Presente
No dia seguinte, Olivia chegou ao escritório de Alírio antes de Ana Maria.
— Precisamos falar sobre a Alana.
— Sente-se, por favor. Olhar para você é muito estranho.
— Se passaram vinte anos, então não precisar estranhar nada. Enfim, não vim aqui para isso.
— Diga o que houve com a Alana? Eu falei com a minha filha ontem! Daqui a pouco vou encontrar a mãe dela.
Olivia tinha o semblante assustado. Cenho franzido.
— O que você disse?
— Vou encontrar a mãe dela daqui a pouco. Depois de quase vinte anos inerte, está querendo o comando da empresa. — Passou as mãos no rosto.
— Não... o que disse antes, você disse que falou com a Alana?
— Sim. Voltou para o Brasil e foi direto para São Paulo, nem ela aguenta a Ana Maria. — disse sorrindo.
Olivia apertou a pasta com os documentos. Marejou os olhos.
— Você está muito enganado, Alírio! — Tentou conter o choro que se iniciava. — A Alana não está bem...
Alana surgiu ao lado dela e tocou de leve seu ombro.
— Não estou enganado, não. Ela parece ótima. Mas diga, preciso conversar com a minha advogada antes de receber a louca da Ana Maria. E depois de me livrar dela, vou tirar férias, estou muito cansado.
— Não era nada importante. — disse e se levantou. — Ela merecia um pai melhor. Alguém que se importasse de verdade com ela.
— Alguém que a deixasse se mutilar, por exemplo? — revidou quase gritando.
— Que seja, Alírio! Mas que se importasse de fato com ela. A menina passou anos longe, voltou e você sequer ficou sabendo.
— Quem você pensa que é para vir aqui me dizer isso?
— Eu sou a única pessoa que a amou de verdade, a vida inteira. A única que sofreu sua ausência. A única que está com condições de sofrer por ela. — disse em lágrimas.
— Ela está em São Paulo. Você pode ir lá. Se é a única que se importa com ela...
— Ela não está em São Paulo, seu desgraçado, egoísta!
Alírio se levantou bruscamente e foi até ela:
— Você vai sair daqui agora... — falou e a pegou pelo braço esquerdo.
Olivia se desvencilhou da mão do homem, o pegou pela gola da camisa e o empurrou contra a janela por cima de uma persiana metálica.
— A sua filha está morta há meses! — gritou bem próxima ao rosto dele. — Você é tão escroto que sequer sentiu a falta dela.
Largou o homem com um empurrão e jogou a pasta sobre o peito dele, que segurou o objeto.
Alírio começou a ofegar quando viu as fotos do cadáver que viu no dia anterior.
†
André acordou no hospital, viu um policial perto do lado de fora. Olhou em volta. Sentia-se zonzo. Viu uma enfermeira se aproximar.
— Bom dia, André!
— Bom dia... — Engoliu saliva ao sentir a garganta seca. — O que aconteceu?
— Você teve uma parada cardíaca na cela.
Um médico entrou naquele momento, examinou o empresário e fez anotações em um tablet.
— Quando eu posso sair, doutor?
— Como você passou um tempo em coma, vai ficar em observação até amanhã.
Valentina deu leve batida na porta e o médico acenou para que ela entrasse. Passou todas as informações para ela e os deixou sozinhos.
— Olá, doutora Valentina, como está?
— Ótima. Acabei de conseguir liberdade para você até o julgamento, que vou protelar o máximo que eu puder. — disse empolgada.
— Não. Eu vou voltar para a delegacia quando sair daqui. Quero ser julgado logo, já falei isso com você.
— Mas, André...
— Só aceitei que me acompanhasse porque o Richard insistiu, mas não preciso dos seus esforços. Eu preciso apenas pagar pelos crimes que cometi.
— Você não está bem, André. Vou falar com o médico.
— Não faça nada, doutora Valentina, ou a dispenso. Eu estou ótimo. Foi apenas um mal-estar, não vai acontecer de novo.
— Um mal-estar que o deixou em coma e com certeza afetou sua capacidade de...
— Já chega.
— Ok. Como quiser. Com licença. — pediu e saiu aborrecida.
Valentina era extremamente vaidosa, não aceitaria jamais perder aquele caso e não largaria de forma alguma.
Vou inocentar você, André, você querendo ou não! — disse para si enquanto andava pelo extenso corredor rumo ao elevador.
Quando a porta metálica se abriu ela entrou sozinha, mas logo se deu conta da presença de um homem ao seu lado.
— Bom dia! — Otto desejou com sua voz grave e rouca.
