IV
Estava quase anoitecendo, enquanto eu estava no nosso escritório em casa, completamente imersa em relatórios, ouvi barulhos vindos da cozinha. Eu sabia que tinha esquecido de comer — de novo. Para mim, um café era suficiente para enganar o estômago. Quando me levantei para investigar, dei de cara com Noah na cozinha, algo que não acontecia com frequência.
— O que você está aprontando? — perguntei, cruzando os braços e o observando.
Ele nem olhou para mim, concentrado enquanto misturava algo em uma tigela.
— Princesa, se você acha que pode viver só de café e trabalho, está muito enganada.
— Ah, então agora virou nutricionista? — provoquei, inclinando a cabeça.
Noah riu, mas não desviou o olhar da comida.
— Só quero evitar que você desmaie antes de resolver seus casos brilhantes.
Caminhei até a mesa, vendo o prato que ele estava montando: crepioca com queijo sem lactose, tomate e orégano — minha combinação favorita. Ao lado, um copo de suco de uva natural. Meu estômago roncou, traindo minha fachada indiferente.
Ele colocou o prato na minha frente e sentou-se do outro lado da mesa, apoiando o queixo nas mãos e me observando enquanto eu pegava o talher.
— Estou esperando.
— Esperando o quê? — perguntei, tentando ignorar o sorriso no canto dos lábios dele.
— Você dizer que está ótimo, Hailey. Vai ser difícil, mas sei que consegue.
Revirei os olhos, mas dei uma mordida. O sabor era exatamente como eu lembrava. Ele sabia como eu gostava, algo tão pequeno, mas que significava muito mais do que ele deixava transparecer.
— Não está ruim — murmurei.
Ele riu, divertido.
— "Não está ruim"? Vou considerar isso um elogio vindo de você.
Olhei para ele, balançando a cabeça enquanto terminava a comida. Por mais que ele adorasse provocar, era nos pequenos gestos que Noah mostrava quem realmente era. Depois de um tempo, o silêncio entre nós foi quebrado, mas foi Noah quem falou, com um tom mais sério, quase pensativo.
— Você sabe, né? Que precisa cuidar mais de você.
Aquelas palavras vieram tão naturalmente que eu mal percebi, mas quando finalmente me dei conta, o peso delas começou a se fazer sentir.
— Eu cuido de mim. — Falei, tentando me convencer, mas não pude deixar de notar o tom em que ele disse aquilo. Ele sabia que eu estava mentindo.
Ele riu baixinho, como se eu fosse uma criança tentando escapar de uma repreensão.
— Está cada vez mais difícil acreditar nisso.
Olhei para ele, e foi quando me lembrei de algo. Algo que eu ainda não tinha conseguido processar completamente.
— Se for em relação a consulta da semana passada... — comecei, sem graça, as palavras escapando. — O médico deixou bem claro que eu não consigo ter filhos. Então, não faz sentido se preocupar tanto com isso.
Noah se aproximou, caminhando até onde eu estava. Ele não disse nada por um momento, apenas se posicionou atrás de mim, envolveu-me em seus braços com uma delicadeza que me fez sentir ainda mais vulnerável do que já estava.
Com o rosto próximo ao meu pescoço, ele inspirou profundamente, como se estivesse sentindo o cheiro da minha pele, e beijou levemente a região do meu pescoço, fazendo-me estremecer.
— O doutor não te conhece tão bem quanto eu — ele disse, a voz baixa e cheia de confiança, como se quisesse me transmitir algo que não tinha palavras para explicar. Ele sorriu contra a minha pele, sentindo minha reação. — Eu sei o que você precisa, Hailey.
Eu não sabia o que responder. Estava completamente envolvida pelo carinho dele, pela maneira como ele estava me tratando de forma tão suave e protetora, como se eu fosse a coisa mais preciosa para ele.
Ele continuou a me abraçar, e eu pude sentir a sinceridade em suas palavras. Ele realmente acreditava no que estava dizendo, e aquilo me fez sorrir, mesmo que estivesse confusa com tudo.
