Capítulo 11

Após uma refeição farta e dançar em torno da fogueira até que meus pés doessem, o encanto do eclipse eminente envolvia-me como um palpável e pulsante coração da própria terra.

Embora meus olhos percorressem tudo e todos, parecia que eu não enxergava nada, mergulhada em uma inércia profunda em meio ao ritual. Meus pés descalços flutuavam pela clareira, absorvendo cada sensação, enquanto minhas mãos se moviam de forma fluída, como se guiadas por energias misteriosas além de minha compreensão.

O ritual do eclipse era sinônimo de liberdade. Era o momento de desfrutar sem amarras, de sentir com a alma e o coração a certeza de que a Deusa Syrenah olhava por todos nós.

Em algum momento, aquela energia me conduziu longe das multidões, em direção ao lago que refletia a lua de forma celestial, transformando suas águas em um espelho mágico.

Senti a presença divina ao meu redor, me observando... distante, mas ao mesmo tempo tão próxima, como se estivesse impregnada no ar que respirava.

"Oh, minha Deusa, será que você poderia me proporcionar um pouco de paz?" Perguntei mentalmente, na remota possibilidade de ela me ouvir.

"Seria possível atender ao meu pedido? Poderia aliviar meu coração pesado, dissipando todas essas dúvidas e anseios?"

Fixei o olhar diretamente na lua refletida na água azul-escura. O eclipse agora cobria boa parte dela.

"Mostre-me o caminho correto, por favor. Diga-me por que sou tão diferente do restante da minha família..." Minhas palavras saíam com sinceridade e anseio, como um pedido silencioso e urgente ao universo que me cercava.

— Uma moeda por seus pensamentos? — indagou uma voz baixa e rouca.

Inebriada por todo o ambiente místico e pelos efeitos da bebida, cheguei a pensar que estava imaginando coisas, já que não conseguia visualizar mais ninguém ao meu redor.

Mas um movimento capturou minha atenção e, ao focar minha visão, percebi Asher encostado em uma árvore, ostentando uma postura deliberadamente relaxada.

Arqueei a sobrancelha, fitando-o atentamente. Eu ansiava por respostas e paz, contudo, o destino parecia brincar comigo ao colocar aquela criatura em meu caminho... alguém que gerava mais incertezas do que esclarecimentos.

— Veio comemorar o ritual? — questionei, optando por não responder ao seu questionamento.

Uma risada repleta de zombaria escapou de seus lábios, e quando o riso enfim cessou, ele balançou a cabeça, como se quisesse afastar pensamentos perturbadores.

— Não — respondeu com um sorriso travesso nos lábios — Vampiros não veneram a sua Deusa, mas estou surpreso em ver quantos nessa aldeia o fazem.

Permaneci em silêncio diante de sua afirmação, evitando revelar que se tratava de uma Irmandade de bruxos. O fato de ele saber meu nome e onde eu morava já era preocupante o bastante.

— Sim, uma aldeia repleta de bruxos — prosseguiu, como se pudesse ler meus pensamentos — Não se preocupe em esconder, posso sentir o quanto deles têm por aqui.

Silenciei novamente, observando-o enquanto ele se afastava da árvore e se aproximava de mim, de forma despretensiosa.

— Interessante... — disse, fitando-me como um gavião analisando sua presa.

— O que quer dizer? — não pude evitar a curiosidade e questionei em voz alta.

— Que, por aqui, conseguem celebrar. Infelizmente, o mesmo não se pode dizer sobre a maior parte de Aranthia.

Eu sabia que os bruxos costumavam se ocultar dos olhos humanos, tornando o ritual uma comemoração secreta em muitas partes do mundo. No entanto, em minha vila, não era necessário tal sigilo, uma vez que a maioria dos habitantes possuía uma veia mágica.

Entretanto, suas palavras acenderam um pequeno alerta em meu interior.

— O que quer dizer com isso? — acabei perguntando involuntariamente, deixando transparecer minha inquietação.

— Com a Sociedade Sagrada à solta, a maioria dos bruxos teme até mesmo celebrar em suas próprias casas, com medo de que sua natureza seja descoberta.

A lembrança da Sociedade Sagrada surgia vagamente em minha mente, como um eco distante de algo que eu havia ouvido em algum momento. Porém, sua verdadeira natureza permanecia envolta em mistério, e eu me perguntava por que os bruxos temiam tanto essa organização.

Observando meu semblante confuso, Asher parecia captar minha falta de conhecimento sobre o assunto.

— Você não faz ideia, não é mesmo? Protegida por esta linda bolha... — Seu tom carregava desaprovação, como se eu devesse estar ciente do que a Sociedade Sagrada representava.

