Capítulo 14





- Phoebe querida, vai se atrasar- avisou Peter da sala, no andar debaixo, enquanto Phoebe ainda estava deitada esperando secar totalmente, olhando para o teto, decidindo entre ler ou não ler, em sua cama.

Já faziam quinze minutos, e ela tinha duas horas para estar no aeroporto, naquela altura, Henry já estava se vestindo, e tudo parecia que ia enrolar, por sua causa. Mania ruim de não ter pressa, não era atoa que a vovó Helena, a repreendia severamente por sua lerdeza em se aprontar, exceto para a escola, tudo era muito rápido neste caso. Calça e um vestido, que chamam de bata, que ia até um palmo abaixo da virilha, preto e branco, boina, casaco, a blusa já era de manga comprida, e ela usaria tênis. Estava com uma mala para explodir, outra bolsa cheia de coisas suas, e caderno e lápis para espantar o tédio. Só faltava ela, a carta. Ela sabia, mas, achava que não devia. Não queria levar, ao menos, não mais, e ainda menos, fugir da verdade. Não estava pronta para a última que ela deixara, mas, se não fizesse isso, e enrolasse mais um pouco, ouviria sermão, até sua morte. Revirou os olhos ouvindo o pai, e suspirou tomando coragem para abri-la, contou até três, espiou os lados, nada, tudo vazio, rompeu o envelope e abriu o papel.



13.09.23

Minha amada e querida filha, Phoebe, eu sei que soou exagerado, mas, para uma mãe, tudo é sempre muito exagerado em questão de seus filhos. Tenho uma confissão a fazer, em todas as cartas escritas só houve um rascunho, e sabe porque? Simples. Quanto menos papel desperdiçado, menos compra de papel, menos árvores mortas. Eu sei que uma coisa não liga a outra, e isso é feito de propósito. Eu lembro de minha infância e me pego vendo uma menina curiosa, que não sabe como a curiosidade não a engoliu, e seu pai tem total razão em dizer que você é idêntica demais comigo. Se alguém que te segurar levantar a mão, você vai querer saber se há algo nela! Continue assim, e você saberá muita coisa.

Um ponto interessante a ressaltar é, não deixe seu pai comprar sorvete, sempre virá com gosto de tutti-frute e eu odeio coisas extremamente doces. Não sei porque isso deve ser de seu conhecimento, mas, aqui estás registrado, por mim.

Quando eu era menina, obviamente nunca deixei de ser, só cresci e amadureci, enfim, eu gostava muito de brincar, isso porque os especialistas dizem que brincadeiras estimulam certos sensores do corpo humano, brinquedos podem lhe ensinar a entender formas, cores e associações de objetos, pessoas e animais. Mas, eu confesso que um paradigma para mim, foi o fato de eu gostar de bonecas e de carrinhos, eu achava tudo lindo, bonecas e carros, coisas diferentes e um necessitava do outro, os problemas foram que na minha época de infâncias, as pessoas viam determinados brinquedos como associação ao sexo do indivíduo, o que auxiliava na maldita suposição de que você brincasse com os dois, você seria "meio-macho", uma palavra muito complexa, sem sentido e discriminante. Ninguém é meio, e nada existe se não por completo. As metades, ficam para a comida, os sentimentos e a matemática, o resto é pura invenção. Mas, quando me tornei adolescente, o mundo via isso como normal, só que distorceram mais do que deveria a verdade, o problema é o ser humano compreender só o que a mente limitada dele permite, e não buscar entender entrelinhas, e a realidade. O que houve foi, que meninos e meninas invertiam os objetos ou usavam ambos, e no final eles tinham a autoridade de escolher seu próprio sexo. Infelizmente, se alguém além de você ler isso, poderá soar de maneira preconceituosa, porque quem fez sua própria escolha, vê tudo na maneira ofensiva, e usa meios nada agradáveis, para que você engula a verdade dela. Phoebe Parker, eu sou eu, sua mãe, Lilian Parker, e digo que as pessoas jamais devem me forçar a crer no que elas veem como verdade, e preciso que faça o mesmo. Se determinado indivíduo acreditar em algo e impor a você, rebata, mostre que você também tem uma, e que cada escolha o que quiser. Não em termos racistas ou discriminatórios meu amor. Mas, a ciência é clara, não existe nada além de feminino e masculino, e por influência divina temos a confirmação. Mas, Phoebe, se hoje há esse caos, nem quero imaginar no seu hoje. Eu serei jugada pelo que eu disse, porque eu fiz uma escolha, de acreditar em meus fatos apurados, o erro humano é arrogantemente forçar as pessoas a aceitarem apenas a sua própria visão, e ai meu amor, o que acontece é que acaba sendo falso o sentido do respeito.

O respeito não está ligado diretamente, apenas a etnia, cor de pele, idioma e parecidos. Está ligado a opinião de cada indivíduo por qualquer questão que seja, isso te leva a obrigação de se calar a opinião do outro, no sentido de não questionar. Mas, a humanidade não sabe o que significa respeito, se seu vizinho gosta de azul e você de vinho, ele vai querer em "respeito", forçar você a escolher a cor favorita como azul. E eu lhe pergunto, para testar se é mesmo inteligente quanto imagino agora. Onde está o respeito nisso?

Para mim, exatamente em lugar algum, a pessoa que respeita, aceita que a opinião do vizinho e divergente da sua, e que ambos podem conviver no mesmo espaço, isto é, cada qual com seu pensar. Isso dito, meu amor, imponha a sua versão, e deixe claro que não gosta menos de seu vizinho, porque ele quer azul como favorito, direito dele, tal escolha, e direito seu escolher azul. Jamais discuta a respeito! Se a intenção da pessoa for lhe obrigar a algo, corte as relações.

