Capítulo 29 - Palavras não ditas

   Quando tentei abrir meus olhos, eu apenas conseguia ver um escuro infinito e interminável diante de mim. No início, pensei que eu tinha perdido minha visão por causa da canalização e eu nunca mais veria as cores ou as formas, mas eu não entrei em desespero de primeira e esperei paciente.

   Embora fosse impossível ver no momento, eu ainda podia ouvir e eu me mantive atenta, concentrando minha atenção em cada movimento ou voz perto de mim. E eu também sentia.

   Todas as noites antes de cair no sono, alguém entrava no lugar onde eu estava e com uma toalha molhada limpava o suor do meu corpo. Eu quis segurar aquela mão e fazer perguntas, entretanto, o que eu perguntaria?

     — Isobel, alguém mais ligou hoje? — Uma voz masculina perguntou.

     — Sim, senhor. As ligações não param nem por um segundo — Uma voz que parecia pertencer a uma senhora respondeu — Todos perguntam a mesma coisa.

     — Eu... falarei com eles sobre isso, não quero que saibam ainda qual é o estado dela — O homem parecia triste — Malia já chegou?

     — Acredito que não, senhor.

     — Eu pedi que não me chamasse assim, Isobel. — O homem disse, gentil.

   Então um silêncio reinou no quarto no momento seguinte. Eles tinham saído e eu mais uma vez estava sozinha e imersa na escuridão.

§ § § § §

   Na manhã seguinte, eu fui acordada pelas mesmas vozes que eu ouvia com frequência. O homem e a senhora que se chamava Isobel, pelo o que eu entendi nas conversas deles.

     — Malia, vai precisar de mim hoje então não voltarei para casa. — O homem explicou com a voz apresada — Pode, por favor, dar o banho nela?

     — Claro, farei como pediu... — Ela disse, sua voz falhando ao chegar na forma como teria que se dirigir a ele.

     — Se acontecer alguma coisa me ligue.

   Eles saíram logo depois. Eu não conseguia saber que horas eram graças a falta de visão, mas meu relógio biológico parecia dizer que ainda era muito cedo para que eu acordasse, então eu acabei caindo no sono mais uma vez após a saída deles.

   Eu estava tão cansada no dia em que os anjos saíram do inferno. Agora a única coisa que eu queria fazer era poder acordar, andar sozinha e descobrir onde eu estava e também quem eram essas pessoas.

   Quando acordei no horário certo dessa vez, um sorriso brotou no meu rosto de tanta felicidade. Eu estava vendo novamente. O teto sobre mim tinha uma cor bege e bem no centro dele tinha um lustre muito bonito e de aparência cara. Além disso, eu não estava em casa.

   O lugar onde eu estava era um quarto bem grande e espaçoso, os itens espalhados sobre as cômodas e outras superfícies planas não tinham nenhuma dica para saber de quem pertencia tudo isso. Eu não conhecia ninguém rico o suficiente para ter uma casa dessa, pelo menos ninguém me vinha a mente... além de Cassandra.

   Ela estava morando com o anjo renegado e a casa onde eles fizeram a armadilha parecia ser grande o suficiente para ter quartos de sobra, mas nada que tinha acontecido ontem me fazia acreditar que tínhamos perdido para o grupo extremista. Eu me lembrava de ter conseguido tirar os anjos, de ter sido atingida pelo raio para conseguir fechar os portões e depois... nada.

   Na verdade, eu me lembrava de mais uma coisa. Alguém ordenou que os anjos se dividissem pela escola, ajudando os anjos falsos e os vampiros. Essa pessoa disse outra coisa...

   Tentei levantar, meus movimentos bem lentos e vagarosos. Minha perna esquerda estava enrolada em uma atadura firme e totalmente branca, enquanto a outra tinha um pequeno curativo na área do tornozelo onde, antes, uma das almas do inferno me segurou. Eu sai da cama, e caminhei pelo quarto, arrastando-me pela parede como apoio e procurando a porta que me levaria para o lado de fora, ou até a pessoa dona do lugar.

