1. In Vino Veritas (p.3)

Cerca de um mês antes, Arthur havia procurado Diana, uma das poucas feiticeiras que ele conhecia e certamente a única em quem confiava.

Já era tarde da noite quando bateu a sua porta. Adiou a visita o máximo que pode, mas ele viajaria no dia seguinte, então precisava resolver isso de uma vez. Diana morava sozinha em uma mansão rústica bastante luxuosa. Ele vira até aqui muito poucas vezes, mas sabia que por dentro, a casa parecia a de algum nobre na idade média.

Era uma feiticeira bastante velha, ninguém sabia ao certo sua idade, mas o boato que corria era de que ela vivia em Londres e mudou-se para Alexandria, com medo de ser queimada, na época da caça as bruxas. Ela era imortal, sendo assim, tinha sua aparência conservada como uma mulher de 25 anos. Pelo que Arthur se lembrava, tinha características comuns: magra e sem muitas curvas, pele clara, olhos e cabelos castanhos, os quais mantinha longos e bem cuidados. Ela era bonita, mas uma beleza discreta.

Mas havia algo de encantador nela que sempre deixava Arthur hipnotizado e extremamente desconfortável.

"Talvez seja magia" pensou Arthur consigo mesmo, mas antes que continuasse a refletir sobre os encantos de Diana, a feiticeira atendeu a porta. Tinha os cabelos presos em uma trança e usava uma camisola vermelha de seda.

Diana sorriu maliciosamente ao ver quem estava a sua porta.

— Entre... — disse ela, e Arthur obedeceu, em seguida a feiticeira fechou a porta a suas costas e começou a caminhar para sua sala. O lugar era amplo, com um sofá marfim em formato de U, móveis de madeira e as janelas cobertas por elegantes cortinas vermelhas. Uma das paredes era coberta por uma enorme pintura em preto e branco de uma mulher sentada em uma cama com um bebê. Era aconchegante. Tinha um cheiro adocicado no ar que Arthur desconfiava que pudesse ser o perfume da feiticeira.

Sentou-se e indicou o lugar ao seu lado direito para Arthur.

— A que devo a honra da sua visita a essa hora da noite, meu estimado cavaleiro? — perguntou enquanto Arthur sentava-se. Não levou um segundo até que ela começasse a passear com as pontas dos dedos sobre sua calça jeans. — O que diriam as más línguas se soubessem que uma dama recebe um rapaz assim tão tarde?

Ela sorriu e lá estava Arthur hipnotizado. Ele desviou o olhar. Era por isso que não gostava de se encontrar com Diana.

— Preciso de um favor — respondeu Arthur tentando se distrair em brincar com os nós dos dedos. Por que ele sempre ficava nervoso perto dela? — mandei forjar uma espada e queria que você colocasse feitiços nela pra que se tornasse melhor.

Arthur arriscou olhar novamente pra ela e Diana fez beicinho.

— Por que você nunca me faz uma visita apenas para conversar-mos, passar o tempo juntos? Ficaria muito feliz com sua presença mais vezes por aqui.

Diana agora mexia carinhosamente em seu cabelo. Arthur já começava a esquecer o que foi fazer ali, de novo. Voltou a atenção para os nós dos dedos.

— Pode ou não me ajudar?

— Ah, eu posso — respondeu descontraída —, mas você sabe não é?  — Ela se aproximou de sua orelha para sussurrar: — Eu sempre quero alguma coisa em troca.

Diana beijou suavemente seu pescoço e se afastou.

Arthur, que ainda evitava olhar para a feiticeira, arfou e fechou os olhos enquanto um arrepio percorria seu corpo.

"Que mulher desconcertante!"  Pensava ele.

— E o que você iria querer em troca? — perguntou cauteloso.

Diana recostou-se no sofá. Ela com certeza estava se divertindo muito essa noite as custas de Arthur. Ele viu pelo canto do olho quando ela passou a mão distraidamente pelo cabelo até a ponta da trança.

— Como já deve ter notado — disse e gesticulou amplamente apresentando sua casa — não preciso de mais dinheiro do que já tenho, sendo assim, só negocio em troca de dinheiro com pessoas desinteressantes. — Aproximando se novamente de Arthur, pôs a mão em seu rosto e o obrigou a olhar para ela — Mas você é um cara particularmente interessante, meu doce cavaleiro.

Diana o beijou suavemente nos lábios e se levantou do sofá. Tinha os pés descalços e ao olha-la, por um instante, Arthur a viu como uma menina, não como uma feiticeira com centenas de anos. Mas esse instante passou em um piscar de olhos, trazendo de volta a feiticeira lasciva.

— Já volto, não se atreva a sair daqui — disse sorrindo.

Arthur esperou, tenso, até que Diana voltasse trazendo uma garrafa de vinho, a qual ofereceu-lhe.

— Para você — disse ela.

Arthur hesitou.

— Por que está me dando vinho?

— Um presente de despedida, soube que está indo embora amanhã. — Deu de ombros e balançou a garrafa em sua frente. — Aceite, é o que eu quero em troca do favor que vou te fazer.

