23 - Juramento de dedinho

Kurogiri ficou furioso ao ver Satoru e eu juntos. Seus olhos brilhavam de raiva enquanto ele nos acusava.

— Você tramou contra mim, depois de tudo que fiz por você! — Ele rugiu, sua voz ecoando pelo templo.

Eu dei um passo à frente, meu coração batendo forte. — Isso tem que acabar, Kurogiri! Muita gente já sofreu por sua causa.

Ele riu, um som frio e cruel. — Se destruírem o tabuleiro, suas memórias nunca voltarão.

Olhei para Satoru e balancei a cabeça e depois me virei para Kurogiri — Não me importo com minhas memórias. Só quero que todos fiquem livres de você!

Kurogiri não esperou mais. Ele atacou Satoru com uma fúria descontrolada, enquanto Geto se posicionava na minha frente, me protegendo. Sentia-me responsável por tudo aquilo.

— Geto, eu preciso fazer isso. — Disse, me esquivando e correndo na direção se Kurogiri.

Kageba, meu irônico poder em forma de velha, se manifestou ao meu lado, crescendo em tamanho e poder. Ouvi Satoru chamar meu nome, mas era tarde demais. De repente, tudo ao meu redor se tornou escuridão completa.

Eu estava sozinha, envolta em sombras. Podia ouvir a respiração pesada de Kurogiri, sentindo sua presença ameaçadora se aproximar.

— Você acha que pode me derrotar? — Sua voz sussurrou na escuridão.

Fechei os olhos, concentrando-me na força de Kageba. — Não estou sozinha.

A escuridão começou a se dissipar, revelando uma luz brilhante emanando de Kageba. A velha se transformou em uma figura majestosa, irradiando poder e luz, da mesma forma daquele dia na floresta. Kurogiri recuou.

— Isso acaba agora. — Declarei, avançando com Kageba ao meu lado, pronta para enfrentar Kurogiri e pôr um fim ao seu reinado de terror.

Kageba lutou ferozmente com Kurogiri, que assumiu a forma de um gato branco gigantesco e caolho, com seis braços esticados como tentáculos. A batalha foi intensa.

— Estamos no domínio dele — Kageba disse, sua voz ecoando na escuridão. — Só teremos jeito de sair se alguém quebrar por fora ou se forçarmos por dentro.

Eu observei enquanto Kageba enfrentava Kurogiri, suas forças colidindo em uma explosão de luz e sombras. Cada golpe de Kageba era respondido com um ataque feroz de Kurogiri, seus tentáculos se movendo com uma velocidade assustadora.

— Não podemos desistir — murmurei para mim mesma, sentindo a urgência da situação. — Precisamos encontrar uma maneira de sair daqui.

Kageba continuou a lutar, sua forma brilhante contrastando com a escuridão ao nosso redor. Eu sabia que não podia ficar parada. Precisava ajudar de alguma forma. Concentrei-me, tentando canalizar toda a minha energia para apoiar Kageba.

— Vamos conseguir — sussurrei, mais para mim mesma do que para qualquer outra pessoa.

A batalha parecia interminável. Kageba e eu estávamos determinadas a vencer, a nos libertar do domínio de Kurogiri. No meio da luta, vi uma luz branca esférica e comecei a ouvir vozes vindo dela. Gritei para Kageba:

— Aquelas são minhas memórias!

Kageba assentiu, seus olhos fixos na esfera. — Vamos ter que lutar com ele para poder pegá-las de volta.

A luta recomeçou com uma intensidade ainda maior. Kurogiri atacava com seus tentáculos, enquanto Kageba se defendia e contra-atacava com uma força impressionante. De repente, o domo ao nosso redor começou a queimar. Haviam chamas para todos os lados.

— Kageba?

— Satoru queimou o tabuleiro! — Kageba gritou.

— Preciso recuperar minhas memórias! — Respondi, correndo em direção à esfera.

— Espera!

No mesmo momento, Kurogiri avançou para me impedir. Um clarão intenso explodiu ao nosso redor, cegando-me momentaneamente. Tudo ficou em silêncio, e eu não conseguia ver nada além da luz branca.

