16 - A aranha no guarda-roupa do André
A primeira vez que Raquel ouviu falar sobre… "aquilo"... Foi na quarta série.
Não que já não tivesse perguntado à mãe. Ela via novelas da Globo e, por mais que tentasse evitar que a filha pequena visse as cenas mais picantes, ela pegava sempre um comportamento em comum nas histórias: o casal se beijando de uma maneira afobada, indícios de que tiravam a roupa e, em um take depois, ambos juntos na cama.
Quando Raquel finalmente entendeu cientificamente o que era toda aquela representação, achou que era a coisa mais nojenta de toda a face da terra. Chegou à sua casa, cheia de dúvidas e revolta. Não conseguia acreditar que as pessoas nasciam daquele jeito. Não conseguia imaginar que as pessoas faziam AQUILO.
A mãe explicou que o científico era apenas uma parte de tudo. Que ali envolvia mais do que o que a professora Marina explicara. Envolvia amor entre o casal também. Mas o que uma menininha de 10 anos entenderia sobre o amor, certo? Naquele momento, não entrava em sua cabeça.
Depois que os anos passaram, a Raquel adolescente mudou, de certa forma, a concepção que tinha, quando criança. Começou a criar em sua mente uma ideia feminina de algo profundamente romântico e avassalador, mas evitava pensar sobre pois ficava triste por não ter, sequer, uma previsão de quando experimentaria.
Quando entrou na polícia, quase voltou ao que pensava sobre o assunto quando criança. Sabia que a maioria dos problemas que as pessoas tinham era direta ou indiretamente relacionados ao sexo. Ex-marido esfaqueando a mulher, venda de drogas em bailes famosos por orgia livre, violência por ciúme. Até mesmo uma mãe que perdia o seu filho estava relacionado ao sexo pois, se ela não tivesse feito o filho, não teria perdido ele hoje. Era o que Raquel pensava.
Quando começou a namorar Levi… foi quando tudo mudou. Foi a primeira vez que a ideia se tornou concreta em sua mente e, ao mesmo tempo, era totalmente abstrata. Sabia que gostava dele, sabia que ele seria o primeiro, mas não sabia como nem quando. Nem se seria bom ou ruim.
Ela lembrava-se da expressão estranha dele. Mas, ainda assim, estava fofo como nunca. Gostava de vê-lo assim. Inseguro, um tanto vulnerável e sentia-se estranha por gostar disto. Mas, mesmo que ele parecesse vulnerável, Raquel sabia que ela estava ainda mais. Ele estava sobre ela. O seu corpo quente aquecia cada um de seus ossos, como uma promessa de que os incendiaria a qualquer momento. Como um paradoxo entre a insegurança e a dominância.
"A-a gente não precisa fazer agora, se você não quiser.", ele sussurrou.
Ela segurou a pele nua do braço dele, que estava rígido como pedra.
"Eu quero sim…", ela sussurrou de volta. "Você não quer?"
"Quero!", ele olhou para a cabeceira da cama. "Mas tô com medo de fazer merda."
"Como assim fazer merda?"
"Sei lá, fazer algo errado…"
"Não dá pra fazer errado, ou faz ou faz.", ela replicou, impaciente.
"Mas é que eu…", ele hesitou.
"O que?"
Ele fechou os olhos e bufou.
"Aí, f#da-se. Bora!"
Raquel ainda se lembrava deste último diálogo. Colocou as mãos no rosto e gemeu de frustração, com Agatha ao seu lado, de queixo caído.
"Tá. Raquel Bacci, eu ainda não entendi nada, estou prestes a te meter o socão."
Raquel estava com as pernas jogadas na parede e o tronco apoiado na cama. Sabia que ia estourar a coluna toda, mas já se sentia detonada, de qualquer forma.
"Como assim amiga? Eu te contei tudo!"
"Não, amada, você não contou nada. Você primeiro me chamou sem dar explicação. Depois falou 'Amiga a gente fez.' Aí eu gritei por mais ou menos uns dez minutos e você começou a chorar. E aí eu fiquei toda traumatizada achando que ele tinha te forçado a algo e você quase me bateu por ter insultado o seu homem. E depois você começou a falar que tava com vergonha e piriri e pororo, que tinha doído, mas que não foi ruim, mas que ele te viu pelada e…"
"AGATHA PARA!", Raquel olhou para os lados. "Meu pai vai escutar! E você falando parece ainda pior."
"Da pra me explicar por que você tá surtando? Eu tô aqui há meia hora e você já chorou, já riu, já me bateu, já gritou…"
Raquel suspirou e se sentou direito. Sabia que tinha que explicar tudo para amiga e não só a história parcial.
