capítulo 2
- Pode beijar a noiva. - O padre encerra a cerimônia.
Cassandra e Jonathan obedecem e se beijam na frente dos convidados, que aplaudem.
Detestava casamentos, não passam de uma fantasia idiota, provavelmente porque nunca havia conhecido alguém que tenha dado certo, e não acredito que encontraria.
Minha irmã, Cassandra, pensava o oposto, que o casamento era o começo de uma nova vida, uma nova oportunidade de fazer a diferença com seu marido e o filho que esperava no ventre. Seja como for, ela tinha razão, pelo menos o casamento dela me faria começar uma vida nova.
Lágrimas de alegria descem no rosto de Luna Sandler, a matriarca da família. Não sabia que cegos choravam até aquele momento.
- Pelo menos um dos meus filhos terá futuro. - Nossa mãe falou alto, sem se importar com a minha presença ou a dos meus irmãos.
A opinião da minha mãe não tinha muita importância, o que era um certo livramento, já que ela só esperava que as mulheres da família Sandler arrumassem maridos afortunados. Eu odiava a ideia de depender de alguém para alguma coisa, e claro que o casamento conturbado dos meus pais não ajudava em nada para que eu desejasse essa experiência.
Milena, a caçula da família, após a minha chegada, não presta muita atenção nos devaneios da nossa mãe. Ao invés disso, fica grudada em mim o máximo possível. Adorava crianças, e ela deixava isso mais fácil, tirando os seus momentos extremamente irritantes que só uma criança de cinco anos conseguia proporcionar.
Adam não se importava muito com a opinião de ninguém fora da sua faixa etária, principalmente se o assunto não fosse relacionado a festas, bebidas e sexo.
- Ela está falando de nós? - Pergunta Milena, que me abraçava desde o começo da cerimônia.
- Está apenas nos criticando. - Vejo Cassandra saindo com o seu noivo de camarote na primeira fileira de bancos ao lado de sua família.
- A gente não fez nada, né? - Diz Milena, que já conhecia o comportamento de nossa mãe.
- Lógico que não, querida. - Acaricio os seus cabelos cacheados.
- Se todos nós tivéssemos futuro, você ia para o asilo. - Depois de algum tempo, Adam se intromete, com uma cara de tédio, provocando nossa mãe.
- Cala boca. - O repreendo.
- Só digo a verdade. - Fala em meio a um sorriso.
- Teriam coragem de me colocarem em um asilo? - Pergunta Luna Sandler, ouvindo apenas o que lhe convinha, e apenas agora se pronunciando assombrada.
- Não é hora de falar sobre esse tipo de coisa, vamos curtir o casamento. - Digo, fuzilando Adam com o olhar para que entenda que era hora de encerrar o assunto.
- Você não negou. - Adam diz sorrindo mesmo com a cotovelada que eu lhe dei.
Adam usava uma camisa social branca e uma calça preta, estava bonito como sempre, uma pena que não conseguia usar o cérebro.
- Não vamos fazer isso ser mais difícil do que já é. - Sussurro para o irmão. - Deixa ela falar sozinha, e a gente segue a nossa vida, temos que ser inteligentes.
- Isso é bem mais cruel do que rir da cara dela.
- Eu não tenho tempo para me preocupar com isso, tenho que cuidar de uma criança, um adolescente idiota e uma cega, não vou arrumar mais confusão para mim, e eu conto com a sua ajuda.
- Quem é o adolescente idiota? - Diz com uma cara de espanto. - Eu pelo menos não estou solteirão, igual a você. - Diz em tom risonho, acerto um soco em seu braço nem um pouco discreto.
- Se comportem. - Interrompe a mãe com a voz ainda de choro.
- Quando ficou tão fria? Você era mais divertida. - Fala debochando. - Preciso beber. - Mudando de assunto, logo fica de pé e avista o open bar.
- Não vai ficar com a sua namorada? - Digo, procurando-a no meio da multidão.
- Ela está com os pais dela lá atrás, a gente não pôde ser os padrinhos. - Falou inconformado, já que foi ele quem levou a irmã para o altar, o que eu achava ser apenas uma desculpa de Cassandra para Adam não ser padrinho.
- É a vida, lindão. - Digo fraternal. - Vai lá se divertir.
- Não precisa pedir. - Diz me dando um beijo na bochecha. - Deixa as chaves escondidas para mim.
Adam se vai e provavelmente não voltará hoje, nem ficará muito tempo no casamento, não fazia ideia de onde se meteu. Não se recordava que na adolescência havia vivido algo semelhante aos desaparecimentos do meu irmão, mesmo que a minha adolescência tenha sido um caos completo dentro da minha casa.
