Irmandade

Christian 

- Tá legal! Eu tenho uma. - Piter disse - Qual é o carro favorito dos fotógrafos?

- Fotógrafos têm carros? - Rafael perguntou e rimos. 

- Claro que têm! - exclamei - Você que não. 

- Ai! - ele disse e jogou a bola de tênis em mim. 

- Focus! - Miles disse. 

- Miles de novo? - Nick reclamou. 

- Se saísse do celular, talvez fosse mais rápido com a charada. 

- Não posso, estou tendo uma dr com a Carla. 

- A essa hora? - perguntei. 

- E tem hora? - Piter perguntou e se aproximou do celular, mas Nick afastou antes que ele visse algo. 

- Vocês precisam se resolver, olha a Stela e eu. 

- Claro, ter um filho resolve todo relacionamento. - Miles disse. 

Levantei e fui encher o copo com mais cerveja. As provas tinham acabado e estávamos aproveitando o final de semana. Não que todo mundo aqui tenha estudado e precisasse espairecer, mas nos reunimos para trocar ideias e beber um pouco. Isso me lembra os velhos tempos quando não tínhamos um futuro para nos preocupar, era rotineiro beber, jogar e reclamar de qualquer coisa que fosse justo. 

Miles apareceu na cozinha e encheu a mão com os doces que estavam em cima da bancada.

- Vai ter uma diabetes. - falei. 

- No máximo, cárie. - ele disse e enfiou os doces na boca. 

- Como se você já não tivesse o bastante. - respondi e bebi um pouco na cerveja. 

- Nós asiáticos temos belos dentes. - Miles se gabou e sorriu com a boca cheia. - Você vai contar para eles?

- Esse é o plano, por isso estamos aqui. 

- E acha que vão aceitar? 

Eu contei ao meu amigo sobre os problemas que a empresa vinha passando, encurtei a história para não expor mais do que já tinha sido revelado a ele, mas disse o suficiente para que entendesse a seriedade do que estávamos passando. O Miles não me decepcionando acabou entrando de cabeça na ideia de montar uma empresa, embora não tenha ideia de como isso funciona ele se dispôs a ajudar, assim como a minha irmã que enviou alguns planos. 

- Sinceramente? Eu não faço a mínima ideia. 

- Bem, vamos ver. 

- Como assim? - perguntei e o segui para onde o pessoal estava. 

- Aí, aí. - Miles chamou a atenção deles - Christian quer montar uma empresa e precisa de vocês. 

Como um golpe certeiro. Ele cortou toda e qualquer apresentação que eu tinha preparado para introduzir a notícia e proposta. Agora tudo tinha se esvaído, parece que toda aquela tensão que eu estava para ter essa conversa foi desnecessária e a cerveja não parecia tão boa assim. 

Sentei deixando o copo de lado esperando alguma reação deles. E para a minha surpresa, eles começaram a rir. 

- É sério? - Piter perguntou entre as risadas - Christian empresário?

Todos riram. E eu tive vontade de rir também. Semanas atrás eu não cogitaria isso e é uma das coisas que eu mais detesto no mundo. Mas a minha família precisava e eu prometi a alguém que iria fazer de tudo para ajudar. 

- É, tipo... eu entenderia se fosse outra pessoa, mas você? - Nick perguntou e eu confirmei com a cabeça - Espere, é sério?

- Sim, é bem sério e preciso de ajuda. 

- Por que isso, cara? 

- Estamos com problemas de gestão e talvez aumentar minha influência na empresa ajude, precisamos tentar tudo. 

- Sim e depois? 

- Depois o quê? - perguntei olhando para o Rafael. 

- Depois, cara! Você tá cursando medicina, não pensa a longo prazo? Abrir uma empresa não é só assim. 

- Puxa! Não esperava isso de você. - Miles disse e deu um tapa nas costas dele - Gente rica abre empresa por qualquer coisa e fecha também, eles não têm problemas com isso. 

- Depois alguém da minha família irá assumir. - respondi - Eu posso contar com vocês?

- Por que nós te ajudaríamos? - Piter levantou e foi buscar mais bebida. 

- É dinheiro, quem não quer dinheiro? - Nick deixou o celular de lado para prestar atenção na conversa - Se você me der um estágio e uma carta de recomendação da Dale, eu aceito. 