— Na verdade, não sei ao certo... — respondi com sinceridade, tentando disfarçar a insegurança que aquelas palavras trouxeram.

Asher interrompeu-me antes que pudesse explicar minha ignorância.

— Permita-me esclarecer, então. A Sociedade Sagrada é um grupo de fanáticos religiosos que persegue implacavelmente todos aqueles que não se submetem às suas crenças, com especial foco em bruxos.

Ao ouvir a explicação um arrepio percorreu minha espinha, como se as palavras dele trouxessem uma ameaça palpável e arrepiante. A ideia de ser alvo de uma organização tão fanática era assustadora, e minha mente se encheu de dúvidas e inquietação.

Se a Sociedade Sagrada era tão perigosa, por que ninguém da minha família nunca mencionou nada? Um turbilhão de perguntas se formou em minha mente, clamando por respostas que eu não sabia se estava preparada para enfrentar.

— Persegue... o que quer dizer com isso? — minha voz vacilante deu voz a uma das tantas questões que giravam em minha cabeça.

A resposta de Asher veio sombria e fria, como uma lâmina cortante em meio à escuridão.

— Depende. Alguns têm a "sorte" de serem enforcados e queimados. Outros têm o azar de acabar em uma de suas prisões, onde sua magia é aprisionada e sufocada.

A crueldade daquelas palavras me deixou ainda mais atônita. Como humanos poderiam afugentar bruxos com tamanha implacabilidade?

A risada profunda e rouca de Asher ecoou ao meu redor, carregada de um tom exagerado e cruel, quase macabro. Só então me dei conta de que havia feito a pergunta em voz alta.

Em meio a tudo aquilo, ele murmurou a palavra "bolha" de forma quase inaudível, como se zombasse do lugar protegido onde eu vivia.

— Para sua aldeia, talvez seja assim — respondeu ele ainda contendo o riso — Mas você se esquece de que existem bruxos vivendo escondidos por aí. Além disso, há aqueles que são tolos o bastante para se negarem a machucar ou revidar.

O coração batia acelerado em meu peito, e uma sensação sufocante de incerteza tomou conta de mim. A noite, que antes era encantadora, agora se revelava sob uma perspectiva sombria, envolvendo-me em um véu de desespero e angústia.

Será que minha família sabia sobre a Sociedade Sagrada e os horrores que os bruxos enfrentavam além da nossa aldeia? E a Irmandade Lumem, também tinha conhecimento dessas atrocidades?

A palavra "bolha" continuava a ecoar em minha mente, como uma sentença que ameaçava estourar a qualquer momento, revelando-me a verdade nua e crua.

Mas e se Asher estivesse exagerando ou mesmo mentindo? Eu mal o conhecia, ao contrário da minha família e da Irmandade.

As dúvidas me envolviam como uma densa névoa, obscurecendo qualquer certeza que eu pudesse ter.

— E devo acreditar em você? — perguntei com uma dose de ríspidez, tentando ocultar o turbilhão emocional que me consumia.

O vampiro respondeu com um sorriso de lado, como se estivesse ciente do conflito em minha mente.

— Não — disse ele com tranquilidade — Mas posso mostrar.

Para minha surpresa, Asher estava mais próximo do que eu havia percebido. Apenas trinta centímetros nos separavam, e sua mão estendida parecia um convite tentador e, ao mesmo tempo, inquietante.

Minhas emoções estavam em um turbilhão. Por um lado, eu sentia a necessidade de afastar-me daquele vampiro misterioso e suas histórias sombrias. Por outro, a curiosidade e o anseio por respostas me impeliam a seguir em frente, a desvendar os segredos ocultos por trás daquela noite enigmática.

Enquanto meu coração estava tomado por uma mistura sentimentos, eu me questionava se a presença do vampiro ali era um sinal divino. Seria a resposta à minha súplica à Deusa Syrenah, pedindo por orientação e clareza em meio às incertezas que rondavam minha vida?

Uma voz interior ecoava dentro de mim, sussurrando que nada acontecia por acaso. Seria possível que a Deusa estivesse guiando meus passos naquela noite, conduzindo-me até aquele encontro inesperado? A ideia parecia ao mesmo tempo assustadora e reconfortante.

Olhei para a lua refletida no lago e, por um breve momento, senti como se Syrenah estivesse me observando, seu olhar divino penetrando minha alma.

Seria ingenuidade acreditar que um encontro com um estranho poderia trazer as respostas que tanto buscava? Poderia ser apenas uma coincidência, um acaso do destino. Mas algo dentro de mim sussurrava que havia mais naquela noite do que meras coincidências.

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