A festa começa a todo vapor. Músicas dos anos 2000 tocavam, e as comidas e as bebidas foram liberadas.
Minha família estava sentada em uma mesa especial perto do bolo de casamento, longe da bagunça que rolava do outro lado do salão.
Quase uma hora se passou, e Milena agora dormia no colo da mãe, quando finalmente Cassandra e o noivo vêm até nós em cumprimentos calorosos.
Minha irmã estava deslumbrante trajada para o seu casamento, e nem sequer parecia que estava grávida de quatro meses.
- Obrigada por tudo. - Minha irmã me diz, me abraçando. - Sei que foi um sacrifício voltar para casa.
- Não precisa agradecer, família é prioridade.
- Assim que eu me estabilizar, vou trazer nossa mãe ou Milena para morar comigo.
- Cuida da sua gravidez e do seu marido, e me viro com elas.
- Está sendo muito lindo o que você está fazendo, depois de tudo que aconteceu.
- O passado ficou no passado. - Não era hora de recordar as brigas que rondavam a adolescência que me motivou a sair de casa. - Vai curtir sua festa!
- E você está curtindo? - Pergunta Jonathan. - Olha, minha mãe está indo para casa com a irmã dela, posso pedir para levarem Milena e Luna.
- Isso não depende de mim. - Falo, me virando para onde minha mãe estava sentada, com Milena ainda dormindo.
- Mil perdões, minha filha, mas quero uma cama, se não se importar, eu vou para casa.
- Não precisa, a casa da minha mãe é aqui do lado, ela tem um quartinho reservado para você e para Milena. - Jonathan respondeu.
- Prefiro a minha casa, estou com dor nas costas. - Diz ela impaciente.
Eu conhecia o final da história, teria que ir para casa com elas.
- Mas não vai ser possível. Ellen não vai poder te levar tão cedo. - Diz Jonathan.
- Deixa de bobagem, garoto. Ellen, vamos embora, eu já casei minha filha, e eu detesto barulheira. - Ela se levantou sem se importar com a minha opinião.
John olha para Cassandra, que se volta para mim e diz:
- Ellen, eu adoraria que você ficasse, mana.
- Eu fico. - Digo sem muita certeza, mas seria uma das poucas chances de curtir que teria nos próximos meses, eu queria aproveitar.
- Vou avisar minha mãe, e o pessoal vai te levar. - Diz Jonathan para a sogra, ignorando as queixas. - Vem comigo, Ellen.
Enquanto saímos só nós dois de perto das garotas, eu pergunto a ele:
- Aconteceu alguma coisa, Jonathan?
- Nada, era só para te deixar aqui. - Ele diz com um sorriso de dever cumprido.
- Espero que valha a pena, pois ela vai chorar a noite inteira e reclamar disso por uma semana.
- Vai valer a pena, me espera no bar.
Vai me apresentar a algum homem, imagino sem graça. Se for bonito e não for um imbecil, que mal tem. Melhor ir ao banheiro, reflito.
Ao entrar no banheiro, me deparo com o meu reflexo no espelho. Revela um vestido vermelho de renda que fazia contraste com a pele morena, ajeito os cachos volumosos que batiam nos ombros, e analiso o sorriso entre os lábios grossos que herdei de meu pai.
Era perfeita, ouvi a voz de Milena em minha cabeça. Quando crescer, serei igual a você. Aquilo me deixava orgulhosa.
Vou pro open bar no fundo do salão com a confiança lá em cima e peço uma caipirinha brasileira, enquanto espero por John.
- Minha nossa! O que aconteceu aqui? - Jorge anuncia a sua chegada sentando ao meu lado.
Esse cara não. Penso impaciente.
Ele estava em uma camisa social e calça jeans preto, com um tênis branco, a pele branca, e o rosto liso como a bunda de um bebê, o cabelo combinava com o rosto e olhos castanhos, favorecia ainda mais sua beleza, estava em forma, mas não chegava aos pés dos soldados musculosos da Zelândia. Mas ele era lindo, e só agora reparei nisso.
- Era só o que faltava, o que você quer? - Falo impaciente.
- Quase não te reconheci, você está... impressionante. - Diz me secando dos pés à cabeça.
- Não, querido. Estou linda, gostosa e perfeita. - Digo sorridente e confiante.
- Era exatamente o que eu queria dizer. - Fala em tom de flerte.
- Aliás, o que você está fazendo aqui? - Digo atropelando a sua tentativa de ser galanteador.
- Ah, sabe, quando as pessoas me convidam para festas, eu costumo aceitar.
- Às vezes é por educação?
- E por educação eu aceitei. - Ele responde satisfeito. - E você é a irmã da noiva, né?
