O Trote (Part. 1)

América

Sempre bom fingir que não tem nada acontecendo. Achei que tinha perdido esse dom, mas ele ainda continua aqui. Depois de tudo o que aconteceu, eu só quero voltar para a boa e velha rotina. Acho que estou sentindo paz. Meus músculos estão relaxados e minha mente limpa. É um sentimento a ser cultivado.

A época de pré-provas está se aproximando e isso sempre deixa todo mundo aflito. É como sentir o gostinho do inferno, segundo a Carla. A única vantagem é que a galera se reúne para estudar e não ficam de bobeira procurando confusão. Sem festas desnecessárias e sem gente barulhenta. Dessa vez, eles estão na biblioteca, imploraram e conseguiram a chave.

Carla me mandou uma mensagem de texto.

"Vamos começar sem você, Ame"

Desci as escadas correndo e me bati com alguém. O choque me fez dar alguns passos para trás e verificar se nenhum caderno tinha caído.

- Boa noite para você também. - ouvi uma voz familiar.

- Você voltou?!

- É, acho que sim. - Christian disse sorrindo.

Da última vez que o vi, ele estava ensanguentado e desacordado. Não foi uma cena muito bonita, repassei aquilo várias vezes para poder entender o que estava acontecendo comigo. Agora eu me lembro da sensação. E Senhor, isso não é nada bom.

Engoli em seco e ele me abraçou.

- Seria bom se você me abraçasse de volta. - Christian disse depois de um tempo.

- Cadernos na mão. - falei com a minha boca roçando na camisa dele.

- Quer que eu os derrube?

- Não! - o empurrei e dei risada.

- Você sorriu. - ele disse - Eu estou bem, não precisa se preocupar.

- Não estou preocupada, Dale. - revirei os olhos.

- E para onde está indo com isso?

- Biblioteca, vamos?

Contei ao Christian o que aconteceu no campus enquanto ele esteve fora. A Ayko recebeu outra advertência, continuamos na mesma em relação a Stela e Rafael, todos os calouros já chegaram e as pré-provas irão começar. Essa última parte o preocupou um pouco.

Ele não me contou muito do que rolou com a família. Só disse que está tudo bem, por enquanto, mas que talvez as coisas fiquem agitadas um pouco. Eu não perguntei muito sobre, desde que eu não o veja mais daquele jeito, acho que tudo ficará bem.

- Sério mesmo? Impossível ser essa resposta! - Molly disse e jogou o livro na mesa - Olhem isso.

- Tem razão, a resposta está errada. - Christian falou.

- Então as provas anteriores foram corrigidas erradas? - Carla perguntou.

- Provavelmente. - respondi - Não deveríamos nos basear por provas antigas.

- Eu as consegui, mas não garantiram veracidade. - Clay disse.

Quando chegamos aqui eles estavam estudando as provas anteriores de outros alunos. Clay disse que comprou por um valor alto e que iria dividir conosco se ajudássemos ele a estudar. Agora que descobrimos o erro não parece tão promissor.

- Seu olho não está meio roxo? - Carla perguntou ao Christian.

Ela estava perto demais, impossível não perceber as pequenas marcas que ainda restavam. Apesar do processo de recuperação ser incrivelmente bom, deixou réliquo.

- É a terceira vez que você pergunta isso. - ele respondeu impaciente.

- Eu sei, mas...

- Que barulho é esse? - Molly foi até a janela ver - Olha, estão fazendo trotes.

- Trote?!

- Ah não! - falei - Esqueci completamente do nosso.

- Verdade, você ficou encarregada de bolar. - Joana disse.

- Obrigada por abrir a boca para isso. - respondi.

- Então estamos sem trote. - Molly disse - Deixa tudo nas mãos da América, ela faz tudo! Faz tudo errado.

- Ai, cala a boca. - falei.

- Por que não colocamos eles para lavarem carros? - Clay perguntou e todo mundo o ignorou.

- Na antiga faculdade que estudei, fizemos um evento beneficente em um hospital, fomos vestidos de palhaços para as crianças.

- Qual a graça disso, Christian? - perguntei.

- É, tipo... queremos vê-los mijarem nas calças, morrerem de medo, se borrarem. - Moly disse.

