Surpresas Natalinas



O homem nos fez ficar em silêncio absoluto, nada mais foi dito depois daquilo. Ele queria o Anthony e era nossa missão achá-lo. 

Quando voltamos para a sala, minha mãe tinha colocado um ensopado na mesa, feijão, farofa e toda nossa comida favorita. Guilherme não soltou minha mão a tarde toda, e não paramos um segundo de olhar aquele homem. Dando selinho em minha tia, rindo com minha mãe e segurando nosso cachorro. Toda aquela cena o levou até nós, ele estava satisfeito, enfim, de me conhecer, e agora que conheceu, teremos que ser rápidos.

Segundo o homem, temos até o Natal para entregar Anthony.


Não ficamos a tarde toda com eles, depois do choque que tivemos, Guilherme e eu inventamos uma desculpa para sair mais cedo. Atravessávamos o rio que cortava a cidade, observando tudo de dentro do trem. Não conversamos nem por um minuto, pois, primeiro: Guilherme agora tinha medo de trem, e segundo: ele se culpava que outra coisa do passado dele tinha aparecido. Nunca passei por isso, mas eu imagino o quão frustante seja, você mudar de vida e as coisas antigas te atrapalhar em tudo.

Quando saltamos na estação, Guilherme estava andando mais rápido na minha frente, atravessamos outras ruas sem se falar e chegamos ao meu prédio. Pedi pro porteiro abrir e vi o rosto de Guilherme, estava vermelho e tinha lágrimas nos olhos, ele estava se concentrando pra não chorar. Foi Mário liberar a porta que vi Guilherme quase correr para o elevador, ele segurou as portas de metais para que eu pudesse entrar, e quando fechou, ele respirou em silêncio, segurando as mãos com força.

Deu o tempo de destrancar a porta do apartamento que Guilherme passou por mim como uma bala de fuzil, atravessou todo meu apartamento direto para meu quarto e bateu a porta. Não queria que eu entrasse, não queria falar ou ver ninguém. 

Nesses oito meses que o conheço, não tivemos um descanso. Sei que Guilherme é romântico e tudo mais, porém seu passado o fazia ser receoso e frio. Nossos romances não durava mais que dois dias em paz.

Por isso eu digo que, cuidado ao fazer suas escolhas hoje, elas SEMPRE irão lhe perseguir, seja qual caminho for.

***

A noite tinha chego e chamei o pessoal pra vir aqui,iriamos decorar minha casa toda com os enfeites do Natal que seria no próximo domingo. E assim foi feito, Maggie, Pedro e Suzane estavam tirando tudo de dentro das bolsas de plástico. Chris ainda estava para chegar.

-Alexia, eu tenho que te dizer uma coisa - disse Maggie me chamando para um canto, Pedro e Suzane ficaram em silêncio, mas logo perceberam que era particular e voltaram a conversar. - O Christian  está trazendo uma pessoa e...

A campainha tocou no momento em que ela falava.

-Espera, vou atender, deve ser ele com essa tal pessoa...

-Não, mas antes você tem que saber quem é - diz Maggie, mas já era tarde, eu estava girando a maçaneta.

Christian estava a frente do seu convidado, quando ele deu espaço revelou Roberto, da pediatria do hospital.

-Roberto, que surpresa! Não sabia que vocês se conheciam...

-É... - interrompe Christian. - Eu pensei em te contar antes, mas aconteceu tanta coisa, não é?

Roberto sorri sem graça e Chris segura a mão dele.

Imagina minha cara ao descobrir que meu melhor amigo, ao qual eu sempre achei que gostasse de garotas, deu a mão para o Roberto, o qual eu nem sabia que gostava de alguém.

-Então... Estamos namorando - continua Christian.

-Uau! - exclamo. - Tipo, não to surpresa por estar namorando, ou ser gay, estou por ter contado para Maggie primeiro.

-Cala a boca - resmunga Maggie aparecendo atrás de mim.

-Então... Entrem - digo.

Roberto segurava um engradado de cerveja nas mãos, já gostei dele.


Enquanto Pedro, Suzane e o novato Roberto decoravam as paredes tentando se enturmar, eu, Maggie e Chris montávamos a árvore do outro lado da sala apenas para fazer fofocas. Começamos pelo namoro de Christian, que tinha sido um baque.

-Conheci ele quando visitei a ala infantil, gente. Sempre o achei mandão e grosso, mas quando o vi trabalhando com as crianças eu me apaixonei - ele diz com brilho nos olhos enquanto pendura um papai noel no galho.

-Você se descobriu quando? - pergunto, curiosa.

-Desde sempre eu sei, mas não sabia como contar. Depois que vi como a vida é curta naquele acidente, eu tive que falar - ele diz, perdendo o brilho nos olhos.

Ainda não falamos nada sobre o acidente.

-Entendo... - murmura Maggie.

-E onde está o seu namorado? - pergunto para ela.

-Ele viajou, vai passar Natal com a família - ela diz. - Super entendo né, eu passaria se tivesse uma - nós três rimos, até porque nós três não temos famílias unidas. - E onde está o seu maquinista?

Engulo em seco.