   Eu errei a porta para o corredor duas vezes antes de encontrar a certa e todo o esforço de me arrastar estava me deixando mais uma vez cansada. Quis me deitar novamente, mas a curiosidade dentro de mim crescia latente, como se algo muito importante estivesse muito próximo de mim. Então segurei a maçanete da porta e a abri, encontrando alguém do outro lado ao mesmo tempo em que meu coração errou uma batida. Engoli em seco e olhei para cima.

   Olhos amarelos brilhavam na minha frente e eles começaram a queimar com um sentimento indecifrável quando me viram. Eu suspeitei que fosse o ódio dele por mim subindo a superfície, pois seria o sentimento mais esperado que ele tivesse nutrido por mim durante todo esse tempo. Esperei que ele derramasse sobre mim sua fúria, mas o silêncio era a única coisa com mais energia entre nós.

   Daimen não fez o que eu esperava, ele sempre fora muito imprevisível. Eu nunca conseguia saber o que passava pela sua cabeça, mas ele sabia cada pensamento que eu tinha, cada dor que eu sentia e eu simplesmente achava isso muito injusto. Muito injusto o fato de apenas um de nós viver em um mistério enquanto o outro era um livro aberto.

   Ele piscou rapidamente, como se estivesse saindo de um transe e eu sabia que embora estivesse com uma aparência muito calma, esse não era realmente o seu estado. Eu entendi no minuto em que vi o seu pomo de adão subir e descer rapidamente que ele estava tão nervoso quanto eu.

     — Daimen... — Tentei dizer, minha voz sumindo pela falta de uso.

     — Atelina...

   Olhei para cima, lembrando-me que Daimen era realmente mais alto do que eu. Eu queria poder olhar para ele por mais tempo, mas sentia que isso seria estranho. Antes eu não queria admitir que estava quase perdendo sua imagem nas minhas memorias e eu me odiava por isso. Daimen foi uma parte muito importante para mim apesar de termos nos conhecido há três meses e por míseras semanas.

     — Senhor Kennedy? — Uma senhora de cabelos negros apareceu na curva do corredor atrás de Daimen — A senhorita Malia chegou...

   Essa devia ser Isobel, a mulher com quem Daimen conversava todas as manhãs no quarto onde eu estava. Ela parou de falar assim que seus olhos se fixaram em mim.

     — A senhorita finalmente acordou?

     — Parece que sim — Daimen respondeu, indiferente — Eu vou descer em seguida, vou pegar algo que esqueci.

   Daimen passou por mim sem ao menos pedir licença e evitando meus olhos a todo momento ele entrou e mexeu nas gavetas do quarto. Por um momento fiquei confusa, devia haver no mínimo seis quartos vagos nessa casa, mas parecia que esse era o quarto dele. Seus pertences estavam aqui, embora fossem minimalistas o bastante para eu achar que esse quarto não tivesse dono.

   Apoiada na porta, observei enquanto ele andava descalço pelo quarto, seus quadris estreitos movendo-se calmamente, mas suas mãos tremiam levemente.

     — A senhorita precisa de alguma coisa? Está com fome? — A senhora apareceu ao meu lado, um sorriso acompanhando suas palavras.

     — Onde estou? — Perguntei, embora quisesse puxar Daimen e perguntar diretamente para ele.

     — Está em casa senhorita, o senhor Daimen trouxe você assim que possível após passar por uma consulta minuciosa no hospital — Ela disse, seus olhos bondosos.

     — E meus amigos?

   Uma risada abafada podia ser ouvida de onde Daimen estava e se não fosse pelo fato de estar evitando a todo custo olhar para mim eu poderia dizer que seus olhos reviraram junto a essa risada, irônica.

