Round 3: Agora é minha vez
Davi chega na sala de detenção pela primeira vez na vida, ele sente como se isso fosse uma grande mancha em seu histórico perfeito. O clima do ambiente é completamente diferente do resto da escola, essa sala é a mais afastada de todas. Fica nos fundos, no térreo. A tensão por lá é diferente, desde a forma que o professor olha para ele, até nas grades na janela. É como uma prisão.
O desdém pelo local é visível, é onde ficam as piores cadeiras e as paredes estão descascando, o professor responsável o olha de cima a baixo, com um tom de superioridade moral. No canto esquerdo da sala tem uma enorme pilha de cadeiras quebradas e no quadro a frente estão listadas as regras do lugar:
1- Faça o que mandarem.
2- Fique quieto.
3- Você não tem privilégios aqui.
4- Se lembre da regra 3.
Todo essa sensação de hostilidade faz com que o garoto sente em um canto e fique apreensivo, encolhido olhando para o próprio caderno, abaixo do radar, sem querer chamar nenhum tipo de atenção para si. Os alunos que ali estão são o tipo de gente que Davi nunca se deu bem, todos aparentam ser algum tipo de garoto problema e pensar no porque estão ali o deixa ainda mais ansioso. "O que será que aquele cara fez? Ele com certeza deve ter um canivete ou algo assim", "Esse ai deve matar muita aula", "O de lá deve ter batido tanto em alguém que até mandou pro hospital", pensamentos assim sobrevoam a mente do rapaz, que a cada segundo que se passa, mal pode esperar pela hora de sair de lá.
Então uma voz vindo do seu lado direito o tira do transe, o fazendo voltar a realidade e observar as coisas ao seu redor.
--- Tem caneta aí?
Diz o jovem do seu lado, ele é um rapaz de cabelo longo bagunçado e desgranhado, tendo comprimento até seus ombros. Usa uma camiseta branca e calça preta com um cinto com uma grande fivela de caveira, o sapato social contrasta com o resto do look e seu olhar sério penetra a alma de Davi.
--- Tem caneta ou não? --- Ele repete.
---- Aqui.
Davi entrega sem nem pensar duas vezes, não quer arriscar ter um cara desses bravo com ele. O cabeludo então começa a escrever algo no caderno.
--- Qual sua capivara?
---- Capivara..? --- Davi responde sem entender a gíria.
--- É, qual teu b.o? Cê tá aqui porque!?
--- Eu quebrei a janela da sala com uma cadeira.
--- Irado. Eu posso respeitar isso. Quer saber o que eu fiz? --- Rebate com um sorriso estranhamente orgulhoso.
--- E-Eu dispenso.
O outro rapaz então dá uma pequena gargalhada. E meio presunçoso continua a conversa.
--- Cê que sabe, vai ficar perdendo uma história engraçada, Davi.
--- Eu posso viver com isso. E como sabe meu nome? Sem ofensas, é claro.
--- Eu sou da sua turma ô lerdão. Só nunca te enchi o saco falando contigo porque tu tá sempre na sua, nos cantos, todo depressivão. Ai te deixo quieto lá. Tu né emo não né vei?
--- Não Não Não.
--- Então só é tímida, uma menininha fofa.
O cabeludo ironiza, mas segue com um tom amigável. Um breve silêncio se inicia no local, mas ambos mantém contato visual. Davi completamente nervoso e ansioso, enquanto o outro rapaz aparenta estar totalmente neutro.
--- Me chamo Gustavo.
--- Eu sou Davi.
--- Disso eu sei né, bocó? Eu já tinha dito seu nome.
--- Ah, é mesmo.
--- "Ah, é mesmo" --- Gustavo repete com uma voz fininha pra zoar --- Presta atenção ô, aqui tão os piores dos piores da escola. Se ficar assim vai virar esparro aqui.
Davi olha todos os rapazes mal encarados no local. Alguns tinham cara de quem já tirou cadeia e tem três filhos, enquanto mesmo tendo a mesma idade, Davi ainda aparentava ter no máximo uns 14 anos. O olhar de medo nele é tão genuíno que Gustavo logo nota.
