9. O Mar (p.2)
Eles caminharam por um tempo razoavelmente longo, enquanto o céu se iluminava gradualmente, para uma cor alaranjada. No céu ainda era visível a lua, em sua fase minguante. Parecia demarcar o céu: um lado dia, o outro noite.
Arthur não parecia tão diferente do céu. Agia como se estivesse animado por leva-la até lá, mas oscilava, e deixava transparecer uma certa melancolia, como se tudo o que ele quisesse fosse ir para casa.
Mas logo Lívia já nem conseguia pensar nisso. Algo começou a funcionar como um imã dentro dela, a puxando na direção norte. Ela já sabia o caminho, e não esperava mais para ser guiada ele.
Em algum momento, ela o ouviu a chamando.
— Espera! — ele dizia, seguindo-a apressado. — por que está correndo?
Ela nem havia percebido que estava andando rápido, então desacelerou.
Sentia o cheiro salino no ar, era divino. Havia um barulho forte também, como um trovão distante.
— Estamos perto — disse Arthur. — Espera um minuto.
Lívia teve que exercer um autocontrole heroico para se manter parada. Quando olhou para ele, Arthur estava sorrindo.
— Fecha os olhos — ele disse.
— O que?
— Fecha os olhos, confia em mim, eu digo quando abrir.
Lívia hesitou, mas acabou assentindo e fechou os olhos. Sentiu quando Arthur a pegou pela mão.
— Eu te levo. Confie em mim.
Lívia aceitou ser guiada às cegas. Arthur segurava sua mão firmemente, transmitindo segurança para ela, não tinha medo de tropeçar ou cair. Pouco a pouco o cheiro e o som foram se intensificando, e Lívia sentiu dentro dela a proximidade com uma quantidade absurda de água.
— Acho que você vai querer tirar os sapatos, mas não abra os olhos. — disse Arthur ao seu lado, e ela se apoiou nele, tirando os tênis desajeitada. Sentiu a areia fofa sob seus pés, entrando entre seus dedos.
— Isso é bom — disse ela e sorriu com prazer, ainda com os olhos fechados.
— Vem — chamou ele, a puxando suavemente pela mão.
Em alguns passos, ela sentiu a areia se tornar firme, e o chão estava inclinado, jogando seu corpo para frente.
O vento assobiava em seus ouvidos, e o barulho agora era muito alto. Gotículas de água salgada respingavam em seu rosto.
— Pode abrir os olhos.
Ela abriu. E ficou sem palavras.
Quando imaginava o tamanho do mar, jamais pensaria em algo de tamanha proporção.
As ondas quebravam sequencialmente, jogando sprays de agua para o ar. Era isso que fazia o barulho. A água refletia o sol que começava a nascer, colorindo o dia.
Seu corpo se arrepiou e ela respirou fundo tentando sorver aquilo.
Era fácil compreender o que Diana havia dito sobre sua mãe. Alice amava o mar, e agora era óbvio pra Lívia o motivo.
— O que acha disso? — Arthur perguntou ao seu lado. Lívia notou que eles ainda estavam de mãos dadas, mas não se importou. Teve medo que se ele a soltasse ela impulsivamente fosse correr para a água e se perder para sempre.
— É simplesmente a coisa mais incrível que eu já vi na vida.
Ele sorriu docemente e se aproximou dela, passando o braço livre por sua cintura, de forma que agora eles estavam de frente um para o outro.
— O objetivo é agradar.
Para a surpresa de Lívia, Arthur a beijou na boca, como se isso fosse completamente normal. Os lábios dele estavam salgados e gelados e o contato remeteu ao dia em que se conheceram, rolando na grama e dando beijos sob o efeito do álcool.
Mas isso era diferente. Era real, e no fundo, ela sabia o que estava acontecendo.
Então o afastou.
— O que você está fazendo? — ela perguntou.
Ele riu a soltando devagar.
— Eu chamo de beijo.
— Mas por que está me beijando? — ela olhava para ele sinceramente confusa.
Arthur franziu o cenho, os olhos verdes se destacando logo abaixo das sobrancelhas e dos cílios escuros.
— Eu preciso de um motivo, exatamente?
