, calma Madi.— Ele segurou meus braços, abrindo um sorriso enorme, que mostrava todos os dentes branquinhos e desnivelados, que eram um charme de Lucas.— O chão bem que está precisando de um beijo, mas você não precisa cair em cima assim...
Não pensei duas vezes antes de dar um tapa tão forte nas costas de Lucas, que ele envergou para trás dando um gemido de dor. Lucas escorregou igual eu escorreguei trinta segundos antes, e foi a minha vez de segurar ele.
— Universo dá o troco em quem merece!— Disse, gargalhando alto.— Ou será que é você quem quer um beijinho do chão?
— Poxa, nem entramos no treino e eu já estou levando porrada... Alguém já te disse o quanto sua mão é pesada?
Lucas se levantou encabulado e voltamos a caminhar, com um bico enorme e brincalhão no rosto. Abri a porta da sala de aço, dois minutos para as oito horas, e Hugo levantou a sobrancelha, desviando o olhar dos outros cinco Escolhidos que estavam ali, os braços cruzados no peito.
— Madison chegando no horário é novidade.— O deus comentou, olhando de cima a baixo eu e Lucas, vestidos com o macacão de treino.— Vamos poder começar no horário pelo menos uma vez no ano...
— Ok, ok, podemos parar de esculachar a Madison já?— Pedi, me posicionando junto com Lucas na fileira de pessoas.— Qual o treino de hoje Hugo?
— Eu venho percebendo já faz um tempo, observando vocês, que nenhum dos sete tem uma boa postura ou qualquer técnica para lutar com espadas. Vocês são extremamente aleatórios quando estão lutando com uma espada nas mãos, não fazem a menor ideia de técnica alguma. Isso é uma coisa que provavelmente só não foram ensinados, portanto, hoje, nossos treinos serão de espadas.— Anunciou, as mãos atrás das costas, caminhando devagar de um lado para o outro enquanto nos encara, um por um.— Vocês vão aprender a ter uma boa postura, e não quero ver uma só espada no chão.
Demos um passo a frente, espadas simples de metal aparecendo no chão. Hugo nos colocou um de frente para o outro, e acabei fazendo uma dupla com Genezis. Lucas acabou ficando sem par, e Hugo acabou formando a dupla com ele.
— O primeiro passo para qualquer espadachim, é firmar uma base de apoio. Distribuam o peso entre as duas pernas, levemente afastadas, e os joelhos um pouco flexionados.— Fizemos o que Hugo demonstrava, encarando uns aos outros com os joelhos flexionados.— Destros, iniciem com a perna direita, canhotos iniciem com a perna esquerda. Façam um movimento de vai e vem, frente e traz. Quando um der um passo a frente, o outro dá um passo atrás, coloquem a maior parte do seu peso na perna que estiver à frente do movimento. Quando forem para frente, a maior parte do peso deve estar na perna da frente, e o mesmo atrás. Mas é muito importante que não deixem de colocar algum peso na perna oposta, para que não percam o equilíbrio durante a batalha. Testem.— Colocamos isso em prática, as duplas se movimentando pela Sala de Aço ao mesmo tempo, as botas fazendo barulho no piso.— Jesse, coloca algum peso na outra perna, você vai se desequilibrar no meio de um campo de batalha assim.— Fizemos isso por alguns minutos, Hugo consertando falhas que cometíamos esporadicamente. Ele andava com um sorriso ligeiramente satisfeito no rosto, nos observando de cima, como um bom tutor faria.— Ok, coloquem as espadas encostadas umas nas outras, apenas a ponta, sem perder a postura. Costas retas, todos com as costas retas! Madison, eu disse costas retas, levante a cabeça. O conceito básico de uma luta com espadas é o 1, 2 ,3, 4. Dois choques da espada virada para cima, dois choques da espada virada para baixo, sem perder a postura e com a base firmada. Testem agora.
