Ⓔ03 ⒸEXTRA ✖ BREE ▬ Parte II

 — Me tirem daqui! — A garota gritava em desespero, chorando convulsivamente.

— Não adianta mais você gritar, garota! Só vai fazer sua garganta arder e minha cabeça doer. — Uma outra respondeu sentada em cima do seu colchão mofado, encarando a novata com um misto de indiferença e preocupação que ela não deixava transparecer.

— Como você consegue estar tão calma? — A novata questionou, fungando e soluçando.

— Não pense que eu não fiz o seu papel quando aqui cheguei — A adolescente respondeu baixando o olhar pensativo. —, mas cedo aprendi que não ia adiantar de nada. Então siga meu conselho. Ninguém que você quer vai te ouvir, apenas eles. E quando eles cansarem de te ouvir, vai ser muito mau pra você. — A jovem respondeu ríspida e amargamente. Não como se ela estivesse com raiva da garota ou a repreendendo, mas porque ter que ver na sua frente um prospeto do que ela mesma fora tempos atrás, lhe trazia recordações dolorosas.

— Há quanto tempo você está aqui? — A novata questionou fungando mais uma vez e se afastando da porta para se acomodar numa das três camas naquele cômodo pequeno, escuro e cimentado, a única que parecia não ser ocupada.

— Não sei mais. Talvez uma eternidade... não temos noção do tempo aqui. — A garota encolheu os ombros sem realmente se importar com aquilo. Houve um tempo em que cada segundo fazia diferença. Ali o tempo era inexistente.

— Sabe onde estamos?

— Vamos nos ater a perguntas que eu saiba responder. — A adolescente revirou os olhos e bufou, porém percebeu estar sendo dura demais com a novata e então se reprimiu. — Qual o seu nome?

— Liesbeth. E o seu?

A jovem hesitou por segundos, indecisa se diria o seu verdadeiro nome ou o nome de guerra que adotara após se iniciar na prostituição: Luna.

A verdade é que sua identidade era uma miragem de um passado que parecia totalmente perfeito aos seus olhos em comparação à realidade que estava levando hoje em dia.

Desde que ali chegara passara pelos mais diversos tipos de tortura física e psicológica que nunca, em todos os seus piores pesadelos, julgou ter de viver.

Ali, no Ninho das Ninfas – como era nomeado o esconderijo prisional – a relação entre todas as garotas era competitiva e amarga e ela mesma percebeu o porquê ao tomar conhecimento dos privilégios que as preferidas do chefe tinham quando eram comportadas, obedientes e faziam um bom serviço.

Luna também poderia ser uma dessas privilegiadas, mas o ódio mortal que sentia pelo chefe a impedia de algum dia ceder às suas ordens e caprichos sexuais e por isso, muitas vezes, era violentada pelo mesmo.

Sua sorte, no meio de tudo aquilo, era que ele ficava frustrado com sua atitude e tentava se manter longe dela o máximo de tempo possível. No entanto todos ali sabiam que Luna era a preferida do Chefe e, por isso mesmo, a odiavam com todas as forças a excluindo mais ainda do grupo desregulado e confuso delas. Porque ainda que elas fossem competitivas, elas se protegiam sempre que preciso e cuidavam umas das outras.

A única que não a afastara e ainda a protegia era Gertha, ou Fany, como era conhecida, e era por essa mesma garota que ela aguardava ansiosa.

Luna percebeu que havia ficado tempo demais em silêncio, deixando a pobre novata sem uma resposta. Pensando em Gertha e em como poderia puxar Liesbeth para a sua pequena irmandade, Luna resolveu falar o seu verdadeiro nome.

— Brigitte. Meu nome é Brigitte. Mas pode me chamar apenas de Bree. — Seu sorriso saiu forçado pois as lembranças daquele nome traziam dor e mágoa à agora fortificada Luna.

— Você parece preocupada com algo. — Liesbeth apontou ao perceber a quantidade de vezes que Bree olhava para a porta.

— Só esperando alguém. — Ela respondeu e a novata não questionou quem, provavelmente chegando à conclusão de que seria a terceira habitante daquele quarto.

— O que eles querem de nós? — A garota questionou afastando sua franja cor de caramelo da frente dos olhos castanho escuro e os enxugando com a ponta da manga.

Bree não quis ser direta nem grossa em apontar a verdade nua e crua, então tentou arrancar dela a sua história. Pelo menos a parte que interessava a ela.

— Você lembra como veio aqui parar? Ou suspeita?

— Foi um cara. Ele me prometeu tirar da pobreza, falou que faria de mim uma modelo famosa. Dizia que eu era especial. Um dia ele me levou para um estúdio de fotografia e fez um book meu e nessa mesma noite saímos para comemorar. Quando dei por mim estava bêbada num quarto de hotel, com ele por cima de mim me estuprando sem que eu nem tivesse forças pra lutar. Quando eu voltei a acordar já estava aqui. — Liesbeth foi sucinta em sua história, muito provavelmente porque lhe custava esmiuçar em detalhes o que lhe acontecera, mas aquelas informações bastavam para Bree, que engoliu a vontade de chorar ao se colocar no lugar da garota.