--- Mas relaxa, ninguém aqui morde. --- Após terminar a frase fica pensativo --- Se bem que o Rafael já mordeu o rosto de um moleque.
--- O rosto?
--- Na cara. Sem dó.
--- Meu Deus que porra é essa?
Gustavo então coloca a mão atrás da nuca e depois coloca os dois pés em cima da cadeira, logo depois solta um longo bocejo.
--- Bem vindo ao inferno, cara.
🥊
As horas na detenção passam em um tempo diferente do mundo real, um segundo lá equivale a pelo menos dez minutos no resto do universo. O local é tão denso que nenhum raio de esperança consegue entrar no ambiente, essa atmosfera pesada faz com que seja sofrido habitar ali, prolongando assim a sensação de querer ir embora e não poder. Mesmo com tanta gente perigosa, ninguém nem sequer olhou para Davi, o rapaz suspeita de que é porque Gustavo conversou um pouco com ele, devem pensar que são amigos ou algo do tipo. Isso o deixa curioso sobre quem é Gustavo e o motivo do porque respeitam tanto ele.
Ele segue entediado e esperando a hora de ir para casa, mas ao menos está aliviado de não ter que brigar com o Mosca, pelo menos não hoje. Que terrível engano, suas certezas somem ao escutar algo vindo da janela.
--- Ei, Davirgem, psiuuuuuu --- Diz um rapaz que ele nunca viu na vida.
Davi então olha para a janela e vê esse jovem do lado de fora. O jovem amassa uma folha de caderno e joga para dentro, logo em seguida sai correndo.
--- O que diz ai? --- Gustavo pergunta curioso.
O jovem tímido então abre a folha de caderno e entrega para Gustavo, que logo lê em voz alta.
"Vou esperar vosse sair da detenção e vamos brigar no ringue. Não se atrasar mais, ou não vou ser tão bonzinho"
--- Quem te mandou isso?
--- Pela péssima gramática, com certeza o Mosca --- Davi diz suspirando --- Esse cara é um pé no saco.
--- E cê tem medo desse merdinha?
--- Odeio admitir, mas tenho. Ele quer me bater.
Gustavo olha com um olhar genuíno de quem não entendeu algo.
--- Então é só você bater nele primeiro.
--- Não é tão simples assim.
--- Não? Pra mim parece bem simples. Aliás, Você é certinho de mais pra estar aqui. O que rolou?
Davi então amassa o papel e guarda na mochila, logo depois se vira novamente para Gustavo. Suas mãos começam a fazer pequenos tiques discretos, é seu jeito de tentar aliviar a pressão que está sentindo.
--- Ele tá há alguns meses me enchendo o saco. Zoando, batendo, roubando, perseguindo. Sem motivo, saca?
--- Tem um grande motivo na verdade.
--- Ahn? Qual?
--- Ele faz porque pode. Se você não tem forças pra impedir, ele faz o que quer. Se você não freiar isso, vai só piorar.
Davi fica em silêncio, e nesse momento a ficha cai. A razão dele ser o alvo não é nenhuma em específica, ele poderia ter outra aparência, outro saldo bancário ou outras características, mas ainda assim seria a escolha de Mosca, simplesmente porque é alguém fácil de ser feito de vítima, por não conseguir delimitar limites ou barreiras.
--- E como eu freio?
--- Você mostra que ações tem consequências.
--- Mas não tem, eu delatar não muda nada --- Davi diz em um tom meio desesperado --- Nas outras escolas não resolveu em nada.
--- Quem tá falando de delatar vei? É só quebrar o nariz dele e ele para.
O rapaz então fica pensativo alguns segundos e depois responde com uma voz triste.
--- Mas eu não sou violento. Não quero me tornar assim, violência é ruim. Faz mal as pessoas.
--- Violência é só uma forma de comunicação.
--- Ahn?
