O namorido


Comentei com Benício sobre as conversas minhas com Douglas e claro que ele ficou irritado, se fechou uns dois dias e me jogou na cara que eu dava conversa, que nem deveria atender o telefone, que devia bloquear e foi o que fiz.  

Não tem jeito, não é só em romances que existem os dramas. Na vida real é onde eles estão e um livro pode e faz é recriar isso. Eu já estava namorando há seis meses com o Benício e tudo andava muito tranquilo até que um dia, eu sento pra trabalhar e Micael comenta.

— Tu soube que um carinha se jogou do sétimo andar, aqui em balneário, tá no jornalzinho.

— Credo, que horror começar o dia com uma notícia dessas, rapaz. Vamos falar de vida, frio, festa junina no mês que vem.

Tinham passando quase três meses que havia conversado com o Douglas e me deu um arrepio forte pelo corpo. Quando pensei em olhar o jornalzinho perdi a coragem porque tinha um mau pressentimento de que o nome lá era o dele. Diferente do que pensei, o cara não perturbou mais depois da última ligação e dissipou aquela coisa ruim que eu senti, algo que parecia com culpa.

Porém na noite daquele dia em que recebi a notícia, dormi super mal, tive um pesadelo ruim, senti a raiva que o Douglas sentiu, medo, tristeza e acordei às três horas assustado. Liguei pro Benício, pedindo se podia buscá-lo aquela hora.

— Poxa, eu tava dormindo. Odeio que me acorda. — O Ministério da Saúde adverte: acordar Benícios no melhor do sono, pode ser FATAL. — O que é?

—Depois converso contigo. Tô sentindo um negócio horrível.

Benício quando entra em minha casa, pergunta emburrado:

— Nossa, porque me acordou essa hora?

— Sabe o Douglas?

— O que aconteceu?

— Acho que ele se matou.

— Credo. Quando isso?

Conto-lhe sobre a notícia enquanto ele mexe no celular, o que me irrita.

— É ele mesmo... ó a foto. — Benício encontra a notícia na página on-line do mesmo jornal e eu entro em pânico.

— Ele avisou que ia se matar, avisou, meu Deus... Benício, ele me avisou é culpa minha. Diz que isso é um pesadelo. 

Benício também fica muito triste e me abraça, beija meu rosto e diz:

— Suicídio é escolha. Tu não podia fazer nada.

Quando me diz isso, eu desabo, choro muito, mas é de dó do cara. Tirando a paixonite que tivemos, eu lembro das conversas, do drama que ele vivia, família intolerante e tudo isso foi motivo pra ele não suportar ser o que era: homossexual. O próprio cara olhava pra si como se esse fato fosse um erro em sua vida, imagina a família.

Tudo o que Douglas se tornou foi um corpo sem vida, uma notícia e uma tristeza para os amigos. Nem me interessa saber o que os parentes sentiram, mas eu fiquei bem abalado e Benício foi uma rocha, me deu carinho, convencendo-me que não tínhamos culpa, porque não tínhamos mesmo. 

E depois daquela semana pesada, eu fiz algo que já tinha vontade de fazer, o chamei pra morar comigo.

— Ah, mas eu tenho vergonha. É sua casa...

— Por isso mesmo. Assim não preciso sair de casa quando te acordo de madrugada pra dar notícia ruim...

— Ou de pau duro, né.

Ele me faz sorrir, o clima vai ficando levezinho e a resposta cretina dele é:

— Aham.

— Aham o que? Fala com a boca, meu querido!

— Aceito.

— Oh animação.

— Quer o que? Que eu fique pulando e fazendo escândalo?

— Queria...

Ele sorri e diz:

— Eu que vou dormir no lado direto, perto da porta.

— Ahaha, engraçado, sonha. Aquele sempre foi meu lado, peste.

— Então não quero morar aqui.

— Então vai te cagar.

Assim, desse jeitinho romântico e depois de cinco dias, pra arrumar as bagunças dele, meu Benício finalmente coloca sua escova dental verde do lado da minha no porta-escovas de dente da pia do banheiro. E o lado direito da cama, agora nossa cama, adivinha de quem é?

Nem vou falar nada, né, vão me chamar de pau mandado.

........