Afinal, naquele momento, não era apenas sobre o trabalho, nem sobre os diagnósticos médicos. Era sobre nós dois. E, por mais que eu tentasse negar, havia algo ali que eu não podia ignorar.
Eu ri baixinho, balançando a cabeça, com um sorriso no rosto.
— Você é impossível.
— E você adora isso — ele respondeu, com um tom brincalhão, mas havia uma leveza em sua voz que transmitia o cuidado e o afeto que ele tinha por mim.
Sim, eu adorava isso. Adorava o jeito que ele cuidava de mim, o jeito como, mesmo nos momentos mais inesperados, ele conseguia me fazer ver as coisas de uma perspectiva diferente.
E, enquanto ele me abraçava, me senti mais segura, mais amada do que eu jamais imaginei que fosse possível. O futuro parecia incerto, mas, com ele ao meu lado, eu sabia que poderia enfrentar qualquer coisa.
O silêncio entre nós era confortável, preenchido apenas pelos sons da respiração dele e pelo bater suave dos nossos corações. Eu fechei os olhos, sentindo seu toque em minha pele, e deixei que aquela sensação de paz se instalasse em meu peito.
Mas, antes que eu pudesse me perder mais naquele momento, ele se afastou lentamente, ainda me mantendo envolta em seus braços. Olhei para ele, e ele parecia mais sério agora, seus olhos profundos refletindo um brilho que eu não sabia interpretar.
— Vem cá — ele disse suavemente, ainda com aquele sorriso no rosto, mas com um toque de urgência. Sem esperar minha resposta, ele me levantou delicadamente e me carregou nos braços, como se eu fosse a coisa mais preciosa para ele.
Fui envolta por aquele abraço forte e seguro, e, em um impulso, beijei seus lábios com a mesma intensidade com que ele me beijava. A respiração dele ficou entrecortada, e logo ele começou a me deitar na cama, afastando-se para retirar sua camisa com um sorriso travesso.
— O que você... — comecei a dizer, mas, ao vê-lo tirando a camisa, meu olhar se desviou para o corpo dele, para o jeito confiante com que ele fez aquilo, e eu não consegui segurar o riso.
— Ah, não vai dizer que ficou surpresa agora — ele respondeu, sorrindo de canto.
Eu ri com ele, mas logo a atmosfera ao nosso redor mudou, e um calafrio percorreu minha espinha. O tempo parecia ter congelado por um instante, e, no exato momento em que ele estava prestes a se deitar ao meu lado, tudo se desfez como uma névoa, deixando-me sozinha em um quarto vazio.
A cena se quebrou, e o calor do abraço dele desapareceu, substituído pelo frio da realidade.
Agora, eu estava de volta ao meu escritório, onde tudo parecia tão diferente. A camisa de Noah estava em minhas mãos, ainda com o cheiro dele, mas isso parecia ser tudo o que restava dele. O ar ao meu redor estava pesado, como se a presença dele ainda pairasse, mas ele estava... longe.
Fechei os olhos por um momento e, com um suspiro, coloquei a camisa sobre a mesa. O peso da saudade me esmagou, mas eu não tinha tempo para me perder naqueles sentimentos agora. O que importava, mais do que qualquer outra coisa, era encontrar Noah. Era a única coisa que eu podia fazer para aliviar esse vazio que me consumia por dentro.
Olhei para o tecido da camisa, alisando suavemente a parte da frente, como se pudesse, de alguma forma, trazê-lo de volta. Minhas mãos hesitaram por um instante, e eu me perguntei se havia algo mais além disso, se tinha algo que ele queria que eu soubesse antes de desaparecer, se havia algo em mim que ele tivesse abandonado. Voltei a atenção para a minha barriga por um momento, um pensamento que começava a tomar forma em minha mente, mas eu ainda não tinha certeza. A possibilidade de estar grávida era um peso que eu mal conseguia carregar. Mas, no fundo, algo me dizia que ele sabia, que ele sentia algo que eu ainda não conseguia entender completamente.