--- É po, pense comigo. Violência é uma forma de comunicação não verbal. Você consegue transmitir informações com ela, mensagens. Pode mostrar limites, pode mostrar consequências, pode passar recados. A questão é, quem é fluente nessa forma de comunicação pode impor o que quiser pra quem é analfabeto nisso. --- Gustavo olha sério --- Por isso o Mosca faz tudo o que faz contigo. Ele é fluente e você não sabe nem o ABC ainda. É simples impor o que quiser contra você, ele deve se divertir na verdade, fazendo o que quer quando quer. É divertido, você se sente poderoso, eu sei porque ja tive uma época que fazia essas coisas.
O jovem fica incrédulo absorvendo o que foi dito, é um pensamento cru vindo de um homem rígido e simples, mas pelo mundo que Gustavo sempre viveu, é algo que faz um certo sentido. É brutal e literal, mas se melhor pensado e lapidado, poderia acabar sendo um pensamento sensato.
--- Então tá sugerindo que eu aprenda a usar violência para me impor sobre quem não sabe?
--- Pelo contrário. Tô falando pra você usar para delimitar o que fazem com você. Se defenda, não deixe ninguém te tratar de qualquer jeito.
Gustavo abre a mochila de Davi e pega lanche sem pedir. Ele abre a vasilha e começa a comer o sanduíche que a mãe do rapaz fez. Depois continua falando de boca cheia.
--- Sanduba show. Enfim, você deveria ir lá encarar ele quando sair daqui.
--- Eu vou levar uma surra.
--- Se não encarar também vai. É melhor lutar pelo seu espaço e ficar de pé o quanto aguentar, do que recuar por medo. Se recuar uma vez, vai recuar sempre. O corajoso e o covarde sentem a mesma coisa, é o modo de lidar com isso que determina qual é qual.
--- Essa frase foi bonita --- Davi diz surpreso --- Não é algo que esperava de você.
--- Não é minha, é do treinador do Mike Tyson.
Então, finalmente após longas e torturantes horas, o tempo da detenção finalmente passou. Eles foram liberados para ir para casa. Davi e Gustavo saem da sala, os dois ficam parados na frente da escola.
--- E então, vai encarar?
--- Ainda não sei --- O tímido rapaz diz hesitante --- O que acha melhor?
--- pense no homem que quer ser e em como quer ser tratado. Depois veja qual decisão te leva a isso --- Gustavo faz um aperto de mão com Davi --- Fica firme. Te vejo por aí.
Gustavo sai andando se sacudindo, Davi vê a cena e acha meio bobo, mas quem é ele para julgar? Ele tinha coisas mais importantes para decidir neste momento. Seja lá o que ele optar por fazer, deve ser logo, pois a briga é prevista para daqui alguns minutos. Lutar ou fugir? Ceder ou ficar firme? Agora é a hora de decidir que tipo de homem ele quer ser.
🥊
Miguel, o pai de Davi, sempre teve como Hobby a pescaria. Praticamente todo final de semana ele vai pescar, e em uma dessas folgas, ele levou o seu filho. O jovem na época era apenas uma criança de onze anos e não estava nem um pouco animado, que graça tem em ficar sentado na canoa por horas esperando um peixe morder? E a recompensa nem é grande coisa, um peixe pescado por você mesmo e um comprado no mercado tem o mesmo gosto, era a filosofia dele. Os dois estavam na beira do rio, conferindo os equipamentos. Miguel de forma autoritária aparentava estar em um interrogatório policial enquanto indagava ao filho se havia trazido tudo.
--- Linha?
--- Trouxe.
O homem continua sério e segue nos seus questionamentos.
--- Anzol?
--- Trouxe.
Davi já estava visivelmente de saco cheio, mas o homem prossegue.
--- Molinete?
--- Esse eu esqueci em casa, desculpe.
Seu pai então para e olha desapontado, é visível a frustração no seu rosto e ele fica em silêncio uns segundos antes de responder.