De repente, algo começou a surgir em minha visão, acompanhado pelo som de crianças sorrindo. Vi-me ainda criança, sentada em um parquinho, conversando com um garoto de cabelos castanhos. Ele estava sorrindo e brincando comigo, sua alegria era contagiante.

— Vamos brincar de pegar a bola! — Ele sugeriu, rindo.

Ele correu para pegar a bola, mas, no momento em que ele a alcançou ouvi um som estridente de pneus. Virei-me a tempo de ver o carro se aproximando rapidamente. Eu tentei avisar, mas era tarde demais.

Vi minha versão criada correr para ajudar, mas quando cheguei lá, o menino estava ileso. Ele sorriu para mim, e continuamos a brincadeira como se nada tivesse acontecido. A partir daquele momento, senti que nossa ligação se fortaleceu ainda mais, ele sempre preocupado comigo.

A cena mudou, e agora estávamos debaixo de uma árvore com muitas raízes. O garoto agora mais velho, estava sentado ao meu lado, e nós dois observamos as folhas balançando ao vento.

— Sabe, Aki — ele disse, olhando para mim com um sorriso suave —, sempre estarei aqui para você.

Eu sorri de volta, sentindo uma paz que há muito tempo não experimentava. Aquele momento sob a árvore parecia eterno, um refúgio seguro em meio ao caos que nos cercava. Mal sabia eu o que viria depois.

Minhas memórias começaram a voltar rapidamente e tudo passava como um filme

— Quero que fiquemos juntos para sempre — disse o menino, olhando nos meus olhos.

— Sim, para sempre — respondi, e fizemos o juramento de dedinho, selando nossa promessa.

A cena mudou novamente. Estávamos na cabana dos pais do menino. Eles estavam brigando com ele, dizendo que ele não era o filho deles. O menino se revoltou, sua raiva evidente.

— Isso não é justo! — ele gritou, lágrimas nos olhos.

De repente os pais estavam mortos, assim como sua irmãzinha. Eu estava desesperada me encolhendo no canto da sala. Meu irmão me puxou pelo braço e nós dois corremos pela floresta. Corremos até algo nos perseguir e sermos separados. A cena mudou mais uma vez. Agora estávamos na beira de um rio. Eu tentava acalmá-lo, mas ele estava determinado.

— Isso não é certo — disse, tentando fazê-lo entender.

— Você prometeu que ficaríamos juntos para sempre — ele insistiu, sua voz cheia de desespero. — Não podemos voltar atrás agora.

O menino segurou meu braço com força, e eu me assustei. No mesmo instante, meu irmão chegou correndo.

— Afaste-se dela! — ele gritou, tentando me proteger.

Kurogiri era Daisuke Fushi. O verdadeiro morreu no dia do atropelamento. Desde então ele se passou por ele até destruir tudo. E iria fazer o mesmo comigo. Antes que eu pudesse reagir, meu poder saiu como uma explosão, arremessando os dois para cima. Fiquei paralisada de medo e culpa. Quando a poeira baixou, vi meu irmão caído no chão, imóvel.

Um acidente causado por mim. Kyo morreu naquele dia. Mas Kurogiri assumiu a forma dele e se fez passar como meu irmão. A cena mudou, e eu estava sendo resgatada por Satoru. Ele me carregava com cuidado, e eu gravava aquela cena com muito carinho. Ele mencionou com Suguru.

— O menino é filho do Touya. Ele parecia morto agora mesmo. Agora está vivo.

— E o outro?

— Não dá para reconhecer.

Era por isso que perdi minhas memórias. Kurogiri não queria que eu descobrisse que ele destruiu minha familia.

Depois do acidente, minha família decidiu se mudar para Hokkaido. Meu pai sempre dizia que todo cuidado era pouco. Kyo estava agindo estranho. Mas ainda parecia... o Kyo. Enganou até mesmo Sakura. Mesmo rosto, mesmo corpo, mesmo jeito de ser. Mas não era ele. Até ele começar a mostrar sua verdadeira natureza

Um dia, vi meu pai conversando com minha mãe. Ele parecia preocupado.

— Nosso filho está estranho — ele disse, a voz baixa, mas cheia de preocupação.

— Deve ser o trauma.

— Vou ficar de olho.

