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- Sua preocupação é válida, Mira. Abandonar o pai no leito de morte não me parece uma atitude muito heróica.- Yuri franziu as sobrancelhas e meu coração parou...não, a sensação era equivalente a parada de todos os meus órgãos de uma vez- Vou ser razoável com você, quero que me peça desculpas e volte comigo.

Era o pior cenário possível. De um lado, a turma inteira perderia o respeito por mim e do outro, Aizawa me odiaria por reatar com Yuri. Eu precisava responder e tomar uma decisão, mas minha garganta simplesmente secou. A memória daquela noite chuvosa invadia cada canto da minha mente, como se eu pudesse escutar bater das asas se aproximando e sentir o cheiro de antisséptico impregnado em meu nariz. 

Se isso vazar, pode afetar a minha carreira.

Imaginar a reação de Midoriya foi suficiente para fazer com que arrepios percorressem minha coluna, eu disse a eles que meu pai estava bem. Não tenho garantia nenhuma de que vão acreditar em mim...Yuri os convenceria em questão de minutos. Os únicos que poderiam desconfiar eram Bakugou e Todoroki. Sopesei os danos em meio a tempestade e me obriguei a recuperar a compostura, engolindo em seco antes de fazer minha escolha.




Enviei uma mensagem avisando o Mirio que tive um imprevisto e pedi desculpas ao ter que adiar nosso encontro. Tentei amenizar o estrago que ser sequestrada causou na minha aparência e respirei fundo na intenção de acalmar os nervos, voltar para o alojamento nesse estado levantaria perguntas desnecessárias.

Pelo horário, eles já devem ter jantado, mas não custa nada prevenir.

Ignorei as notificações que vibraram no bolso da minha calça e, distraída, quase passei na frente de Katsuki. Merda, esqueci que ele foi pro treino. Bakugou checou os arredores em busca da fonte do barulho e eu remanesci escondida atrás da árvore.  

Ele soltou um xingamento pelo engano e seguiu para o dormitório. Aguardei mais 5 minutos até virar a maçaneta devagar, a casa parecia quieta. No entanto, senti o vermelho-sangue de seus olhos perfurar minhas costas assim que adentrei o lugar.

- Quem fez isso com você?- Bakugou demandou, apontando para a camisa retalhada e o inchaço na minha têmpora.

- Eu caí.- menti, nervosa ao baixar o olhar.

- Não vem com essa para cima de mim.- Katsuki estalou a língua, agora exaltado- Nem o Deku é capaz de uma idiotice dessas. Você foi atacada?

Entreabri a boca para replicar quando o barulho da porta principal sendo aberta desviou nosso foco e a figura alta pigarreou para anunciar sua presença. 

- Boa noite.- Aizawa cumprimentou, desconfiado- Estou interrompendo alguma coisa?

- Não!- negamos em uníssono, recuando alguns passos para aumentar a distância entre nós.

Aizawa escaneou a sala, provavelmente verificando se haviam outros estudantes por perto. Ele balançou a cabeça ao concluir e solicitou que Katsuki nos deixasse a sós. Bakugou trincou a mandíbula em protesto, mas logo obedeceu Aizawa.

Sua aparição causava o efeito oposto da adrenalina que explodiu pelas minhas veias ao ser flagrada por Bakugou há minutos atrás. Ter Aizawa aqui tornava tudo mais real, como se o peso da conversa que tive com Yuri finalmente me atingisse. 

- Você me deve uma boa explicação, Miranda.- ele me examinou com um semblante tenso. 

- Eu sei que ontem não te dei opção além de falar...mas preciso mesmo de um tempo.- disse, incapaz de mascarar o esgotamento na minha voz.

- Agora você está me deixando mais preocupado.- franziu as sobrancelhas, tateando meu machucado com cuidado- Vai ter que passar gelo nisso.

Sorri com o pequeno gesto, mesmo que o momento estivesse longe de ser adequado, e implorei para que não me tirassem a felicidade de tê-lo na minha vida.




