Capítulo 3
Pisquei. Não satisfeita, pisquei novamente, minhas pupilas cravadas às dele, que mantinha no olhar à expectativa da resposta. Seus dedos longos roçaram os meus, e ainda que estivéssemos em um ambiente aquecido, pude sentir a frieza que vinha deles.
— Boa pegadinha. É pra algum vídeo do YouTube? — Perguntei, olhando para os lados, procurando alguma câmera escondida. Tinha certeza que estava em alguma pegadinha feita para arrancar views, aquilo não podia ser real.
— Não é pegadinha. — Seu tom sério assumiu uma genuinidade assustadora. Os dedos que apenas roçavam os meus até o momento, agora seguravam-o, ocasionando sensações estranhas em meu corpo e mente.
— Isso.. isso não pode ser real! E não é possível, e eu estou de partida, então..
— É, você vai embora daqui a 3 dias, eu sei. — Arqueei as sobrancelhas. Ele não podia simplesmente esperar que eu terminasse a frase!? — Vamos ter que fazer alguns ajustes. Só preciso de um dia inteiro ao seu lado, tá livre amanhã?
— Você não está entendendo.. É que tudo isso é muito louco.. — Meus olhos pareciam acompanhar o ritmo acelerado do meu coração. Tudo bem que pessoas se conhecem e se relacionam em um único dia, mas o que ele estava me propondo ia um pouco além.
— Pra mim, é simples. — Ele cruzou os braços, finalmente deixando a minha mão. Estranhamente ela parecia incompleta. — O que você tem a perder? Depois que pegar aquele avião, serei só um japonês louco, que deixou a sua pré-viagem mais emocionante.
Juntei a curvinha entre os olhos, mal acreditando que eu estava pensando na proposta. Além de ser lindo, Sasuke Uchiha ostentava uma vasta oratória. Certamente, ele não era o tipo de aluno que tinha problemas para apresentar um trabalho na frente de toda a classe, diferente de mim, que encarava a tarefa como um porco encarava o abate.
— Caso a minha resposta seja sim. — Comecei, suspirando. Meus dedos frenéticos alternavam entre mexer nos hashis, e tamborilar a mesa. — Como seria isso? Acredito que não seja só ficar junto e pronto.
— Ah, certamente não é. — Sua expressão mudava com o meu suposto interesse no assunto, passando a assumir um tom luxurioso. Naquele momento, posso dizer com clareza que senti uma batida errada em meu coração. — A proposta consiste em conhecermos o interior um do outro, além da convivência. Algo que não compartilhamos com frequência, ou que não temos coragem de contar para ninguém.
Arqueei as sobrancelhas. Como raios aquilo seria eficiente? Em 5 anos de relacionamento, havia assuntos que eu nunca mencionei com o meu ex, e certamente era recíproco. Como eu ia confidenciar todas as coisas que nem o meu reflexo sabia, para um completo desconhecido!?
— Eu sei, eu sei. Parece duvidoso. — Ainda bem que ele havia notado. Me poupava do trabalho de comentar. — Mas vai funcionar.
— Começo a achar que você viu esse artigo em uma thread do Twitter. — Suspirei, derrotada. Aquele cara era um maluco, e eu infelizmente estava batendo palma para ele dançar. — Tá. Como isso funciona na prática? — Pelo sorriso dele, parecia que eu havia chegado ao clímax de um ato muito importante. As duas covinhas acenavam para mim, tão atraentes como o todo.
— Uma sessão de perguntas e respostas, minha cara. — Alguém deveria impedi-lo de piscar despretensiosamente. Isso fere todas as barreiras da resistência. — E depois, no final da experiência, iremos nos encarar por 3 minutos, sem dizer nada. Nossos olhares serão responsáveis por dizer tudo o que sentimos.
Ok, aquilo era muito doido. E eu devia estar doida também, porque estava tentada a aceitar. Era como um Tinder, mas ao vivo. Se a conversa fosse merda, aquele cara nunca mais me veria, e eu ainda teria material para comprovar que meus últimos dias como uma pré-universitária foram loucos.
— Certo. — Abri um sorriso, deixando a minha cabeça cair para o lado. Estava pronta para aquilo. — Posso começar?
— Faça as honras.
— Então, Uchiha.. — Despretensiosamente, dirigi o meu indicador até as mechas onduladas, enrolando-as em meus dedos. Sorri ao perceber que estava sendo observada. — Quantas garotas já caíram no seu papinho galanteador? — Ah, as covinhas. Aquelas covinhas apareceram à medida que ele colocava o seu cabelo para trás, procurando o melhor jeito para responder.