     — Eles ligam todo dia para saber como está senhorita, mas o senhor Daimen preferiu deixar que eles soubessem seu estado apenas quando tivesse uma melhoria — Ela explicou — Tem certeza de que não está com fome?

     — Acho que só um pouco — Falei, sentindo meu estômago roncar.

     — Senhor, seria melhor darmos apenas sopa...

     — Eu estou atrasado, Isobel. A receita que o médico deu está na geladeira — Ele disse, ainda sem olhar para mim e pegando tudo com pressa — Vou chegar tarde, não me espere.

   Ele colocou a mochila nas costas e com passos largos e rápidos quase saiu porta a fora, mas meu braço repentinamente se esticou e segurou sua mão. Era gelada, algo que eu nunca pude sentir ao tocar a pele de Daimen. Ele normalmente era quente como um raio de sol reconfortante. Agora era tão frio quanto a pele de um vampiro que era considerado um cadáver vivo.

     — Eu... quero, não... preciso falar... — Antes mesmo que eu concluísse minha sentença, ele puxou seu braço.

     — Outra hora — Ele disse, refutando meu pedido.

     — Quando?

   Ele não respondeu, simplesmente deu as costas para mim e continuou andando sem nem mesmo se dar o trabalho de falar alguma coisa.

     — Senhorita, o que foi? Está doendo em algum lugar? — Isobel perguntou, segurando meus braços antes que todo meu corpo caísse contra a porta.

   Eu estava realmente me mantendo firme em pé, mas desde o momento em que ele tinha entrado no quarto e o ar ficou carregado com sua fragrância inesquecível, eu estava tentando me fazer de forte, apesar das dores e do aperto no coração.

     — Onde doí? — Ela continuou perguntando.

   Segurei suas mãos e apontei para meu peito, ele doía dolorosamente.

     — Vamos, a senhorita deveria dormir mais um pouco.

   Isobel com um pouco da minha ajuda me levou até a cama e me deitou de novo, saindo do quarto para fazer algo para eu comer. Eu estava trêmula pelo esforço e estava confusa pelo fato de ter chorado na frente de Isobel, eu senti que aquilo que conectava Daimen a mim já não existia mais e ele iria me afastar descontroladamente para afirmar isso.

   Eu não podia afirmar com certeza, mas suspeitava que o fato de não voltar cedo para sua casa era por que eu tinha acordado. Ou talvez fosse apenas coisa da minha cabeça.

   Após comer e ouvir um pouco sobre o que tinha acontecido de Isobel, eu caí no sono mais uma vez ainda com as palavras dela na minha cabeça.

   Todos estavam bem e havia se passado mais de três semanas que eu estava dormindo. Eu estive sendo tratada por um médico amigo de Daimen que vinha me ver uma vez por semana, mas ninguém além deles sabiam como eu estava. Após os anjos ajudarem a afastar as fênix e thunderbirds, eles resolveram o estado em que a cidade estava e até mesmo tiveram que pedir ajuda para anjos mais alto que eles mesmos na classificação para conseguir fazer as pessoas esquecerem do dia em que a terra conheceu o inferno.

   Depois disso tudo voltou ao normal, menos o fato de eu ter sumido. Daimen me levou ao hospital e cuidou de mim desde então.

   Mas se ele queria me afastar por que me trouxe para sua casa? Eu sabia que ele queria que eu não conversasse com ele sobre nós. Contudo, ter me trazido até aqui apenas aumentavam minhas esperanças de que talvez... só talvez, Daimen ainda poderia me ouvir e... e o quê? Iríamos voltar?

   O que eu realmente queria de Daimen? Eu queria apenas o seu perdão? Se era só isso para que eu precisava incomodá-lo ainda mais? Seria melhor ir embora e não voltar, mas eu não tinha certeza se era realmente isso que eu queria.

   Então, o que você quer Atelina?