A partir daquele momento, comecei a observar meu irmão mais de perto. Notei que ele estava mais quieto, mais distante. Algo estava claramente errado, e eu precisava descobrir o que era. A sensação de responsabilidade e a necessidade de protegê-lo cresciam dentro de mim, enquanto tentava entender o que estava acontecendo com ele.

A cena mudou mais uma vez. Eu estava investigando sobre meu irmão, sobre o acidente. Estava analisando pistas e tentando entender o que estava acontecendo com ele. De repente, meu telefone tocou. Atendi e ouvi a voz trêmula de minha mãe.

— Aki, seu pai sofreu um acidente. — Ela disse, e meu coração parou por um momento.

O desespero tomou conta de mim. Uma missão. Meu pai nunca escondeu ser um Feiticeiro, mas nunca quis isso para mim. Tudo parecia estranho. Todo o sofrimento que senti naquele dia e Kyo não derramou uma lágrima.

No dia do velório, meu coração estava batendo descontroladamente, como um mau presságio. Quando cheguei, vi Satoru entre os presentes. Meu coração acelerou ainda mais ao vê-lo.

Ele se aproximou, seus olhos cheios de preocupação e tristeza. — Akira, sinto muito. — Disse ele, sua voz suave e reconfortante.

Eu apenas assenti, tentando segurar as lágrimas. A presença de Satoru me desestabilizou. O acidente teve um impacto profundo em mim e na minha família. A perda do meu pai foi devastadora, deixando um vazio imenso em nossas vidas. Eu, já lidando com a responsabilidade de proteger meu irmão, agora tinha que enfrentar o luto e a dor da ausência do meu pai.

Foi quando eu vi Satoru e decidi jogar todos os sentimentos que eu tinha nele. Eu decidi que seria dele. Não importava como fosse.

Minha família, agora sem meu pai, teve que se adaptar a uma nova realidade, enfrentando o luto e tentando encontrar forças para seguir em frente. Eu, em meio a tudo isso, não conseguia lidar com meus próprios sentimentos.

Decidi que iria atrás de Satoru em Tóquio. Menti para minha mãe, dizendo que era uma excursão da escola, e parti em busca de respostas.

Com o número de Satoru em mãos, mandei uma mensagem: "Sei de algo sobre o acidente do meu pai. Podemos nos encontrar?" Esperei ansiosamente pela resposta, meu coração batendo acelerado.

Quando ele chegou, senti um misto de alívio e nervosismo. Ele me olhou com preocupação. As memórias pareciam meio nubladas, mas tudo fazia sentido na minha mente.

— O que você sabe sobre o acidente? — perguntou, sua voz séria.

Respirei fundo, sentindo a culpa me consumir. — Na verdade, é tudo mentira. Eu só queria vê-lo.

Satoru suspirou, mas seu olhar suavizou. — Aki, você não precisa mentir para me ver. Estou aqui para ajudar.

— Não é isso... eu quero você.

Ele se assustou com a declaração e não mentiu quando disse que insisti. Eu realmente o venci pela insistência. Lembro até do gosto do primeiro beijo. Dele me dizer que aquilo era errado e eu dizer a ele que não me importava com isso. Dele dizendo que não poderia preencher as minhas expectativas e que iria falar com a minha mãe para caso alguém diga algo no futuro, mas que não me garantia mais nada. Se eu quisesse era assim. E eu aceitei.

Não ofereci resistência em nada. Nem quando ele disse que não seria fiel, nem quando ele me beijou de novo, nem quando ele me chupou, nem quando eu chupei ele. Eu deixei que ele fizesse tudo comigo.

Isso foi um pouco decepcionante. Toda a magia do "eu fui falar com sua mãe" caiu por terra. Ele só queria me comer e eu sabia disso. Era só a cena de mim com a saia erguida enquanto ele fazia o que queria comigo. Me senti ridícula.

Em uma nova cena, vi Kurogiri me ameaçar pela primeira vez. Num sonho.

Se continuar com esse cara, farei da sua vida um inferno.

E eu paguei para ver. Paguei para ver tudo.