- Lembram de como foi o nosso? Nós vendemos cupcakes. - Joana falou.

- É, pior dia da minha vida. - Carla disse.

- Então vocês têm alguma ideia melhor do que a minha, não é?

- Acho que deveríamos fazer o que o Christian disse. - Clay falou e foi ignorado novamente.

- Talvez não seja ruim sobre o hospital.

- Bom, é isso ou cupcakes.

- Hospital. - falei.



Falamos com todos os alunos e por incrível que pareça eles gostaram da ideia. Molly ficou encarregada de organizar a nossa visita, Clay de ensinar os novatos a serem sutis e nós quatro de montar os figurinos. Já o restante da nossa turma se dividiu em arrecadar dinheiro para o aluguel de roupas e comprar presentes. Tínhamos um dia para fazer tudo.

- Chegaram mais tecidos. - Carla entrou no quarto com uma sacola.

- Vamos fazer tamanho único, como vai ser só um dia, acredito que não tenha problema se ficar folgado.

- Tudo bem. - concordei com a Joana - Aquela roupa que dei ao Christian era qual?

- Tamanho único feminino. - ela respondeu.

- Ótimo, vai rasgar. - falei - Sabe onde o nosso modelo está? 

- No banheiro fantasma - Carla disse - Encontrei ele no corredor. 

- Tudo bem, vou lá. - falei e fui atrás dele.

Ele ainda não tinha vestido a roupa de palhaço que fizemos e isso é ótimo, já que vai poupar uma roupa de ser estragada. Olhei para as costas dele cheias de cicatriz e respirei fundo. Nunca tinta prestado atenção nelas e agora que sei o motivo, não gosto dessa sensação.

Sinto como se eu precisasse protegê-lo do que vem a seguir, como se quisesse colocá-lo em algum lugar livre de toda dor e sofrimento que ele tenha passado. Não quero que isso aconteça novamente com ele. Por que tudo tem que ser tão confuso quando se trata desse cara?

- Parece um fantasma. - ele disse e me tirou dos meus pensamentos.

- Eu entreguei a você o uniforme errado por engano. - falei rápido - Entreguei o feminino.

- Isso explica a saia. - ele disse e se virou.

Notei a cicatriz que estava no abdômen dele. Parecia ter cicatrizado bem, mas ainda estava um pouco vermelha.

- Dói? - perguntei apontando.

- Não. - ele disse - Quer vim ver o seu trabalho?

Coloquei os meus olhos bem em cima da cicatriz para ver de perto e ouvi ele contendo o riso. Por vingança, enfiei os dedos e puxei as extremidades para ver se a pele se rompia. Com sorte não rompeu.

- Isso dói, sabia?

- Ah, pensei. - falei encarando seu rosto de perto.

- Sabe, é injusto você me ver sem camisa e eu não te ver sem. - ele disse se aproximando.

- Essa é sua jogada, Christian? - dei risada - Só você vestir a sua.

- Ou você tirar a sua. - ele disse e segurou na barra da minha camisa.

Céus! Tirei a camisa e deixei ela cair ao chão. É engraçado, pois parece que é a primeira vez que ele me vê de sutiã. Christian ficou me olhando e isso me deixou um pouco incomodada.

Puxei ele e o beijei. Confesso que queria fazer isso desde quando o encontrei. Ele deve ter ficado surpreso, já que demorou um pouco para ele reagir. Dei um sorriso quando ele me apertou para si.

Ele me colocou em cima da pia e apertei o corpo dele com as minhas pernas. Senti seus beijos em meu pescoço e segurei o rosto dele para olhar em seus olhos. Era reconfortante ver que ele estava bem. Mordi o lábio e encostei a minha testa na dele.

- Você não quer? - ele perguntou e eu neguei com a cabeça - Tudo bem, não se preocupe.

Ele tentou se afastar e eu o puxei de volta.

- Não, idiota! - falei - Eu quero, quero mesmo! Mas ainda não cicatrizou, né?

Ele olhou para a cicatriz no abdômen e depois para mim.

- E quem disse que eu me importo? - Christian perguntou e tirou o meu sutiã.


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