26


Winter's pov:

"Enquanto observo seus lindos olhos castanhos um pensamento me ocorre. Vou sentir sua falta pelo resto da minha vida."

Depois que saí da faculdade, fui direto para a galeria. Planejava conversar com Jimin sobre algo que venho pensando, mas desisti dessa ideia assim que cruzei com Jungkook pelo corredor. Estava nítido que alguma coisa tinha acontecido entre os dois. 

— Quem contou que eu era a receptora? — Pergunto quase em um sussurro. Jimin passou a última meia hora me contando tudo sobre a discussão e não posso negar o quanto me sinto culpada por tê-la colocado nessa situação.

— Jungkook entrou em contato com a diretoria do hospital — ela responde, passando a mão nos cabelos. 

Seu rosto está corado e ela está com um brilho de dor nos olhos. Jimin inclina a cabeça para trás e olha para o teto, esfregando as palmas das mãos no rosto enquanto se levanta do sofá. Ela lentamente se vira para mim.

— Eu devia… Tenho uma reunião em alguns minutos. Preciso ir antes que… — Ela se inclina para me dar um beijo de despedida.

— Ele me odeia, não é? — Pergunto.

— Não… Eu não… — ela solta o ar dos pulmões. — Ele não queria doar os órgãos da irmã. Mas acho que seu ódio foi canalizado para mim… — Jimin fecha os olhos por um segundo e depois volta a abri-los. — Eu ligo pra você. — Ela me beija novamente. — Não se preocupe com isso. Vai ficar tudo bem. Você vai ver.

Mas eu não tenho tanta certeza. Não ao ver a expressão dela. 

Respiro fundo, tentando controlar minhas emoções. Tudo é tão confuso…

E mesmo quando deixo meus problemas me consumirem e me sinto um pouco sufocada por eles, percebo quanto estou sendo egoísta. Estou preocupada com o que as pessoas vão pensar de mim, mas estou viva. Somi não está. 

Os dias seguintes na galeria são agitados. Jimin e eu passamos a maior parte do tempo trabalhando em nossos setores na galeria, e tudo está saindo conforme o planejado. Seria uma mentira dizer que não estou sentindo falta de passar mais tempo com ela. Mas é melhor assim. 

No sábado pela tarde, eu estou em casa, no estúdio de arte, finalizando as últimas telas que devo levar para a exposição na galeria. Isso deveria me trazer uma sensação de paz, mas, por algum motivo, não é o que acontece. Provavelmente porque minha mente vaga em um mar de escuridão enquanto estou parada ali, sempre voltando ao que aconteceu, ao que causei a minha pessoa favorita. 

Alguns minutos depois, recebo uma mensagem de texto.

Jimin: Vou conseguir um tempo livre hoje. Quer jantar comigo? Prometo não falar de nada relacionado ao trabalho. 

Dou uma risada. Estou tentada. Mas me sinto… cansada. Mando uma mensagem.

Eu: Desculpe. Combinei de jantar com minha tia hoje. Que tal irmos ao Yongsan Park amanhã pela manhã?

Jimin: Tudo bem, vou ter que aprender a lidar com isso.

Eu: Você é dramática.

Jimin: E você é linda. 

Suspiro quando coloco o celular de lado. Minha cabeça dói quando saio do estúdio. Depois de um rápido banho e de vestir uma roupa confortável, vou para o quarto e me deito na cama.

Uma hora depois, acordo com um sobressalto.

— Minjeong? Você está bem?

Eu me sento na cama. Minha tia paira sobre mim. Eu nem sequer vi quando ela chegou. 

— Acabei caindo no sono. Estou bem.

Mas, quando vou me levantar, sinto um desconforto no peito. 

Verifico minha respiração. Está tudo bem. Quando minha tia sai do quarto, verifico minha pressão sanguínea. Está boa. Estou bem, asseguro a mim mesma.

Talvez seja a preocupação por causa dos mais recentes acontecimentos. Quando vou até a sala, no entanto, tenho dificuldade para descer a escada, embora ela não seja longa. Estou sem fôlego ao chegar lá. Estou bem, repito a mim mesma. E, quando a verifico outra vez, minha respiração já está normal.