   O som da porta sendo aberta me acordou de madrugada, mas eu não abri meus olhos. Fingi que estava dormindo enquanto esperava que ele viesse até mim para confirmar que eu estava dormindo e se eu estava bem, eu o conhecia o suficiente para saber que ele faria isso. Dessa vez, ele fez exatamente o que eu esperava. Entretanto, quando tocou meu rosto suavemente e meu coração se apertou eu quase perdi a vontade de falar o que queria antes.

   O que eu menos queria era tocar na ferida dele. E se ele tivesse superado durante esse tempo no inferno? Eu apenas iria causar mais dor a ele. Mas era mesmo isso que tinha acontecido? Daimen me superou e eu ainda estava na mesma?

     — Sei que está acordada — Ele sussurrou, antes que eu segurasse sua mão.

     — Eu não estava esperando esse tempo todo — Falei, desculpando-me sem saber o porquê.

     — Eu não duvidaria se tivesse feito — Ele disse, o leve cheiro de álcool flutuando dele — Você me esperou sai do inferno para fechar os portões.

   Rapidamente me sentei na cama, acendi o abajur do lado que iluminou debilmente a área ao meu redor não alcançando Daimen que estava do outro lado do quarto próximo a janela.

     — Eu queria ver você — Falei.

     — Por que? Não há motivos para você querer me ver, Atelina — Ele disse, suas palavras amargas — E nunca deveria existir algum.

     — Por que? Por que não deveria existir tal coisa? — Perguntei, magoada — Eu sei que magoei você quando fiz o que fiz pelo irmão de Peyton... eu sinto muito. Mas eu realmente...

     — Não quero um pedido de desculpas. Eu sei que sou o único intruso entre você e seu primeiro amor — Daimen disse, suas palavras quase engasgadas — Não precisa se desculpar e nem se sentir culpada por me causar dor. Eu estou bem.

   Olhei para a janela e depois para o seu rosto, esperando encontrar algum sentimento oculto na sua expressão, mas eu não conseguia ver seu rosto no escuro.

     — Mas eu não estou bem — Falei, lembrando dos sentimentos que ainda estavam dentro de mim, mas que eu os tinha afundado até que deixassem de ser um impedimento para a missão — Eu senti a sua falta.

     — O que? — Ele questionou, sua voz incrédula.

     — Eu senti muito a sua falta, Daimen. — Repeti, meus olhos marejando — Pode parecer que eu não tenha me sentido assim, mas eu usei a chave que você me deu do seu apartamento e quando fui lá eu...

     — Atelina...

     — Me deixa terminar! — Pedi — Antes de morrer, eu tinha discutido com Peyton, mas nunca passou pela minha cabeça desistir do que tínhamos para voltar com ele, nunca. Então, por favor, tire da sua cabeça que eu morri por ele...

     — Com que provas você quer que eu acredite? Você o conhece a mais tempo e passou anos apaixonada por ele — Daimen disse, seus passos vindo na minha direção — Eu não estou pedindo que me ame como amou ele, mas não minta para você mesma. Você ainda...

     — Não! Eu sei o que eu sinto — Gritei, todos os sentimentos fluindo do meu peito — E eu sei que senti sua falta porque você era a primeira pessoa que vinha na minha cabeça quando algo acontecia e eu me perguntava: "o que o Daimen faria nesse momento? Ele me apoiaria?"

   Agora que Daimen tinha avançado e saído da escuridão eu podia ver seu rosto retorcido em uma carranca entristecida e dolorosa de se ver. Deb tinha me dito que eu deveria me explicar e depois dar um tempo para que ele analisasse tudo o que sentia por mim, inclusive se seu ódio era maior que qualquer outro sentimento, mas eu estava com medo. E se ele decidisse que não queria mais me ver?

   Antes eu pensei que ficaria bem mesmo que ele escolhesse me odiar depois de me ouvir e isso só passou de palavras floridas. Eu não queria que ele me afastasse. Queria sua presença. Daimen diferente das outras pessoas nunca me desapontou e era isso que eu gostava nele. Ele mantinha suas promessas. Até mesmo quando disse que conversaríamos e depois mudou de ideia, ele manteve a promessa inicial permitindo agora que conversássemos.