— Você é a primeira.
— Então quer dizer que sou uma cobaia?
— Quer dizer que é a minha vez de perguntar. — Seu sorriso parecia tomar todo o seu rosto, ao ver que havia conseguido me irritar. Bufei e dei de ombros, me encostando mais na cadeira, imaginando que os hashis que eu segurava com força fossem o rostinho lindo de Sasuke Uchiha. — Por quê rosa?
Por um instante, arqueei as sobrancelhas, olhando ao redor à procura do motivo de sua pergunta. Soltei um pequeno “ah” quando descobri. Ele perguntou sobre o meu cabelo.
— Não sei. — Dei um suspiro relaxado, tentando achar alguma resposta mais conveniente. Não havia. — Acho que eu só olhei para a tinta, ela olhou para mim, e funcionou.
— É uma cor muito bonita. — Disse ele, me fitando de um modo profundo. Desviei o olhar, desconcertada. — Destaca os seus olhos. Que também são bonitos.
Corei. Ah meu Deus, ele não usaria a tática do elogio, não é? E por quê aquele comentário extremamente clichê ocasionava tantos fogos de artifício em meu estômago!?
— Minha vez. — Comprimi os lábios, tomando fôlego antes de continuar. Não deixaria que ele percebesse que seu comentário acertava pontos estratégicos do meu coração. — Me diga que você não deu um google para saber o que eu estava cantando.
— Não, não. — Uma risada baixa ecoou de seus lábios antes que ele continuasse. — O Akito realmente gosta dessas coisas. Acho que sei todas as aberturas de trás para frente.
“Akito” devia ser o sobrinho dele. Assenti, pensando que conviver diariamente com crianças era complicado.
— Uma pessoa que você admira. — Ah, estava aí. As perguntas pessoais que ele havia mencionado no começo.
— Minha mãe. — Respondi de imediato, abrindo um sorriso no processo. Imediatamente, minha expressão e voz se tornaram mais suaves. — Ela é uma médica incrível. Eu amo o como ela parece forte, mas eu sei que parte dessa fortaleza é para que eu não me sinta incapaz de conseguir o que quero. Eu devo tudo, tudo o que sou hoje à ela. — Mordi o lábio inferior, impedindo que mais palavras saíssem da minha boca. Preferia que as lembranças de nossas noites de cinema com pipoca e suco de laranja, ou o dia de beleza que tiramos só para jogar conversa fora, ficassem apenas comigo. — E você?
— Vou ter que burlar um pouco a pergunta. — Começou, abrindo um sorriso que evidenciou apenas a covinha esquerda. — Admiro o relacionamento do meu irmão com a minha cunhada. Eles são o tipo de casal que são a metade um do outro. — Seu sorriso aumentava, à medida que as lembranças invadiam a sua mente. — Itachi estava com tanto medo no começo, mas ele é um pai e tanto para o Akito. Os dois fazem de tudo por aquele moleque.
Se eu não estivesse prestando atenção em cada detalhe de seu rosto, não teria percebido o curvar de seus lábios para baixo, ao mesmo tempo que falava sobre o relacionamento do irmão com o sobrinho. Uma pequena ponta de tristeza alcançou os seus olhos, e mesmo sem saber o por quê, tive vontade de segurar em sua mão.
— Me fala uma coisa boa. — Pediu ele, me tirando do transe antes que eu tomasse a iniciativa de juntar minha mão à dele. Quando olhei novamente em seu rosto, Sasuke já estava sorridente novamente, mas por algum motivo, sentia que esse sorriso não chegava ao seu coração.
— Uma coisa boa..? — Perguntei, precisando de algum tempo para decidir se aquilo era uma pergunta. Talvez fosse. — Um dia, em uma apresentação da escola, eu queria ser a princesa abelha. Mas como a escolha cabia à professora, acabei ficando no papel de árvore. É claro que eu chorei muito, me recusando a aceitar aquele papel.
— E o que aconteceu depois? Você conseguiu ser a princesa abelha?