Yongsun e eu passamos a tarde juntas. Vamos a livraria. Cada uma de nós escolhe um livro. Então escolhemos um livro uma para a outra. Compramos algumas coisas para o jantar, vamos para casa e passamos um bom tempo na cozinha. 

Minha tia está falando sobre alguma cena do filme que estamos assistindo. A voz dela ao falar sobre isso está ligeiramente animada. Enquanto a ouço falar, caio no sono. Quando ela me acorda com cócegas, fico constrangida.

— Tudo bem, bela adormecida? — Ela pergunta.

— Sim. 

Mas sei que não está. Eu me senti assim um mês antes de ser diagnosticada com uma doença mortal. Uma semana antes de a minha vida sair dos eixos. Antes de eu perder tudo. Minha dignidade. Minha identidade. Minha esperança num futuro.

Eu me lembro das vezes em que pensei o pior e depois percebi que estava apenas apavorada. Será que estou assim de novo?
Esse pensamento me impede de falar a verdade para a minha tia. Faz com que eu continue agindo normalmente.

[…]

Na manhã seguinte, Jimin me encontra em um dos bancos do Yongsan Park. Ela me beija. Quero esquecer tudo. Quero voltar para a casa de campo e me fundir a natureza. Anseio pelo silêncio feliz daquele dia. O jeito como senti os braços dela ao meu redor. Estar prestes a me entregar a ela pela primeira vez.

— Aposto que sentiu minha falta hoje. — Ela brinca quando se afasta. 

E então um pensamento me ocorre. Vou sentir falta dela pelo resto da minha vida. Engulo em seco.

— Como estão as coisas com o irmão de Somi? — Pergunto.

— Não comece outra vez — ela diz.

— Não comece o quê? 

—  Não comece de novo com essa ideia de que tudo o que aconteceu foi por sua causa. Eu já disse: você não tem culpa de absolutamente nada.

Sempre escuto suas palavras, mas não consigo evitar me preocupar. 

— Não gosto quando você faz isso, lembra? — Ela diz.

— Sim, eu me lembro. — É por isso que tenho evitado tocar no assunto. É por isso que tenho que fazer alguma coisa.

Respiro fundo, preparando-me para o que está por vir.

— Você não merece isso. Você não merece sofrer por causa de outra pessoa, Jimin. Você merece ser feliz. E nesse momento? Nesse momento, não sei se posso te dar isso. Você merece uma chance de ter uma vida normal. E eu só estou complicando as coisas.

Ela se afasta de mim, franzindo a testa.

— Pare com isso, está bem? — Diz, passando a mão nos cabelos. — Pare de me dizer o que mereço. O que é bom para mim. O que é certo para a nossa situação. Não me importo com essas coisas. — Ela faz uma pausa e bate com a ponta dos dedos no lábio inferior. — Eu estava tão sozinha antes de começar a trabalhar na galeria. E então você chegou e se aproximou de mim. Você me trouxe a luz em meus dias mais sombrios. 

Sorrio de forma singela. 

— Quando cheguei à Seul eu me sentia perdida. Fui até a livraria numa tentativa de me sentir em casa mesmo em outra cidade. Entrei ali sem nenhum grande objetivo e mente. Então olhei para cima e vi aqueles olhos castanhos, e soube, de alguma forma, de alguma maneira, que as coisas ficariam bem. — Quando ela inclina a cabeça na minha direção, nossos lábios se tocam. — Você não me trouxe a luz, Jimin. Você é a luz.

Ela abre aquele sorriso perfeito que tanto amo.

— Ser normal não é a coisa mais importante na vida. — Ela faz uma pausa. — Não tenho medo de lidar com nenhuma situação se isso significar poder ficar com você. 

