Capítulo 05
Eu me esquivei do soco de Caleb, sentindo a brisa do golpe passar rente ao meu rosto. Revidei com um chute na lateral do corpo dele, mas ele bloqueava com o braço, me empurrando para trás.
Nós estávamos treinando em uma clareira próxima ao limite da floresta, onde os lobos costumavam praticar. O sol brilhava forte no céu azul, mas eu mal notava. Minha mente estava tomada pela lembrança da porca agonizante, do sangue escorrendo, da energia pulsando em meu peito.
Eu me sentia confusa, culpada, envergonhada. Não conseguia entender o que tinha feito, como tinha feito, e pior, por que tinha gostado.
Eu me odiava por ter quase matado um ser vivo, por ter decepcionado minha família.
A noite anterior foi uma verdadeira agonia. Meu sono foi constantemente perturbado, alternando entre momentos em que eu acordava ao som do coração da porca parando de bater e outros em que o olhar de decepção no rosto de Caius me assombrava.
Desde o início do treino, Caleb percebeu meu estado de nervosismo. Ele fez várias tentativas para me acalmar, perguntando o que havia acontecido, mas eu me recusei a compartilhar. Desde então, ele tem me provocado com piadas e insultos, claramente tentando desviar minha atenção para si e não para meus problemas pessoais.
Continuamos engajados em um intenso confronto, limitando-nos a golpes desferidos apenas com o corpo, sem recorrer a qualquer artifício sobrenatural.
Nosso objetivo era testar nossas habilidades físicas, resistência e agilidade. Movíamos-nos com velocidade e precisão, aproveitando cada brecha e oportunidade que surgia, buscando explorar ao máximo nosso potencial.
— Você está lenta hoje, Morri — Caleb zombou, habilmente desviando de um soco meu e acertando um tapa na minha nuca. — O que foi? Comeu algo estragado?
— Cale a boca, Caleb — eu retruquei, girando o corpo e desferindo um chute em suas pernas, fazendo-o cair no chão. Ele sabia muito bem que eu odiava ser chamada assim. — Na verdade, é você quem está mole.
— Mole? — Caleb riu, rolando para o lado e se levantando rapidamente. — Você não tem ideia do que está falando, Morri. Estou apenas esquentando, aquecendo os músculos antes de mostrar a você o que é estar verdadeiramente preparado.
Seus olhos brilhavam com determinação enquanto se aproximava de mim, prontamente assumindo uma postura de combate. A brisa suave agitava seus cabelos pretos, mas eu mal conseguia me concentrar na cena diante de mim.
Minha mente continuava tumultuada, minha consciência repleta de dúvidas e remorso, tornando cada movimento do treino uma batalha interna. Eu sabia que precisava superar aquilo, mas parecia uma tarefa impossível.
Caleb avançou novamente, lançando um rápido soco em minha direção. Eu consegui bloquear o golpe, mas senti a força impactar meu braço. A dor pulsava em minha pele, mas eu a abafava, canalizando-a para reforçar minha determinação.
— Acha mesmo que vai conseguir me vencer? — Caleb provocou, sua voz carregada de sarcasmo. — Você está distraída, desfocada. Não tem chance contra mim.
Meu corpo se movia em resposta aos seus ataques, minha mente lutando para encontrar a clareza necessária. Eu precisava me concentrar no presente, no treino, e deixar as preocupações de lado por um momento.
Um impulso de coragem percorreu minhas veias. Eu não poderia permitir que minhas próprias inseguranças me dominassem. Ergui a cabeça e encarei Caleb com determinação nos olhos.
— Você fala demais, Caleb — disse em tom firme.
Com um movimento rápido e preciso, desferi uma sequência de golpes calculados, mirando seus pontos fracos. Cada soco e chute era impulsionado por minha vontade de provar a mim mesma que eu era mais forte do que minhas dúvidas.
Caleb, surpreso com minha súbita mudança de postura, tentava se defender, mas eu estava determinada a superá-lo. A adrenalina pulsava em minhas veias, o suor escorria pela minha testa, mas eu não desistia.
O combate se desenrolava em meio à clareira, o som dos nossos golpes ecoando pelo ar. O treino se tornara uma batalha interna e externa, onde eu lutava não apenas contra Caleb, mas também contra meus próprios demônios.
À medida que o confronto avançava, eu sentia uma chama ardente se acender dentro de mim. A raiva e a culpa que me consumiam eram canalizadas para cada movimento, cada ataque.
Finalmente, um golpe bem-sucedido fez Caleb recuar alguns passos, seu rosto exibindo surpresa. Eu aproveitei a brecha para avançar e com um rápido movimento, desferi um soco preciso em seu peito, fazendo-o cambalear para trás.