— Foi quase igual comigo. Por algum motivo sádico, o monstro me fez apaixonar por ele e até hoje ele finge que me ama. De alguma maneira doentia e distorcida, eu acho que ele me ama mesmo. — Seu olhar turquesa descaiu sobre suas mãos de unhas sujas e destruídas e um suspiro conformado saiu por seus lábios. Seu peito ainda doía, bem como sua alma, porém a hora de sofrer há muito tinha passado para ela.

— Por que você diz isso? — Liesbeth questionou e Bree elevou o rosto redondo, de olhos arregalados e furiosos com a inocência e estupidez da garota, pois se via refletida nela quando também chegara ali. Todavia aquela não era mais ela, era apenas mais uma miragem do seu passado.

— Existem várias outras garotas como nós. Liesbeth, nós estamos aqui para servir homens fisicamente. — Ainda que sentisse raiva, ela tentava falar sobre o assunto com delicadeza, por mais que sua voz saísse apressada e tremida.

— O que você quer dizer com isso? — A novata questionava ainda sem querer acreditar, enquanto seu queixo tremia ameaçando uma nova leva de lágrimas a surgir.

— Nós fomos sequestradas e somos treinadas para sermos prostitutas.

— O que? Não, não, não...

— Beth, me escute. Você precisa ser forte, você precisa resistir e lutar por sua vida. Você precisa obedecer a eles e fingir que tem medo deles. Você tem que dizer sim a tudo o que eles mandam. Você não pode demonstrar fraqueza, nem dor. Você tem que colocar um sorriso no seu rosto e fingir que está gostando.

— Eu não consigo, eu não vou conseguir.

— Eles nos torturam por semanas até termos tanto medo deles que nunca na vida ousaremos fugir. Muitas de nós já tentaram o suicídio. Algumas conseguiram e outras enlouqueceram. As que sobreviveram são tratadas como rainhas e por causa desse tratamento especial, outras de nós tentam obedecer tudo o que eles fazem.

— Brigitte, eu não sei se vou conseguir. Eu sou fraca.

— Olhe pra mim! Você não é fraca! Eu fui fraca. Eu me revoltei, eu desobedeci, eu tentei fugir, tentei morrer, tentei ficar louca, mas nada disso me tirou daqui! Nada disso e agora...

— Agora o quê? — Antes que Bree pudesse continuar a falar, a porta foi aberta e uma outra garota, de cabelos curtos, entrou.

— Bree! — Fany correu até a loira.

— Gertha! — Bree a abraçou forte, brevemente, para então se afastar e olhar para as mãos dela com urgência. — Você conseguiu o que te pedi?

— Não foi fácil trazer até aqui, mas sim — Gertha respondeu se agachando no chão. Com um dedo ela afastou a calcinha para o lado e fez força. Pouco depois ela segura na mão um tubinho pequeno contendo um líquido arroxeado.

— O que é isso? — Liesbeth perguntou um pouco enojada com o que vira.

— Veneno de rato. Quantidade demasiado pequena pra matar, mas forte o suficiente pra o efeito necessário — Bree respondeu.

— Tem certeza que vai fazer isso? — Gertha questionou com um olhar consternado.

— Que outra alternativa tenho, Gertha? Se ele descobrir ele vai usar isso contra mim!

— Como arranjou isso? — Beth questionou a Gertha, curiosa enquanto encarava fixamente o tubinho.

— Deitar com soldados tem seus benefícios. E o que não falta por aqui é veneno de rato. Foi só deixar o soldado adormecer depois de cansar muito ele. — Gertha riu, falando com descontração.

Para Beth aquilo não fazia sentido. Ela não queria aceitar que teria de se sujeitar a deitar com homens nojentos contra a sua vontade e ainda teria que fingir que estava gostando. No rosto de Gertha não havia vislumbre de que ela estava fingindo, mas talvez ela já mentisse tanto para si mesma que acabou por acreditar que realmente gostava.

Contudo Beth não queria chegar até aquele ponto. Ela não iria.

— Porque não trouxe quantidade suficiente para matar. Eu quero morrer! — Beth gritou, tentando arrancar o tubinho das mãos de Bree.

— Ei, ei, ei! Ninguém aqui vai morrer! — Gertha gritou de volta, agarrando a novata e a encostando com violência à parede.

— Então por que ela tem isso? — Beth choramingou quando Bree retirou o vidrinho de suas mãos e o tomou de uma vez só, sem hesitações.

— Para abortar. — Ela respondeu assim que terminou de engolir. — Eu estou grávida.

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