"Judia de mim, judia..."


Seu Hercílio só me aparece uma semana depois, quando retorna de uma dessas viagens com a Paulinha e vem azedo pro meu lado. Noto algo estranho no meu patrão, tá esquisito e parece até que andou sofrendo. Ele comenta muita coisa de sua vida pessoal quando a gente fica sozinho, mas a confissão que ele faz, me leva a ter um choque forte, só me faltou cair no chão estrebuchando. Não sou exagerado.

— Eu briguei com a Paula.

Ah cara... o homem fez merda e tá cagado mesmo.

— Bateu na mulher?

— Não! Quem falou em bater. Tá doido rapaz...

—Ai seu Hercílio, isso é foda. Olha, eu confesso que sou pavio curto e já cheguei perto de dar um safanão num ex namorado. Acho que eu nunca me perdoaria se fizesse. O senhor vai se incomodar.

— Porquê?

— O senhor ficou louco, bater em mulher?

— Não bati, Charles. Tu não ouviu o que eu disse... —  Ele suspira, disfarça, fecha a porta, coça o cavanhaque e me olha... —  A culpa é minha, separei da esposa quando o dinheiro sobrou e isso só atrai essas "varejeiras". Ela me irrita com aquele monte de futilidade, são vinte e sete anos de diferença, eu tô sempre com a cabeça cheia e aí sabe como é... a gente tava ali numa brincadeira e... não vai comentar com ninguém né, Charles?

— Ah, mas mesmo... claro que não.

— É que é íntimo demais...

— Não quer contar não conta, seu Hercílio.

— Ela chupou meu pau por uns quarenta minutos e não levantou.

— Porra, quarenta minutos? Coitada! — Cacete, "escapuliu". Fui curto e grosseiro, mas deu pena da bichinha. Quarenta minutos chupando o pau do velho, afs, nem eu que gosto de chupar um macho aguentava. Na verdade, depende...

— Coitada?

— Hã?  —  Me faço de besta e ele prossegue.

— O esculacho que dei, foi porque ela me disse que eu devia ter tomado Viagra. Eu falei que tomei dois azuis e ela disse que eu não dava mais conta, tava velho e cansou de se humilhar pra tentar levantar o meu pau, que tinha dia que sentia até raiva e por qualquer motivo eu broxo e que ela nunca consegue gozar, que não goza nunca e que estava cansada de tudo. Eu tentei dar um carinho e ela não quis e mais tarde me pediu mais dinheiro. Respondi que eu não sou banco e ela se irritou e me disse que só meu dinheiro que lhe dá tesão.

— E?

— Mandei a merda e que suma da minha vida.

Calma, Charles hoje é apenas segunda-feira...E depois, eu não tenho nada com essa bronca.

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Enquanto o trampo me trazia uns aborrecimentos, a noitada de sábado me trazia só coisa fina. Mas antes do anoitecer do sábado, eu passava pelas maravilhas de ser filho da dona Terezinha, minha mãe e melhor pessoa.
Sexta a noite, fui dar um beijo na mãe e perto das oito da noite, caí cansado no sofá dela e quando eram dez horas, tomei um peteleco na cabeça e um grito:

— Levanta moleque, vá dormir na cama. Vai revirar meu pano de sofá, Charles. Eu limpei a casa, seu cabeção.

Amor de mãe é isso, irmãos! Ela me enxota para o quarto de visitas. Só tem dois quartos no barraco, lógico que não era na cama dela que eu ia dormir. Eu poderia ir para casa, que fica há poucos quilômetros, mas vou arriscar comentar com ela e tomo bronca:

— Nem pensar, não vai dirigir com sono. Larga de ser besta, Charles, a mãe morre de saudade a semana toda. Fica aí, moleque. Vai, toma um banho e te larga na cama. Amanhã cedo já tá aqui quando a feijoada ficar pronta.

