Capítulo 41 - Missão Praga
EM AGOSTO DE 1975, a Guerra Fria continuava sendo um dos principais focos jornalísticos mundiais, porém, os denominados "Acordos de Helsinque" estavam prestes a serem assinados na Finlândia com o intuito de promover a segurança e a cooperação na Europa. Os confrontos militares diretos entre os países ocidentais e orientais eram cada vez mais iminentes naquela época e, por essa razão, houve uma mobilização durante a Conferência sobre Segurança e Cooperação na Europa para impedir que uma guerra nuclear obliterasse a ambos os lados.
A ideia dos acordos era reafirmar o princípio de não intervenção nos assuntos internos de outros países, buscando garantir a soberania e integridade territorial de todas as nações europeias. Um dos seus pontos-chave era o compromisso de respeitar as fronteiras existentes na Europa, além de fomentar acordos econômicos entre as nações e enfatizar o respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais.
A implementação dos acordos ocorreu ao longo do tempo, e muitas das disposições eram de natureza mais declarativa do que legalmente vinculativas. No entanto, eles representaram um esforço significativo para melhorar as relações Leste-Oeste. Os Acordos de Helsinque não resolveriam todos os problemas entre os blocos Ocidental e Oriental, mas foram um passo importante para promover o diálogo e a cooperação durante um período tenso da Guerra Fria.
Enquanto o mundo continuava tentando evitar que o relógio do juízo final chegasse à meia-noite, os meus conflitos com as forças de Thænael ocorriam com ainda maior intensidade naquele ano, sendo impossível de se evitar que novas baixas ocorressem para ambos os lados.
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Algum tempo depois dos Acordos de Helsinque, eu comecei a pôr em prática a etapa final daquele que era o meu plano derradeiro para destruir Thænael, e pude contar com a ajuda de Akanni para executá-lo. Depois de meses de investigação ferrenha em busca de um dos antigos laboratórios médicos do Concílio de Sangue, Stella Brandt e sua agência de investigação paranormal conseguiram encontrar dois endereços usados por Adela Quinn na Europa, e onde a vampira irlandesa mandava sintetizar o inibidor neural sintético que bloqueava os poderes de vampiros e lobisomens.
Um dos galpões usados por Quinn ficava localizado perto de Westport, na Irlanda, e foi o primeiro visitado por mim e pelo anjo caído. Quando assumiu o corpo de Arnaud Quinn, Akanni havia retido algumas das memórias do rapaz vampiro e, por isso, sabia como vencer as defesas do lugar, bem como onde deviam ficar as reservas remanescentes da solução líquida que buscávamos.
Para nosso infortúnio, o laboratório em Westport estava abandonado há muitos anos e nada de útil foi encontrado no local além de poeira e teias de aranha. O que nos conduziu imediatamente para o segundo endereço: Praga.
O laboratório na Tchecoslováquia havia sido montado no décimo piso de um prédio que possuía vinte e cinco andares e cuja segurança reforçada logo aguçou a nossa curiosidade. À espreita num beco que dava para a saída de trás do estacionamento comum, Akanni e eu conseguimos contar pelo menos quarenta e cinco agentes de segurança, além de grades reforçadas nos portões da garagem, portas de aço nas entradas e cadeados em todas as demais saídas.
Segundo as informações conseguidas por Stella, o imóvel pertencia a uma empresa denominada Société Unie, que, mais tarde, viemos a descobrir que era uma subsidiária Quinn, criada e gerenciada pela própria Adela do começo do século XX até 1971. Embora não soubéssemos quem havia tomado conta dos negócios familiares depois da morte da megera ruiva e de seus herdeiros legais, nós resolvemos invadir o prédio assim mesmo.
Os seguranças que tomavam conta do andar térreo não eram sobre-humanos nem possuíam qualquer técnica de combate mais apurada, o que me garantiu um avanço rápido e furtivo até que eu alcançasse os elevadores. Para evitar surpresas defensivas, Akanni tinha preferido um acesso alternativo via subsolo, pelas saídas de esgoto do imóvel, e nós combinamos de nos encontrar nos andares superiores.
A partir do terceiro andar, a cabina do elevador era bloqueada para uso de terceiros, o que me obrigou a descer ali e enfrentar um pelotão de pelo menos dezenove soldados fortemente armados que usavam coletes à prova de balas. Um alarme silencioso de invasão tinha sido acionado no andar de baixo onde eu pensava ter passado incólume, o que permitiu que já tivessem à minha espera quando as portas do elevador se abriram.
Eu devo ter sido avistada por câmeras de vigilância, pensei eu, conforme levantava a minha guarda à espera de um conflito físico com os empregados Quinn.
— Prontos para dançar, meninos? Prometo pegar leve com vocês.
Os homens naquele andar eram mais bem treinados que seus colegas do térreo e me proporcionaram um exercício proveitoso à medida que avançavam em duplas tentando me surpreender. Munidos com submetralhadoras automáticas de calibre grosso, eles tentaram me atingir com suas coronhas e cabos antes de partirem para o uso do chumbo propriamente dito.
Naquela época, eu havia aperfeiçoado os meus movimentos de Qigong com Caihong Chen, logo, desenvolvera a minha agilidade vampírica em pró da arte milenar asiática que me ajudava na concentração e foco do chi. Era bem verdade que humanos normais não exigiam o gasto desnecessário de meus dons místicos, por esse motivo, me dediquei a nocauteá-los apenas com meus punhos e os meus pés.