Mas assim, a vida de casado é boa. Eu nasci pra casar, sinto nos meus ossos. Benício gosta um pouco de organização, mas nem tanto, juntamos as despesas e ele concordou em me ajudar a pagar uma diarista uma vez por semana e demais coisas, nos ajudamos sem tanta neurose.

Em início de setembro de 2017, consegui tirar o guri do joguinho virtual, que pela misericórdia, eu era trocado pelo Tíbia sem ressentimentos da parte do felino do mau, chamado Benício. Inventei academia, depois do trabalho e foi só eu dizer que o professor, parecia o Julius de Todo mundo odeia o Chris, que ele pediu o valor da mensalidade e se matriculou em seguida. Será que é por ciúmes?

— Poxa, desde que comecei a namorar contigo, engordei sete quilos. — Ele taca na minha cara.

— Sete? Tá gordinho, heim.

— Se for fazer as contas dá quase um por mês. Minha bunda tá gorda, olha...

— Sim, tô prontinho pro trabalho, não vem me atiçar.

— Tá... — Ele ri, pelado vira de costas e baixa vulgarmente pra por a cueca. — Aiai...

Conto?

Não rolou porque estávamos em cima da hora, ambos gostamos de pontualidade e ele anda ainda mais comprometido com o trabalho, desde que o chefe o colocou como analista, lhe deu  reajuste de função e ajuda de custo para fazer um curso.

— Opa, então o patrão tá baita feliz com teu trabalho, amor...

— É.

— Que orgulho desse menino. Vamos comemorar? Sexta-feira, vamos sair um pouquinho de casa?

— Tá, pode ser. — Com um selinho e aquele sorriso apaixonante ele se despede e entra no edifício comercial onde trabalha e eu sigo pra cidade vizinha onde eu me estresso ultimamente.

Seu Hercílio está solteiro há três meses e um homem sem sexo é difícil de aturar, eu mesmo fico insuportável quando Bê me põe de castigo por duas noites seguidas, imagina... deixa pra lá.

— Porra, caralho, porque a guia do FGTS deu tão alta esse mês?

— Claro, o senhor quis adiantar o 13° em agosto, tá certo.

— Mas que merda... Tudo isso?

— Sim, ano passado o adiantamento do 13° foi em novembro como sempre, aí chegou em dezembro tava surtando. É isso, tem empregado, tem que depositar, fazer o que... O senhor é macaco velho no ramo, não começou ontem com a empresa.

Ah, foda-se, falei mesmo! Todo ano essa ladainha.

O velho resmungou quase uma hora no ouvido, Micael ficou assustado e nem se mexia na mesa dele.

— Que coragem a sua. — Ele gargalha quando o patrão vaza.

— Falo mesmo. No começo eu tinha receio, mas depois eu comecei a largar a real e ele se acalmou bastante. O problema não é a grana, pode apostar, é falta...

— Hahaha... você é demais. Minha mulher sempre diz isso quando tô irritado.

— Nem me fala...

— Tu também fica de castigo?

— Melhor nem falar nada.

Micael sabe que vivo junto com outro homem, jamais foi desrespeitoso, mas sinto nele uma vontadezinha de fazer piada, especialmente quando algum artista LGBT é criticado ou quando rolou o vídeo polêmico do aniversário do menino gay onde cantaram "é pica, é pica"... ou quando rolou outro vídeo onde crianças dizem "eu nasci menino, eu nasci menina". Micael é mais conservador e por isso o privo dos detalhes da minha maravilhosa intimidade. Viado não faz só sexo, sempre digo quando nos olham atravessado.

E falando em viado, eu resolvo que vou comemorar a nova fase do meu namorido num lugar bacana e pelo menos uma vez que seja, meter a mão no bolso pra fazer um agrado maior pra ele.

Terminei de pagar o financiamento do meu W. (carro), na minha opinião, um bom carro que comprei com trinta mil quilômetros quando terminei aquele namoro do passado. Tá na hora de comprar meu primeiro zero. Será presente de natal pra nós.

— Charles, ó...

Para quem não entendeu algo assim tão bem explicado, eu traduzo:

"Charles, ó... = Oi, amor! Hoje é dia seis e recebi o salário, tá. Toma aqui a parte pra ajudar nas contas do mês."