Fizemos isso, mas dessa vez demorou muito mais para que todos acertássemos o movimento direitinho. Quase vinte minutos inteiros de treino, barulho de espadas se chocando e muitas correções gritadas depois, Hugo se deu por satisfeito com o movimento, e nos deu 5 minutos de descanso. Ofegantes e suados, nos jogamos no chão frio da Sala de Aço, as espadas caindo no chão com um som de tilintar. Me encostei na parede de ferro, e com um gesto rápido, Hugo organizou as espadas na parede ao meu lado, me dando um leve susto.
— Nunca imaginei que espadas fossem tão complicadas...— Jesse resmungou, me entregando uma toalha para secar o suor.
— Se eu soubesse tinha passado bem longe delas no primeiro teste.— Respondi, agradecendo com a cabeça e me secando.
Enquanto respirávamos fundo, aproveitando o ar condicionado geladinho da Sala de Aço, Kille colocou uma musica aleatória para tocar no celular, encontrando o olhar com Genezis. As duas começaram a cantar, as vozes esganiçadas, que fizeram eu e Helena rirmos. Kille e Genezis começaram a fazer uma coreografia estranha no meio da Sala de aço, aleatoriamente, girando em direções iguais com o celular na mão. A musica era realmente muito boa, tanto que eu comecei a tentar cantar junto (mesmo que falhando muito nisso), e rindo. Jesse tinha colocado a mão no rosto, escondendo a risada, e dava pra ver Hugo completamente confuso com aquela situação toda, sentado do outro lado do comodo.
Por um segundo tudo parecia leve, tudo parecia calmo e dava para ouvir as ondas batendo levemente na praia. Kille deu um último giro, e dessa vez, o celular na mão dela voou longe, batendo com força onde as espadas estavam penduradas, o som horrível de tudo desabando me fazendo arregalar os olhos. As espadas estavam caindo bem ao meu lado. E estavam afiadas como eu nunca tinha visto.
As espadas pararam no ar, meus olhos arregalados encarando as pontas que entortavam rapidamente, o metal se retorcendo sobre si mesmo. Encarei Hugo, crente que era ele que tinha feito aquilo, mas o deus parecia tão atônito quanto eu. Saltei para trás, meu corpo reagindo ao medo das lâminas, e procurei quem estava entortando as espadas, sabendo agora o que estava acontecendo.
Genezis encarava as espadas, os olhos azuis elétricos arregalados, as sobrancelhas loiros extremamente claras arqueadas. Ela estava com a mão estendida, e uma gota de suor escorria ao lado da cabeça. Hugo veio correndo, um sorriso um pouco torto e desesperado no rosto, encarando assim como eu uma Genezis concentrada. As espadas já estavam completamente tortas, inutilizáveis, quando a loira deixou a mão estendida cair e os pedaços de metal tilintaram no chão ao meu lado.
Lucas e Helena abriram sorrisos compadecidos para ela, e ninguém precisou anunciar o que tinha acontecido. Hugo dispensou todos nós mais cedo, e levou Genezis ao encontro de Kortry e Felin, uma das mãos nas costas enquanto a conduzia.
Já dentro do elevador, enquanto subíamos de volta para a casa, encarei minhas mãos, a cicatriz que Ametista tinha deixado ali a algumas semanas. A lembrança da água evaporando no primeiro banho voltou à minha mente, e o calor nas minhas mãos pareceu algum indicativo daquilo. A sensação foi tão rápida, que imaginei se não estava ficando obcecada por aquilo... Cheguei a conclusão que provavelmente estava.
Primeiramente FELIZ NATAL A TODOS!!! Espero que vocês não estejam lendo isto aqui no dia de natal, e se estiverem VÃO SE ENTUPIR DE COMIDA SERES ANTISSOCIAIS!!! É natal, aproveitem com as famílias de vocês, por mais que odeiem uva passa ou os tios do pavê pá cume, porque (momento de leve tristeza mórbida), pode ser o último natal com alguma pessoa da sua família, já pensou nisso?
Se você esta vendo isso depois do natal, okay, comente e deixe um votinho, por favor. Estou com saudade da interação de vocês, um comentário sobre o cap vai matar alguém? KKKKKK!!!
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