11. Entre Versos e Estrofes (p.3)
— Bom dia! — disse Arthur animado entrando na cozinha seguido por Diana. Chloé e Lívia se entreolharam, e enquanto uma fez um rápido movimento com a sobrancelha, a outra respondeu dando de ombros.
— Bom dia — disse Lívia aos recém chegados.
— Fiz chá — Anunciou Chloé.
— Por Merlin! — disse Diana arregalando os olhos. — Acabo de me lembrar que tenho umas poções pendentes.
A feiticeira deu meia volta e andou até a porta, deixando a cozinha. Arthur apenas deu de ombros, antes de se servir do chá e sentar à mesa junto com as duas.
— Você e Diana parecem bem — comentou Chloé.
— Alguma de vocês duas tem alguma ideia do que fazer em relação a Miguel? — ele perguntou, ignorando a irmã.
Elas se entreolharam. Haviam conversado um pouco sobre isso, e a própria Chloé achava que não era seguro contar para Miguel toda a verdade, que era a sugestão de Lívia.
O que era estranho era a falta de confiança de Chloé no próprio namorado, mas Lívia concluiu que isso deveria apenas significar que ela o conhecia muito bem — bem o suficiente para saber o que ele faria se descobrisse tudo o que eles andavam escondendo sobre ela.
— Não sabemos — Chloé respondeu. — Esperávamos que você e Diana tivessem pensado em alguma coisa.
Ele sacudiu a cabeça.
— Nada.
— Precisamos chamar ele pra vir aqui — anunciou Lívia, finalmente bolando algo em sua cabeça. — Vamos mascarar os fatos, as melhores mentiras são baseadas em verdades.
Os irmãos a encararam surpresos. Arthur pausou no ato de morder uma fatia de pão.
— Onde você aprendeu isso? — perguntou Arthur, parecendo perturbado.
Lívia balançou a cabeça impaciente.
— Eu não sei, e tanto faz — disse com desdém, olhando em seguida para Chloé à sua esquerda. — Pode chamar ele?
— Eu posso, mas você devia pedir autorização de Diana primeiro — ela respondeu.
— Ótimo. — disse Lívia e se levantou para sair da cozinha, deixando Arthur e Chloé confusos com sua repentina mudança de comportamento.
Bateu à porta do quarto que Diana chamava de Sala de Magia, mas não esperou a feiticeira e foi abrindo a porta, e espiando dentro.
— Posso entrar? — ela perguntou.
— Pode, mas não faça muito barulho. — Diana respondeu.
Ela estava curvada sobre uma pequena panela escura, que estava em um fogão, fervendo o conteúdo escuro dentro dela e lançando vapor para o alto. Com o movimento das mãos da feiticeira sobre o líquido, que era exatamente viscoso, ele mudou de cor, indo do que parecia um verde musgo para um violeta.
— Isso faz você parecer uma bruxa — comentou Lívia, enquanto Diana adicionava um pó branco ao preparo.
Era bastante escuro no quarto, mas Lívia viu quando ela sorriu.
— Os bruxos geralmente levam mais jeito com poções, nós feiticeiros costumamos ser especialistas em feitiçaria, é claro — respondeu ela e começou a mexer o líquido em sentido anti-horário com uma colher de cabo longo —, mas poções criadas por feiticeiros, só podem ser feitas por feitas por feiticeiros, e poções criadas por bruxos só podem ser feitas por bruxos. Algumas poções tem versões dos dois povos, como por exemplo, a famosa poção do amor, mas algumas outras não têm. Como essa, por exemplo.
— E o que essa poção faz. — perguntou Lívia curiosa, mas Diana apenas abanou a cabeça.
— Veio falar algo comigo? — ela perguntou, ignorando a pergunta.
— Sim. Vim pedir sua autorização pra chamar Miguel pra vir aqui.
— Você e Chloé tiveram alguma ideia fabulosa? — ela perguntou, concentrada em cortar uma coisa molenga e acinzentada sobre uma mesa de madeira, que era manchada em alguns pontos, como se houvesse sido queimada.
— Eu tive — corrigiu Lívia. — Vamos contar só uma parcela da verdade. Só o que for preciso pra convencê-lo.
Lívia explicou seu plano enquanto Diana apenas ouvia atentamente, assentindo ocasionalmente. Por fim, Diana apenas sinalizou positivamente com o polegar.
— Se você acha que vai conseguir convencer ele, peça a Chloé para chamar ele. Tenho algumas coisas atrasadas pra preparar aqui, mas me chame quando ele chegar.
***
Assim que ouviram as batidas na porta, Arthur correu para chamar Diana, enquanto Lívia seguia até a porta. Quando a feiticeira chegou apressada, ela, Arthur e Chloé sentaram-se em uma mesa redonda que Diana havia colocado ali justamente para conversarem.