Suspirei fundo e, sem querer perder mais tempo, peguei o telefone e liguei para os gerentes e supervisores, tentando obter qualquer informação sobre o desaparecimento dele. A cada ligação, a esperança se dissipava um pouco mais, como se o vazio ao meu redor fosse ficando maior a cada palavra que eu ouvia.
"Não há novidades. Estamos investigando, mas ainda não temos nada concreto", disseram os primeiros. E a sensação de impotência foi se instalando em mim, com cada resposta negativa.
Eu desliguei o telefone após a última ligação e me afastei, meu olhar se fixando na camisa de Noah mais uma vez. Ela parecia uma lembrança de um passado recente, algo que me conectava a ele de uma maneira que eu não podia ignorar.
Enquanto minha mente buscava alguma explicação, minha mão foi até a camisa novamente. Segurei-a com força, apertando contra o peito como se pudesse sentir algo mais ali, uma mensagem não dita, uma última lembrança. A saudade me dominava, mas eu sabia que não podia parar agora. Eu precisava encontrar Noah. Precisava saber o que aconteceu com ele.
E, enquanto a cidade continuava a girar ao meu redor, eu não podia deixar que as respostas fugissem de mim. Ele ainda estava por aí, e eu iria encontrá-lo, não importava o que fosse preciso.
Com o pensamento firme, levantei-me da cadeira, decidida. O tempo não poderia me esperar.
Enquanto saía discretamente do escritório da S.I.G.M.A, a sensação de estar quebrando todas as regras me consumia, mas não havia outra escolha. O laboratório subterrâneo nas velhas indústrias abandonadas de Nyxville era minha única pista, e eu não podia desperdiçar mais tempo. Cada passo que eu dava em direção àquele lugar parecia me afastar mais da segurança e das respostas que os outros acreditavam serem suficientes. A urgência que queimava dentro de mim não me permitia hesitar.
O vento frio da noite fazia as sombras parecem um cenário de filme de terror com as ruas vazias da cidade. O laboratório era escondido e a entrada ainda mais discreta. Ao passar pelas construções deterioradas, o prédio imenso parecia engolir a luz da rua. Uma sensação de inquietação me invadiu. Em algum nível, eu sabia que estava indo para um local onde as coisas não eram o que pareciam, e ainda assim, estava disposta a seguir em frente.
As instalações estavam em total abandono, mas as portas de segurança ainda estavam intactas, um sinal de que algo poderia estar acontecendo ali. Eu precisava encontrar respostas sobre o que estava por trás dos experimentos. Eu sabia que Noah estava de alguma forma envolvido, e isso me guiava. Mas, ao mesmo tempo, algo no fundo da minha mente me dizia que o risco que eu corria poderia ser maior do que qualquer resposta que eu encontrasse.
Caminhei pelos corredores do laboratório com passos rápidos e cuidadosos, tentando não fazer barulho. Tudo estava em silêncio absoluto, o que só aumentava a tensão no ar. Mas, de repente, um som abafado cortou o silêncio, vindo de uma das salas adiante. Um barulho estridente de algo se arrastando, seguido de uma espécie de rosnado grave.
Meu corpo congelou. Sabia o que aquilo significava. Era um dos NeoGen, os mutantes geneticamente modificados que estavam sendo usados em experimentos. Um calafrio percorreu minha espinha. Eu não sabia exatamente o que ele faria com alguém como eu, mas a minha prioridade agora era evitar ser pega. Antes que eu pudesse dar mais um passo, uma presença preencheu o ambiente, e meu coração disparou. De algum modo, eu sabia quem era, antes mesmo de ver seu rosto.
Ele apareceu das sombras, tão silencioso quanto uma serpente, vestindo um terno preto impecável. Seus cabelos brancos como neve refletiam a pouca luz da sala, eles eram ondulados presos do mesmo tamanho do cabelo de Noah. Ele se movia com uma graça quase predatória, seus olhos, parcialmente ocultos pela máscara, fixaram-se em mim. O que mais me incomodava era o sorriso que ele tentava esconder, como se soubesse algo que eu não sabia.