   Apesar de estar abrindo meu coração, eu pensei que no momento em que eu me declarasse tudo seria um mar de rosa, mas não era bem assim. Eu estava causando dor nele.

   Daimen olhava para mim decepcionado, sua respiração descompassada fazia seu peito subir e descer rapidamente e suas mãos paradas ao lado do corpo abrindo e fechando como se quisesse socar alguma coisa e se segurava loucamente.

     — Mesmo que você não acredite em mim, eu vou esperar — Falei, cruzando meus braços sobre o peito e tentando parecer firme.

     — Esperar o que? — Ele perguntou, sorrindo finalmente.

     — Que você venha até mim, vou esperar — Tentei sorrir, limpando minhas lágrimas.

     — Não vamos voltar, Atelina — Ele afirmou.

     — Ok — Falei, contra minha vontade — Mas isso não quer dizer que você vai sumir, né?

   Daimen deu mais alguns passos na minha direção, fazendo o cheiro cítrico presente nele misturado ao álcool inundar os arredores. Era tão erótico que fez meus olhos acompanharem seus passos e percorrerem seu corpo por um momento furtivo.

     — Vou ajudar você a concluir sua missão, depois — Ele olhou nos meus olhos pela primeira vez — veremos.

     — O que? Veremos? — Perguntei, confusa.

     — Se irei embora depois disso tudo acabar... — Ele se deteve, olhando para mim.

   Ele estava dizendo exatamente a mesma coisa que Peyton disse, ambos iriam embora quando isso acabasse. Contudo, Daimen não queria tentar mais nada comigo e Peyton disse que tentaria. Peyton lutaria uma luta já vencida para poder ficar comigo... isso seria o que eu realmente queria?

   Entre Daimen e Peyton. Não deveria existir uma escolha, não deveria existir um dedo apontando para quem sofreria enquanto os outros dois seriam felizes. Não. Eu não queria isso.

     — Amigos... — Falei, minha voz falhando — Vamos ser amigos, pelo menos.

   Todos os tipos de coisas passaram pela minha cabeça sobre sugerir isso, talvez parecesse que eu estava desistindo dele e eu estava desistindo. Desistindo de Daimen e de Peyton. Eu não merecia escolher qual deles sofreriam no lugar da minha felicidade, da minha paixão correspondida por um deles.

   Sendo assim, não haveria uma escolha. Não haveria nenhum coração partido.

     — Nem mesmo o seu? — Daimen perguntou, inesperadamente interrompendo meus pensamentos.

     — O que?

     — Nada. — Ele disse, caminhando na direção da porta — Volte a dormir. Conversaremos mais amanhã.

   Então Daimen saiu do quarto, eu quase o parei, mas desisti disso também. Eu não sabia ainda o que aconteceria comigo após o fim da missão, sendo assim, eu não poderia dar esperanças para ninguém e por isso nem mesmo poderia pensar em algo romântico no momento. Eu só precisava aceitar que tinha feito minha parte pedindo desculpas para Daimen e me explicado.

   Será que tinha sido o suficiente? 

BRILHA, BRILHA ESTRELINHA 🌟🌟🌟

Oie anjinhos, como estão? O livro está realmente no final dessa vez e espero que tenham gostado desse, tanto quanto gostaram do outro. O que acharam da discussão de Daimen e de Atelina? Será que ambos estão escondendo o que realmente sentem e afastando o outro de propósito? Nós sabemos que Atelina ainda não sabe se ela ama mais um do que o outro, e vocês tem algum palpite sobre isso? Você é Team P ou Team D?

Não esqueçam os votos e dos preciosos comentários!

❤️❤️❤️

Beijinhos, beijinhos.

- Atenas.

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