Então essa é a Corte Runenma, o lugar onde deveríamos estar seguros, o lugar que deveria lutar por nós. Eles estão livres, sem correntes e mesmo assim não lutam. Meu coração dispara em pensar no que está acontecendo de novamente, bruxos matando bruxos em troca de poder.

Austin atravessa a porta com sua coroa ridícula debaixo do braço, junto a ele está um homem vestido um casaco vermelho com botões dourados, sua pele é negra e seu cabelo preso em pequenas tranças o deixa fácil de reconhecer, Lord Dommy, um dos bruxos supremos, me lembro dele visitando o casarão em que cresci, ele se senta no trono à direita de Austin. Os caçadores entram logo depois, montados em seus cavalos de olhos vermelhos se posicionando atrás dos tronos, alinhados lado a lado. Um deles, o caçador que enfrentamos na floresta para com os olhos fixos em Gregor deixando escapar um discreto rosnando.

- Não guarde rancor cavalheiro, afinal, ele só estava cumprindo a missão em que você falhou. - diz Austin.

Olho imediatamente na direção do Gregor, seus olhos me encaram e então ele se levanta caminhando em minha direção, logo percebo que ele não está na condição de prisioneiro assim com nós, ele está livre.

- Não é surpresa que você tenha nos traído - digo.

Grego se aproxima lentamente fixando seus olhos nos meus por alguns segundos antes de algo em tom de sussurro.

- Você pode não entender agora, mas logo você irá, eu te trouxe aqui porque a corte precisa de você. - diz Gregor.

Tenho uma sensação estranha, como se eu devesse confiar nele. O garoto se vira e vai até onde estão os tronos, parando com os braços cruzados ao lado do Austin. Não minto quando digo que a sua traição não me surpreende, mas ele era nossa única opção, errei, e agora estamos todos aqui, sem a menor chance de sobreviver.

O silêncio que a pouco tomava o lugar é interrompido pelo barulho de uma cadeira caindo sobre o chão.

- O dos olhos azuis, mas notícias, acho que aquela garota veio para arrancar sua cabeça. - diz Elak.

- Ah, não tenho dúvidas... Kloe, desastrada como sempre- diz Ikal.

Olho em direção ao local que os garotos estão olhando, em uma estrutura no andar superior da sala, uma garota está lá levantando as cadeiras de estofados vermelhos que a havia derrubado. Ela desce lentamente, saltando para o andar de baixo, seu corpo é marcado por símbolos, seus olhos são encantadores e parecem frágeis como cristal.

A garota olha para Ikal e sorri enquanto caminha até os tronos, Austin se ajeita em seu assento e observa curioso enquanto ela se aproxima até estar diante dele, nenhum soldado tentou impedi-la, mas todos os olhares estão voltados para a garota.

- Você eu ainda não conheço, mas sua coragem é... Intrigante. - diz Austin.

Ela aproxima seu rosto junto ao rosto dele e fareja algumas vezes.

- Também não te conheço, mas conheço esse cheiro, está com medo, não está? - diz a garota.

- Não... Você... Cala a boca - diz Austin.

- Como pensei, medrosinho, mas calma que não vou te morder, não agora, vim negociar, você me entrega o garoto, a gente vai embora, ninguém se machuca - diz a garota.

Austin abre um sorriso e se esparrama no trono.

- Me conte, como pretende fazer isso? - ele diz.

Os olhares agora se voltam para um pequeno garotinho da pele parda e de cabelos longos que acabou de saltar do andar superior até o meio da sala, deve ter aproximadamente dez anos, ainda caído sobre o chão ele olha para o Ikal acenando com uma das mãos.

- Com a minha ajuda claro, Kloe quando quiser que eu os morda, e só me dizer - diz o garoto.

- O que você está fazendo aqui Ryan - diz Kloe.

- Você veio resgatar o Ikal, com certeza iria precisar da ajuda do lobo mais rápido da aldeia - diz Ryan.

- E quem te disse que você é o mais rápido da aldeia? - ela diz.

- Ikal, você não contou para ela o que dizem de mim! - diz Ryan.

- Ryan, na verdade, eu só disse aquilo para que você me ajudasse, desculpa! - diz Ikal.

- Ah não, como você pode?! - diz Ryan.

Não contenho um sorriso ao ver o garotinho decepcionado se esparramado sobre o chão com os braços abertos. Abaixo a cabeça tentando disfarçar o sorriso, mas tudo muda. Ouço uma explosão seguida de uma luz de forte intensidade, somos todos lançados ao chão, meus olhos relutam ao se abrir.

