Ariano no limite
Depois desse contato inicial com a minha mamis ruim e malvada que eu amo, (será que pareço com ela?), meu pai chega do banco onde foi pagar umas duplicatas e fica feliz em me ver, me abraça, me chama de porcariazinha, lombriguento e peste ruim, briga com a minha mãe...
— Não fez nada de diferente pra ele? O Cleyton gosta do rollmops, coloca na mesa. Filho tem morcilha, tem um queijo da "colonha", polenta a vontade, espinhaço de porco, tem ovo na conserva, gosta?
Eu comi tudo aquilo acima tá, não sinto nenhum constrangimento em dizer que um vidro de rollmops não deu nem pro cheiro, pior é o bafo depois. Prefiro nem estragar o conto comentando os efeitos dessa comilança toda.
Depois do almoço, mais Celso no telefone e tive que dar uma cortadinha educada nele, no mesmo tom do ciúme.
— Celso, te retorno mais tarde, meu pai quer conversar um pouco.
— Pai... sei...
— LARGA MÃO DE SER ASSIM. NÃO SOU TEU NAMORADO E SE FOSSE, EU TE MANDAVA À MERDA COM ESSE CIÚME.
— Precisa berrar?
— Pra ver se tu entende, né. Quando eu voltar, presta a atenção, anota, grava, porque é sério: quando eu voltar, vou meter um anel de compromisso em nós dois, vou contar pra todo mundo que a gente tá ficando, vou te chamar de mozão, quero que conte pra todo mundo que tu é comprometido e vai me assumir em público. Se fizer isso, vou ver se aceito o ciúme.
— Cley...
Desligo na cara né. Odeio enrolação, sou prático e direto. Ou caga ou desocupa a moita.
Estranho, ele não me ligou por dois dias seguidos.
Rá, olha a minha cara de preocupação.
Sério, eu não quero nem saber.
Nessa cidade não tenho lembranças de melhores amigos, farras, colegas, ex namorados, nem traumas ou coisas marcantes. Isso é ótimo, porque assim só relaxo, nesse lugar cheio de paz, silêncio, chuvinha de verão e esse barulhinho de sapo que a gente não houve lá na praia.
— AHHHHHHHHHHH, SOCORRO! UM SAPOOOOOO.
Minha mãe cata o bicho por uma perna e joga no gramado.
— Desce do sofá, Cleyton. Nem a Sofia, tua sobrinha, tem medo de sapo.
— Ah, uiii, que nojo! Parece que ele tá dentro da minha roupa, eca.
— Cleyton, o vizinho tá ali no portão conversando com teu pai, para de fiasco, por favor.
— Nossa, que gostoso! Mãe do céu, que machão!
— Cria vergonha, isso é feio, pelamordedeus. Chegam os parentes e saem daqui falando.
— AI, VOU MORRER POR CAUSA DISSO. NA MINHA CARA NINGUÉM FALA.
— Tu não tem educação com eles.
— SE NÃO TENHO É PORQUE VOCÊ NÃO ME DEU. E QUANTO À ELES, EU QUERO QUE VÃO TUDO PRA PUTA QUE PARIU.
— Cleyton, desce desse sofá.
— O que aconteceu, Hilda? Deixa ele quieto.
— Xande, ele só faz fiasco.
— Tu não se acostumou? Deixa o guri. Desce, Cleyton.
— Não... tem sapo, eu odeio esse bicho.
— Hilda, desde criança ele tem medo, calma.
— Eu vou dormir. — Lá vai a mãe. Demonha ela, tão eu. Se eu morasse junto outra vez, a gente não estava mais morando junto de certeza.
Mas o Mister Coxa Grossa me liga e amacia muito pra conversar comigo, falou até que se arrependeu de ter me dado férias e não faz cena nenhuma de ciúmes. Sabe o que é isso? Medo que eu cumpra a promessa.
— Como tá o movimento no comércio? Eu tô aqui perdendo comissão.
