- Você se lembra?





" A memória guardará o que valer a pena. A memória sabe de mim mais que eu; e ela não perde o que merece ser salvo. "

-Eduardo Galeano

Dizem que um momento pode mudar tudo, que nossas escolhas fazem nosso caminho. E quando todas essas escolhas somem? Como podemos descobrir o porquê de estarmos nesse caminho?

Há alguns anos atrás eu acordei num hospital em Amsterdã sem ter nenhuma ideia de como fui parar lá, tudo o que havia eram enormes buracos na minha memória que eu simplesmente não conseguia preencher sem sentir que poderia explodir minha cabeça.

- Não se esforce demais senhorita Scott. Você não precisa recuperar tudo em um dia, espere pela sua irmã, ela está a caminho. ~Disse o meu médico~

Ele disse aquilo como se minha irmã fosse a solução para tudo o que estava acontecendo, eu preferia que meu irmão Josh estivesse vindo, ele sempre soube mais da minha vida do que Margot.

Margot não era o tipo de irmã mais velha protetora, que ama e cuida, ela nunca fez o tipo mãe adolescente, ela estava mais para egoísta sarcástica. Passei metade da vida desejando seu quarto e a outra metade desejando sua liberdade e independência.

Josh era o irmão mais velho que toda garota sonha. Protetor, cuidadoso, cheio dos melhores conselhos, eu o amava com todo meu coração e sentia que precisava dele naquele momento, precisava do seu abraço acolhedor.

Mas quando Margot entrou no meu quarto de hospital naquele dia eu não a reconheci, toda sua preocupação e compreensão, tudo aquilo era novidade para mim, ela com certeza não era mais a pessoa que eu conhecia.

- Pare de me olhar como se eu fosse um E.T.

- Me desculpa, eu apenas não reconheço você, não reconheço esse comportamento.

Ela me olhou profundamente e seus olhos me lembraram os da mamãe, ela me olhou exatamente do mesmo jeito que a mamãe fazia quando sentia pena de mim e eu me afundei na cama exatamente como fazia quando tinha 11 anos.

- Tudo bem irmãzinha, não se esforce ta, tudo vai ficar bem.

Minha irmã passou o dia todo sentada numa poltrona ao lado da minha cama, nossos pais estavam a caminho, mas Josh não viria. O doutor proibiu qualquer tipo de conversa sobre como eu bati a cabeça, eu estava sem memória e sem informações para tentar reconstruí-la.

Enquanto eu estava deitada sentia minha cabeça doer e me lembrava da árvore do Natal, minha cabeça pulsava como as luzes do Natal. Mas o Natal na minha cabeça era um borrão, algumas partes eram claras por exemplo o abraço dos meus pais, meus presentes, mas quando tentava me lembrar de quem estava presente naquele dia a dor era quase capaz de me matar.

- Quer ajuda para se lembrar de alguma coisa? ~Perguntou Margot~

- Está tão obvio o meu esforço?

- Como você se sente?

Ela fechou a revista que segurava em sua mão, uma revista de moda antiga que me fazia duvidar se ela estava realmente lendo ou apenas fingindo não prestar atenção em mim.

- Eu me sinto bem, quase como um bebê, sem minha memória é como se eu nunca tivesse sentido raiva ou tivesse sido magoada. É um pouco estranho, mas estou bem.

Margot sorriu quase que para si mesma então piscou para mim e voltou a olhar para revista, é ela ainda era um pouco egoísta, mas se aquela piscada era sarcasmo eu não entendi.

Quando meus pais chegaram eu quase enlouqueci, foi como se eu mergulhasse em escuridão enquanto eles faziam perguntas suficientes para me matar e então eu desmaiei como era de se esperar e quando acordei novamente meu pai dormia na poltrona ao lado da minha cama.

Tentei me lembrar da última vez que o tinha visto dormir e só então percebi que estava em Amsterdã aparentemente sozinha antes do meu "acidente", como eu vim parar aqui?

- Papai?

Ele abriu os olhos devagar e sorriu para mim.

- Olá querida. Como se sente?

- Eu estou bem.... Eu estava pensando e eu não consigo me lembrar como vim parar em Amsterdã.

Meu pai se ajustou na cadeira e empurrou os óculos que caía sobre seu nariz na direção de seus olhos, depois suspirou profundamente e tentou sorrir novamente, mas não foi a mesma coisa.