Olho para o chão. Limpo a garganta. O que eu estou fazendo? Eu sei que estou enviando os sinais errados para ela, sei que a estou confundindo. Mas eu não vim até aqui hoje para provar o quanto o nosso relacionamento é forte. Eu estou com a cabeça nos meus recentes problemas de saúde e no que isso pode significar. E agora Jimin está dizendo ser capaz de enfrentar o mundo por mim.

— Nós não podemos continuar com isso, Jimin — sussurro. Ela arregala os olhos, surpresa com minhas palavras.

— O quê?

— Não posso mais te ver. 

Eu não tinha a intenção de magoá-la, mas simplesmente não quero que ela tenha alguma relação com isso. De todas as coisas que experimentei nesta vida, ela é a melhor.

Talvez eu esteja imaginando coisas. Talvez eu seja apenas uma jovem paranoica e não esteja rejeitando o coração de Somi. Ainda assim essa é uma possibilidade.

Se não hoje, amanhã. Se não esta semana, a próxima. Se não este ano…

Nunca serei capaz de planejar o futuro em anos. Sempre estarei olhando por sobre o ombro, procurando esse fantasma. E Jimin não merece passar por isso. Ela não tem que passar por isso.

Ninguém deveria ter que passar por isso.

— Nossa. O que você está fazendo, Minjeong? — Ela pergunta, se afastando de mim. — Você me chamou até aqui para… para terminar comigo? 

Engulo as lágrimas. Não. Não posso deixar que ela me veja chorando. 

— Minjeong…

Eu não respondo. Acho que se disser as palavras, elas vão carregar mais verdade do que eu estou interessada em admitir.

Jimin me olha como se tivesse levado um tapa. Eu me sinto como se tivesse levado um tapa. Me sinto sem forças. Me sinto doente. Me levanto do banco. 

Ela segura meu braço.

— Espere aí! — Ela diz. Está ficando com raiva ou, melhor, frustrada. Jimin não fica com raiva quando se sente magoada. Mas isso vai magoá-la muito menos agora do que se tiver que me assistir rejeitando o coração de Somi.

Ela já perdeu Somi.

Agora vai me perder. E Somi novamente.

— Por que está dizendo isso? O que eu fiz? Se fiz alguma coisa errada ou disse alguma coisa… errada, me desculpe.

Dor. Vejo isso nos olhos dela, ouço em sua voz. Eu estou fazendo isso com ela, eu estou partindo seu coração. Grandes nós retorcidos de dor se formam no meu peito. Eu preciso sair dali.

Agora.

Eu me afasto.

— Minjeong — ela me chama.

Não olho para trás. Avanço por entre as pessoas no parque, puxando meu casaco contra o corpo. Está um clima ameno, mas estou com frio. Um arrepio percorre minha espinha.

Quando chego em casa, confirmo mais um dos meus temores. Minha temperatura está acima dos 38 graus.

Verifico a pressão sanguínea. Desta vez está baixa. Muito baixa. 

Eu me sento na cama, o celular nas mãos. Penso no que essa ligação vai fazer com a minha tia. Com a minha mãe e com o meu pai. Penso no que vai fazer com Ningning e Jimin. Até com Jungkook, que ainda nem aceitou que estou com o coração de Somi. Mas sei que ele não é uma pessoa ruim. Ele é amigo de Jimin e ela é uma pessoa incrível. 

Yongsun atende o telefone no primeiro toque.

— Tudo bem?

O tom dela, aquele toque de medo na voz, me perturba. Talvez ela nunca tenha superado realmente o fato de eu ter ficado doente. Quase posso vê-la passando a mão nos cabelos enquanto caminha de um lado para o outro em seu escritório. Eu me lembro de que, por muito tempo, ela vivia extremamente preocupada. E estou fazendo isso com minha tia novamente.

— Estou com febre.

— Pressão sanguínea? — Ela pergunta automaticamente.

— Baixa.

Eu ouço aquele ruído. O jeito como ela respira. É muito sutil. Mas tão alto… Eu reconheço. É dor. É medo. Sua alma está se quebrando outra vez.

Fecho os olhos. Me desculpe, quero dizer. Eu sinto muito.