Ah Jesus, feijão da dona Terezinha é algo fora de série. Não é sábado quando não tem. Feijão, arroz, "zóiudo" e farinha de mandioca. A Bruna não aparece, mas meus irmãos os gêmeos, Alan e Jonatan, não faltam.

— Cadê a Bruna?

— Como que eu vou saber? — Jonatan responde.

— Responde direito menino. — Ele tem trinta e cinco anos, é casado, pai de família e anda miúdo com a mãe. Imagina eu que sou o mais novo. 

— Bicha braba, dona Terezinha.

Meu irmão abraça a mulher e beija com carinho, fazendo ela dar uma risada e sair cantando alto...

— "Que tristeza que "nóis" sentia, cada "tauba" que caía doía no coração"... — Herdamos o samba no sangue da mãe. Coisa mais engraçada do mundo é ela sambando, dando risada dos problemas e cantarolando de forma errada. Jonatan e Alan, batucam na mesa, eu acompanho e até minha sobrinha Sheila, canta trechos da Saudosa Maloca.

— Oh cabeludo tá deixando a lãzinha crescer? — Minha mãe sempre pega nosso pé quando o cabelo cresce um pouco.

— Ei, dona Terezinha, pega no pé do Alan que tá de dreads.

— Não me responde, que o Alan tá bonito assim.

Tô nem aí, não vou no barbeiro no sábado, tô com preguiça e preciso poupar as energias pra noitada. Bruna (minha mana) e eu combinamos de sair pra beber alguma coisa, já que ela tá sem carro e carona, aceitou minha "caridade". A nega é exibida, povo, tava de chamego com um "abonado" e terminou com ele não faz muito tempo. Foi só falarem casar e ter filhos que ele passou a escapar da bichinha.

Num barzinho bacana, nós nos ajeitamos em uma mesa e pedimos porções de qualquer coisa, afinal queremos é beber o chopp e os "comes" não têm lá grande importância.

— Abençoada seja a mãe natureza que não faz nada pela metade. — Nossa! Comecei cedo a receber a benção de encarar uma bunda bonita nesse lugar. O cidadão em questão é um barbudinho atraente do cabelo preto e pele clarinha.

— Ai Charles, não começa com fiasco que levanto e vou embora.

— Olha Bruna... esse ou aquele?

— Hã?

Putz, eu sei que ela acabou de falar algo, mas não ouvi. Mostro a ela as ótimas opções de flerte. O barbudinho ou o titã negro que parece Toni Tornado nos anos 70.

— Tá louco, miserável. Charles, o negão é marido da Gonçala que faz meu cabelo, não encara.

— Porra, mas tá bem servida a Gonçala.

— Cala a boca, bicho do cu.

— Vai te cagar sua tola, tás solteira, dá uma olhada em volta. Peraí, cuida do meu celular que vou mijar.

Faço aquela cara de agente de funerária no banheiro elegante. O barbudinho bem do meu lado e quase morro ouvindo o barulho no mijo do cara escorrendo. Puta merda, eu queria ver aquele troço de mijar dele...

Disfarço. Ele olha para o lado e depois pra mim, um esboço de um "oi" se forma, só que nada diz. Minha região pélvica é analisada quando ele para do meu lado e em frente ao espelho para lavar a mão, depois a seca na toalha descartável e cai fora, voltando para a mesa compartilhada com mais três caras.

— Cara, para de olhar.

— Cê é chata Bruna. Contigo aqui, o barbudinho deve achar que sou hétero.

— Ah tá. Pior que eu também tô contigo e isso me atrasa, vão achar que tu é meu namorado.

— Mas sou gostoso, chamo atenção. Se alguém estiver interessado em ti, deve pensar: "com um macho igual aquele, não posso competir".

Ela cai na risada. Bingo! Chegou quase chorando e depois desse nosso momento, damos umas risadas juntos, lembrando de coisas que a gente aprontava com a mãe que descia o chinelo em nós dois.

— Opa, amigo. Alguém mandou esse drink especial pra você. — O garçom desce da bandeja, uma bebida chique de cor amarela esverdeada ou verde amarelada. Não sei quem mandou, então já trato de pôr defeito e comento com a Bruna.