As bruxas sumiram, apenas o símbolo está lá, em chamas, o fogo azul claro é quase transparente e emite um brilho diferente, o mesmo brilho que tinha a grama da casa na floresta. Magia, o fogo que queima é magia das bruxas, eles conseguiram.

Abro os olhos devagar, todos da sala estão no chão, alguns desacordados, sinto uma mão segurando meu ombro, e sou arrastada para trás de uma das pilastras da sala, mesmo acorrentada e sem meus poderes tento lutar.

- Ei ei, calma tá legal? Não vou te machucar - diz Kloe.

- O que está fazendo? - pergunto.

Charlott aparece agachada, logo atrás da Kloe, em sua testa está desenhado um pequeno triângulo com algo escrito em uma língua estranha.

Kloe passa o dedo em minha testa, desenhando o mesmo símbolo que desenhou em Charlott, ela não usa tinta, mas conforme seu dedo se movimenta em minha pele o símbolo ganha cor.

- Estou anulando o efeito da magia proibida em seu corpo - diz Kloe.

Assim que ela termina seu desenho sinto uma onda de energia tomando meu corpo.

- Obrigado - digo.

O chão começa a tremer o fogo que recobre o símbolo no chão começa a aumentar, uma enorme fenda se abre entre ele.

- Seja lá o que for aquilo, tem uma energia ruim, algo de muito ruim vai acontecer se não fecharmos, posso sentir - diz Kloe.

- Eu não sei como fazer isso - digo.

- Talvez eu possa ajudar, reconheço os tipos de magia pelo cheiro, sinto cada tipo de energia, e já vi isso antes, acho que posso impedi-la, mas preciso chegar até lá - diz a garota.

"Eu posso ajudar", seguro o colar em meu pescoço, ele está quente e emite um brilho diferente. "Vá até a fenda, rápido". Corro em direção a fenda, alguns soldados me olham e atacam em nossa direção.

"Deixe que eu assuma garota" a voz do Booh vem em minha mente como se eu recebesse uma pancada na cabeça. Fecho os olhos e permito que ele assuma.

- Austin... ou devo dizer Morok, eu imagino que esteja se divertindo tomando o corpo de um pobre menino, não é mesmo "irmão". Eu disse que iria te encontrar - digo

- Boochk, irmão, será um enorme prazer te matar novamente.

Os soldados fazem uma barreira, protegendo os bruxos que já voltaram a se posicionar na borda da fenda. Rakrom e Elak desaceleram o tempo tentando atrasar seja lá o que os bruxos estão fazendo, Charlott está junto a ele com as mãos em seus ombros repondo cada energia que perdem, Marina e Claryce mostram um pequeno livro para Kloe, parecem estar ensinando alguma coisa. Não vejo Carlo em lugar nenhum.

Austin caminha em minha direção, sinto uma empolgação ao sentir meu poder voltando. Pressiono a esfera de fogo presa em meu bracelete. A pequena chama se acende em uma das minhas mãos, as sombras do fogo projetadas sobre o chão, sobem pelo meu corpo até chegarem a pequena chama, logo elas se misturam e tenho em minhas mãos uma pesada espada de fogo negro.

Dou dois passos para trás, um rastro de macha escura desliza pelo chão em minha direção, assim que se aproxima piso sobre ela antes de acertá-la com minha espada. A mancha se transforma em pó debaixo dos meus pés. Austin estende seu braço para agarrar meu pescoço, levanto a espada e atravesso seu corpo em um único corte. Ele recua com alguns passos antes de também virar pó.

Sinto meu corpo gelar, solto a espada que se desfaz ao encontrar o chão. Todos os olhares se voltam para mim. Fecho os olhos e balanço a cabeça tentando não pensar no que acabou de acontecer. Já comecei e não vou parar agora. Dou um passo para frente, os soldados empunham suas armas apontando em minha direção, os caçadores junto com Gregor apenas me observam.

- Luna não vá, eles são muitos, não temos chances, vamos morrer! - grita Charlott.

- Vamos juntas ok? Já temos um plano, Luna pare - grita Marina.

Olho em direção a elas, Kloe ainda está com o pequeno livro aberto em suas mãos, ela acena com a cabeça em positivo fecha o livro deixando cair sobre o chão. Me volto em direção aos soldados, mas antes que eu comece a andar percebo que as cinzas no chão não estão mais lá. Elas estão debaixo dos meus pés, subindo pelas minhas pernas, sinto uma mão fria se fechar em meu pescoço.