--- Mas o pai não pediu pra você separar tudo? Eu disse que ia chegar tarde do trabalho e iamos direto pra cá. Você tava o dia todo em casa, porque não separou direito? Sabe o quanto isso importante é pra mim.
--- Desculpe, eu fiquei jogando e esqueci. Ai tive que fazer tudo na pressa.
--- Filho, você já está velho pra esse tipo de erro. Em breve você já vai ser um homem e vai ter as responsabilidades de um. Na vida vão ter pessoas que vão depender de você e não vai poder errar ou vacilar com elas --- O pai diz olhando nos olhos dele --- Um dia terá que cuidar de mim e da sua mãe, proteger seus futuros filhos e esposa. E não vai poder fazer nas pressas por causa de jogo ou prazer, um homem tem que fazer o que precisa ser feito. Mesmo não gostando, fique mais atento a isso.
Davi não esperava escutar isso, mas ouvir essas palavras o atingiram em cheio. Foi quando a ficha caiu, ele não seria criança o resto da vida e isso o fez sentir medo. Há tanto no mundo dos adultos, coisas que não entende e coisas que são difíceis, em breve serão o que terá que enfrentar. Para encarar esses desafios vai ter que se tornar alguém a altura, mas o que faz alguém apto ou digno disso? Ele não sabe responder, pelo menos não ainda.
--- Me desculpe, pai. Não vai se repetir.
--- Desculpas não resolvem nada, mas relaxa. Nesse caso é só passar na loja e comprar um, mas na vida vão ocorrer situações que só acontecem uma vez ou que você não pode errar. --- O pai segura em seu ombro --- As coisas tem consequências. E quando vacilamos, geralmente quem sofre é quem amamos. Essa é uma dor que eu não quero que você sinta. Nunca.
O pai solta o seu ombro e começa a separar os coolers. Miguel tem uma lesão no ombro, adquirida na sua época de boxeador. Graças a isso, ele tem dificuldades em carregar peso com um lado e até mesmo de fazer exercícios regularmente. Então carregar os coolers com os equipamentos e colocar na canoa é uma atividade que ele faz com dificuldades, e fica bem claro que sente dor a cada vez que levanta a carga. Davi só pode apenas observar, porque não tem a força necessária para carregar os objetos, isso o faz se sentir mal em ver o pai passar por dificuldades, mas não ser apto a nem pelo menos aliviar um pouco o que acontece.
Essa é uma daquelas memórias aleatórias que a mente simplesmente grava e faz questão de você lembrar, mesmo que seja banal e não haja nada importante ou específico que dê para julgar necessário de recordar. Davi não entende porque está se lembrando disso nesse momento, a única coisa que ele sabe é que nesse dia, o seu eu criança não sabia o que queria ser quando crescesse, já que haviam muitas possibilidades de profissão, mas algo que ele determinou nesse dia foi que seria forte, para ajudar a todos aqueles que ama e para estar apto a assumir as responsabilidades que fossem necessárias para garantir a felicidade dos seus. Esse é o tipo de homem que ele quer ser.
🥊
Agora não havia mais volta, estava cercado por uma multidão de estudantes que berravam e sacudiam o alambrado da quadra. Gritos são ouvidos por todos os lados, coisas como "Uh, vai morrer, uh, vai morrer!!!", e uma animação e empolgação por parte dos telespectadores. Todos parecendo primatas e animais, à espera de sangue. A sua frente está Mosca, sem a jaqueta, revelando usar uma camisa branca folgada, com um grande A de anarquia nas costas. Davi não demonstra estar com medo, está olhando seu algoz nos olhos firmemente, sem desviar nem por um milésimo de segundo.
Já que decidiu que iria mudar, então vai até o fim. Estava preparado para brigar até as últimas consequências, positivas ou negativas, pouco se importando com o que poderia acontecer. Mosca, provocador como sempre, começa o seu showzinho.
--- Então veio mesmo hein, Davirgem? --- Ele sorri --- Achei que iria fugir do país.
--- Só vamo acabar logo com isso. Não tenho o dia todo.