- Você se mudou para cá fazem dois anos, você ... ~Ele pensou por alguns segundos~ Você queria ser dona da sua própria vida, se cuidar sozinha.

Pensei um pouco e então sorri para mim mesma.

- Interessante. Parece que não deu muito certo não é.

Nós rimos.

- Você deu o seu melhor.

Nessa hora mamãe entrou no quarto seguida por Margot.

- Sim, você deu e agora esperamos que você escolha passar um tempo com Josh até se recuperar.

- Mamãe não pressione ela. ~Disse Margot olhando friamente para nossa mãe.~

Minha Mãe e Margot sempre tiveram desavenças, minha mãe tinha essa mania de forçar as pessoas a fazerem exatamente o que ela queria e Margot tinha todo o seu senso de liberdade e escolha, por isso escolheu casar com Lorenzo que era exatamente o contrário de Liam filho de um dos sócios do Papai com quem Mamãe passou metade da vida tentando casar Margot.

- Não estou pressionando, estou dando a ela uma opção agradável. ~ Rebateu Mamãe.~

Antes que as duas iniciassem um combate eu concordei com Mamãe. Eu nem sabia aonde estava e entre meus pais, Margot e Josh eu com certeza escolheria o Josh, ele morava sozinho em New York e cuidava da filial de restaurantes de lá, nunca imaginei que Josh cuidaria dos negócios da família sempre o imaginei tocando violão na praia totalmente despreocupado, mas parece que eu estava errada.

E depois de uma semana no hospital sobre a supervisão de Margot eu me atualizei sobre algumas coisas. As pessoas mudam com o tempo mas os velhos hábitos ainda ficam lá e Margot ainda era egoísta e sarcástica, Josh tinha sofrido uma grande decepção amorosa e o que não deixou ele se afundar foi ter a chance de cuidar do restaurante da família, Mamãe e Papai iniciaram um divorcio ano passado mas desistiram na metade do processo e eu havia ficado longe da família e velhos amigos por dois anos aparentemente porque tive um tipo de surto de liberdade.

E dentro do Táxi a caminho do aéroporto eu me perguntava o que teria causado esse surto de liberdade, o que me faria deixar meu irmão favorito por dois anos? Me virei para Margot e a observei enquanto ela encostava sua cabeça na janela como fez sua vida inteira, estiquei minha mão e toquei seu braço, ela me olhou.

- Obrigada.

- Não precisa agradecer. ~Então ela sorriu e se virou novamente para a janela~

Não tivemos uma grande despedida, Margot disse que nos veríamos em breve e eu soube que não era verdade, mas não me importei em fingir que acreditava nela, disse para mim mesma que não olharia para ela uma última vez antes de embarcar e mesmo assim olhei, porque eu não sabia quando a veria de novo e eu queria guardar a imagem da minha irmã.

Quando eu finalmente desembarquei em New York senti um leve medo, talvez um pouco de vergonha por ser a pessoa que bateu a cabeça e não se lembra de nada. Caminhei lentamente empurrando o carinho com minhas malas em direção aos carros estacionados lá fora e então avistei Josh, encostado em seu carro de braços cruzados checando a hora pela última vez antes de colocar os olhos em mim. Ele sorriu, e não havia pena em seu olhar, seus braços se abriram e ele caminhou em minha direção e me abraçou com força soltando um longo suspiro.

- Eu senti tanto sua falta Em!

Sorri sem me importar em saber que ele não veria.

- Eu não me lembro de ter te deixado, mas sinto que te devo desculpas.

Ele me soltou, sorriu e balançou a cabeça.

- É, você deve mesmo.

A porta do passageiro do carro se abriu e por exatos cinco segundos eu imaginei que uma mulher sairia de lá, mas um homem que parecia ter a idade exata de Josh colocou a cabeça para fora e pareceu estar paralisado por um tempo, Josh pigarreou e então ele saiu do carro e sorriu para mim, um sorriso desconfortável, meu irmão respirou fundo.

- Em, você se lembra do Tom?

....

Hello.

Espero que vocês estejam curtindo e que continuem acompanhando a Fic, Novos Capítulos toda Terça e Quinta. Não se esqueçam de curtir e aguardem pelo próximo Cap, bjuss

- MIIH

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