— E nenhuma saudade?
— Do quê?
— Cley...
— Celso, tem certeza que quer isso?
— Não fala assim... não tem necessidade de a gente escancarar pro mundo. Só junta gente pra se meter e atrapalhar.
— Me responde uma coisa, tu tem certeza disso? Tu quer o status no facebook: "Em um relacionamento sério" e cheio de fotos minhas contigo.
— É o que eu tava dizendo, se manter a discrição, dá mais certo.
— Não sou discreto, isso é da minha natureza. E me responde direito. Tô com sono.
— Tá deitadinho?
— Celso, responde ou desligo.
— Não, Cley. Não tô pronto pra me expor.
— Sei, entendi. Eu imaginava.
— Pensa um pouquinho. Não precisa todo mundo saber, só as pessoas mais importantes... eu e você.
— Só vou dizer que sim porque tô cansado e meu olho tá fechando.
— Tá pelado?
— QUÊ? Até parece que vou dormir com o rabo de fora da casa dos meus pais. Tô usando um short com um furinho aqui do lado, uma camiseta I ♥ MY GIRLFRIEND.
— Sério? Haha. É tua?
— Era do meu irmão, Márcio. Tá frio aqui, choveu e encheu de sapo em volta de casa. Eu tenho pavor dessas coisas e os meu irmãos jogavam em mim, bando de diabo.
— Oh, que vontade de ir ali te abraçar.
— Vem... Celso... ué, deve ter acabado a bateria do troço dele.
Pensei em dormir até umas nove horas, mas não consigo, sou menina agitada que não nasceu pra ficar rolando na cama. Meu celular é que descarregou, bosta!
Quando recarregou, tem mensagem de voz no whats, tem mensagem escrita, tem bilhares de ligações perdidas e uma frase que me chama um pouco a atenção:
"Vou pra Pomerode no domingo, vou te buscar "
Já dou piti e ligo pra ele, quero nem sabe onde eu tô e que tem umas tiazonas combinando com a minha mãe, quem vai temperar o churrasco da festa da Igreja Luterana.
— COMO ASSIM? AQUI?
— Não grita Cleyton, já se despede da família que quero te sequestrar.
— Escuta aqui, eu falei que ia ficar duas semanas inteiras aqui na minha família.
— O quê? Duas semanas? — Agora foi minha mãe que tomou um susto.
— Porque, não posso?
— Eu e o teu pai vamos receber uns conhecidos no fim dessa semana...
— Ah entendi, daí a senhora tem vergonha da minha pessoa. —As vizinhas ficam sem graça, só faltam assobiar pra disfarçar. — Celso, o endereço é esse... vem que vou te apresentar pra família, claro que pode. Fim de semana vamos ter visitas a tia Trude que vem pra ir com a gente no churrasco lá da igreja.
Não baixo a minha bola e a visita precisa me engolir, minha tia Gertrudes só fala em alemão com a minha mãe, mas me olha com aquele desprezo que eu adoro afrontar.
— TIAAAAAAA. ME XINGA EM PORTUGUÊS MESMO QUE EU ADOOORO.
— Eu não falei nada nom, nom.
Sério, sábado à tarde eu senti tristeza e solidão. Minha mãe não faz muita questão da minha presença e isso me remete ao dia que ela me olhou dançando e falou:
"o que eu fiz pra merecer isso?"
Meu pai perguntou sobre o que ela estaria falando e ela disse que eu tinha aquele jeito "desmunhecado" e tava se perguntando onde ela havia falhado. EU, Cley, pessoa linda, poderosa, que não se rebaixa, esperei completar meus dezoito e caí fora, e já que é pra falar, só volto porque morro de saudade daqui.
— Quer um café, Cleyton, toma aqui. — Papi Xande faz café no coador de pano e me dá uma caneca de esmalte quase transbordando. — Quer por leite?
