1. In Vino Veritas (p.4)

Lívia acordou sozinha sob uma árvore. Meio confusa, tentando entender onde estava e com uma leve dor de cabeça.

Sentou-se e olhou em volta. Encontrou Arthur distraído em acariciar seu cavalo e se lembrou do que havia se passado durante a tarde. Seu rosto queimou e ela o escondeu com as mãos.

— Lívia? — Era Arthur abaixado na sua frente olhando-a preocupado. — Está tudo bem?

— Dor de cabeça — respondeu ela.
Arthur colocou a mão em sua testa e fez leves movimentos circulares, como uma carícia. Sua dor começou a esvair-se, até desaparecer.

— E agora? — perguntou ele.

— Como você fez isso? — perguntou surpresa. — sabe, desaparecer a dor.

Arthur sorriu e lhe deu uma piscadela.

— Não é só você que tem poderes. — Ele passou as mãos pelos cabelos — pelo menos sua febre baixou, não estava conseguindo curar.

Arthur já estava sentado na sua frente, tinha um pote na mão, o qual ofereceu a garota.

— Esquentei comida enquanto você dormia. Achei mais seguro para a fogueira — brincou ele. — Já ia te acordar.

Lívia aceitou de bom grado a comida que consistia em arroz, feijão e salada.

— Nós precisamos ir pra minha casa. Coma logo pra podermos ir.

Arthur levantou-se para arrumar suas coisas enquanto Lívia comia no pote que recebeu do rapaz.

Observou que ele jogava tudo de qualquer jeito dentro da mochila. Colocava coisas que nem pareciam caber nela. Era como se a mochila nem tivesse fundo.

— Qual é a dessa sua mochila que parece caber o mundo? — perguntou ela e o garoto riu.

— Ela é ótima não é? É enfeitiçada pra caber muita coisa e continuar leve.
— Uau! — disse surpresa — parece muito útil. Onde conseguiu?

Lívia notou que Arthur enrubesceu.

— Uma amiga... Eh... Uma amiga feiticeira.

Arthur tirou um par de botas da mochila e pôs próximo de Lívia.

— São grandes, mas acho que se você apertar bem os cadarços elas não saem do pé. Melhor do que andar descalço, minha casa ainda é meio longe.

Não demoraram muito e já estavam os três indo na direção norte, Lívia, Arthur e Sir. Lancelot.


* * *


— Chegamos — disse Arthur, quando chegaram em frente a uma pequena casa amarela, com janelas de madeira escura. Não muito distante corriam águas de um rio. Uma casa no meio da floresta.

Haviam caminhado por cerca de duas horas até chegarem ali. Os pés de Lívia doíam bastante. Não haviam montado Sir. Lancelot, Arthur disse que ele era muito arisco e ela poderia acabar se machucando. Não conversaram muito pelo caminho, Lívia notou que o rapaz parecia distraído, perdido nos próprios pensamentos.

Foram até a porta da casa e Arthur e ele tirou uma chave da mochila para abrir. Logo entraram e o rapaz jogou suas coisas em um canto e despencou em um velho sofá desconjuntado que fora um dia verde escuro, mas que agora estava mais para marrom. O lugar cheirava a poeira e mofo. As janelas estavam cobertas por cortinas na cor azul cobalto manchadas e rasgadas vários lugares, o piso era marrom e imitava madeira, mas parecia solto em vários lugares e fazia barulho quando Lívia andava, paredes claras exibiam manchas de infiltração.

— Sinta-se em casa — disse e gesticulou apresentando o lugar. — Não é nenhuma beleza, mas é o que temos pra hoje.

Lívia sentou se ao lado dele no velho sofá, receosa de que pudessem haver ratos ou baratas morando nele.

— Certamente não é um bom lugar, mas você viu minha casa não viu? Mesmo antes do incêndio não era exatamente confortável.

Arthur sorriu.

— Tem razão, sou eu quem não estou acostumado a morar aqui.

— Essa não é sua casa? — Perguntou confusa.

— Temporariamente sim, mas amanhã viajo de volta pra minha verdadeira casa — respondeu saudoso.

— Então onde você mora?
Arthur hesitou por um instante, mas respondeu em seguida.

— Em um lugar chamado Alexandria.

Lívia lançou-lhe um olhar confuso.

— Alexandria? Como a Biblioteca de Alexandria?

— Você já ouviu falar da Biblioteca de Alexandria? — perguntou admirado arqueando uma das sobrancelhas. — Achei que vivesse com sua tia isolada do resto do mundo?

— E vivia — concordou ela. — Muito poucas vezes na vida vi outras pessoas que não fossem ela, no geral só quando alguém circulava pela floresta, mas eu tinha livros, vários livros. Alguns dos que eu gostava falavam sobre cidades, lugares onde as pessoas se amontoavam, casas construídas umas sobre as outras, que chamam de apartamentos. Carros, que seriam máquinas capazes de levar as pessoas em alta velocidade de um lugar para outro. Sempre sonhei em conhecer esse mundo do qual meus livros falavam, mas nunca pude sair de casa. Muitos dos meus livros falavam também sobre a cidade de Alexandria, a biblioteca e sobre Alexandre, O Grande.

— Então talvez eu deva te deixar frustrada informando que a maior parte das coisas que você pode ter lido sobre Alexandria é uma grande mentira.

Lívia ergueu as sobrancelhas surpresa.

— Então como é Alexandria?

— Uma ilha. Enorme. Se estivesse no mapa, seria mais ou menos do tamanho do Japão.

— E como não está no mapa?
Arthur deu de ombros e começou a tirar as botas dos pés.

— Um grande grupo de feiticeiros no passado deu um jeito nisso, assim que as raças dotadas de magia passaram a habitar o continente... Olha, acho melhor dar uma pausa na aula de história... — ele já estava se levantando, agora descalço. — Quando chegarmos a Alexandria te empresto um livro em que possa ler a vontade sobre nosso país. Agora vou tomar um...

— Pera! — Lívia o interrompeu. — você está sugerindo que eu vá junto?

Arthur a encarou e riu.

— Estarei de volta pra casa amanhã. O que você pensava? Que eu ia te largar por aí, especialmente agora que eu sei que você é um Anjo de Água e que não tem uma família...

— Você não me perguntou se eu quero ir! — disse exasperada.

— Bom, você quer ficar zanzando sozinha por aí? — Arthur tinha uma sobrancelha erguida e continuava de pé na sua frente. Ele era alto e tinha os ombros largos, parte dos cabelos lhe caiam sobre os olhos e o rapaz passou os dedos sobre eles em um gesto impaciente, jogando os para trás. Ela o encarou pressionando os lábios, sem resposta, até que ele saiu andando em direção a uma porta, falando enquanto saia. — Vou tomar um banho enquanto você pensa, quando eu terminar você me diz.

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