- Como sabe?
- Eu vi no altar, você no meio da família dela, e bem, vocês são parecidas.
- Você é o que dela? - Pergunto curiosa, e matando meu drink.
- Nada, sou amigo do noivo. - Diz sinalizando para o garçom mais dois drinks.
- Ah, entendi, você que armou tudo isso? - Pergunto impaciente.
- Armei o quê? - Se faz de inocente, como se não soubesse do que eu estava falando.
- John disse ter uma surpresa para mim e você surge do além? - Pergunto sarcástica.
- E se eu fosse? Qual seria o problema?
- Ah, você não lembra. - Falo ríspida. - Cuidado com o que faz, alguns morreram por menos. - O imito, repetindo o que ele havia me dito na noite passada, no restaurante.
- Esse sou eu. - Diz Jorge com desdém. - Você é péssima nisso.
- E você é um idiota.
- Nossa! Como eu sou burra! - Diz me imitando, fazendo uma careta, me lembrando de quando eu acertei o suco na cara da loira.
- Você faz pior. - Sorrio da imitação.
- Nós somos horrorosos. - Ele diz olhando no fundo dos meus olhos castanho-claros, até ele se distrair e chamar alguém atrás de mim.
John vem até nós, e Jorge o parabeniza.
- Estou vendo que estão se dando bem.
- Longe disso. - Diz Jorge. - Bem, a nossa querida?... - Jorge me encara e sussurra. - Qual é o seu nome mesmo?
- Ah, é japonês, Melcu duendo.
- Parece nome de homem. - Cochicha e se volta para John. - Melcu doendo está...
Solto uma gargalhada seguida por Jorge, que gargalha igual uma hiena, o que me faz rir mais ainda por longos segundos, até sermos interrompidos por John.
- Pessoal preciso ir. - Diz sorrindo e já saindo.
- Não espera, qual era a surpresa mesmo? - Falo entre risos, o fazendo retornar.
- Iria te apresentar a minha irmã e as minhas primas, elas são bem divertidas, mas você está bem acompanhada.
- Onde que elas estão? Me apresenta, por favor?
- Só vou resolver uma coisinha, me espera aí? - Diz já saindo rapidamente.
- Vai me deixar, meu bem? Sabe que eu não vivo sem você, Melcu Duendo? - Diz se passando por apaixonado, segurando para não rir.
- Me desculpe, Jorge. - Falo com voz boba. - Mas você tem sua rapariga loira, esqueceu? - Digo arrumando o colarinho de sua camisa.
- Que tipo de pessoa você acha que eu sou para pensar que eu namoro alguém como àquela maluca? - Diz ofendido, bebericando seu whiskey.
- E o que você tem com ela? - Pergunto curiosa.
- Eu gosto do jeito dela. - Diz segurando o riso. - Ela é gentil, educada, carinhosa, meiga, simpática. Ela tem um caráter ímpar. - Soa debochado.
- Você só está com ela porque ela é gostosa e rica?
- É, sim, o que me entregou?
- Aqueles peitões que ela tem, os olhos azuis, o rosto bonito. Aparentemente são as únicas qualidades dela.
- Bem, não faz mais diferença, eu terminei com ela ontem à noite. Aquilo no restaurante foi a gota d'água.
- Bom para você, mas eu lembro que você estava rindo lá. - Digo voltando o tom brincalhão.
- Verdade, te devo desculpas, mas sendo bem sincero, se ela te visse hoje, ela implicaria ainda mais com você.
- Por quê?
- Não preciso dizer. - Ele diz olhando para mim. - Você é divertida, e como você mesmo disse. - Ele bebe seu whiskey. - Eu sou linda, gostosa e perfeita. - Diz imitando uma voz de mulher fajuta e balançando a cabeça em cada adjetivo.
Sorrimos juntos. Ele tinha um sorriso lindo, seu olhar cruza o meu, ele me admirava.
John retorna sorridente e pede uma bebida.
- Prazer em te conhecer, senhorita Melcu duendo.
- Ellen Sandler. - O corrijo.
- Que nome horrível. - Diz em uma careta.
- E o seu, bonitão? - Digo já me levantando.
- Jorge Mamaki. - Diz tentando lamber os peitos rapidamente, me fazendo cair na gargalhada.
- A gente se esbarra por aí. - Aviso sorridente.
Ele acena com a cabeça, e vou embora com John.
- Quantos anos vocês têm? Você está igualzinha a Milena e Adam. - Diz John perplexo entre risos.
- Nossa família é assim mesmo. - Digo sorrindo e com um pressentimento de que a noite me reservaria grandes surpresas. E infelizmente elas eram tenebrosas.
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