— Bom, eu não estou entendendo — disse ela o encarando com as sobrancelhas erguidas. — Primeiramente, já disse que não estou apaixonada por você, e pensei que você tivesse entendido. Segundo, eu sei que você dormiu com Diana.
Arthur pareceu definitivamente surpreso.
— ...mas como?
Lívia sorriu, satisfeita consigo mesma.
— Então, você dormiu com ela?
Ele deu um sorriso torto.
— Acho que acabei de ser enganado, e admiti informações particulares.
— Eu já desconfiava — disse Lívia. — era muito cedo pra você estar na casa da Diana, a não ser que você tivesse dormido lá. E a cama no quarto de hóspedes também estava muito arrumada.
Lívia notou que ele parecia entretido. Como se a conversa tivesse relaxado um pouco da sua tensão.
— O que eu não entendi, foi o motivo de você vir me beijar — completou ela.
— Não devia ter feito isso — admitiu ele. — mas queria ter certeza que você não gostava de mim.
— Mas eu gosto de você — disse ela e riu. O vento assoprou uma mecha de cabelo em seu rosto e ela a tirou impaciente. — Mas não desse jeito.
Arthur sorriu.
— Então acho que este problema está resolvido.
Lívia assentiu, mesmo sem entender bem qual era exatamente o problema.
***
Arthur não conseguia descrever como estava aliviado. Ele e Lívia estiveram por mais algum tempo na beira do mar e ele notou que ela parecia radiante, mais feliz do que ele já tinha visto desde que se encontraram. E podia imaginar o motivo.
Quando se conheceram, Lívia ainda estava de luto por sua tia. E se sentindo sozinha.
Podia imaginar como ela devia ter ficado desesperada, sozinha naquele lugar. Nunca havia nem mesmo pensado no quanto ela devia ser forte para suportar isso.
Depois, ele a trouxe para Alexandria, e ela viveu escondida desde então, presa dentro de casa. Lembrava-se do segundo dia dela ali, quando, discutiu com ele porque queria sair, mas parou de insistir quando descobriu que haviam pessoas dispostas a mata-la.
Só nesse momento ficou chocado consigo mesmo. Como pôde tira-la de casa? Isso era perigoso! Alguém poderia vê-los.
Apressou-se a chama-la de volta pra casa, e ela aceitou depois de alguma resistência.
Acabaram correndo um pouco pra chegar logo. O dia já estava claro, e chegaram a porta de Diana suando e ofegando. Estavam rindo de alguma coisa, mas se esqueceu do que era quando viu a feiticeira.
Estava de pé, apoiada nas costas do sofá, com os braços cruzados e seus cabelos escuros ondulando ao redor deles e desaparecendo atrás dos ombros. Seu rosto era uma máscara fria, mas sua voz pareceu ainda mais gelada quando ela falou.
— Lívia, me espere no seu quarto.
Lívia não pareceu satisfeita.
— O que? Não me dê ordens! — irritou-se ela.
— Vá agora, eu não vou repetir.
Lívia grunhiu e saiu da sala pisando duro, claramente irritada.
O olhar de Diana a acompanhou ate que ela sumisse de vista, então olhou novamente para Arthur.
— Que droga foi isso, Arthur Paeon? — Diana parecia exasperada. — Enlouqueceu?
— Levei Lívia para um passeio, ela está presa aqui há dias — disse Arthur para ela. — E não era isso o que você queria? Não queria que eu me aproximasse dela?
— Passeio? Um passeio? — Diana parecia incrédula, olhava para ele com a boca torcida. — Se alguma coisa acontecer... Se alguma coisa acontecer com ela por sua culpa. — Ela fixou as ultimas palavras.
— O que? Vai me colocar de castigo? — Arthur perguntou com tom de sarcasmo. — Sinto muito, mas acho que já estou meio grandinho pra isso.
— Não. Você é um homem, Arthur, tem idade suficiente pra cuidar da própria vida. Tomar as próprias decisões. Mas faça algo assim novamente — sua voz ganhou um tom de ameaça, o cenho estava franzido — e nunca mais vai ver Lívia novamente. Faça algo assim novamente, e vai se arrepender.
— Não pode mantê-la em uma torre de marfim!
— Acredite — disse ela. — Eu posso.
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