VI
Scarlett estava deitada em sua cama tentando não chorar mais, pois sua cabeça parecia estar prestes a explodir. Tudo estava uma completa confusão para ela entender, parecia tão cruel o rumo que sua vida estava levando. Nada que tinha sonhando havia se realizado, nem mesmo o menor detalhe.
Fungou, queria conseguir dormir, mas não conseguia fazer isso com milhões de pensamentos lhe atormentando. Não conseguia encontrar a paz, mesmo que rezasse e pedisse a Deus, achava que não conseguiria. Estava abalada e magoada demais.
— Scarlett? — ouviu a voz da sua irmã chamá-la.
— Charlotte, não quero conversar com ninguém.
— É preciso que diga o que sente em seu coração.
— Eu já disse o que era preciso.
— Tenho doces.
Scarlett revirou os olhos. Sabia que era comprada por doces, em qualquer situação em que estivesse, ela se rendia a eles.
— A porta está aberta.
Charlotte entrou com uma bandeja cheia de doces. Seus cabelos estavam soltos e trajava sua roupa de dormir. Apesar da simplicidade, ela estava tão linda e adorável, que Scarlett sentiu-se até um pouco melhor por estar com sua irmã por perto, ainda mais lhe trazendo doces.
— Seriam servidos depois do jantar, mas como não houve jantar. — Charlotte fechou a porta. — Está se sentindo melhor?
— Não.
— Pensei que mentiria. — colocou a bandeja sobre uma pequena mesa. — Não espere que eu vá servi-la. Levante seu corpo preguiçoso dessa cama de uma vez, querida.
— Sabe o que é estranho, Charlotte?
— Não, o que é estranho?
— Estar com a sensação de que isso sempre esteve em minha frente para acontecer, mas eu fechei meus olhos para tudo quando cheguei em Cambridgeshire.
— Oh, papai foi errado.
— Por favor, evite falar sobre ele em minha presença. Ainda dói.
— Claro. — ouviu Charlotte mastigar alguma coisa. — Venha comer comigo.
Scarlett levantou-se e pegou uma pequena torta.
— Quando partiremos para a Escócia mesmo?
— Dentro de poucos dias. Estou ansiosa para rever Phoebe e meus sobrinhos.
— E nosso primo? — Scarlett sorriu.
— Tenho notado a presença de Frederick em Londres constantemente. Isso me preocupa, não por ele, claro, mas por nossa irmã.
— Como sabe das visitas constantes dele?
— Contaram a George.
— Ele estava em lugares...
— Estava. — Charlotte amassou um biscoito com força. — Isso está me matando por dentro, pois Phoebe não merece um tratamento como esse.
— Jamais esperei tal comportamento de Frederick. — Scarlett mordeu a torta, que era de morango com alguns pedaços de amora. — Phoebe nunca me disse nada através das cartas.
— Nem a mim. Talvez queira manter a imagem de casamento perfeito para a família.
Scarlett terminou de comer a torta e pegou outra.
— Quero que peça a George desculpa por mim. Ele não é obrigado a presenciar brigas familiares Harrison no palácio dele.
— Ele é meu marido. Automaticamente nossas famílias se tornaram apenas uma ao nos casarmos, ele compreende.
— Não importa, faça o que eu estou pedindo.
— Sim, Majestade.
— Engraçadinha. — apontou o dedo para a irmã.
— Eu sei. — um sorriso diabólico surgiu nos lábios de Charlotte.
— O que está pensando em fazer?
— Eu? Nada.
— Nunca foi boa mentindo.
— Estive pensando que o rei Adam está...
— Pelo amor de Deus! Não vou ser consolo do viúvo!
— Acalme-se! — Charlotte começou a rir. — Mas poderiam formar um par.
— Não vou lhe responder nada.
— Ora, por que isso lhe desagrada tanto? Disseram-me que ele é bonito, os filhos são adoráveis.
— Você não é cúpido, Charlotte.
— Infelizmente não. — bocejou. — Preciso ir para meu quarto, estou cansada.
Scarlett beijou a bochecha de Charlotte e a levou até a porta.
— Obrigada por ter vindo até aqui.
— Mais do que minha obrigação.
— Não é obrigação nenhuma a irmã mais nova cuidar da mais velha. Soa tão ridículo, que vou fingir que isso nem está acontecendo.
— Que grande besteira. — Charlotte revirou os olhos. — Durma bem e sonhe com os campos da Escócia.
Charlotte saiu, deixando Scarlett sozinha mais uma vez com seus pensamentos conturbados.
♔♔♔♔
Os dias que se seguiram foram agitados com a aproximação da viagem para Edimburgo. O palácio estava em verdadeira comoção para deixar tudo em perfeita ordem, sem nenhum defeito. Scarlett, em seus passeios pelo palácio, notou como cada trabalho, mesmo que mínimo, era feito com delicadeza e precisão.
Foi até a sala de música, que estava vazia e pegou o violino que estava em cima do piano. Fazia tantos anos que não tocava, que provavelmente não lembrava mais como fazia aquelas cordas ganharem vida. Amava a música, mas tinha banido ela de sua rotina fazia algum tempo.
— Scarlett? — ouviu a voz de Millie.
— Oh! — assustou-se.
— Vai tocar violino?
— Não... — colocou o violino em cima do piano novamente.
— Por um momento pensei que tocaria. Sempre imaginei a tríade Harrison tocando juntas.
— Ah, Charlotte disse.
— Sim, piano, violino e flauta. Que belo concerto seria.
— Tocávamos bem.
— Por que parou?
— Não encontrei mais sentindo para continuar com a música.
— Mas música nos ajuda em todos os momentos possíveis. Alegria, tristeza, dor, amor. — Millie entregou o violino para Scarlett. — Deveria voltar a tocar violino e encantar a todos que estão ao seu redor. Meus dedos estão doloridos de tanto tocar piano, não quero perder a prática jamais.
— Seu amor pelo o instrumento é grande demais.
— Nunca sentiu o mesmo pelo violino? — os olhos castanhos de Millie brilharam.
— Sim, meus dedos ficavam doloridos também. Eu gostava de atingir a perfeição, nada pela metade. — voltou a colocar o violino em cima do piano. — Mas percebo que realmente não vejo motivos para voltar a tocar.
— Se encontrar motivos, voltará a tocar?
Scarlett nunca parou para pensar sobre voltar a tocar violino, pois nunca foi algo a ser considerado. Não tinha uma resposta para a princesa, para sua surpresa. Apenas negou com a cabeça, e percebeu uma expressão de decepção se formar no rosto dela. Millie era tão fofa e delicada, que Scarlett não queria vê-la com aquele rostinho decepcionado.
— Não precisa ficar chateada.
— Estou apenas...
— Decepcionada?
— Exatamente.
— Estou em uma fase tão chata e atormentada, Millie. — suspirou. — Preciso esquecer até de mim mesma, por algum tempo.
— Qualquer coisa, podemos conversar. — deu de ombros.
— Não quero estragar sua cabeça com meus problemas. — começou a caminhar para fora da sala. — Vou para meu quarto descansar um pouco.
— Bom descanso. — Millie sorriu.
— Obrigada.
Scarlett saiu da sala apressadamente, mais um minuto lá, choraria e falaria tudo que estava preso em sua garganta. Coisa que não desejava fazer, pois não queria mostrar sua fraqueza mais uma vez. Não mais.
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