— Ah, é você está aqui — a voz dele, baixa e suave, ressoou com uma calma quase desconcertante. — Pensando em encontrar respostas onde não deveria.
Eu não podia permitir que ele me intimidasse, mesmo que a sensação de perigo fosse palpável. Mas algo nele, talvez a maneira como se movia, me fazia hesitar por um momento.
— O que você quer? — Perguntei, tentando esconder o nervosismo em minha voz. Mas meu corpo não mentia: as mãos estavam suadas, e eu sabia que não estava pronta para o que quer que fosse que ele tivesse planejado.
Ele deu um passo à frente, mais próximo, e eu instintivamente dei um passo para trás. Ele parecia relaxado, como se tivesse o controle de tudo, ele se curva fazendo referência tentando me fazer sorrir e pegando na minha mão que logo puxo.
— Eu sou Dusk, — ele disse, e a forma como o nome saiu de seus lábios me deu um arrepio. — E você está no lugar errado, Hailey.
Meu corpo estremeceu ao ouvir meu nome saindo de sua boca. Como ele sabia meu nome? Mas antes que eu pudesse fazer qualquer pergunta, ele já estava em cima de mim, seus movimentos rápidos demais para eu reagir. A adrenalina disparou em minhas veias, e eu me preparei para o que parecia ser uma luta inevitável.
Tentando me afastar, desferi um soco direto, mas ele desviou com uma facilidade assustadora, sorrindo com um prazer sádico no rosto. Com uma agilidade impressionante, ele girou meu braço para trás e me empurrou contra a parede, fazendo com que o ar escapasse dos meus pulmões.
— Acha mesmo que pode me pegar assim? — Ele sussurrou, e sua voz estava embargada de diversão. Ele estava se divertindo, o que só me irritava mais. Eu não sabia quem era esse homem, nem o que ele queria, mas eu sabia que não iria me render tão facilmente.
Eu me virei rapidamente, tentando usar meu joelho como uma arma, mirando entre suas pernas, mas ele se afastou com uma risada baixa, mais uma vez me provocando, como se estivesse me testando.
— Sabe isso doí em qualquer um — Dusk sorriu, seus olhos ainda ocultos. Ele era forte, muito mais do que eu imaginava, e agora ele estava me segurando com facilidade, pressionando-me contra a parede.
— Eu não vim aqui para brincar de gato e rato — respondi, tentando manter a postura, mesmo que estivesse presa e sem saída. Mas ele não parecia interessado em me machucar. Ele estava apenas me desafiando, testando os limites.
— Você realmente acha que pode me parar? — Dusk disse, com um sorriso sádico, enquanto desvia facilmente de um golpe. Ele riu, como se se divertisse com minha tentativa.
Tentando me recompor, me afastei um pouco, mas ele já estava em cima de mim. De repente, ele me pressionou contra a parede, e eu senti a perda de ar. Seus olhos brilharam com uma mistura de diversão e desafio.
— Tsc, tsc. — Ele clicou a língua, o som baixo e carregado de desdém cortando o silêncio. Um sorriso debochado curvou seus lábios enquanto seus olhos me avaliavam com uma mistura de superioridade e diversão. — Você realmente acredita que pode me enfrentar desse jeito?
Eu senti a raiva aumentar. Ele estava me provocando, mas, ao mesmo tempo, havia algo em sua postura que me dizia que ele não estava tentando me ferir, apenas testar meus limites.
Ainda assim, não ia me deixar intimidar.
— Eu não vim aqui para brincar, — respondi, tentando não demonstrar que sua proximidade estava me afetando.
Ele sorriu, ainda se divertindo.
— Não volte aqui, Hailey. Na próxima vez, posso ser um pouco menos... cavalheiro.
Antes que eu pudesse reagir, ele me soltou com facilidade, se afastando com a mesma calma de antes. Ele estava jogando o jogo dele, e eu sabia que tinha acabado de dar o primeiro passo de um confronto que não seria fácil.
Com um movimento suave, ele me soltou, mas antes que eu pudesse me recompor, um som estridente cortou o ar. O NeoGen estava se aproximando rapidamente, o rosnado vindo de sua garganta parecia ainda mais intenso. Ele havia notado nossa presença e estava se preparando para atacar.
