A reconciliação das flores



Num momento aleatório durante meu "noivado" que durou quatro anos, aconteceu a reconciliação de minha mãe com a Alessandra.

Confesso que fiquei bastante apreensivo com a questão da Vanda, que além de esposa, é uma pessoa extremamente protetora com minha irmã. Pedi que ela fosse sozinha da primeira vez, que era pra poder conversar mais a vontade, se reconciliar, introduzir a Vanda aos poucos, mas Lelê não aceitou. Ela queria fazer as pazes com a mãe, mas à sua maneira.

Sempre estive ao lado dela, porém torcia para que houvesse um final feliz. Que a amizade das duas, após o "conserto", ficasse parecida com a original de fábrica. Queria paz.

Lelê tinha todas as suas razões. Eu nunca lhe questionaria. Até porque eu só fazia, era me colocar em seu lugar.

Precisamente não lembro da data, lembro-me que foi em abril de 2016.

— Mana, não sei como te falar mais uma vez que te dou toda a razão disponível em mim, mas numa reconciliação, ceder faz parte.

— Eu sei... — ela chora.

— Então vem. A Vanda pode ficar malocada lá no apartamento do Antônio até tu conversar com a mãe. Sabia que ele se mudou no ano passado?

— Sim, tu já me disse no ano passado.

— Ah tá... mas pensa bem e fala com a mulher de uma vez. Ela te pariu, foi pai e mãe, tem um monte de defeito, mas tá bastante mudada. Acho que é o maior sonho dela, que tu dê um abraço de dia das mães outra vez. Preciso também que tu me ajude a dividir as broncas outra vez, porque ela pegou confiança comigo e o Antônio e tá sendo uma chata.

Minha irmã ri e diz que vai pensar. 

Mas um dia, ela aparece de surpresa numa manhã de sábado fresquinha, trazendo em suas mãos uma cesta de frutas e café da manhã. Eu choro o mesmo tanto que ela quando nos abraçamos, Vanda fala que vai dar uma volta e eu peço que espere porque a família foi ao culto de sábado.

— Eu tô com medo...

— Ela também, eu acho. Mas vai dar certo. Queria que o Antônio tivesse aqui... — falo meio sério.

Elas se espantam.

— O que aconteceu com ele?

— Tá limpando o apartamento sozinho. Me chamou de chato ontem quando eu falei que ia dormir lá pra acordar cedo e ajeitar a "maloca" dele. Aí rolou uma briguinha.

— Ai, Vander... não fica triste. Quer que eu fale com ele?

— Claro, nós podemos fazer um meio de campo — Vanda se oferece.

— Quê??? Eu triste? Eu tô com ódio. Eu que quis vir pra casa e fiz ele me trazer. Se eu ficasse lá hoje de manhã, ele ia tomar umas bifas. Eu, eu... odeio quando ele diz que sou chato.

— Mas tu é, meu nego.

Nota-se o amor entre irmãos. Que vontade que deu de retrucar que pelo menos não sou chorão igual a ela. Se eu fizesse isso, corria o risco de minha mãe e ela, não conversarem. Isso custou para acontecer, eu me puniria sete vezes se eu mesmo estragasse o momento.

Apreensão, desconforto, ódio e saudade... eu sentia isso meio embolado e tudo junto naquela manhã. Odeio ser chamado de chato e não foi a primeira vez. Wolf tá precisando de um castigo. Mas um castigo ruim e não sexo com BDSM que o deixa todo alegrinho.

Acomodo as duas em casa e aviso que vou comprar algo pra nós tomarmos um café juntos.

Aiai... eu tô bravo hoje e não perdoo com facilidade.

— AH!!! — Alguém já ouviu um grito muuuuito gay? Tão gay que chega a ser fino? Muito prazer: sou o grito do Vander. — Esse viado ruivo, só... eu mato ele...

Eu acabo de voltar da padaria, um carro zarpa da frente da minha casa e quando eu entro... rosas... rosas vermelhas.

Tem buques extravagantes de rosas no sofá, em cestas de vime pelo chão, na minha cama tem pétalas de rosas e um ruivo (sem vergonha na cara) rindo enquanto eu choro feito moleque quando rala o joelho.

— Oi Vander. — ele cumprimenta rindo todo fofinho. — Será que dá pra me perdoar?

— Vou te esmagar com um abraço e depois vou te surrar... porque gastou tanto dinheiro?

— Naaa, você merece.

— Tá feliz né? Me fez chorar. — sou abraçado "fofamente" e ele pede perdão por ter me chamado de chato. Me sinto um chato quando as meninas entram no quarto e reforçam que sou chato mesmo.

— Antônio tu é um santo homem. O Antônio deveria ser canonizado, Vander. Tu é um baita dum chato, ele não pode sair um dedo da linha e ainda tenta te agradar quando tu tá errado.

Vanda me taca a verdade na cara. Eu sou um pouquinho ruim, eu sei bem. Mas reconheço o meu defeito e peço que ele me perdoe também.

— Tu merece um cara menos idiota. — Eu falo.