Bakugou

Subi as escadas em passos coléricos e bati a porta do quarto, essa garota me tira do sério. Arremessei a regata no cesto e esquentei a água do chuveiro, querendo me livrar da expressão assustada que ela me direcionou.  

Nunca daria certo...ser a dupla dela. Passei a mão pelo meu cabelo e enxaguei o shampoo da raiz com mais força do que deveria. Vesti uma camiseta preta com calça moletom e espiei o relógio na cômoda, passava de 20h30.

- Já esperei muito, vou descer para comer.- resmunguei para mim- Eles que resolvam essa merda lá fora.

Parece que vou continuar sem respostas. 

Quer dizer, é melhor assim.

A cozinha estava escura, os pratos lavados e não havia vestígio dos dois enquanto meu estômago revirava. Balancei a cabeça para expulsar a decepção que me atravessou e esquentei as sobras do almoço. Sentei à mesa vazia e pelo final da refeição, tive certeza que o silêncio jamais me incomodou tanto quanto hoje.




Sexta-feira de manhã e essa casa estava um verdadeiro inferno. Um infeliz do terceiro ano ocupava minha cadeira, risadas ecoavam pelas paredes e Miranda encarava a mesa com uma feição mais pálida do que o fantasma da minha avó. 

- Bom dia!- Deku cumprimentou radiante e eu estalei a língua.

- Bom dia, Midoriya.- Todoroki respondeu com um aceno de cabeça.

- Tá cedo demais pra essa porra.- reivindiquei a atenção da roda formada e apontei para o insolente no centro da bagunça- Você tem exatamente 10 segundos para sair do meu lugar.

Comecei a contagem regressiva e o filho da puta sorriu diante da ameaça. 

- Bakugou, Todoroki.- Yuri Kayama se pôs de pé e eu odiei ter meu nome pronunciado por ele- Vocês têm um segundo? Queria conversar, por favor.

- Pra você não.- respondi simples. 

- Não seja grosseiro, Bakugou.- Momou se intrometeu e eu ergui minhas sobrancelhas em descrença- Vamos passar bastante tempo juntos agora.

- O que? Eles notaram sua incompetência e te devolveram pro primeiro ano?!- desdenhei com escárnio ao retomar minha cadeira. 

- Como você é engraçado!- Yuri gargalhou e Kirishima escancarou a boca pela audácia- Ele deve te divertir no treino, Mira. 

Yuri agarrou a cintura dela para enfatizar que estavam juntos e pude jurar que faíscas escaparam da minha palma conforme a cena se desenrolava. Já chega. Peguei uma maçã do cesto e abandonei o show de horrores na minha frente, sendo seguido por Todoroki milésimos depois.  

- Quem te chamou, meio-a-meio?!- fiz careta, incomodado. 

- Também não gosto dele.- deu ombros, sentando na poltrona à esquerda. 

Afundei no conforto do sofá, mordiscando a fruta audivelmente, e decidi ignorar sua presença. Qualquer coisa era mais tolerável do que estar na mesa com aqueles dois.



Tomei a liberdade de sair mais cedo e aproveitar o tempo restante para revisar os conteúdos da semana passada. A sala de aula vai estar vazia e os fones de ouvido vão me ajudar a esquecer os últimos minutos. 

Carreguei a mochila e fechei a porta com força enquanto Todoroki ainda comia seu omelete. Estava na metade do trajeto quando interromperam o refrão da minha música favorita.

Só pode ser brincadeira.

- Bakugou, espera aí!- Yuri disse ao meu encalço e me recusei a desacelerar- Queria me desculpar pela grosseria naquele dia. Fui insensível por mencionar o festival desportivo, eu tava de cabeça-quente e ataquei você sem motivo. 

- Você teve sorte que não te arrebentei, imbecil.- chequei por cima do ombro e ele esboçou arrependimento- Para de testar minha paciência.

- Sei que tivemos nossas desavenças, mas como a Momou disse, seria melhor criar uma amizade. Você é colega de classe da minha namorada, Bakugou.

Que praga insistente.