— Não. — Balancei a cabeça em negação, abrindo um sorriso, perdida em minhas próprias memórias. A imagem da minha mãe limpando as minhas lágrimas inundava a minha mente, junto de suas palavras. — Eu cheguei em casa muito triste, dizendo que eu não queria mais estudar. Disse que a árvore não tinha nenhuma utilidade, e que ninguém repararia em mim. — Sasuke acompanhava a história, atento. Talvez estivesse esperando a parte boa. Não neguei isso a ele. — Minha mãe secou as minhas lágrimas, e disse que isso não era verdade. Ela me disse que a princesa abelha podia ser a principal, mas que todos os que estão em um papel de destaque, em algum momento da vida já tiveram um alicerce que os permitiram estar onde estão. E a árvore era esse alicerce. É onde a abelha produz a sua colmeia, onde o passarinho constrói o seu ninho, serve de sombra para que os animais descansem. Naquela peça, eu representaria a coisa mais importante que temos, e que nos liga como indivíduos: a vida. — Sasuke aplaudiu quando terminei, os olhos vívidos, e as covinhas expostas. Agradeci com uma risada, me sentindo vívida também. — E foi assim que eu fui a árvore mais feliz daquela peça. Por causa das palavras de uma médica que sabia utilizar as palavras necessárias para convencer uma garotinha de 5 anos.
— Sua mãe é uma mulher incrível.
— Ela é, sim. — Continuei sorrindo, o coração apertado ao pensar na saudade que eu sentiria dela. — Agora é a sua vez. Me conta uma coisa boa.
— Hmmm.. — Começou ele, sorrindo. — Eu adorava passar as férias de verão em Nagano, na casa dos meus avós maternos. E a melhor coisa da viagem eram os festivais de verão. — Abrindo um sorriso saudoso, ele continuou. — Quando eu tinha uns 8 anos, acho, fomos passar alguns dias lá e eu como sempre, decidi ir brincar na praia com o meu irmão e os meus primos. Porém, eu já estava meio gripado alguns dias antes, então a minha mãe recomendou que eu não entrasse na água, ou os sintomas poderiam piorar e eu não poderia assistir os fogos de artifício.
— Algo me diz que você a desobedeceu.
— Uma lição que eu aprendi depois desse dia, mesmo que eu tenha cometido mais algumas desobediências depois. — Ele piscou um dos olhos, soando divertido. — Todo mundo estava na água, e ela parecia muito convidativa. Eu achei que não teria problema se eu ficasse só um pouquinho, mas você sabe como é a noção de tempo de uma criança. Quando saímos, o sol já estava se pondo, e eu, assim que coloquei os pés na areia, comecei uma sessão de espirros que só aumentou quando cheguei em casa. Minha mãe me viu molhado, trêmulo e com princípio de febre e apenas nos encarou. Como eu estava doente e era o mais novo, quem teve que ouvir a bronca foi o Itachi. Lembro até hoje do olhar assustado diante da cara de brava da mamãe. — Ele riu, parecendo estar vivendo o momento. — Mesmo tendo sido poupado da bronca, eu não podia ir ao festival. É claro que eu estava muito triste com isso. Minha mãe também ficou, para cuidar de mim. Ela estava chateada pela minha desobediência, é claro, mas ainda era a minha mãe. Vendo que eu estava cabisbaixo, ela pegou os materiais de pintura do vovô, e começou a desenhar o céu iluminado pelos fogos. Ela me perguntou se eu queria ajudá-la, e a partir daquele momento, eu esqueci dos fogos lá fora. Todas as cores que eu imaginava estavam na minha frente, desenhadas pela minha mãe. — Sasuke estava com os olhos fechados e um sorriso vacilante no rosto, aquele tipo de sorriso que antecede a tristeza. Apesar de ser uma lembrança boa, para ele, parecia uma memória de um tempo que não voltaria mais.
— Sua mãe também parece ser uma mulher incrível. — Comentei, tirando-o daquela aura turva que o rodeava. Fui respondida com um sorriso que eu sabia não ser totalmente genuíno, mas por mais que eu quisesse, não tinha coragem de perguntar o motivo.
— Ela é. — E na mesma rapidez da resposta, veio a pergunta. — O que tem na sua barra de pesquisa?
Podia dizer que odiava o modo como ele mudava de assunto tão rápido, parecendo ter uma facilidade incrível nisso. Suspirei, dando um tempo para que meu cérebro se acostumasse com aquela troca. Nossas mentes não funcionavam no mesmo ritmo.
— Você por acaso está querendo saber se eu pesquiso métodos confiáveis para esconder um corpo? — Brinquei, pegando o celular.
— Se isso estivesse na sua barra de pesquisa, eu estaria com problemas. — Ele respondeu, entrando na brincadeira. — Não sei se eu fugiria.
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Oii, corações! Então, finalmente chegou a parte das perguntas e a gente pode conhecer um pouco mais do nosso casal <3 O que vocês estão achando do andamento da fic até agora? Se preparem que logo logo terá surpresas.. Até a próxima!
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