Caleb tentou se reequilibrar, mas antes que pudesse se recuperar totalmente, aproveitei a oportunidade e desferi uma sequência de socos rápidos.
Os insultos e provocações de Caleb agora pareciam distantes, abafados pelos batimentos frenéticos do meu coração. Eu estava completamente envolvida na luta, até que, num momento de desatenção, Caleb conseguiu bloquear meus braços e me segurou firmemente.
A percepção da nossa posição me atingiu de repente. Estávamos no chão, eu em cima dele, ambos ofegantes. Caleb parecia atordoado, sangue escorria de seu nariz e boca, mas ainda mantinha sua firmeza ao segurar meus braços.
Tentei me soltar novamente, mas Caleb apertou meu pulso com mais firmeza. Seu olhar se fixou no meu, e em seus olhos, vi um misto de dor e determinação.
— O que está acontecendo com você, Morrigan? O que te fez reagir desse jeito? — Ele perguntou com sua voz um pouco rouca.
Minha respiração ficou presa na garganta. Eu quis me soltar dele e correr para longe, mas também quis abraçar ele e chorar em seu ombro.
Eu fiquei paralisada por um instante, sem saber o que fazer.
Nesse momento de tensão, um som repentino de pigarreio ecoou na clareira, interrompendo o momento. Ambos desviamos o olhar na direção do som e vimos Elisa de pé ali.
Senti meu rosto corar de constrangimento. Eu sabia que ela estava vendo aquela cena embaraçosa e não sabia como explicar o que havia acontecido.
Antes que eu pudesse encontrar as palavras certas, um guincho agudo me fez paralisar. Segui o olhar de Elisa e, para minha surpresa, vi que ela trazia consigo, amarrada por uma corda francesa cor-de-rosa, a porca...
Meus olhos se arregalaram e minha expressão se transformou em choque e horror. Meu coração se apertou ao ver o animal, eu me senti envergonhada e culpada por ter causado dor àquela criatura.
Elisa, com um sorriso gentil no rosto, se aproximou de mim segurando a porca com cuidado. Ela percebeu minha expressão de horror e rapidamente tentou me explicar.
— Mor… — ela começou com sua voz doce. — Depois que Caius a curou ontem à noite… eu decidi levá-la para casa e cuidar dela. Eu a nomeei de Abigail… em homenagem à minha tataravó, ela foi uma bruxa poderosa que lutou contra as trevas, então achei que seria uma linda homenagem…
Ela falava sem parar, atropelando as sílabas. Ela parecia não perceber o meu desconforto ou o de Caleb, que ainda estava debaixo de mim, imóvel.
Eu não sabia o que me horrorizava mais, o fato de minha amiga estar carregando a porca como um cachorrinho ou o fato de ter dado o nome de minha bisavó a ela.
Eu tentei me soltar de Caleb, mas ele me segurou com mais força, me impedindo de me levantar.
— Não se mexa, fique quieta. Talvez ela vá embora. — ele sussurrou em meu ouvido.
Eu senti seu hálito quente em minha nuca, causando um arrepio em minha espinha. Eu quis protestar, mas ele colocou um dedo em meus lábios, me silenciando.
Elisa chegou até nós, sorrindo inocentemente. Ela se agachou ao nosso lado e estendeu a porca para mim.
— Olha, Mor… ela está bem, ela está feliz, quer te ver. — ela disse com sua voz melosa.
A porca grunhiu e mexeu o focinho, como se reconhecesse minha presença. Eu senti uma onda de náusea me invadir, lembrando-me do que eu tinha feito com ela.
— E vocês dois? O que estão fazendo? — ela perguntou com sua voz ingênua, alheia ao meu desconforto.
Caleb e eu nos entreolhamos, sem saber o que responder. Nós estávamos no chão, suados, machucados, abraçados.
Eu senti meu rosto corar ainda mais e tentei encontrar uma desculpa plausível.
— Nós… nós estávamos… — eu gaguejei sem sucesso.
Caleb interrompeu minha fala e rapidamente inventou uma mentira.
— Nós estávamos praticando uma técnica nova. Uma técnica de imobilização, é muito eficaz. — ele disse com sua voz convincente.
Elisa arregalou os olhos e pareceu interessada.
— Uma técnica de imobilização? Que legal! Como é? — ela perguntou com sua voz animada.
Caleb sorriu nervosamente e tentou explicar.
Eu senti uma vontade louca de rir daquela situação absurda. Eu também senti uma vontade louca de chorar daquela situação ridícula.
Eu não sabia o que fazer...
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top