"Foi meio que sem querer."
"Como assim?"
"Então…"
Ela começou a contar o que, de fato, tinha acontecido na noite anterior. Assim que chegaram à casa de Levi, ele se jogou no sofá e enterrou o rosto na almofada. Raquel tirou os sapatos e o viu, quase desmaiado, pelo fracasso da reconciliação do jantar.
"Own bebê.", Ela sentou no braço do sofá e fez um carinho no cabelo dele. "O que houve?"
"Desculpa te fazer passar por isso.", ele choramingou, com a voz abafada pela almofada. "Meus pais são muito chatos e eu sou pior ainda, por não ter pedido desculpas pra eles."
Ela apertou os cabelos lisos e escuros dele na palma de sua mão e pigarreou.
"Bem, nisso você foi burrinho mesmo."
Ele virou para Raquel, fazendo um bico que ela jamais imaginou ver, um dia, no rosto dele.
"Que foi?", ela franziu o cenho. "Nunca te vi assim!"
"Tô meio sensível hoje.", ele brincou com os fios da capa da almofada.
"Quer uns beijinhos?"
"Quero!", ele se levantou, sorridente.
Ela segurou as bochechas dele e deu um beijo rápido em seus lábios. Depois outro. Não demorou muito para que cada um daqueles beijos pequenos se tornassem mais longos e, logo, mais profundos. Ele apertou a coxa direita dela e ela se sobressaltou, assustada com a facilidade que aquilo foi longe.
"E aí, vocês fizeram!", Agatha concluiu, com um sorrisinho malicioso.
"Não! Escuta a história."
"Eu quero os detalhes, mas não todos os detalhes amada."
"CALMA! Confia em mim, vou contar tudo."
Raquel voltou ao momento da história, onde pulo do sofá, totalmente corada, indo em direção à cozinha.
"Nossa, nossa, nossa, tô morrendo de fome. Sobrou pizza do André?"
Levi suspirou e foi até ela. Não podia ficar calado sobre isso também.
"Ei, Quel."
"Eu", ela falou com a cara na geladeira.
"Por que toda vez que a gente tá no clima, você sai correndo…"
Raquel mordeu os lábios, encarando um pote de sorvete, cheio de feijão, pensando na desculpa que inventaria. Mas não arrumou nenhuma boa.
"Quem eu? Nada a ver, é que me deu fome. Aff, você só tem feijão!", resmungou, fechando a porta.
"Quel…", ele estreitou os olhos. " A gente prometeu ser sinceros um com o outro."
Raquel suspirou e olhou nos olhos do seu namorado.
"Tá. Eu admito. Talvez eu tenha medo de ir rápido demais e… te decepcionar."
"Como assim?"
"Eu…", ela coçou a cabeça. "Nunca fiquei com ninguém assim, Levi. Eu posso parecer durona mas, antes de te conhecer, a única pessoa que eu tinha beijado na vida era o amigo do meu primo e foi selinho de verdade ou desafio.", ela se apoiou na pia. "Não tenho experiência que nem você."
Levi deu uma risada curta, que se estendeu até tornar-se uma gargalhada.
"Valeu.", ela rolou os olhos e saiu da cozinha, com Levi ao seu encalço.
"Ei, Quel, não tô rindo de você.", ele segurou o pulso dela. "Tô rindo de mim."
Ela olhou para ele, com uma ruga entre as sobrancelhas.
"Eu também não sei nada."
"Como assim?"
"Eu não sei tanto sobre… você sabe…"
"Quer dizer que você é…"
"Sou sim."
Agatha colocou a mão na boca escancarada, completamente pasma com aquele pedaço do relato.
"O Levi Kim é virgem?"
"Era amada. Deixa eu terminar a história."
Raquel se lembrava de ter feito quase a mesma expressão de Agatha. Levi ficou vermelho, mas venceu a vergonha e segurou as mãos dela.
"Eu não ia te contar. Cai entre nós, nenhum homem gosta de admitir isso."
Raquel estreitou os olhos.
"Quanta bobagem. Você sabe que não ligo pra isso."
"Eu sei. E é por isso que te contei. Então não precisa se sentir pressionada a nada, nem preocupada. Não vou te atacar do nada."
Ela assentiu e deu um beijo no rosto dele.
"Então vamos fazer o que tiver que fazer quando estivermos prontos.", Ela completou o pensamento dele. "Beleza?"
O sorriso dele nasceu, vencendo o rubor de suas bochechas.
"Beleza!"
"Perai!", Agatha interrompeu. "Até agora, pela conversa, não tem contexto nenhum pra frase 'A gente fez!' Achei fofinho, mas pareceu mais um quase voto de castidade temporário."