-No quarto, ainda, se culpando por tudo.

-Como sabe que ele está vivo? - pergunta Maggie.

Ergo a tela do celular na frente dela. As milhares de mensagens de Guilherme na aba de notificação.

-Ele está mandando que está vivo a cada dez minutos que se passam - explico.

-Mas em dez minutos ele pode pensar em suicídio, oque vai fazer? - indaga Christian.

-Confiar que não fará isso.

Depois da minha resposta, ficamos em silêncio. Nossa decoração da árvore ficou horrível, mas o resto da casa estava lindo.

-Meu Deus, antes parecia que o Grinch tinha deixado os roubos de natal aqui, agora parece que o Jack fez o Natal "barra" Halloween nessa árvore - brinca Christian vendo o fim da nossa obra de arte.

-Na verdade parece que um duende vomitou em cima dela.

-Ou então que o papai noel ta morto aí.

-Ou então que teve uma bomba no polo norte...

-Chega, vocês dois - digo, por fim, colocando a estrela no topo.

-Uau, faltava a cereja do bolo - continua Christian. - É uma cereja bem feia, pra um bolo feio e...

-Cala a boca idiota! - o empurro.

Nos viramos rindo e percebemos que só nós estávamos rindo, Guilherme tinha entrado na sala e vestia a mesma roupa de hoje cedo, sua blusa social e calça jeans, nem os sapatos tinha tirado. Seu rosto estava vermelho e inchado, mas abaixo do seu nariz ele dava um sorriso sem graça.

-Acho que estou melhor agora - ele diz e ergue a mão para mim.

Vou ao seu encontro e ele me puxa em um canto. Todos voltam a conversar depois.

-Eu preciso lhe explicar oque Anthony fez...


Sentei com Guilherme no meu quarto e trancamos a porta, ligamos até o ar-condicionado, pois sabíamos que iria durar.

-Oque aconteceu, foi a dez anos atrás, quando eu estava prestes a fugir de casa. Anthony tinha a máfia dele, e terminava com outras. Mas um aliado seu estava trazendo dúvidas entre todos eles, Anthony sabia que Bruno, o homem que está com sua tia, tinha fraquezas consideráveis - diz Guilherme fazendo aspas com as mãos na palavra consideráveis. - Na máfia, na maior parte das máfias, sua última fraqueza deve ser relacionamento. Por isso, todos dali vinham de famílias que os expulsaram.

Ele estava falando tudo tão rápido como se tivesse vindo flashes, segurava minha mão para não tremer.

-Então, Bruno, tinha família. Descobriram depois que ele já tinha participado de missões. Foi aí que eu cheguei, apenas adolescente e já namorando Anthony. Bruno tinha um problema, o amor. Foi quando um homem pediu que Bruno revelasse nossas missões ou matava a família dele. Bruno revelou, fazendo Anthony perder uma missão e cinco amigos - Guilherme diz isso com um olhar fixo no chão, ainda parecia assustado. - Então, eu descobri quem contou, e falei para Anthony. Depois disso foi mandado três homens que exterminaram a família de Bruno, em pleno Natal - finaliza Guilherme.

-Então, ele desde então vem tentando se vingar de vocês dois? - pergunto já sabendo da resposta.

-Sim. Desde aquele dia ele procurou nós dois separados, deve ter visto que estávamos próximos quando viu o noticiário e arrumou um jeito de se infiltrar. Com certeza, Bruno viu sua família no hospital e se aproximou de sua tia lá.

-Isso quer dizer...

-Que se não encontrarmos Anthony, e entregá-lo...

-Ele vai matar minha família.

Guilherme tira seus olhos do chão e me encara.

-Céus - respiro pesado. - Isso não pode estar acontecendo.

-Nós temos até o Natal...

-TRÊS DIAS GUILHERME! - exclamo. - TEMOS TRÊS DIAS PARA ACHAR UMA PESSOA EM QUE NÃO TEMOS CONTATO NENHUM...

"ALEXIA!" grita Maggie da sala.

-Oque é?! - devolvo abrindo a porta do quarto.

-Visita... - ela diz saindo de frente da porta.

Era ele.

Anthony.

Segurava uma sacola com comida e na outra mão um refrigerante. Guilherme chega por trás de mim e segura minha mão.

-Desculpa aparecer sem avisar, só quero conversar com vocês e... Sei lá, ajudar em qualquer coisa. Não tenho com quem ficar no Natal e imaginei que tenhamos feito as pazes, agora que sou pastor...

-Pa-pastor? - gagueja Guilherme saindo do quarto e indo recebe-lo.

-Sim, ajudo a instituição infantil, saí completamente daquela outra vida - ele explica com um sorriso no rosto.

Ali estava Anthony, revigorado, mudado, com comida e bebida para seus antigos inimigos, parecia imensuravelmente feliz. Realmente tínhamos feito as pazes, Guilherme o perdoou e eu fiz o mesmo, e ele nos perdoou também, não tinha um certo naquela história.

Lá estava ele, desejando passar o natal com a gente.

E aqui estamos nós, desejando sua morte amanhã mesmo.

-Então, oque acham? - ele pergunta.





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