Sou arremessada até a pilastra em minha frente, o impacto me faz perder o ar, tento me levantar o mais rápido que posso, mas é tarde, Austin já está em minha frente, "hora de improvisar, agora é com você, apenas o olhe nos olhos ", escuto a voz de Booh em minha cabeça. E assim faço, nossos olhares se encaram, Austin vacilam e novamente por alguns segundo eu ainda vejo seus olhos castanhos, mas só por alguns segundos, sua espada rasga o ar deslizando em minha direção, fecho os olhos esperando sentir o impacto, mas ele não vem. Sua espada atravessou o abdome da Charlott e parou a poucos sentimentos do meu rosto. Ela coloca as duas mãos na lâmina da espada impedindo que ele a retire de seu corpo.

Kloe em forma de lobo salta em direção ao Austin, ele solta sua espada e a agarra pelo pescoço, em instantes ela assume a forma humana, ainda sendo sufocada ela coloca suas mãos nos braços que a prendem e tenta relutar. Parece ter dado certo, Austin a solta e se ajoelha no chão, percebo que tem uma marca em seu pulso, pequenas palavras em um idioma estranho ganham formas e correm pelo seu braço, Kloe deve ter feito isso enquanto ele a segurava. Instintivamente levo minhas mãos aos ouvidos tentando abafar o som dos seus gritos arrepiantes. Ele cai ao chão desacordado, uma densa fumaça negra sai por sua boca e se agita pelo ar indo direto para a fenda onde os bruxos estão.

- O garoto está pronto, eu o ofereço para que o senhor viva - Diz o bruxo supremo das tranças.

Antes que a fumaça atravesse a fenda, um dos bruxos lá parado estende as mãos para a fumaça fazendo com que ela lhe obedeça. Em seguida ele sussurra algo em um idioma desconhecido. Gregor apoia um dos joelhos sobre o chão e professa as mesmas palavras ditas pelo bruxo, a fumaça vai até ele como uma flecha e penetra seu corpo, agora é o garoto quem grita antes de cair no chão da sala.

"Está feito" escuto um sussurro.

O fogo que queima sobre a fenda muda de cor, os bruxos que estão ao redor começam envelhecer depressa, logo viram esqueletos e depois pó, suas capas são engolidas pelo fogo. A chama alaranjada está maior a cada segundo, seu brilho é tão intenso que mal consigo olhar para ela.

Rakrom me puxa pelo braço e se coloca em minha frente, estamos todos reunidos novamente. O fogo se apaga, demoro para focar minha visão, mas consigo ver três silhuetas paradas onde havia fogo.

- Ele conseguiu, os trouxe de volta - diz Rakrom.

Sua expressão está abatida, ele abaixa a cabeça enquanto fala.

- Os banidos não é mesmo? - diz Elak.

- Primus, Secundu e Tertius Creator... Sim estou falando deles. Nós perdemos.

Gregor se levanta, respira fundo olhando para cada detalhe do seu novo corpo, um largo sorriso se abre em seu rosto, ele olhar sombrio e vazio que vemos nos soldados agora também o pertence.

Vou até o corpo do Austin deitado no chão, me abaixo e arranco sua armadura. tento trazê-lo até onde estamos reunidos, Elak aparece ao meu lado e me ajuda a carregá-lo. Seguro o colocar em meu pescoço pela última vez antes de devolvê-lo. "Que plano ridículo Booh, queria me matar?" Sussurro sem saber se Booh ainda está me ouvindo "Não me julgue garota, você é a menina que ele ama então pensei que funcio... Hã, não sei se deveria ter dito isso, só não conte que tivemos essa conversa, ok?" Booh sussurra em minha mente.

Sorriu como resposta, tiro o colar do meu pescoço e coloco junto ao corpo do Austin, ele está frio, perdeu sua cor e já não respira. Me levanto junto aos outros, permanecemos em silêncio. Estamos cercados, não sei de onde surgiram tantos soldados, todas as armas estão apontadas para nós, os caçadores se alinham atrás dos Creatores. Não temos como sairmos daqui.

O novo rei apanha sua coroa do chão, e caminhando em direção ao trono a colocando em sua cabeça. Logo após se sentar, aponta o dedo indicador em nossa direção.

- Matem todos - diz o rei