Capítulo 44 - Parte I
Enquanto Selene e Caleb se encontravam com o misterioso negociador do artefato que minha avó tanto queria, nós quatro passamos o tempo contando histórias e nos divertindo. O clima descontraído permeava a clareira, transformando-a em um refúgio momentâneo do caos que me cercava.
Elisa exibia um sorriso radiante, seu semblante iluminado pela alegria evidente. Arlan ocupava o lugar ao seu lado, e sua expressão transbordava a felicidade de quem havia descoberto um novo capítulo em sua vida. Minha prima, ao pular de alegria, confidenciou para mim que ela e o lobo haviam trocado beijos, enquanto eu compartilhava meu próprio momento de paixão.
Horas se desenrolaram entre risadas e histórias de nossa infância, criando uma sensação de pertencimento que há muito tempo eu não experimentava. Estar ali, em meio a três jovens, compartilhando conversas triviais, era como descobrir um lar em meio à tempestade. Sem julgamentos, sem a constante vigilância, irmandades, éramos simplesmente pessoas desfrutando da companhia umas das outras.
Com Asher, experimentei uma liberdade surpreendente, rompendo barreiras que eu mesma havia erguido. Sua presença trouxe um sopro de ar fresco, e, a sensação não se devia apenas ao passeio por Aranthia, havia algo mais profundo, algo que me conectava a ele de maneira única.
Mas ali, com o vampiro e Elisa também, era como se tudo tivesse finalmente se encaixado. Aquilo era familiar, mesmo que novo, era um lar. Eu sorria sem parar, incapaz de controlar meus lábios, outrora sempre marcados por um franzir insistente, e então, tão relaxados como se não houvesse problemas no mundo, e o mais importante, em mim.
Entretanto, esse instante de harmonia foi abruptamente interrompido. Uma energia intensa varreu a clareira, fazendo os pelos da minha nuca arrepiarem. O silêncio caiu sobre nós quando todos perceberam a mudança no ambiente.
— O que é isso? — indagou Elisa, a preocupação marcando sua testa.
— Não faço ideia, mas parece… poderoso — o lobo respondeu, com uma nota de inquietação.
Observamos em silêncio aquela energia estranha, o ar impregnado de algo indescritível. Pouco depois, um perfume de violetas inundou a clareira, fazendo meu corpo todo reagir. Era uma magia tão intensa que o próprio ar parecia se curvar diante dela.
Asher se levantou de repente, uma expressão intrigada torcendo seus lábios.
— O que foi? — perguntei, tentando compreender a situação.
— Foi… interessante — respondeu o vampiro, seu olhar agora voltado para mim, revelando uma emoção indescritível — Preciso confessar que eu não esperava… gostar tanto.
Ele falava enquanto caminhava para longe de mim, rumo ao lado oposto, onde Elisa e Arlan estavam sentados em um tronco. O vampiro contornou os dois com passos deliberados, e seu olhar denotava uma reflexão profunda sobre algum assunto que me escapava completamente.
— Do que você está falando? — questionou Elisa, virando-se para ele, tão confusa quanto eu.
— Bem, eu não esperava hesitar — Asher soltou uma risada amarga — Ou que fosse chegar tão cedo. Qual o nome dessa sensação? — inquiriu, buscando respostas nos olhares confusos ao seu redor.
Então, algo estranho aconteceu. Uma nota de algo errado impregnou o ar, substituindo o suave aroma de lavanda. Carregava uma sensação errada, de um poder cru e sombrio que se espalhava, fazendo-me perceber que a energia sentida anteriormente era, na verdade, acolhedora em comparação.
Num instante fugaz, uma espada materializou-se nas mãos do vampiro. Fiquei estática, observando-o balançar aquele artefato de um material negro, adornado por desenhos de serpentes que serpenteavam pela lâmina lustrosa.
— Mas que merd…
A frase de Arlan ficou suspensa no ar, assim como meu ser, quando Asher, com um movimento brusco das mãos, desceu a espada diretamente em direção a Elisa.
Senti a vida abandonar meu corpo, mergulhando-me num estado catatônico. Testemunhei o movimento em câmera lenta, incapaz de reagir ou impedir o que se tornava o pior momento da minha vida. O choque me paralisava, e eu não conseguia compreender totalmente o que estava acontecendo, como se estivesse assistindo à cena de fora do meu próprio corpo, uma alma espectadora da tragédia.
O grito do lobo rasgou o ar, carregando consigo uma dor tão crua e dolorosa que parecia transcender a própria alma, e talvez, eu tenha gritado também.
Ela, que minutos antes era tão viva, agora parecia uma boneca, sua expressão chocada congelada como uma cruel ironia. Seus olhos azuis perdiam o brilho celestial, a pele, normalmente dourada com um toque de rosa, adquirira uma palidez que rivalizava com a minha própria. O terrível corte atravessava-a de um lado ao outro, e o líquido carmesim… um volume excessivo escorria dali. Nunca senti tanto horror diante de sangue, tanta repulsa.
Arlan levantou-se em fúria, parecia dividido entre socorrer a bruxa e dilacerar o vampiro. Movendo-se em um impulso incontrolável, ele se transformou ainda em movimento, saltando em direção ao ruivo, que, para minha total surpresa, o lançou para o outro lado da clareira com um simples gesto das mãos. Magia, algo que parecia impossível, afinal, vampiros não deveriam possuir tal habilidade. O estrondo do corpo do lobo chocando-se contra o chão foi assustadoramente alto, um baque surdo que me fez estremecer internamente, mantendo-me paralisada no meu lugar.
— Lobos — Asher falou num revirar de olhos.
Em seguida, ele gargalhou, sua risada estrondosa ecoou por todo o bosque, como uma avalanche sonora que ameaçava me esmagar. O som ressoava em meus ouvidos, agitando o ar e fazendo meu coração palpitar.
Seus olhos frios me perfuraram como lanças de gelo, roubando meu fôlego e deixando meu corpo tenso como uma corda de arco.
A dor da traição e da perda me atingiu como um soco no estômago, deixando-me tonta. Eu havia perdido duas pessoas amadas de uma só vez. Não só Elisa, ensanguentada por suas mãos, mas também aquele em quem eu confiava e passei a amar profundamente.
Aquilo deve ter me tirado do estupor, diante da cena macabra, senti minhas pernas fraquejarem, quase desabando no chão. Meus olhos marejados se fixaram na figura sinistra à minha frente. Uma presença que antes considerava um refúgio seguro, mas que se revelara meu pior pesadelo.
— Por quê? — a pergunta saiu sem controle, rasgando pela minha garganta.
— Oh, acho que esqueci de mencionar, deixe-me corrigir isso — o vampiro respondeu sem emoção — É um prazer conhecê-la, Morrigan. Sou Astaroth, Príncipe de Abaddon — ele falou seguido de uma mesura profunda.
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