Sim, ajudar nas contas do mês. É óbvio, estamos morando junto e não sou milionário e nem José Rico, casamento é sociedade. E meu sócio é muito gostoso nesse caso.

— Porra que raba, ah papai... Sente aqui no colinho de teu mô, sente. — Coisa linda esse sotaque, que não é o meu, tá.

Ele senta todo neném, todo manhoso e todo suado da academia. Faz tempo que mostra os cambitos de bermuda, nem liga mais para seu tom de pele clarinho e sempre digo a ele:

— Nós não pedimos a aparência que temos, mas podemos nos amar e eu amo essa coisa poderosa que vejo no espelho. Mamãe caprichou aqui.

— Mas você é gato, eu sempre te achei charmoso e gostoso e ficava todo errado quando olhava minha bunda.

— Safado, tu.

— Eu, é... tu que olhava minha bunda e eu que sou safado.

— Poxa, dia vinte de novembro, vamos fazer um ano já.

— Lembro bem daquela fase porque fui demitido.

— Seu nojentinho, lembra disso e não do nosso um aninho?

— Aham.

Travesso, esse cara é um maroto, acaba comigo, me detona. Ali, de novo pela enésima vez, a gente transa na sala. Suados do jeito que estávamos, nosso cheiro ficou mais forte, o sabor da pele salgado, o sexo mais selvagem, os beijos mais violentos, os gemidos dele mais altos e o primeiro "eu te amo" saiu de alguém, nem sei quem disse primeiro, mas em seguida, ouvimos um "te amo também". Era o que ambos sentíamos e ainda sentimos.


Sábado de manhã quando chegamos na mãe... adivinha? Ela tava brigando com uma vizinha. Motivo: molecada da rua soltando pipa que caiu no no telhado da edícula, aí os moleques subiram e quebraram uma chapa de amianto e ela tava com sangue nos olhos.

— Até parece que nunca teve filho moleque, dona Terezinha. — Jonatan, meu mano chega tirando onda e toma aquele olhar dela. Dá dó, meus amigos, não é uma olhada comum é a olhada! (mortal)

— Ah então tu paga o eternit e alguém pra consertar, já que essa "seriguela" tá me dizendo que não foi o filho dela.

— Seriguela é tua mãe.

— Não fala da minha mãe, sua folgada. Vi aquela peste do Marcelo trepado no meu telhado.

Gente, pensa num barraco! Dona Tere, né. A mulher que não deixa barato. Só não entendi porque elas estavam se chamando e se ofendendo por seriguela que é uma fruta. Mas deixa quieto.

Esse é o ambiente onde fui criado e sobrevivi, sinto até falta disso tudo, dessas molecagens. E eu era um pequeno terror, pelo menos os meus dois irmãos, irmã e a própria mãe dizem que sim, mesmo que eu discorde.

— Benício não se assusta não. Vai entrando pra nem se misturar com essa gente sem cultura aqui do bairro. — Essa é minha mãe que faz barraco e fala isso na maior cara de pau. — Senta nego, quer uns bolinhos fritos de banana, um cafezinho preto, tá fresquinho, come, pega mais.

— Calma dona Tere, é muito. — Ele protesta rindo dessa hospitalidade dela que vive dizendo que achou o genro dos sonhos.

— Eu sempre digo, "olha meu genro é um menino querido demais, só que fala pelos cotovelos".

Ele continua rindo e claro que avança nos bolinhos da mãe. É tudo de bom, igual (nem tanto) o BIS, come um, pede bis.

Duas horas depois a piazada tá soltando pipa de novo e ela pendurando roupa, dando risada com a vizinha, a mesma que ela brigou, enquanto nós, meu padrasto e o marido da vizinha, consertamos e substituímos a folha de telha quebrada. E tudo fica de boas de novo. E claro, sábado nunca é ruim, lembram? Tem feijoada da dona Rochelle que me surra de pano de louça quando chamo ela assim e meus irmãos também pegam esse costume.

********************

Olá Pessoal! Tudo lindo? Acho que eles já podem casar e rolar o felizes pra sempre, né.  Hehe, mas... antes de finalizar, escrevo uns extras do casal, pra ficar gostosinho, tá♥

Beijos e bom domingo!!! =^.^=   ♥

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