 - Não estou interessado nas suas desculpas.- cortei ríspido e pus as mãos no bolso.

- Já que vai ser assim...vou te dar um último aviso.- deu um tapinha nas minhas costas e me virei pronto para explodir até a terceira geração dele- Fica longe dela.

- Se chegar perto de mim de novo, eu te mato.- prometi, Yuri exibiu um sorriso dissimulado e meu sangue ferveu- Some, caralho! 




- Ei, o Kayama veio conversar com você?- Todoroki me cutucou na fila do refeitório. 

- Já falei pra parar de me seguir, meio-a-meio!- gritei a ordem e ele permaneceu ali- Sim, o projeto de galã apareceu pra me encher o saco.- repliquei, esperando que se calasse de vez. 

- Eu acredito nele.- Todoroki refletiu, pegando uma bandeja- As desculpas pareciam sinceras.

Que dia de merda, era torturante pensar que ainda faltava metade para acabar. Avancei outro passo e notei que Shoto me encarava com uma expressão ansiosa. Puta que pariu...era como se todo mundo tivesse acordado com o objetivo de me tirar do sério.

- Se acreditou, você é burro!- exclamei, franzindo o nariz- Só perde para a Miranda que escolheu namorar esse otário. 

- Bakugou, isso não foi legal.- ele me repreendeu e revirei os olhos.

- Então sai de perto, vão achar que somos amigos.- servi outra concha de curry.

- Nós somos.- Todoroki refutou, insuportavelmente calmo. 




Miranda

Aizawa rondava seu escritório de maneira inquieta, exatamente como fiz para confrontá-lo sobre o Bakugou, e meu coração palpitava em seu aguardo. Sabia que tinha algo a ver com a visita de Yuri, ele era bem inteirado. Faziam 3 minutos desde que me tirou da aula de All Might com uma desculpa esfarrapada e o tom cuidadosamente descontraído entregou a mentira oculta. 

Uma hora ele ia descobrir...só queria que tivesse sido por mim.

Que droga, Yuri podia ter esperado para aparecer na casa.

Ter que assumir um relacionamento com ele era a última coisa que eu queria resolver pela manhã, sua aparição literalmente acabou com o meu apetite. Kayama criou uma tempestade somente para mostrar que podia, o babaca quis mostrar que retomou o controle sobre mim. 

- Foi ele quem te machucou?- Aizawa indagou, confirmando minhas suspeitas.

- Sim...mas vou dar um jeito de resolver essa bagunça.- engoli em seco.

- Miranda.- pronunciou meu nome como um aviso.

- Você precisa confiar em mim.- supliquei, alisando o tecido da minha saia para reduzir um pouco do estresse- Não vou deixar que afete meu desempenho na U.A.

- Essa não é a questão...reatar com o Kayama foi, no mínimo, insano de sua parte.-  Aizawa enrijeceu a postura.

Se ele começou a falar formalmente, estou mais do que encrencada.

Deus, ele não vai me perdoar tão cedo.

- Aizawa, ele ia contar sobre a morte do meu pai.- repliquei num sussurro, temendo que alguém nos escutasse- Toda a turma ia perder o respeito por mim e minha carreira ia sofrer se os boatos se espalhassem. 

O resto do argumento morreu em minha língua conforme o semblante impassível se desmanchava e seus olhos brilharam com compaixão.

- Devia dar mais créditos a seus amigos.- ele suspirou, levemente desapontado- Fugir não vai apagar o que aconteceu naquela noite.

- Eu sei...só não tenho coragem para encarar isso agora.- admiti com pesar.

- Bom, não espere que eu faça vista grossa.- Aizawa praticamente declarou que interviria e encerrou a conversa- Volte para a aula.

Preciso sair dessa antes que ele interfira.




Midnight exibia o maior de seus sorrisos ao vistoriar o exercício, contrastando com o desânimo que tomava conta dos meus movimentos. Bakugou, por outro lado, estava mais afiado do que nunca. Era como se quisesse me mostrar o que motivação de verdade fazia ou descontasse seus problemas em cada golpe desferido.