Arthur aceitou o presente, mas olhou para ela com os olhos semicerrados.

— Não deveria ser eu quem te dou algo em troca pelo favor?
— Ah, mas você vai me dar. — ela sorriu e sentou-se novamente ao lado de Arthur. — Vai me contar uma excelente história.

Arthur a olhou, desconfiado. Ela parara de jogar seu charme, agora ela realmente parecia estar negociando.

— História?

Diana pôs a mão sobre seu joelho.

— Você vai fazer o seguinte. Sei que vai ficar quatro semanas fora. Quando encontrar companhia, quero que a convide para dividir essa garrafa com você. Só isso.

Arthur olhou torto para a garrafa de vinho, mas sabia que apesar de louca, Diana não era maldosa.

— Tudo bem, mas você sabe que eu sou um Guardião da Fauna, não costumo encontrar pessoas no meio de uma floresta.

O sorriso malicioso que era marca registrada da feiticeira retornou aos seus lábios.

— Caso isso aconteça, quando voltar a Alexandria, vai vir novamente até minha casa, onde você vai beber sozinho todo o vinho.

Diana agora arrastava os dedos suavemente em sua nuca, provocando contínuos arrepios. Arthur encarou a garrafa em suas mãos por um momento e olhou para a feiticeira em seguida.

— O que tem nesse vinho?

— Vai ter que descobrir se quiser sua poderosa espada. — Diana deu-lhe uma piscadela. — Falando nela, onde está?

Arthur desembainhou a espada que trazia no cinto, e depositou nas mãos da feiticeira, a qual examinou atentamente.

— Muito bonita — elogiou passando os dedos pela lâmina dourada. — Talvez até bonita demais pra uma espada. Deveria ser forte e afiada, independente da aparência.

— Eu não sou um guerreiro. — Arthur apertava os dedos até ficarem brancos.

— Eu sei — disse Diana —, o que me leva a questionar: por que você quer uma espada?

Arthur mordeu o lábio inferior de nervoso. Ele não contava pra ninguém, tinha medo que o chamassem de louco.

Diana pareceu perceber que ele estava desconfortável e tocou carinhosamente seu braço.

— Tudo bem Arthur, farei o melhor que eu puder. Como ela vai se chamar?

Arthur a olhou e sorriu levemente embaraçado.

— Excalibur.

A feiticeira riu alto, deixando Arthur ainda mais constrangido.

— Excalibur? Isso é sério? Quer que eu a entregue espetada em uma pedra também?

Arthur permaneceu quieto, novamente, mas dessa vez ela não agiu de forma compreensiva, como da última vez. Ao invés disso, o empurrou de costas no sofá, debruçou-se sobre ele e deu-lhe um leve beijo na base do pescoço.

— Acho que devia te chamar de Meu Rei — disse assoprando sua nuca.

Ele podia sentir o corpo da feiticeira e o calor que irradiava de sua pele sob a fina roupa de dormir. Diana mordeu seu pescoço o fazendo arfar. Teve que respirar fundo um momento, para que conseguisse clarear os pensamentos. Não podia entrar nos joguinhos de dela.

— Meu Deus, Diana! — disse ofegante. Ele a segurou pela cintura e a fez sentar novamente, sentando-se ele próprio também. — Acho melhor eu ir embora, já nos acertamos.

Arthur levantou-se e apressou-se para sair.

— Espera, Arthur. — O garoto estatalou-se e virou de volta a Diana. Teve um leve sobressalto ao ver que ela já estava de pé logo atrás dele. — Faltam duas coisas.

— Duas coisas? — Arthur estava confuso.
— A primeira é: precisa deixar a bainha de Excalibur comigo — disse ela e ele a desprendeu da cintura e entregou. A bainha brilhou por um segundo em sua mão e desapareceu magicamente em seguida. — Não se preocupe, eu a guardei. Farei para você uma espada quase tão boa quanto a do próprio Rei Arthur.

— E a segunda coisa? — perguntou, e quando se deu por conta, Diana já tinha suas mãos sobre as laterais de seu rosto e o beijava.

Arthur relaxou por um momento e se permitiu por as mãos na cintura da feiticeira enquanto retribuía o beijo. Puxou o seu corpo mais próximo, mas logo a soltou.

— Uma pena que não queira ficar mais — ela disse quando enfim se desgrudaram. Arthur respirava como se tivesse corrido quilômetros. Diana gesticulou com as mão e uma fumaça vermelha fez com que a garrafa de vinho aparecesse nela. Arthur já ia se esquecendo de leva-la. — Não se esqueça do nosso acordo.

Arthur assentiu e pegou a garrafa, sendo conduzido em seguida até a entrada da casa.

— Sentirei sua falta, Meu Rei — disse a feiticeira antes de fechar a porta.

Assim que ela se foi, Arthur caminhou de volta pra casa. Se sentia leve agora que estava fora da presença de Diana, como se ele tivesse chumbo correndo nas veias e agora este tivesse sido drenado de seu corpo.

Para Arthur, Diana era louca.

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