Antes que eu pudesse reagir, Dusk se moveu rapidamente à minha frente. Ele tomou a frente sem hesitar, sua postura firme. O mutante se lançou em nossa direção com uma fúria incontrolável, mas Dusk, com uma habilidade impressionante, se esquivou com uma facilidade quase sobrenatural. Ele não parecia ter medo. Seu controle sobre a situação era absoluto.
Eu assisti, tensa, enquanto eles lutavam. Dusk parecia se divertir com a batalha, movendo-se com a graça de um predador. Ele se esquivou de um golpe do mutante, e, num movimento rápido, usou a força do próprio NeoGen contra ele. Com um empurrão brutal, Dusk arrastou o mutante até uma piscina de resíduos químicos, que estava parcialmente coberta por sujeira e detritos.
O NeoGen gritou enquanto afundava na água suja, seus movimentos ficando cada vez mais desordenados. Ele lutava contra a água, mas algo parecia estar acontecendo com ele. Dusk observou com calma, como se soubesse exatamente o que estava fazendo.
— Ele não gosta de água — Dusk disse falou baixo, mas eu escutei.
O mutante continuou a lutar, mas logo começou a se enfraquecer. A água, aparentemente, estava corroendo suas forças. Em poucos minutos, ele desapareceu completamente na piscina, seus gritos abafados pela água turva.
Dusk se virou para mim, seu sorriso sádico ainda presente, mas agora, havia algo mais: um toque de satisfação, como se ele tivesse apenas cumprido uma tarefa simples. Ele se aproximou de mim, pegando minha mão sem dizer uma palavra. E, sem esperar que eu o acompanhasse, puxou-me com ele, correndo pelos corredores escuros do laboratório. Ele não se preocupou em olhar para trás. A luta havia terminado, e agora, tudo o que ele queria era me tirar dali.
— Vamos sair daqui antes que atraíamos mais problemas, vem comigo Boneca — ele disse, com o mesmo sotaque italiano de Noah fazendo eu ficar em choque.
Quando saímos do laboratório subterrâneo, fico olhando para Dusk. Enquanto caminhávamos pelas ruas desertas, o som das nossas botas contra o asfalto era a única coisa que quebrava o silêncio. Dusk estava a alguns passos na minha frente, suas mãos nos bolsos do casaco, como se estivesse completamente à vontade. Eu, por outro lado, ainda estava processando tudo o que ele tinha acabado de me contar.
A noite estava fria, mas algo na presença dele tornava tudo mais pesado. Meu olhar fixou-se em suas costas, na maneira como ele parecia caminhar sem preocupações, mesmo sabendo que tudo em mim estava em alerta.
Finalmente, não aguentei mais.
— E se você fosse uma ameaça para mim? — soltei, sem rodeios.
Dusk parou de andar por um momento e olhou por cima do ombro, o sorriso que ele carregava desde o laboratório ainda presente.
— Uma ameaça para você? — Ele riu, balançando a cabeça. — E por que acha que seria?
Cruzei os braços, mantendo meu olhar firme.
— Porque você é Dusk. Porque já matou antes. E, convenhamos, eu não sou exatamente a pessoa mais fácil de lidar.
Ele virou-se completamente para mim, apoiando o peso em uma das pernas, e o que eu conseguia ver de seu rosto por trás da máscara parecia intrigado.
— Você não me deu nenhum motivo para isso, ainda.
— Ainda?
Ele deu um passo na minha direção, mas seu tom não carregava ameaça. Pelo contrário, havia algo quase casual em sua voz.
— Nem se quisesse, seria contra a minha programação.
Franzi o cenho.
— Contra a sua programação?
Dusk suspirou como quem precisava explicar algo óbvio.
— Eu fiz uma promessa. Para Noah. — Ele apontou para mim, como se quisesse reforçar a ideia. — E, por mais que isso me irrite às vezes, eu sou um homem de palavra.