Lívia segurou a porta pelo puxador e abriu. Miguel estava esperando do outro lado, bem vestido e com as mãos no bolso da calça, inspirando autoconfiança. E ele sorriu docemente ao vê-la.
— Oi, Lívia — ele cumprimentou.
— Oi. Entra aí — disse ela expandindo a abertura da porta e gesticulando em direção a sala. — Estávamos esperando por você.
Logo estavam todos sentados, como se fosse algum tipo de reunião de negócios. E Lívia imediatamente relacionou aquilo como uma espécie de Távola Redonda, como na história do Rei Arthur, mas rapidamente afastou o pensamento da cabeça, pois precisava se concentrar no que estava fazendo.
— E então, decidiram que vão me contar seus segredos em troca das minhas informações? — perguntou Miguel com as sobrancelhas erguidas, indo direto ao ponto. Ele estava de frente para Diana e Arthur, enquanto Lívia e Chloé estavam uma de cada lado.
— O que nos garante que sua informação vale alguma coisa? — especulou Diana.
Mas Miguel não vacilou, e já tinha uma resposta na ponta da língua.
— Não posso dar garantias, você sabe, mas seja lá qual for o motivo, eu sei que o que eu tenho a dizer pode ajudar bastante, mas vai ter que acreditar na minha palavra. Ou não.
Diana fechou a cara.
— Certo — ela olhou para a afilhada. — É sobre você, então, decida o que fazer Lívia.
Lívia assentiu tomando coragem, e olhou para Miguel, tentando ficar calma para não entregar a si mesma apenas com o olhar.
— Preciso que você guarde segredo. Acha que pode fazer isso por mim? — pediu gentilmente, tentando conquistar a confiança dele, da mesma forma como se amansa um animal.
— Claro — ele assentiu.
— É só que... — ela olhou hesitante para os outros. — É estranho conversar com ele com todos vocês me olhando. Será que poderiam dar licença por alguns minutos? — Lívia tentou encontrar palavras. — Vou me sentir melhor se estiver sozinha com ele.
Arthur pareceu pronto para protestar, mas Diana respondeu antes que ele pudesse falar qualquer coisa.
— Estaremos na cozinha quando terminarem seu assunto a sós — disse ela empurrando a cadeira para trás e se levantando, o rosto preenchido por uma frieza que não deixava transparecer qualquer sentimento. E os irmãos a seguiram para o outro cômodo, parecendo insatisfeitos, mas sem reclamar.
— Por que sozinhos? — Miguel questionou, parecendo confuso.
Lívia pôs as mãos sobre a mesa e começou brincar com os dedos, em uma imitação de Arthur quando estava nervoso ou ansioso. Torcia para que isso fizesse ela parecer inocente.
— Você sabe que eu não deveria estar em Alexandria, não sabe? — Lívia perguntou e Miguel assentiu. — Eu só... — ela tentou parecer hesitante. — Eu queria passar um tempo por aqui, poder conhecer um pouco melhor minha mãe, você entende, não é?
— Sim. Mas sabe que é perigoso, não sabe?
Lívia assentiu com a cabeça baixa.
— Eu sei, mas eu queria muito vir. Minha mãe nunca quis, mas há pouco tempo ela me deixou vir. O fato é que quando eu cheguei, os centauros me mandaram um recado, dizendo que eu deveria encontrar algo no lago Delacroix. Mas eu não faço ideia do que eles querem que eu encontre, e nem por quê. A gente nem sabia onde ficava o Delacroix, mas Arthur e Chloé estavam tentando descobrir...
— Mas você não pode ir até o Delacroix! — disse Miguel parecendo alarmado. Lívia não estava esperando por essa reação e se sentiu confusa.
— O quê? Por que não?
— Eles vão te matar...
— Quem vai me matar?
— Os Anjos — disse Miguel com firmeza, como se ele próprio não fosse um deles. — Os Anjos vão te matar se você aparecer na Biblioteca de Alexandria, eles vão perceber que você é híbrida.
— Na Biblioteca de Alexandria? Por que eu iria até lá? — perguntou Lívia com as sobrancelhas juntas.
Ele hesitou, como se houvesse percebido o que estava fazendo, mas em seguida pareceu decidir que não importava.
— Meu pai me contou uma vez — disse ele. — que havia uma poesia que falava sobre Anjos Maus, que se banhavam em sangue em um lago chamado Delacroix. Meu pai disse que como as reuniões do conselho aconteciam dentro da Biblioteca, apelidaram o rio que passa por dentro dela de Delacroix, mas você não pode ir até lá.
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