— Parece diarreia de bebê alienígena, eu que não vou tomar. Quem será que foi?

— Charles, tu tem o costume da mãe. Espera a pessoa sair pra perguntar. Devia ter perguntado ao garçom.

Sigo no chopp e na batatinha que é mais seguro e de repente um cara gordinho levanta da mesa do barbudinho e pede meu telefone. Tudo bem, Charles. Eu tava afim do outro cara.

Foi a vez da Bruna me consolar um pouco, percebendo o jeito que fiquei quando o cara me pediu o número.

— Tô atrasando mesmo teu lado, né Charles?

— Deixa de bobiça, Bruna.

— Não vai tomar essa bebida, é cara. Posso provar?

— Não bebe isso não, minha nega, vai que tem um daqueles "boa noite Cinderela".

— É tu que vai me levar pra casa mesmo.

— Pois é...

Um vibrar no celular informa que recebi algum tipo de mensagem. Não conheço e até penso em bloquear aquele: "oi". Mas talvez seja o gordinho que criou coragem de me chamar pra uma conversa. 

Não bloqueio o cara e ele digita: "tô sacando a tua". Preciso salvar o contato pra aparecer a foto dele e tomo um pequeno sobressalto quando me aparece a foto de um branquelo barbudinho usando óculos de grau. Ele mesmo.

Devolvo: "saquei a tua no banheiro".

Ele devolve: "quem é essa daí"?

Rebato: "a luz da minha vida, minha irmã".

Aquela frase dele: "quem é essa daí?" me broxou inteiro. Não dou bola às outras mensagens que chegam e até convido a Bruna pra irmos embora. Não foi a nossa melhor saída juntos, pois ela estava chateada com o final de seu namoro, eu não saí com ninguém e precisava de um: pele na pele, cheiro no cheiro, uma cafungada, um dengo, um chameguinho e tudo o que me acontece é voltar cedo pra casa sozinho. Pior que isso, sem tesão e meio decepcionado com o jeito daquele fresco.

Antes de me pelar para tomar um banho, verifico que no meu celular tem umas trinta notificações no zap e tudo do mesmo perfil, o barbudinho. Se eu visualizar, ele vai achar que tenho algum interesse.

Bora, visualizar.

"oie, desculpa o jeito, não era pra parecer grosseiro"

"te conheço, a gente estudou no mesmo bloco de adm, lembra? Douglas..."

"tá, a gente..."

"se vê"

"haha, lembrei do teu nome Charles"

"Eu tva na dúvida, lembra de mim, né, o douglas"

Ai caramba que bonitinho, olha ele todo mimoso, enchendo meu zap-zap das conversas. Vou dar um oizinho, afinal foi colega de facul. Pior que eu não me lembro da cara dele. Eu era mais ou menos bem enturmado e conversava com todo mundo, só que mais com o pessoal que fez o segundo grau junto comigo.  Ele certamente fazia parte dos filhos de dono de empresas que se separava numa panelinha para qualquer tipo de atividade e intervalo. 

Não vou dar oi, coisa nenhuma, é burguesinho, não faz meu tipo. Mas ele pode ser um carinha bacana, até pediu o meu número. Porque mandou o colega? Nem se dignou a vir pessoalmente.

...

Tem vários tipos de conquistador e Douglas é do tipo preguiçoso, o lance dele sempre foi mandar mensagem e esperar eu chegar junto. Sim, nós tentamos e ele ainda me tenta muito. Infeliz da hora em que respondi o whatsapp dele há um ano. Esse barbudinho só judia de mim, pessoas. 

"Judia de mim, judia..."

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Ola que tal! Todo bien con ustedes? hahaha... Yo de nuevo

Meee nem liguem, é soninho aqui. Mas consegui aprontar mais um capítulo.

Conforme sobra um tempinho vou revisando e postando.

Obrigado pelo carinho♥ Gracias


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