A verdade deve estar em você, por isso, seja criança em ser curiosa, tenha medo do que sabe que é errado, não aceite menos do que é, não se deixe, obrigar pela arrogância, o seu nome é Phoebe Parker, nós Phoebe, somos mulheres, queremos respeito, respeitamos os outros, agimos de acordo com a lei e as verdades inculcadas em nós. Além disso, nada é aceitável.

Seja o que for no seu agora, ou no seu amanhã, quero que saiba que deve ser escolha sua, crença sua, não do outro. Se aceitar viver com outra pessoa, por amor, e somente por amor, seja paciente, mas, saiba que tua opinião é válida, tanto quanto a do outro, você não é menos e nem mais. Terá sua posição e haja como tal. Não aceite menos, e não seja gananciosa a ponto de desejar todo o seu tempo por mais. Eu não coloquei nenhuma criança, em tamanha dificuldade, para ser gananciosa, agir de todas formas erradas possíveis, para ser arrogante, para menosprezar outro, ainda menos, para manipular ou se deixar ser manipulado. Acorde Phoebe, o mundo é mal como o bicho papão, e quem você vai querer ser?

Mais um detalhe, quem é você? A quem pertence? De onde vem? Qual a sua verdade? Quem a criou?

Estou ciente que não serei eu, mas, acima de tudo, eu a coloquei no mundo, e só estou indo embora, porque eu sofri um contratempo, chamado doença, ela me consumiu e eu não tenho mais alternativas. Eu já falei milhares de vezes, eu aconselhei o quanto pude, tudo que fiz foi por vocês, e agora eu parto de coração quieto e mente vazia, coma certeza de que eu coloquei uma mulher e um homem ao mundo, para serem o que sonhei, mas, independente disso, os seus sonhos. E que sejam pessoas boas, de índole clara, de posição justa, de falar audível, que sejam pessoas boas, generosas e honestas, que amem, que vivem e que se for preciso chorem.

Eu serei honesta, estou indo a uma hora ainda não determinada, mas, já não vejo mais a vida em mim, tudo dói e nada eu sinto, eu olho para você e seu irmão, e morro mais um pouquinho, e c quando os olhos doces e preocupados de Peter se encontram como o meu, eu forço o que não existe mais, para desabar só depois, não existe força em mim, porque estou partindo, hei descansar até que seja levantada novamente. E meu amor, eu te amarei eternamente, minha menina de olhos esmeraldas, minha borboletinha, de cabelos macios e escuros, de sorriso apaixonante de uma beleza avassaladora, e ainda só um bebê. Eu quero que voe alto se desejar, eu quero que sinta o que puder sentir, mas, não seja mantida enjaulada e menos ainda escravizada, eu te amo e sempre te amarei. Sua mãe, sua amiga, sua progenitora, a mulher que te amamentou quanto pode e que criou enquanto teve vida, a que te escreve, a que te aconselha e a mãe de verdade. Meu sonho de mãos pequenininhas. Isso é um breve adeus, nós ainda vamos nos rever!

Com amor, Mamãe.




Primeiro, pensou que a cabeça só estava doendo, e depois, seu coração doía a cada palavra, era muito forte, era toda ela, e não pôde, não deu. Foi fraca, porque perdera ela, e poderia passar cem anos, ainda choraria por isso. Como doía não a ter. Como doía ter de ler e entender isso. Mas, o abdômen doía, já dava para ouvir os soluços. Já estava atrasada, não usava nada além da toalha, e não pensava em nada além de chorar.

Porque com ela? Porque isso? Por que Lily?

Chorava pelo que lera, pelo que sentia, pela perda e por não conhecer a mãe. Ela era bela, esperta, e sabia tudo o que ela desejava saber.

- Phoebe? O que foi?- Henry perguntava preocupado, enquanto entrava pela porta do quarto- Ta doendo alguma coisa?- ele não vira o papel e o envelope.

- Sim- falou ela, entre a dor e os soluços, e todas as suas lágrimas.

- O que?- perguntava o gêmeo, desesperado.

- Aqui dentro- ela apontava para o peito, agora com a mão vazia.

- Quer que eu chame o papai?- ele perguntou, mas, ela dera de ombros, se agarrando as pernas -eu to preocupado maninha, diz o que está acontecendo.

Era claro que ele não ia saber, não se ela não mostrasse, não se não dissesse. Mas, ela não queria falar e não falou, pegou o papel e entregou na mão dele.

- É a última dela?- perguntou ele, analisando a folha e depois a irmã.

- Sim.

- Meu Deus, Phoebe, porque leu isso agora?- perguntou ele.

- Leia a sua, por favor, leia a sua.

- Henry, Phoebe vamos, ainda temos que...- Peter ficou parado, vendo a filha naquele estado- o que está acontecendo? O que está doendo? Phoebe meu amor, o que foi?- perguntava o pai descontroladamente.

- Foi a última carta da mamãe- respondeu Henry, triste e sério.

Tudo parou, seu olhar sobre a filha, o tempo e suas lembranças vieram a tona, o desespero de perdê-la, choros de bebês, vozes de palavras de apoio, abraços e o caixão descendo para a terra. Se ainda doía, para ela deveria, estar destruindo tudo lá dentro. Mas, Lily disso aos 14, seriam eles novos demais para entender?

Abaixou e tocou a perna gelada da mocinha a sua frente, e como não sabia fazer outra coisa, apenas se pôs a chorar.

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