Minha garganta secou ao ouvir o nome do Noah de novo. Ele continuou:
— Além disso, boneca, não sei se percebeu, mas matar você não faria sentido. Você é o centro de tudo isso.
As palavras dele me deixaram mais inquieta do que aliviada.
— E você espera que eu simplesmente confie em você por causa disso?
Dusk riu, dessa vez mais baixo, quase como se estivesse se divertindo com minha reação.
— Não espero que confie em mim. Eu esperaria o mesmo se estivesse no seu lugar. Mas a questão aqui não é o que você acha de mim. — Ele deu um passo para o lado, voltando a caminhar na direção de minha casa. — É sobre o que Noah achava de você.
Minha mente se embaralhou.
— O que quer dizer com isso?
— Ele sabia que você era teimosa, Hailey. Sabia que você não ouviria ninguém e que colocaria a si mesma em perigo só para descobrir a verdade. — Ele me lançou um olhar por cima do ombro. — É exatamente por isso que ele me pediu para cuidar de você.
— Isso não é cuidar — rebati, acelerando o passo para ficar ao lado dele. — Isso é controle.
Ele parou abruptamente, me obrigando a parar também.
— Controle? — Sua voz era baixa, mas carregava um tom de seriedade que eu nunca tinha ouvido antes. — Se fosse controle, você realmente acha que eu teria deixado você fazer metade das coisas que já fez até agora?
— Noah... se for você, pare de brincar agora! — Minha voz falhou, uma mistura de súplica e frustração.
Ele ficou em silêncio por um momento, seus olhos fixos nos meus como se estivesse tentando decidir o quanto revelar. Então, respirou fundo e voltou a caminhar lentamente, suas palavras cortando o ar como lâminas.
— Eu não sou Noah, Hailey. E, honestamente, não sou nem um pouco parecido com ele. Mas vou te contar algo que talvez ajude você a entender. — Ele parou e me encarou com uma expressão sombria, algo entre arrependimento e resignação.
— Noah e eu éramos melhores amigos. — Ele disse com um leve sorriso de canto, mas sem qualquer traço de alegria. — Éramos tão parecidos que as pessoas nos confundiam o tempo todo. Foi assim que nos aproximamos. Nossa aparência criava caos, e isso nos fazia rir. Mas também nos fez perceber o quanto podíamos usar isso a nosso favor.
Meu coração apertou ao ouvir aquilo, como se uma peça do quebra-cabeça finalmente estivesse se encaixando.
— Noah confiou em mim para garantir que você chegasse até onde precisa chegar. — Ele olhou para o céu por um instante, perdido em lembranças. — E por mais que eu odeie admitir, eu respeito essa confiança.
Engoli em seco, tentando processar o que ele acabara de dizer. Mas ele não me deu tempo.
— Nunca ouviu falar de "sócia"? — Ele arqueou a sobrancelha, seu tom quase zombeteiro, mas ainda carregado de uma seriedade inegável. — É isso que eu sou. Não sou Noah, mas sou parte dele, assim como ele é parte de mim. Só que nossas escolhas nos tornam bem diferentes.
A ideia de Noah confiar nele era desconcertante, mas havia algo em suas palavras que parecia... genuíno. Não gostei da sensação de que ele poderia estar sendo sincero.
— Só quero deixar claro — comecei, minha voz firme — que eu não preciso de você.
— Claro que não precisa — ele respondeu com um sorriso debochado, sem nem me olhar. — Mas isso não muda o fato de que eu estarei por perto.
E com isso, ele continuou caminhando, deixando-me sozinha com meus pensamentos. Alguns passos depois, percebi que estava atrás dele, mantendo o ritmo com dificuldade enquanto ele caminhava à frente, parecendo nem um pouco apressado. Foi quando ele bufou, parou de repente e, sem aviso, me pegou no colo.
— O que você está fazendo? — protestei, debatendo-me com os braços, mas ele me segurou firme, como se eu não pesasse nada.
Dusk parecia completamente à vontade, ignorando minhas tentativas de me soltar. Ele até riu, aquele riso irritantemente despretensioso.
— Você é exatamente como o Noah me descreveu.
