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Winter's pov:

"Você já pensou nisso? Como é egoísta e libertador a forma como às vezes o coração não se importa nenhum pouco com o que a cabeça quer."

Fico ali parada, fones de ouvido e uma tela inacabada na minha frente. É curioso eu sentir falta das coisas que eu jurei ter superado. Minha mãe não me liga desde que mudei para Seul. Eu sinto falta de ouvi-la pedir para que eu não viajasse. De escutar ela me dizendo que eu estava tomando um rumo equivocado na vida. Eu sinto falta da sua voz, da sua natureza excessivamente protetora, do seu amor opressor.

Quando eu ligo para casa, ela atende, mas diz que está ocupada e desliga. Parece ter superado a ideia de tentar me convencer a desistir do meu curso. 

Deixo minha tela em segundo plano e ligo para meu pai, querendo saber como estão as coisas em Busan. Ao atender, ele parece tão ponderado como sempre. 

— Oi filha, está tudo bem? — Pergunta.

— Está tudo bem, pai. Na verdade eu liguei porque queria saber como estão as coisas por aí. 

— Estão muito bem. Nosso escritório está fechando acordo com uma grande empresa de infraestrutura. Vamos ficar responsáveis pela administração de importantes contas jurídicas. Foi um dos primeiros lugares para onde oferecemos nossos serviços, mas até então eles nunca tinham aceitado.

— O que fez com que mudassem de ideia?

— Ao que parece tiveram problemas com o antigo escritório de contabilidade. Algo relacionado a desvio de dinheiro e corrupção. Mas de todo jeito é uma notícia boa, Minjeong. Uma notícia muito, muito boa!

— Como eu faço para falar com minha mãe? — Pergunto.

Ele fica em silêncio por um instante.

— Acho que é melhor esperar ela voltar de viagem. Sua mãe está em Icheon para uma conferência, ela foi representando nosso escritório já que eu não podia sair de Busan no momento. Eu falo para ela que você ligou. 

Meu pai pergunta sobre minha saúde, e aviso que já estou com uma consulta de avaliação marcada para o início do mês porque, se ele suspeitar que estou sendo relapsa com isso, vai reagir da mesma forma que a minha mãe e pedir para eu volte para casa. Quando ele desliga, continuo pensando na minha mãe.

Eu estou com saudades. Até do seu emocional confuso e tudo mais.

Respiro fundo, pego meu pincel e permito que minha mente se perca na arte.

[…]

Na manhã seguinte passo na faculdade para ver algumas coisas com meu orientador. Depois vou ao refeitório e não fico surpresa ao ver Ningning me esperando. Me junto a ela e acabamos almoçando juntas.

— Obrigada por me fazer companhia. — Digo quando estamos saindo do prédio.

— Idem. — Ela sorri, virando para mim. — Essa coisa de sermos amigas está dando certo. Não está?

Sorrio enquanto sinto o frio contra minha pele. Não faz muito tempo que eu conheço Yizhuo, mas já percebi que ela é uma pessoa extremamente confiável. 

Ela não espera por uma resposta minha e me acompanha pelo campus.

— Ótimo! Então, deixa eu te contar uma coisa… Giselle vai estar livre no próximo feriado e vamos aproveitar para passar alguns dias na casa de campo dos pais dela. Quero que você se junte a nós.

Ergo uma sobrancelha e dou uma risada.

— Não, obrigada.

Ningning respira fundo e cruza os braços.

— Porque você sempre recusa os meus convites com tanta facilidade? Sou tão insuportável assim? — Ela faz uma pausa,  levando a mão a nuca. — É sério… você pode me dizer se eu for.

Olho para ela, notando que apesar de ainda ter um sorrisinho no rosto, também há uma fragilidade que nunca tinha visto antes. 

— Não é nada disso, Ningning. Eu só não vou segurar vela para você e sua namorada. 

— Isso é bom! É totalmente aceitável. Mas… — Ela sorri e fecha os olhos. — Talvez você consiga usar esses dias para se aproximar mais de Jimin já que Giselle me garantiu que vai levá-la. 

Meu queixo cai e endireito meus ombros.

— Essa é mais uma das suas brincadeiras, né?

— Na verdade, não. — Ela abre um dos olhos para mim, encolhendo-se ante a ideia de que eu possa estar chateada com ela. Eu ainda estou processando o que ela me disse. — Além disso, você tem que concordar que é a oportunidade perfeita.

Olhando para o céu carregado, meu coração batendo acelerado no peito, cruzo os braços.

— O que você está planejando, afinal? 