"Se você me deixar terminar…"
Raquel depois daquilo, subiu para o quarto de André. Ela tirou a muda de roupas que ele emprestava para ela do guarda-roupa de vez em quando e arrancou o vestido, ficando apenas com o conjunto de sutiã e calcinha dos Minions e meias soquetes. Uma cena que a mesma julgava horrorosa. Então, até agora, não tinha entendido como aquilo aconteceu.
Quando ela abriu o guarda-roupa novamente, para procurar as pantufas, deu de cara com a maior aranha que já viu. Peluda, de pernas enormes e andar rápido. O corpo inteiro dela se arrepiou e ela soltou um grito apavorante.
Levi entrou, com os olhos arregalados no quarto e Raquel pulou para trás dele.
"Ali, ali!", ela choramingou.
Ele sabia que ela tinha pavor de aranhas. É algo que conversaram na viatura um dia. Então, com cautela, ele pegou a bota de policial reserva de André e acertou com firmeza a aranha.
"Meu Deus, de onde estas pestes estão saíndo? Eu coloquei telas nas janelas e…"
Neste momento, Raquel se deu conta de que estava semi nua, na frente de Levi. Ela segurou as mudas de roupa, em frente aos pontos mais constrangedores e ficou vermelha.
"AI MEU DEUS. Eu… Desculpa, eu tava com medo da aranha e… Aí que vergonha, se vira, por favor."
Mas ele não se virou. Encarou, embasbacado, o corpo da garota. Cada pedaço que ele nunca tinha visto e percebeu que a desejava mais do que imaginou.
Sem pensar muito ele a puxou pelo pulso, a prendeu contra a outra porta do guarda roupa e deu um beijo longo e desesperado, silenciando qualquer surpresa da parte de Raquel com a sua língua. A surpresa dela logo foi substituída pelo mesmo desespero dele. Ainda com os lábios colados aos dela, ele arrancou a própria camisa e a jogou na cama, grudando o abdômen nu ao dela.
"E aí a gente fez…", Raquel concluiu.
Agatha estava prestes a explodir com a quantidade de informações e plot twists daquela história.
"Não acredito que dói assim!", ela apertou a almofada. "Por causa de uma aranha?"
"Pois é né? E ele só tirou ela do guarda-roupa depois que a gente acabou."
"Parece pornô dos anos 80. Ou fanfic do wattpad."
Raquel deu de ombros, com um sorrisinho.
"Não pera… Vocês fizeram na cama do André?"
"Aaaa…."
Agatha caiu na gargalhada, até chegar ao ponto de chorar.
"Cara, eu vou zoar muito ele por isso."
"Ele não sabe disso, cala a boca!"
"Vou te chantagear. Saiba disto.", ela cruzou as pernas na cama. "Mas amiga, porque você tava chorando?"
Raquel se jogou na cama de novo.
"Porque eu tô com vergonha. Como que eu vou encarar ele agora?"
"Mas foi ruim? Você disse que não foi ruim!"
"Não foi mesmo. Mas eu tô com vergonha ainda. Toda vez que ele me olhar… eu vou acabar imaginando que ele me viu pelada. E que eu também vi ele... E vou lembrar do conjuntinho horrível que eu tava usando e de outras coisas que não quero te falar. Eu paguei mico amiga. Fiquei rindo e fiz uns barulhos meio…", ela entortou o nariz, lembrando de si mesma.
"E ele deve ter amado. Amou até o conjuntinho, senão não tinha te atacado minutos depois que ele falou que não ia te atacar."
Raquel franziu o cenho e assentiu. Como sempre, Agatha tinha razão.
"Só sei que meu pai quase me esfolou depois de ontem. Cheguei às 3 da manhã. Joguei a culpa em você."
"Jesus, me conte quando for me usar nas suas mentiras pilantras. Eu quase acabei dando na cara quando ele perguntou se foi legal o filme ontem."
"Ei e me conta como foi o lance com o Daniel…"
"Ah…", Agatha deu vários soquinhos na almofada, com um sorriso enorme. "Vou contar tudo. Meu momento chegou."
"Tá… me conta, me ajudando escolher o look pra operação na 17."
"Operação na 17? Na 17 mesmo, mesmo?"
"Sim… a polícia civil pediu ajuda da PM em uma operação em um baile lá hoje. Precisamos ir à paisana. Sabe como é né? Sábado a noite…"
"Raquel Bacci vai pra um baile funk? Meu Deus, chega por hoje."
"E você vai me ajudar. Minha prima deixou um monte daquelas roupas feias dela. Cropped, shorts… me deixa bonitinha, por favor, mesmo com esse assassinato à moda?"
"E vamos de Mizuno, nega."
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top