— Mereço só você. Não se chame assim. Eu não fiquei chateado contigo, só te chamei de chato, porque né... é chatinho.

— Te adoro.

— Tô trinta e três vezes mais apaixonado.

— Ainda tá contando?

— Aham. Se você mudar perde a graça. Eu te adoro assim, ruinzinho mesmo.

— Preciso de um dentista, acabou de apodrecer todos os meus dentes de tanta doçura... — Vanda chama nossa atenção.

Ainda rindo, vamos todos para a cozinha da minha mãe. Dois casais de configuração diferente do que ela queria, porém felizes a nossa maneira e afins de compartilhar um pouco dessa alegria com quem amamos.

— Ei, a Leopoldo ganhou uma irmãzinha. Adotamos mais uma gata de rua. — Alessandra conta toda orgulhosa. — Apareceu lá em casa uma toda branquinha, magrinha faltando pelo em algumas partes do corpo, um olhinho fechado machucado e outro aberto bem verdinho. Nós sabíamos que não teria dono e que os cachorros de rua logo iam matar a coitadinha, então recolhemos e colocamos no começo uma caixinha de papelão separada da Leo. Depois fomos cuidando. Comprei um colírio receitado pelo veterinário e pinguei no olho que nós achamos que tava furado, mas não tava, ela tem um olho azul e um verde.

Só faltou sair corações pelos olhos dela. Pensa numa menina feliz ao falar da pequena Sandrinha.

— Hahaha, ai Lê, Sandrinha?

— É bonitinho né.

— Não contraria, meu cunhado, porque eu que sofro depois.

— É bonitinho sim. — Antônio concorda e eu suspiro. Ainda morro de fofura com ele. Me arrependo das minhas maldades, só um pouco.

Falando em Sandrinha, o Celta entra na garagem e um pedaço de rosca para no meu esôfago. Dá-lhe água pra empurrar.

— Ei, vamos dar uma volta? — com certeza Vanda e Antônio vão aceitar. Isso é óbvio.

— Não. — eles me respondem juntos. E Vanda diz que não arreda o pé, sem saber se a mana tá bem.

— Ah eu quero ouvir a conversa. — Antônio responde sem cerimônia.

— Claro que não. Eu quero sair um pouco. Vamos deixar as duas conversarem.

Já tô na porta e os dois curiosos nem se mexeram.

Sem tanto suspense, minha mãe entra na cozinha e começa o choro, abraços, mais abraços, mais choro, nenhuma palavra e num abraço, minha mãe puxa a Vanda também.

— Obrigada por cuidar da minha filha.

— Sua filha é meu maior tesouro. Acho que o momento é das duas. Agora sim, Vander vamos dar uma volta pra deixar as madames conversarem.

— Vem Antônio. — Alguém crê que ele não tinha levantado da mesa? Como bom noveleiro, amante das novelas dramáticas do SBT principalmente, ele queria ver o capítulo da reconciliação até o fim e com jeito, achamos algo que o entretece quando fomos dar uma volta.

— Queria ouvir as duas conversando. — sempre honesto, ele fala novamente. — Pode ser real ou na ficção, mas uma cena de perdão é sempre linda. Ainda mais mãe e filha, filho, pai, irmão... se é pra chamar de família, precisa estar tudo bem. Porque se for pra ser infeliz, melhor ficar longe mesmo.

Eu entendo perfeitamente o tom da amargura dele, porém outro dia eu relembro e conto sobre o que aconteceu em março de 2015...

— Família é quem nos faz bem. — Vanda fala.

— Família é família. Aprendi com o Vander. — ele confessa. Antes sua filosofia era: família é quem escolhemos ou como disse a Vanda: quem nos faz bem. Eu o convenci que família também tem problemas. Lidamos com isso ou nos cercamos de pessoas estranhas que podem dar certo conosco ou não.

.

Naquele sábado, dia que minha mãe consagra por conta de sua religião, pudemos pela primeira vez, almoçarmos todos juntos, seus dois filhos com seus respectivos pares.

Foi bastante emocionante nosso momento, nossa reconciliação. Nossas conversas escolhidas com cuidado, nosso medo de quebrar o encanto do momento. No fim tudo foi lindo, quase perfeito. O quase não tem nada a ver com as mancadas do Wolf, mas com a própria situação. Amizade, amor e família que uma vez foi interrompida e agora tinha um "remendo" frágil e recém colocado.

Acredito que faríamos de tudo para que esse remendo sumisse o mais breve possível, deixando somente todos nós unidos novamente.

— Dona Vanda, a senhora... — Antônio não pode falar. Nem sei o que é, mas hoje não.

— Ah, Wolf, ei, me ajuda a catar esse monte de rosa pra colocar tudo lá no meu quarto.

— Mas a Vanda... — ele tenta.

— Não, não... vem comigo. — No meu quarto ele me abraça e me chama de lindo. Pergunta porque eu o interrompi. — O que tu ia perguntar?

— Se quando ela era nova, também foi assim com a família dela. — até que não era tão grave, mas na frente da mãe naquele momento, melhor não. — Tem muita gente que igual a Alessandra sofre o pior preconceito dentro de casa.