— Você sabe muito bem do que estou falando, mas parece ser tão cega quando a Karina. E é por isso que alguns dias longe de tudo talvez ajude vocês duas a acordarem.

Olho para ela por mais tempo, sem piscar, com um olhar de choque.

— Não posso fazer isso.

Indo em direção à entrada da faculdade para me afastar da minha nova “melhor amiga”, sou impedida quando Ningning para na minha frente.

— Tudo bem! Me desculpe. Foi errado sair deduzindo as coisas assim e juro nunca mais fazer isso. — Ela fica em silêncio, então suspira. — Não tenho a intenção de ser invasiva sobre sua vida pessoal, Winter. Mas é óbvio para quem vê que o clima fica diferente quando vocês duas estão juntas. E eu fico me perguntando o que vai acontecer se um casal lindo desses não for pra frente! 

Eu não posso deixar de sorrir.

— Você é mesmo uma figura — digo, olhando para a cara de drama exagerada de Ningning. A parte assustadora é que ela parece estar falando muito sério. — Eu nem sei… Talvez Jimin não queira se envolver com outra pessoa no momento. 

Ela sorri e coloca as mãos no bolso do casaco.

— Eu não conheço Jimin tão bem quanto Aeri, mas posso afirmar que ela anda bem diferente desde que te conheceu. E também sei que você se sente bem com ela. Só não quero que nenhuma das duas se arrependa no futuro. 

Meu coração acelera, diante da possibilidade de tudo o que ela diz ser verdade, mas não comento nada. Mordo o lábio inferior e franzo o cenho.

— Está bem, eu vou.

Ela anima-se e olha para mim.

— Você vai?!

— Só se você prometer que não vai fazer nenhuma gracinha durante essa viagem. 

— Eu prometo! — Ela grita, enlaçando seu braço no meu.

— E preciso conversar com você sobre algumas coisas. — Digo, assumindo um tom mais sério. Não costumo falar abertamente sobre meu transplante porque não quero ninguém me tratando como doente, mas aqui a situação é diferente. 

Ningning é rápida em entender sobre o que quero conversar.

— Isso tem relação com as restrições que comentou da vez que saímos para o café?

— Sim, tem.

Ningning faz uma pausa e olha para mim com aquela expressão de tristeza que eu aprendi a odiar. Então desvia o olhar e pigarreia.

— Tudo bem. Ainda temos uma hora antes de você entrar na galeria, vamos ao café. Podemos conversar lá. 

[…]

Depois que me despeço de Ningning, vou até o Yongsan Park, como em quase todos os dias. Por um segundo, acho que estou sonhando quando vejo Jimin parada de baixo de uma árvore. Ela encara o lago que a essa altura da estação já está inacessível. O gramado coberto por uma fina camada de neve. As mãos dela estão enfiadas nos bolsos do casaco.

— O que faz aqui nesse horário? — Pergunto, me aproximando.

Ela me lança um olhar surpreso, então sorri. Paro ao seu lado e nós duas encaramos o lago juntas.

— Resolvi passar aqui antes de ir para a galeria — ela diz. — Queria conferir o avanço do inverno por Seul, mas parece que agora as coisas estão mais intensas.

— Então acho que chegou minha hora de brilhar. Não devo ter ganhado esse apelido a troco de nada. 

Ela dá uma risada. É estranho, mas o som da sua risada me dá vontade de sorrir e de me aconchegar nela ao mesmo tempo. 

— Acho que vou precisar aprender a lidar com isso. E pelo visto você não vai conseguir finalizar aquele seu desenho agora.

— Vou precisar esperar o clima melhorar — falo, indicando o lago com a cabeça. — Se eu ficar muito tempo debaixo dessa neve vou acabar congelando também.

— Tenho certeza de que cada minuto vai valer a pena. A gente devia ter passado mais tempo aqui antes do clima piorar. 

Ela puxa o cachecol contra o rosto e tira a neve que há nos sapatos.

Um vento frio passa entre os galhos das árvores.

— Você não devia ficar tanto tempo nesse frio — censuro.

— Não se preocupe, está tudo bem — Ela diz, ainda olhando para o lago. 

Jimin passa a mão nos cabelos e desvia o olhar do lago. 

A neve começa a cair sobre nós. Delicados flocos brancos cobrindo a cidade. Eu estou com frio, mas não muito porque Jimin sempre faz meu coração aquecer. Ela respira fundo e fecha os olhos. Eu quero contar. Quero dizer que estou me apaixonando por ela, que é difícil me concentrar quando ela diz meu nome ou fala sobre arte ou sorri.