Conhecendo a peça, eu aposto mais na primeira opção. 

- Estou feliz que deu uma nova chance ao Yuri.- Midnight declarou baixinho e eu a agradeci com um sorriso forçado- Você traz a melhor versão dele à tona, Mira.

Se ela soubesse das condições impostas...diria que eu trouxe a pior.

Procurei visualizar os copos na metade e tentei inutilizar a visão dela corretamente pela décima vez. Outra falha. Geralmente me imagino atravessando a corda com copos cheios, mas Midnight queria que eu regulasse a quantidade que tomo dos sentidos alheios. 

Aizawa já havia proposto algo semelhante no ano passado, porém, ele priorizou a abordagem direta. Roubar 100% dos meus oponentes era mais eficiente dentro das lutas, além de promover maior controle da minha individualidade. Estabelecer limites agora era realmente complicado.

- Meu corpo não me obedece!- grunhi impaciente, arrancando uma risada nasalada de Midnight.

- Essas coisas levam tempo, Mira.- tranquilizou, dando um tapinha na minha cabeça- Vamos fazer um intervalo.

Saber que ela estava pegando leve comigo me deixou ainda mais indisposta. Desabei no gramado e fechei os olhos, imaginando as diversas formas possíveis de esganar Yuri Kayama. As explosões de Bakugou me despertaram da doce ilusão cedo demais, entretanto. 

- Qual é a próxima, Midnight?- Katsuki inquiriu e limpou o suor acumulado na testa, me lançando um olhar determinado no processo.

Sustentei o contato visual na mesma intensidade e invoquei o que restou da minha concentração para dominar a nova técnica. A leve provocação foi mais do que suficiente para resgatar minha motivação, eu precisava alcançá-lo.

- Já terminou?- Midnight correu até ele, animada- Quero que melhore a precisão do AP Shot.




Bakugou foi o único que não acreditou nele, até o Kirishima caiu na lábia do Yuri. Não que eu esteja em posição para julgar alguém quando passei anos apaixonada pelo desgraçado. Conclui, frustrada. Katsuki acelerou o ritmo e me deixou para trás, uma representação exata de como me ultrapassou no treino de hoje. 

Significava que os muros entre nós foram erguidos novamente e a ideia de ter que voltar à estaca zero em nossa amizade fez com que meus batimentos saltassem. 

Já perdi muito por causa do Yuri, ele não vai me tirar isso também.

Deixar que Katsuki descobrisse daquela forma foi ruim...nós estabelecemos uma espécie de parceria e eu estava pedindo conselhos dele nessa mesma semana. 

Talvez ele seja orgulhoso demais para me dizer que ficou desapontado. Ah, isso explicaria a maneira que agiu no café da manhã. Na hora, pensei que ele simplesmente detestasse Yuri. Tomara que não tenha ligado os pontos e associado meus ferimentos a ele, receber um olhar de pena de Katsuki Bakugou seria humilhante. 

Criar todos esses cenários não vai adiantar em nada. 

Preciso tomar uma atitude...algo que possa remediar a quebra de confiança.

- Katsuki, se alguém importante para você sumisse por anos. Você gostaria de saber que ela morreu?- quebrei o silêncio, ciente de que ele reagiria somente à urgência.

E eu realmente quero a honestidade brutal dele.

- Que merda de pergunta é essa, garota?- Bakugou estranhou, parando ao meu lado.

- Só responde.- insisti, cerrando o punho em nervosismo.

- Sim, eu ia querer saber.- Katsuki me fitou sério e eu estremeci por inteiro.


Nota da Autora:

não esqueça de votar e comentar, por favor <3


- Parece que tem muito mistério por trás da morte do pai da Miranda.

- Bakugou oficialmente detesta o Yuri e Aizawa está preparando alguma coisa.

- Espero não ver nenhum ataque a Miranda, hein...o vilão da história é o Yuri.

- Muito obrigada pelos 11k de leituras!


Tiktok: japadreams | Insta: japa_dreams

link da playlist da fic na bio

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