Ver essa retidão e assertividade nas palavras surpreendeu Mosca, que visivelmente deu uma hesitada. O projeto de punk faz uma cara de espanto, mas logo em seguida volta com seu sorriso sarcástico.
--- Não tão rápido. Primeiro as regras --- Mosca diz alto para a plateia.
--- Regras?
--- É, apesar de tudo não somos animais. No ringue só tem uma regra: Quem entrar na quadra, está automaticamente na briga e vai levar golpes também. Isso garante que não vão separar. ---- Mosca coloca a posição de luta --- Vou te bater o quanto eu quiser. Ninguém vai te ajudar.
Antes mesmo de terminar a frase, o delinquente já avança de surpresa e solta um chute nas partes íntimas do oponente. Por conta da dor, Davi se encolhe e não consegue se defender. O valentão aproveita a deixa e dá dois socos desordenados na nuca do rival, logo depois passa uma rasteira o jogando no chão.
--- Isso é pra você aprender seu lugar --- Mosca berra chutando o rapaz caído, que apenas coloca os braços ao redor da cabeça e tenta sobreviver a tempestade.
O projeto de rebelde então se agacha perto do rosto do oponente, o segura pelo cabelo e bate seu rosto contra o chão. A testa dele rasga, fazendo assim uma pequena mancha de sangue no chão.
--- Tá gostando? Tem muito mais de onde veio es... --- Mosca tem seu diálogo interrompido porque Davi o acerta com um bruto soco. A cabeça do punk é lançada para trás e ele cai sentado.
O valentão então se arrasta para trás e levanta com um olhar visivelmente surpreso. Ele fica ofegante olhando incrédulo enquanto observa Davi levantar com dificuldades e colocar a posição de luta novamente.
--- O-o quê? --- Mosca diz colocando a mão no nariz e vendo a palma manchar com o próprio sangue.
--- Deveria ter vindo com uma camisa vermelha.
As pernas do algoz tremem, ele esperava um grande passeio no parque, um combate sem dificuldades. Davi revidar o atingiu bem no espírito, o fato do golpe ser certeiro e bruto o deixou ainda mais apreensivo. Desde quando aquele nerd tinha toda essa força? Desde quando o Davi era tão firme assim? Cadê o medo de sempre? Esse é mesmo o Davirgem? Essas perguntas assombram sua consciência e se transferem para suas pernas, que tremem. Ele organizou todo esse teatrinho para se amostrar para a escola, se perder, o que ocorrerá com sua reputação? Seu coração palpita com medo do resultado. Mosca então conhece algo que Davi se cansou de sentir, medo.
Estando pressionado e contra o fio da navalha, o delinquente avança e atinge uma bruta cotovelada no rosto do adversário. O nariz se quebra, fazendo voar um jato de sangue no ar. Davi cambaleia dois passos e logo é atingido com um chute frontal na barriga. O tímido rapaz lança um soco como resposta e acerta a testa de Mosca que sente seu cérebro sacudir.
Ainda tonto, Davi avança para atacar, mas desequilibra e agarra o tronco de Mosca para não ir ao chão. O delinquente então começa a acertar cotoveladas em sua nuca, o som das pancadas é seco e acoa por toda a quadra.
--- Caia, caia, caia!!!! Caia filho da puta --- Mosca berra enquanto atinge os golpes, visivelmente transtornado e assustado --- Porque você não cai????
Até que o rapaz atingido finalmente amolece e cai de bruços no solo de cimento. Mosca está respirando pesado e está com a roupa amassada, ele fica estatalado olhando Davi que não se mexe.
---- AHHHHHHHHH --- Mosca dá um berro gutural e animalesco vindo do fundo da alma como forma de comemoração, mostrando o quanto aliviado estava.
--- Não... tão rápido. Me dá só um segundo.
Davi diz levantando com imensa dificuldade, seu corpo está falhando, mas seu espírito só aparenta estar cada vez mais fortalecido, independente dos golpes. O jovem finalmente consegue ficar de pé e novamente coloca a sua posição de luta, ele não aguenta andar até Mosca então fica plantado no chão, firme, reto, no aguardo do oponente para continuar combatendo.