Ficamos em silêncio por um tempo, vendo os flocos de neve caírem.

— Acho melhor eu ir para a galeria — falo.

— Eu também.

Silêncio.

— Minjeong?

— Jimin?

— O que aconteceria se eu te beijasse?

— Se você me beijasse?

Fico encarando seus lábios. Solto o ar lentamente.

— Bem, tudo mudaria.

— Isso seria uma coisa ruim?

Minha voz fica trêmula, e sinto as palmas das mãos começarem a suar. Eu não quero olhar nos olhos dela, então fico encarando o parque.

— Eu não sou uma pessoa tão bem resolvida quanto pode parecer, Jimin. Ainda estou nesse processo. E embora já tenha passado por muitas situações na vida, continuo em aprendizado. Só queria que você soubesse disso.

Ela vira-se para mim, colocando uma mecha de cabelo atrás da minha orelha.

— Olhe para mim, Minjeong… Eu sou a pessoa mais cheia de questões mal resolvidas que conheço. Se tem alguém aqui com motivos para se afastar, esse alguém é você. É compreensível. Eu nem vou ficar com raiva se você decidir fazer isso. Na verdade, até eu faria.

— Eu nunca faria isso — digo com confiança.

Ela põe a mão na minha nuca. Se aproxima. Passa a respirar mais devagar. Nossos lábios estão a milímetros de distância. Eu não consigo parar de encarar a boca dela, e acho que ela também está encarando a minha. Ela passa a mão na minha bochecha e olha nos meus olhos.

— O que quer que tenha feito você duvidar do quanto é incrível, o que quer que tenha te machucado… Você pode se abrir comigo sobre isso. 

— Você pode fazer o mesmo? 

— Como assim?

— Compartilhar sua dor comigo, por que esse fardo que você está carregando, seja ele qual for, eu quero ajudá-la a se libertar dele.

Seus lábios se aproximam e, quando encontram os meus, sinto sua mão nas minhas costas. Uma sensação de calor e de proteção percorre meu corpo inteiro. Inclino a cabeça para a esquerda, intensificando o toque enquanto coloco os braços ao redor do seu pescoço. 

Nossos lábios se tocam com suavidade, mas respiro fundo no momento em que sinto sua língua timidamente tocar a minha. Então nossos lábios se conectam de uma forma que eu nunca experimentei. É preciso criar um novo adjetivo para esse tipo de beijo, porque nenhum dos que conheço podem ser aplicados a ele. 

Nenhuma garota nunca me beijou do jeito que ela me beija. Eu nunca soube que beijar poderia despertar tantas emoções.

Quando meus olhos se abrem, ela está me encarando com os mesmos olhos castanhos de sempre. Afasto minha boca lentamente, mas de alguma maneira parece que ainda estamos nos beijando. Secretamente, desejo que essa sensação nunca desapareça.

— Minjeong, você é especial — Ela diz, com as pontas dos dedos massageando lentamente minhas costas. — E estou feliz por ter conhecido você.

Esse foi o beijo mais cheio de significado que eu posso imaginar, e por isso ele foi o melhor de todos.

Quando ela se afasta, seu celular toca e eu vejo o nome da Sra. Bae na tela. Jimin atende rapidamente. O que começa com um sorriso e um “oi, e aí?” rapidamente se transforma em Jimin franzindo o rosto e endurecendo o maxilar.

— Estou indo agora.

Ela desliga o celular e o coloca no bolso do casaco.

— Acho melhor voltarmos para a galeria.  

— O que aconteceu? — Pergunto, tocando no seu antebraço.

— Parece que minha mãe está tendo problemas por conta da viagem do professor Park. — Ela diz, passando a mão no cabelo. — Não é nada grave, mas de qualquer forma ela quer conversar comigo sobre o assunto. 

Seu semblante está sério, então reajo do mesmo modo. 

— Fica perto daqui. Eu vou com você. 

Ela assente com a cabeça e segura minha mão, seu toque eletrificado algo em mim.

Eu não tenho certeza se posso, mas estou me apaixonando por ela. Cada segundo contém mais amor do que o anterior. Eu não sei se uma garota como eu pode se apaixonar por uma garota como ela. Minha cabeça não para de me dizer que é errado, que eu não devo considerar uma ideia tão absurda.

Mas meu coração… meu coração acredita em um tipo de amor simples e tranquilo. Um tipo de amor criado antes mesmo do tempo, mais forte do que quaisquer barreiras que o mundo possa impor sobre nós. Um tipo de amor que é visto somente pelas almas de duas pessoas.

Meu coração não me dá muita escolha.

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