- Viu? Temos um! - Miles disse. 

- Você faz administração, Piter, pode ajudar bastante. 

- Você acha que eu sei algo da faculdade, cara? E outra, eu só quero um diploma, meu futuro já está encaminhado. 

- Claro, casar com uma garota que não gosta e viver as custas dos pais dela. - falei e me arrependi na hora. 

Planejava ser convincente com todos eles, visto que nenhum gosta de ter dores de cabeça ou se preocupar com algo, a vida mansa atrai bastante os meus amigos. Parece que montar uma empresa não é uma ideia amistosa para nenhum deles e eu estava piorando as coisas. 

- Golpe baixo. - Piter disse. 

- Como ela está? - Rafael perguntou e ele o olhou - A sua noiva. 

- Bem, tá com o namorado em Bali. 

- Romântico. - Miles ironizou - Nunca irei conseguir entender essa relação de vocês. 

- Que escolha eu tenho? - Piter perguntou derrotado. 

A essa altura ele já tinha se convencido de que essa era a melhor forma de ajudar os pais e a si mesmo. Tempos atrás quando eu ainda estudava em outra faculdade, os pais dele fizeram um investimento errado e perderam tudo o que tinham, a família ficou devastada. Meu pai tentou ajudar, mas eles nunca tinham se dado muito bem e na primeira desavença desfizeram todo o acordo. Soube que eles conseguiram ajuda de um grupo rico e conseguiram se restabelecer. 

Só não sabia o preço que tiveram que pagar por isso. 

- Bem, dando certo, pode tentar começar a devolver o dinheiro. - respondi. 

- Nem se eu trabalhasse a minha vida inteira conseguiria pagar essa quantia. - Piter retrucou. 

- Não vale a pena tentar? Se não der certo, você sai. 

- É cruel dar esperança a um soldado abatido. 

- Onde você serviu? 

- Meu Deus, Miles, cala a boca. - Piter disse e rimos - Eu não gosto dessa história, mas já aceitei faz tempo, por isso vivo como eu quero enquanto estou no campus, quando acabar a minha sentença será dada. 

- Ela é tão feia assim? - Rafael perguntou. 

- O que isso tem a ver? 

- Não, ela é linda. - Piter respondeu - Mas eu não gosto dela nenhum pouco, insuportável, só aquela voz dela... fora que ela disse que quer morar na casa dos pais. 

- E se você assumir a empresa depois que eu sair?

- Como assim? Christian que porra você bebeu?

- Não, sério! - levantei e comecei a andar pela sala - Eu tinha uma ideia para pedir a ajuda de todos vocês. Rafael precisa de uma casa e de emprego porque tem filho e esposa para cuidar. Miles me ajudaria de qualquer jeito. Nick eu não sabia bem o que queria, mas ele já topou em troca de um estágio. E você, eu pretendia ajudar você com a sua dívida e os seus pais também. 

Falei apontando para cada um querendo ter a certeza de que todos estavam prestando atenção em mim. Minha mãe disse uma vez que amigos são tão importantes quando a família e talvez até mais, porque nós os escolhemos para compartilhar a vida e para o bem e para o mal eu escolhi esses aqui. 

- É muita grana, cara. - Piter disse com os olhos marejados - E eu não faço ideia do porquê você me ajudaria. 

- Somos família. - Miles disse. 

- Exatamente. Ajudaria vocês até se me batessem. - falei - Estou ajudando até o estúpido. 

- Estúpido!! - Nick disse se referindo ao Rafael e rimos. 

- E então? O que me dizem? 

- Eu fico bem de terno. - Piter disse. 

- Preciso falar? - Rafael respondeu - Lógico que estou dentro. 

- Beleza, então vamos abrir uma empresa. 

Antes que eu percebesse já estávamos imaginando o nosso futuro. Algumas ideias eram bem mirabolantes como dominar o mundo e comprar o Texas inteiro. O álcool tem o poder de liberar a criatividade reprimida de alguns, era o que acontecia conosco. 

Essa pequena social que montei para relembrar os velhos tempos estava servindo de inspiração para os novos tempos. Crescemos e finalmente temos algo para nos preocupar, são coisas diferentes para cada um, mas basta para confirmar a nossa irmandade. 

- A propósito, a empresa é de quê? - Nick perguntou. 

- Turismo. - respondi. 

- A cara... 

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