†
Um defensor público se apresentou para cuidar do caso de Inácia. Foi levado para conversar com a mulher, que estava extremamente dócil e comportada na cela.
— Olá... eu sou o doutor Romário Felisberto. Eu estudei seu caso, fui enviado pelo estado. Como devo chamá-la?
— Alana Fonseca...
— Senhora, já sabemos que esse não é o seu nome. Para que e essa defesa seja eficiente você precisa me falar a verdade. Confiar em mim. Sua condição física é favorável a uma sentença mínima, mas se continuar resistente com relação a esses fatos, será impossível evitar que seja condenada por tudo o que a promotoria a está acusando.
Inácia passou a mão na cabeça com força e começou a chorar.
— Eu não sei. Eu sou Alana Fonseca. Por que você insiste em dizer que não sou?
— Tudo bem, acalme-se. A doutora Lara avisou que as investigações estão rápidas e logo vão descobrir seu verdadeiro nome. Se não se lembra, posso usar isso a seu favor no julgamento. Não me esconda nada.
— Tá bom. Eu não me lembro de nada.
Romário fez algumas anotações, outras perguntas e a deixou sozinha.
Impossível descobrirem meu nome! — pensou de sobrancelhas franzidas olhando para a grade que fora fechada há segundos depois que o advogado saíra.
Nunca em toda sua vida, Inácia experimentava paz tão grande quanto usufruía naquele tempo encarcerada. Dormia muito bem, acordava disposta, sentia-se feliz. Mas queria sair dali.
André precisa me perdoar. Já consegui enganá-lo uma vez, não será difícil. — divagou.
Inácia passava seu tempo fazendo planos. Treinava até seu comportamento diante do júri.
Começou a achar que Alana sumira para sempre quando experimentou os momentos de tranquilidade. Mas quando o advogado saiu deixou a mosca da dúvida em sua cabeça, ela passou a se preocupar com a possibilidade de ser descoberta.
— E se aquela desgraçada estiver ajudando nessa investigação? — disse aflita em voz alta.
A partir daquele momento sua paz sumiu. Passou a discutir com ela mesma, a sentir dores terríveis nos membros amputados. E numa madrugada fria, recebeu a ilustre visita de Alana, que apenas sorriu e passou a gélida e úmida mão em sua perna.
†
Ana Maria chegou ao escritório de Alírio junto com Tiago. O homem estava transtornado. Precisou ser acalmado por sua secretária e pela advogada que estava na sala quando a mãe de Alana entrou.
— O que aconteceu aqui? — Ana Maria perguntou quando viu Sheila com um medidor de pressão.
— Tira essa mulher daqui! — mandou gritando afrouxando o nó da gravata.
— Alírio, acalme-se, por favor. — pediu a advogada. — Entrem, sentem-se! Aconteceu uma coisa muito desagradável e ele está um pouco nervoso.
— Eu não tenho nada a ver com isso, preciso resolver a situação da minha empresa.
— Claro que você tem a ver com isso. — Alírio gritou novamente, se levantou: — Você não me disse que a minha filha estava morta!
Alana chegou perto da mãe, que franziu o cenho.
— Você enlouqueceu, Alírio? Não estou drogada para você me manipular de novo com suas histórias loucas, não.
Ele pegou a pasta e jogou na direção dela.
— Essa empresa é minha e você não verá um centavo meu mais. Some daqui antes que eu chame a segurança e os tire à força. — bradou furioso.
Ana Maria sentiu forte mal-estar ao ver as fotos do cadáver da filha e foi amparada por Tiago. Alana avançou na advogada do pai que tentava contê-lo e a jogou na parede. Sheila ligou para a segurança.
— Sumam daqui! — gritou Alírio novamente. O homem estava descontrolado.
Ajeitou a postura do próprio corpo ao sentir um abraço gelado por trás.
Oi, papai! — A voz de Alana fez o homem perder completamente os movimentos naquele instante.
Os seguranças entraram quando Tiago colocou Ana Maria desmaiada no colo e saiu da sala. Alana enfiou as duas mãos pela nuca de Alírio agarrando seu rosto por baixo da pele em busca dos olhos arrancando gritos apavorados do homem e de quem estava presenciando a cena. Os dois seguranças tentaram ajudar, mas foram empurrados para longe.
Alírio tentava, desesperado, tirar as mãos de Alana de seus olhos. Mas num movimento brusco a jovem arrancou os globos oculares do progenitor fazendo-o cair de joelhos no chão enquanto esguichava sangue para todos os lados. O homem bateu o rosto no piso gelado, já sem vida.
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