— E cabe? Que exagero, seu Alexandre.
— Nem tanto, olha nem fica magoado com a mãe.
— Até parece, pai. Não sou de guardar rancor, só não gosto dessa indiferença dela, queria que ela me destratasse, que me xingasse. Adoro um bate boca.
— Deus me livre, rapaz, tu parece a falecida sogra. Aquilo deve aparecer um dia por aqui.
— CREDO! PAI, NÃO FALA ISSO, AHHH!
— Mas é verdade, aquilo era pior que o "cão" e um dia ele expulsa ela de lá.
— Para, tô ficando com medo, pai.
Ele dá umas gargalhadas altas, coça a barba e toca no assunto...
— Tem um rapaz?
— Ai, o senhor vai me fazer ficar com vergonha...
— Tu nunca teve isso, palhaço. Quero conhecer... é firme?
— Acho que sim. Tem problema se amanhã... tipo, ele dar uma aparecida?
— Se ele não te levar embora amanhã, pode. Senão melhor nem aparecer.
...
Então gente, eu sinto informar que o Celso não foi no domingo e nem me ligou. Eu fiquei com raiva no começo, preocupado no decorrer do dia e com saudade no final da tarde.
Estranho que ele disse que era o domingo de folga e desapareceu.
— Cidooo, tu trabalhou hoje, bicha?
— Claro né, quando que a gente não trabalha nesse outlet?
— Viu o Celso?
— Não. Nem olhei pra loja, mas o talibã todo dia aparece e fica ali perto da praça de alimentação, onde tem wi-fi liberado sabe, fica ali quietinho esperando a mulher da saia longa. Cley, posso comentar uma coisa?
— Fala que eu sou forte.
— Aquele cidadão não é hétero porra nenhuma. Fiquei sabendo de um história que vai arrepiar esses fios "doirados" da tua cabeça, mas não vou te conta-a-a...
— Eu vou te encher de bofetada.
— Não conto. Beijo. Ah, se eu ver o Celso, te aviso.
— Nem precisa... Ai Cido, acho que amanhã volto pra casa. Meus irmãos souberam que eu estou aqui na casa do pai e nem apareceram.
— Porque será?
— Sério, tô sem vontade de gritar. Aqui ninguém me quer. Ali, pelo menos o Celso tá todo cheio de atenção e vou me permitir. Ah vou, vou pegar esse macho pra mim e chega!
— Uia, reagiu! É assim que se faz, vinhado! Beijo na bunda, tô morrendo de sono.
— Sono? E o teu negão escândalo?
— Ex?
─ O quê, mas nem começou, como que já terminou?
─ Tu não sabe? Ele deu em cima de um outro cara e eu soube. Legal né?
— Mentira...
— Não é não, miga. Deu em cima, descobriu o whats do menino e mandou uma mensagem bem safada e quando o viadinho disse: "sou amigo do Cidinho, só pra ti saber tá, vou contar pra ele, seu safado" ele ameaçou o Fefê.
— O Fefê?
— Viu só, o Fefê.
Ah que bad! Quem vontade de abraçar o Cido, levar ele pra farra, mas agora sou eu quem tá comprometido. Sinto muito, sociedade, TÔ COMPROMETIDA, SOU DONA DO TOUROOOO.
— MAS QUE BOSTA! PORQUE ESSE FILHO DA PUTA NÃO ATENDE?
— Não grita, Cleyton. Me dá raiva, tomo cada susto.
— Dona Hilda, deixa eu falar uma coisa pra deixar sua semana maravilhosa: amanhã vou embora! Quando eu sentir saudade, marco um encontro com o pai e nem apareço mais.
— Quem disse que é pra tu ir embora?
— Tua cara de cu, diz o tempo todo. E nem adianta falar nada que odeio melação e fingimento.
...
— Caralho, Celso, tá vivo?
— Meu telefone foi roubado dentro da loja. Poxa desculpa, eu não tenho fixo.