— Onde você está? — Ela pergunta.

— Em casa.

— Estou a caminho.

Desligo. Um calafrio percorre a minha espinha. Puxo minhas cobertas e me cubro até o queixo. Começo a tremer. Estou sozinha. Estou assustada. Vou morrer.
Estou ainda pior quando minha tia chega. Ela começa a surtar.

— Tia — chamo sua atenção. — Vai dar tudo certo. — Mas sei que não vai.

Ela liga para a minha mãe e eu as ouço conversando, tentando decidir se ela me leva para o hospital mais próximo ou para o maior. O Seul Hospital.

Decidem que é melhor o Seul Hospital. Meus pais vão pegar o próximo voo e nos encontram lá. 

Entro no carro dela. Levo meu celular comigo, mas ele está desligado. E vai continuar assim.

Tenho dificuldade para afivelar o cinto de segurança. Ela faz isso por mim. Está inclinada sobre o meu corpo. Consegue afivelar o cinto. Seus olhos castanhos e assustados se erguem e encontram os meus.

— Até numa situação dessas você continua linda — digo.

Ela dá uma risada, mas também está franzindo a testa. Ainda acredito que essas são as risadas mais dolorosas; as tristes.

Eu me inclino contra a janela e observo o mundo passar. Lembro-me de ter feito isso quando cheguei à Seul. Algo que parece ter acontecido há uma vida. 

Fecho os olhos e penso no lago de águas cristalinas. E penso no anel em meu dedo. Me pergunto porque não o devolvi durante nossa conversa. Será que foi por que no fundo tinha esperança de que ficaríamos juntas? 

Minha tia não vai me deixar tentar sair do carro sozinha. Ela entra com tudo no acesso para a emergência. Posso ouvi-la gritando. Fecho os olhos com força, como se isso fosse me impedir de ouvir.

Quase imediatamente trazem uma maca até onde estou. Me tiram do carro.

No segundo em que entro na emergência, vejo a dra. Moon. Minha tia provavelmente ligou para ela.

Do outro lado da sala, o olhar dela encontra o meu. E eu vejo. A decepção. Até mesmo um pouco de medo. Ela realmente queria muito me dar vários anos. Espero ter a chance de dizer a ela que está tudo bem. Ela só me deu um ano, mas esse tempo foi bom. O melhor da minha vida.

Yongsun corre até mim. Pega minha mão. Ela está com aquela expressão de quem está carregando o mundo nas costas. 

Eles me empurram para uma sala. Ouço a dra. Moon pedir a minha tia para esperar do lado de fora.

Sou cercada por quatro pessoas. Percebo que devo estar realmente mal, porque não me pedem para tirar as roupas. Em vez disso, começam a cortá-las com tesouras.   
Uma enfermeira está colocando eletrodos no meu peito. Outra está segurando meu braço e tentando enfiar uma agulha na minha veia. Sinto a agulha entrar.

A dra. Moon se aproxima e paira sobre mim. Ela começa a falar rápido o nome dos diferentes exames que preciso fazer. Medicamentos que ela quer que eu tome e a rapidez com que os quer administrados.

— Droga! — Ela pragueja. — Precisamos ser rápidos! O monitor cardíaco está ligado? — Ela grita. — Vamos, gente! Não podemos ferrar com tudo agora!

Eu nunca a vi tão tensa antes. Os olhos dela encontram os meus brevemente. Estão cheios de lágrimas. Ela toca meu rosto. Não posso ouvi-la, mas acho que ela está dizendo que lamenta muito.

E tudo fica embaçado.

Olho em volta e suspiro quando vejo o lago. Mas ele não pareceu tão perfeito assim durante nossa viagem. A água está com uma cor linda, nem muito verde, nem muito azul. É como uma obra de arte. É tudo tão puro. A areia é tão branca…

Vozes soam na minha cabeça.

— Minjeong! Fique conosco. Me escute, fique conosco!

Olho para o lago. Eu me sento na areia. É macia, fina e eu corro os dedos através dela. Quero ficar aqui.

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