Acabei com o conflito em tempo recorde. Dois minutos e cinquenta e sete segundos.
Eu tornei a encontrar Akanni no andar do laboratório, depois que surrupiei a chave de acesso aos andares superiores no bolso da calça de um dos soldados. Ele preferiu fazer mistério quando questionado como havia chegado ali tão rápido e se pautou a apenas responder, com um sorriso lacônico no rosto:
— Posso não ser mais tão poderoso, mas ainda tenho a graça de um anjo.
Forcei a maçaneta da porta de vidro que fechava o laboratório com uma torcida de punho e não perdi a oportunidade de irritá-lo:
— Se podia chegar aqui batendo as suas asas, por que me deixou sair no soco com trinta homens nos andares de baixo antes disso?
— Você está precisando se exercitar um pouco. O seu traseiro está ficando enorme!
Dei-lhe um soco forte no bíceps e aproveitei para empurrá-lo para dentro. Na mesma hora, um alarme barulhento começou a soar, enquanto um giroscópio vermelho brilhava sobre as nossas cabeças alertando que tínhamos sido detectados.
— Vamos, anda! Não temos muito tempo até que uma terceira leva de guardas chegue até aqui.
Seguindo o meu conselho, Akanni começou a vasculhar armários e gavetas dentro do laboratório equipado. Além de balcões com pipetas, cilindros e outros instrumentos científicos, aquele andar possuía uma ampla gama de prateleiras contendo os mais diversos tipos de invólucros e recipientes de vidro.
Sabíamos que Adela Quinn havia mandado fabricar uma quantidade grande de supressor neural para o caso de precisar conter Alexandra e eu durante um conflito direto. Além da própria vampira ruiva, Yuliya Mikhailova, a amante russa de Thænael, também já havia conseguido uma amostra da solução bloqueadora de poderes, o que nos levava a crer que um estoque dela estava guardada em algum lugar das empresas Quinn.
— Esse laboratório é o último da lista que Stella conseguiu. Se o inibidor não estiver aqui, não sei mais onde procurar.
Naquele momento, Akanni arrombou um armário cuja porta jazia trancada à chave e a sua expressão se iluminou quando ele deu de cara com uma caixa refrigerada contendo quatro frascos de uma solução amarelada dentro. Enquanto ouvia o elevador se deslocando até o décimo andar e os sinais vitais de dez homens robustos em sua cabina, eu me aproximei do anjo e usei o meu olfato para reconhecer o conteúdo lacrado.
— Sim, é o mesmo cheiro daquilo que Yuliya usou em Alex, em Hîncesti. É o inibidor neural criado pelo Concílio de Sangue.
Tão logo eu disse aquilo, rajadas intensas esfacelaram o vidro resistente da porta, obrigando-nos a esquivar das balas que zuniam para todos os lados.
— E agora, Akanni? Eles estão bloqueando a saída. Como saímos daqui?
O anjo de pele escura fez um aceno para que eu confiasse nele, logo depois, deu uma cambalhota ágil no chão a fim de alcançar um arquivo metálico de quatro gavetas que ele arremessou em direção aos guardas do lado de fora.
O estrondo do choque do móvel sobre os homens ecoou no corredor em frente, no mesmo instante em que eu tive tempo para saltar sobre dois deles, os impedindo de continuar a apertar o gatilho.
— Não leu o recado de "não perturbe" do lado de fora, companheiro? Pare de atirar!
Enquanto eu arrancava a UZI das mãos do guarda, eu lhe apliquei um golpe ascendente de punho cerrado que lhe atingiu o queixo e o derrubou desacordado no chão. Um de seus parceiros continuava disparando a sua arma em direção a Akanni no interior do laboratório. Eu fui obrigada a detê-lo me colocando perigosamente em sua mira.
Cacete! Eu tinha me esquecido como chumbo quente dói!
Os tiros me acertaram à queima-roupa, mas eu consegui incapacitar o autor deles, dando-lhe uma joelhada caprichada no plexo solar e estapeando com força a sua orelha direita para ensurdecê-lo ao mesmo tempo.
Akanni avançou sobre outros três agentes de segurança, os jogando contra a parede frontal com um chute. Depois, os nocauteou com tapas bem colocados no maxilar. O que ele havia perdido em robustez com a destruição de seu antigo corpo, ele tinha adquirido em destreza e agilidade com o novo.
Eu ficava incrivelmente empolgada em vê-lo em ação.
A caminho das escadas de emergência, nós dois demos uma última verificada no estado dos frascos que havíamos obtido com muito custo da caixa refrigerada e o ouvi lamentar com um xingo no idioma enoquiano.
— Os tiros acertaram os frascos.
O líquido amarelo agora escorria pela blusa branca que ele usava sob o seu casaco, me deixando nervosa.
— Quer dizer que essa missão não serviu para nada?
Para a minha surpresa, ele retirou um frasco intacto do bolso cravejado de balas e abriu um sorriso.
— É bom a doutora Brandt ter um ás na manga, porque ela vai precisar usar os seus conhecimentos químicos para duplicar o pouco que conseguimos hoje.
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