— Orelhão, o senhor conhece?
— Ah Cley, nem pensei nisso. Tô com a cabeça quente depois da novidade.
— Que? Vão me demitir?
— A Dani tá grávida.
Desligo na cara? Desligo. Pesadelo é assim mesmo. Tô em pé nessa porra de ônibus, não tem ar, tem um cabeção ouvindo sofrência do meu lado, uma bonita fecha o vidro porque tá bagunçando o cabelo dela, o motorista freia em seco pra não atropelar um corno, calor... eu tô surdo... eu mato alguém hoje... eu tô solteiro... eu preciso matar, socar uma cara ou gritar, o que farei?
— EI, COLOCA UM FONE DE OUVIDO, COLEGA QUE NINGUÉM TEM CULPA SE TU TOMOU UM CHIFRE.
— Cada um no seu quadrado...
— Acontece que essa música não fica no teu quadrado. — Aí um velho se mete, tudo que eu queria. —O senhor falou o que? VIADO? SOU MESMO. AH CALA A BOCA. BOLA MURCHA.
— O nenê tá dormindo aqui. Fala mais baixo.
— TÔ NO MEU QUADRADO, BEM. QUANDO ERA AQUELA MÚSICA ALTA NÃO TINHA CRIANÇA DORMINDO.
— Ô amigo, da uma maneirada ou o motorista vai parar o ônibus.
— Hahaha.
Tem como contar essa cena em "slow motion"?
Bem, foi assim...: o cobrador ameaçou parar o ônibus e o corno manso riu da minha cara... eu fechei o punho... o beiço dele ainda tinha um sorriso... pelo vão dos dentes a risada ainda saía... HA HA HA... a pele que cobre meus dedos da mão direita entram em contato com aquela boca... e o rosto dele que tava virado pra mim... vira para o lado oposto...
— Pronto cobrador. Para o ônibus que vou descer. — Coloco meus óculos escuros e puxo a cordinha.
Sim, linda, triunfante, eu Cleyton Kevieczynski parecia a Bernardete de Priscilla a rainha do deserto descendo, depois de meia hora de tortura dentro do latão.
Não que eu cague dinheiro, mas vou pagar uma passagem nova e me preparar pra ouvir o Celso, sem surtar com a paternidade dele. Tomei um coletivo, depois de mais meia hora comendo poeira, volto pro cafundó onde tem a rodoviária pra comprar uma passagem nova e aproveito pra reclamar do desaforo, ameaço processar a viação e enquanto isso, ganho um lanche, água e enquanto o encarregado da agência fala com alguém no telefone, eu aproveito o tempo pra conversar com minha outra mana...
— Pudera, né, Abi. Com um cacete daquele tamanho, um filho é pouco, né viado. Depois te ligo, mona.
— Quando chegar, tu me liga que te busco no terminal.
Ai gente, tô no ônibus e vou fingir que tô dormindo pra não ter que ceder meu lugar pra outra mulher com criança.
Tô morta, mas sobrevivi: desço no terminal de Itajaí e quando vejo o Abi, canto alto pra cacete, precisando extravasar e aparecer:
— AI UIL SURVAI, AI UIL SURVAI, HEI HEI...
— Ô doente! Grita menos...
— CIDOOOO, ABI, AH SUAS ARROMBADAS.
— Cley...
— Celso? Eu não quero falar contigo, hoje me deixa.
— Oh polaco, era só brincadeira, foi ideia deles (Cido e Abi) a história da gravidez. Tem nada não.
....
Mato?
( ) Sim
( ) Sim, mato e depois ressuscito pra matar mais ainda
Afinal, mato quem primeiro?
( ) Luiz Aparecido
( ) Avilson Júnior
( ) Celso
( ) J. Kev
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Haha, aiaiai, acho que cutuquei a onça... ai que "bedo"... "çocorro"
Vou fingir que nada aconteceu, kkk. Besos♥
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