Eu paguei para ver o Satoru beijando outra mulher e depois eu dar o troco nele com o Izumi, só para depois ele vir até Hokkaido dar um de bom moço e a gente ficar de novo. Quase perdi a virgindade naquele dia, agora faz sentido do porquê ele ficou na dúvida. Foi por muito pouco, se Kyo não tivesse ligado. Para depois eu ver ele com outra mulher de novo.

Eu paguei para ver o Kurogiri usar a imagem do meu irmão e nos enganar com aquele maldito jogo de tabuleiro.

Mori ainda disse: "isso não parece seguro"

Mas eu disse: "é só um jogo"

Fomos amaldiçoados aquele dia. Não, eu fui e amaldiçoei todos ao meu redor.

Paguei para ver Kurogiri destruir todos ao meu redor. Os apagões da mente, o sonambulismo, a crise de nervos comigo quebrando a porta depois das ameaças do Kurogiri, o coma...

E como se não bastasse eu e Kurogiri brigamos lá também. Ele invadia o labirinto, lutava com Kageba e depois desaparecia, e depois voltava fazendo tudo de novo.

— Você nunca vai sair daqui! Prefiro você morta a ficar com ele!

Eu retrucava, a gente brigava, ele lutava com Kageba e depois o ciclo Se iniciava de novo... até ele ter acesso às minhas memórias, depois que eu comecei a enfraquecer. Muitas vezes eu conseguia voltar parcialmente e mover o corpo, mas logo eu estava de volta ao mesmo lugar. Ele me torturou psicologicamente até o dia que acordei desmemoriada, quando eu fiz o pacto com ele. Kageba tentou me proteger, mas ele já havia conseguido o que queria.

Vi tudo depois disso.

Ele matando os homens na obra e fazendo parecer um acidente.

Ele derrubando a Shizune.

Ele prendendo a alma da Mori.

Ele me perseguindo por todo canto

Me ligando de madrugada

Manipulando meus pensamentos e minhas memórias

Ele envenenando minha mãe, dizendo mentiras.

Ele me prendendo na cabana

Tudo isso. Era obra dele. E enquanto ele existisse, eu jamais teria paz.

Ali diante de mim, apenas a silhueta de um gato branco de um olho só, tremendo de medo enquanto parecia derreter pelo chão.

— Você... prometeu que ficaríamos juntos para sempre.

— Eu menti.

— Juramento de dedinho...

— Sinto muito. Fiz com o Daisuke e não com você. Aliás, o que você é?

— Uma maldição alimentada pelo medo, pelo luto e pelo desespero... Você tinha tudo isso e uma imensa energia amaldiçoada.

— Isso acaba agora.

— Ele também não presta, né? Só queria comer você... — Ele deu um riso fraco.

— Pelo menos foi muito bom. Eu vou sobreviver com isso. Desde que você desapareça de uma vez por todas...

Eu acenei para Kageba que deu o golpe final e Kurogiri desapareceu como poeira. A esfera negra ao nosso redor se quebrou em mil pedaços e vi Satoru já pronto para atacar.

— Aki! — Ele correu e me abraçou. — Você está bem?

— Estou sim. Melhor que nunca.

— E Kurogiri?

— Foi destruído.

Eu abaixei o olhar e continuei andando. Satoru me segurou pelo braço. — Você está estranha.

— Eu recuperei as minhas memórias, Satoru.

A sobrancelha dele arqueou de leve. Era assim que ele demonstrava o mínimo de interesse pelas coisas.

— E então?

— Acho melhor a gente não se ver mais. Foi tudo muito bom, mas eu tenho que lidar com dois lutos, dar apoio para minha mãe, amparar minhas amigas e terminar o ensino médio. Não vou ter tempo para nada. Mas... a gente se vê por aí.

— Espera! Vamos conversar.

— Você tinha a intenção de namorar sério? De ser fiel a mim?

— Aki... A gente não precisa colocar um rótulo no que a gente tinha. A gente só tinha que se curtir. Avisei para você quando me procurou!

— Eu tinha 17 anos! Era louca por você, tudo que me pedisse eu ia fazer!

— Aki, não foi por mal. É só que...

— Você não ama ninguém mais do que a si mesmo. Não dá para competir com esse amor.

Eu virei as costas sem nem olhar para trás. Tinha medo de que quando visse o rosto dele eu voltasse correndo implorando para que ele nunca me deixasse.

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