--- Você é maluco, caralho? Porque está levantando? Só fica no chão logo!
--- Levantar é o que o tipo de homem que eu quero ser faria. --- Davi diz tossindo. Logo depois recita como um mantra a frase que Gustavo o dissera mais cedo --- É melhor lutar pelo seu espaço e ficar de pé o quanto aguentar, do que recuar por medo. Se recuar uma vez, vai recuar sempre. Eu cansei de ceder.
Mosca recua dois passos, seu corpo treme, ele está visivelmente apavorado. A plateia começa a gritar por Davi, isso faz o valentão ficar ainda mais pressionado a dar uma resposta adequada. Ele sente todo seu status social ruir como um castelo de areia, ele tem que impedir, tem que fazer algo a respeito, mas ver aquele rival de pé, sem hesitações o deixa morto de medo, ele não quer chegar perto de Davi novamente. Ele sente estar enfrentando alguém sem medo da morte, que vai até as últimas consequências para vencer, a imagem de um kamikaze.
Sabendo que se aproximar é arriscar levar outro soco pesado daquele, Mosca resolve apelar para o refúgio do covarde, a trapaça. Ele tira um soco inglês do bolso de trás e coloca na mão direita. Avança correndo e manda um poderoso soco na cara de Davi, que cai imediatamente com o lábio cortado. Mosca coloca o joelho na barriga de Davi e o agarra pela camisa, logo depois acerta outro soco com a soqueira. O rapaz tímido não tem mais forças para revidar, então só o encara nos olhos sem arrependimentos e solta o maior e mais caloroso sorriso de sua vida.
--- Do que você tá rindo, retardado? --- Mosca diz assustado --- Assim você vai morrer!
--- Ainda não entendeu? Você pode me bater o quanto quiser, mas eu já venci essa luta. Eu não recuei e nem cedi. Eu não sou mais aquele cara que você humilhava, e você não pode fazer nada quanto a isso. Essa é a sua maior raiva.
Essas palavras atingem Mosca no íntimo, no emocional. Ele sente um misto de medo e raiva, Davi se tornara incontrolável, isso além de inadmissível, era aterrorizante. O que um cara com essa mentalidade faria para se vingar? Isso o deixava tremendo completamente. Ele estica a mão para trás e se prepara para dar mais um soco, mas o som de passos se aproximando o fazem parar.
Era Gustavo o dono dos passos barulhentos, ele se aproxima dos dois combatentes e fica parado os observando. Mosca se levanta e deixa Davi caido no chão, imóvel.
--- Cê tá um caco hein, mano? --- Gustavo diz presunçoso.
--- Já estive melhor --- Davi retruca.
--- Isso eu posso ver.
Mosca finalmente sai do seu estado de choque e arruma o moicano. Ele lambe os lábios e encara Gustavo fixamente.
--- Você é burro? Se entrar no ringue você está oficialmente na briga. Você não escutou? Deixa de ser burro e não se mete.
--- Eu estou ciente disso.
--- Se está, então cai fora logo. Rala daqui e não atrapalha.
--- Estou com outros planos.
Gustavo começa a saltitar sob a ponta dos pés, ele ergue os punhos em uma postura ortodoxa, com a mão direita protegendo o queixo e a esquerda mais à frente. Ele começa a fazer pequenos saltos para frente e para trás, de forma rítmica, coordenada e graciosa. Então de forma neutra e desinteressada fala normalmente:
--- Ei Mosca, agora é a minha vez.
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Notas do autor:
Eae galera, quem deve ser esse misterioso Gustavo? Siga acompanhando pra saber ksksks. Enfim, esse é o capítulo da semana, espero que tenham curtido.
O Davi finalmente revidou, essa é a virada de chave para a mudança de vida dele e o começo do primeiro arco da história: A introdução ao boxe!
Te vejo na próxima semana? Até mais, coloque suas luvas e te vejo no próximo round!
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