— Infelizmente. Mas a gente levanta a cabeça e segue adiante.

— Nem sempre a pessoa consegue fazer isso. Família é família. A gente sempre. volta e meia. pensa na aceitação deles. Na reaproximação... eu não vou correr atrás do pai, nem do Marcelo, não vou me rebaixar por eles. Nunca se preocuparam muito comigo desde que saí de casa e quem se preocupava, agora...

— Não fala disso — abraço meu lobão, porque tá na academia, tá grande. — Eu vou ter que dormir no seu apartamento hoje.

— Porquê? — ele provoca.

— Porque a mana vai dormir no meu quarto.

— Mas a cama é de solteiro.

— Eu coloquei o colchão de casal da visita no meu quarto e agora não tenho onde dormir.

— Dorme na sala... — ele tá pedindo. Dá um riso bem sem vergonha e ameaça: — Lá tu não vai conseguir dormir. Vou mexer em você a noite toda.

— É...?

— É.

— Mexer de que jeito?

— Vou...

— Antônio. Vander! Vem filho, janta.

A mulher pegou nós dois no flagra, sentadinhos no seu sofá, comigo no colo do genro. Deu pra ver que ela ficou um pouco sem graça, mas nada diria na frente dele, né. Geralmente é na minha fuça que ela aponta o dedo e acusa:

"O Antônio respeita a nossa casa, mas tu fica se esfregando nele. Poxa Vander, já falei..."

Valha-me Deus. Eu baixo as orelhas lindamente.

Então me cuido pra não levar as broncas dela.

Porém sua felicidade estava tão radiante que ela nem lembrou disso durante a primeira e segunda semana que se passaram. Já pensava no dia das mães, na filha que agora viria para abraça-la depois de anos de separação.

Eu confesso que comecei a sentir um ciúme bem pequeninho quando pegava as duas conversando por telefone ou quando a minha mãe dizia;

"Vander, desliga o feijão que tô falando com a Alessandra do whats."

"Filho, meu celular descarregou, avisa a Alessandra que vi os vídeos que ela mandou."

"Olha, a Lelê me mandou um vídeo do Clodovil. Eu odiava ele, mas essa entrevista aqui nos anos oitenta, me fez gostar muito dele. Sério? Ele morreu? Quando foi isso?"

Aiai, elas parecerem interessadas em recuperarem tudo o que perderam durante esse tempo e bem no fim, me dá uma alegria muito grande em ver isso. Mesmo com minhas crises de ciúme, tipo:

— Mãe, não coloca cebolinha na maionese, eu não gosto.

— Mas a Alessandra e o Antônio adoram.

— Ah tá. Eu não sou mais tão importante aqui né?

— Larga de drama e arruma a mesa. Ah, faz o suco.

— Tá bom... — vou, mas arrasto o chinelo pra mostrar que tô bravo. — Palmito? A senhora usou o meu vidro de palmito pra fazer um empadão? Eu falei que ia fazer pastelzinho pra levar na despedida da Giovana que vai embora.

— Usei. Compra outro depois.

— Aff... — Faço minhas tarefas, arrumando mesa, fazendo suco, ajeitando a pia e atendendo as manas que chegam. Antônio vem quase coladinho nelas e quando salta da moto passa um trabalho pra retirar a embalagem de presente que trouxe.

Dia das mães. Ano de 2016. Eu pude ver o abraço que a minha mãe e também a Alessandra tanto precisavam. Minha mãe me surpreende e dá uma lembrança à minha irmã: uma orquídea linda e florida como aquela que ganhara no passado. Até o Antônio desviou o olhar, pois um ano antes dona Marta se foi e ele se apegou foi com dona Vânia mais ainda.

Tadinho, se comportou feito menino e esperou sua vez de dar nosso presente, aquele presente que ela falou por dois meses seguidos, desse jeito:

"Ah, minhas panelas estão com o teflon todo arranhado."

"Vi uma promoção de panela, lindas, por fora vermelhas e por dentro com uns desenhos, ali naquela loja parcela em 10x sem juros."

"Essa panela é horrível, mas cozinha bem rápido. O dia que eu tiver um jogo novo de panela, vou jogar essa coisa feia no lixo."

"Olha Vander! Chegou esse encarte da loja, meu sonho, essas panelas."

Misericórdia! Eu entendi que ela queria panelas, precisava de panelas específicas. Porque mesmo ganhando as novas do jeito que tanto quis, ela não mandou as velhas embora. Pior, transformou a panela de ferro que ela acha feia, num vaso. Meteu um xaxim dentro e plantou a MINHA orquídea, que já foi dela, que foi pro lixo e agora mora pendurada na garagem e cuidem com a cabeça quando forem visita-la porque eu já fiz um galo na testa.


********************

Aiai família... trem bão esse. Perfeita nem pensar, mas importante com certeza.

Obrigado pessoal pela paciência e pelo carinho. Um beijão e muitos pelos de gato, bafinho deles na nossa cara... minha gata dorme no meu peito e boceja na minha cara, kkk Senhor. 

Beijos =^.^=

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