Isso fez meu corpo congelar por um instante.
— Como assim? — perguntei, tentando disfarçar a curiosidade enquanto ele continuava a caminhar, me carregando como se fosse algo normal.
Ele deu de ombros.
— Ele disse que você era teimosa, irritante e com um talento especial para entrar em problemas.
Revirei os olhos, mas antes que pudesse responder, fiz a pergunta que já estava na ponta da minha língua há algum tempo.
— Como você e o Noah se conheceram?
Dusk parou de andar e me colocou no chão, mas não antes de soltar um suspiro pesado. Por um momento, ele parecia pensativo, quase melancólico.
— A gente se conheceu lá no laboratório, onde ele disse não era para a princesa ter ido. — Ele finalmente respondeu, desviando o olhar para um ponto distante.
Franzi o cenho.
— No Laboratório?
Ele hesitou, mas então continuou:
— Eu estava investigando... encontrei outros mutantes.
Minha mente se agitou com a informação.
— Você quis dizer os NeoGen?
Ele concordou com a cabeça, e um sorriso de canto se formou em seus lábios.
— Sim, boneca, os NeoGen. Agora você está começando a ligar os pontos.
Antes que eu pudesse aprofundar a conversa, um clarão repentino me tirou do foco. Virei rapidamente e vi um homem parado do outro lado da rua, segurando uma câmera com as mãos trêmulas. Ele parecia congelado de medo ao perceber que o flagramos.
Dusk, no entanto, não congelou. Ele deu um passo à frente, claramente preparado para agir.
— Não. — Falei rapidamente, segurando o casaco dele para impedi-lo de avançar.
Ele olhou para mim, franzindo o cenho, e seus olhos por trás da máscara brilhavam com impaciência.
— Você acha que pode me controlar assim? Eu não sou o Noah, Hailey.
— Por favor. — Minhas palavras saíram mais suaves do que eu esperava. — Não machuca ele.
Dusk suspirou e rolou os olhos, como se estivesse sendo obrigado a algo extremamente inconveniente.
— Está bem... — Ele bufou e ergueu as mãos em sinal de rendição. — Só vou pegar a câmera e pedir para apagar a foto.
Antes que ele pudesse sequer dar um passo, o fotógrafo já tinha feito uma corrida desesperada, quando pedi para Dusk não machucar ele, o homem desapareu.
Dusk riu, cruzando os braços.
— Tá vendo, boneca? Agora vamos ser notícia. Eles vão vir atrás de você. Melhor dizer que eu estava te sequestrando gentilmente.
Revirei os olhos e cruzei os braços.
— Para com isso, seu idiota.
Ele fingiu indignação, levando a mão ao peito.
— Idiota? Eu aqui demonstrando que tenho sentimentos, e é assim que você me agradece?
Não pude evitar uma risada, mas logo voltamos a caminhar. Chegamos ao meu apartamento quando já era quase madrugada. As ruas estavam desertas, e o silêncio da cidade fazia o som dos nossos passos parecerem ainda mais altos.
Dusk olhou ao redor, verificando as ruas e os becos com cuidado, antes de finalmente parar em frente à porta. Quando me virei para ele, senti uma pergunta queimando em minha garganta.
— Noah... ele está bem?
Por um segundo, o sorriso que ele sempre carregava pareceu suavizar. Ele assentiu.
— Noah está bem. Ele só está resolvendo algumas coisas. Prometo que ele vai te contar tudo quando for a hora certa.
Engoli em seco, mas assenti de volta.
Ele deu um passo para trás, mas antes de se afastar, acrescentou:
— Ele mandou dizer algo pra você.
— O quê?
Dusk se inclinou um pouco, como se quisesse que eu ouvisse com clareza.
— Ele disse: "Mesmo quando você se perde em perguntas, saiba que sempre terá as respostas dentro de si. Você é minha luz, Hailey."
Meu coração apertou com aquelas palavras, era a frase que Noah me dizia todas as noites antes de dormir, e antes que eu pudesse responder, Dusk já estava desaparecendo na escuridão da noite.
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