Adeus, Alana



Inácia tomava banho de sol tranquilamente todos os dias no pátio do manicômio.

— Otária! Em breve eu consigo um jeito de sair daqui. — divagou sentada numa cadeira de rodas, pois estava sem a prótese da perna.

Sentiu uma coceira na cabeça, coçou ignorando aquela sensação.

Não se deixava abater, se comportava bem para não ser medicada e vivia tranquilamente lá. Seduziu um enfermeiro que transava com ela sempre que estava de plantão. E já arquitetava seu plano de fuga.

A coceira na cabeça aumentou. Ao coçar com mais força sentiu algo molhado no dedo, viu que era um líquido escuro. Olhou para cima e saiu de debaixo de uma árvore.

No dia seguinte ao acordar viu duas larvas andando sobre seu travesseiro branco. Afastou-se assustada, pegou a prótese da perna e colocou imediatamente para chegar até a porta e chamar alguém.

Limparam o quarto dela e deixaram pronto para recebê-la. Depois do banho, Inácia voltou ao quarto e sentiu forte cheiro de podre, chamou novamente alguém e ao verificar o quarto impecável, a zeladora avisou:

— Está tudo certo... — avisou se aproximando e fez uma careta levando a mão à boca. — Você tomou banho?

— O quê? — perguntou se cheirando e não sentiu nada. — Está louca? Olha meu cabelo ainda molhado, acabei de sair do banho.

A mulher a deixou sozinha se afastando quase correndo para longe daquele mau cheiro ou vomitaria aos pés dela.

Mesmo incomodada com aquele mau cheiro da cela, Inácia não fez escândalo. Acordou no dia seguinte sem escutar nada, tocou no ouvido esquerdo e sentiu algo pegajoso ali. Bateu no lado oposto da cabeça na intenção de derrubar o que quer que estivesse a impedindo de ouvir e caíram várias larvas no chão. O grito que deu ecoou pelos corredores.

Foi levada à enfermaria e examinada. Ficou lá em observação. Depois de passar por uma lavagem no canal auricular, ela passou a ouvir apenas um zumbido naquele lado.

Acordou no dia seguinte sentindo gosto de sangue na boca e a garganta seca, engoliu saliva na intenção de hidratar e sentiu-a arder. Abriu os olhos e precisou esfregar o olho esquerdo, pois estava embaçado impedindo-a de enxergar o ambiente com clareza. Piscou algumas vezes e não conseguiu se livrar daquela sensação.

O médico chegou e a liberou para voltar à cela. O olho continuava embaçado e ela continuava passando os dedos na intenção de se livrar daquela agonia. Resolveu lavar e ao chegar na frente do espelho, viu que olho estava cinzento. Lavou, tentou tirar aquela película e cada vez aumentava mais.

— Que porra é essa?

Inácia estava se decompondo viva.

Com vários bandidos perigosos soltos, algumas cidades entraram em caos total. As pessoas que arriscavam sair de suas casas eram mortas por tiros nos confrontos entre policiais e bandidos. Crianças estavam sendo encontradas mortas. Jovens eram estupradas.

Otto se divertia com aquilo enquanto observava. Até que Alana parou na frente dele e o intimidou com seu olhar.

O que está fazendo? — indagou furiosa e viu o riso da entidade maligna cessar.

Otto pegou Alana pelo pescoço e a puxou para uma dimensão paralela à que estavam. O local era fétido, escuro e barulhento, havia muitas pessoas sofrendo, chorando, gritando, outras rindo às gargalhadas.

Aquelas pessoas que estão lá, vão prosperar esse lugar. Vão me deixar mais forte. E você não vai me impedir. — ameaçou e quando foi jogar Alana em um buraco, a jovem sumiu de suas mãos.

Ana Maria estava rezando naquele momento, pedindo proteção para a filha, desejou com força que ela fosse para casa sã e salva. Alana apenas foi puxada para perto dela. O demônio tentou se aproximar e não conseguiu, o que deixou Alana tranquila.

Depois de deixar a mãe dormindo serenamente, Alana saiu voando baixo pela noite analisando a destruição e medo semeados por Otto. Viu o caos que estava na delegacia onde Lara trabalhava, nos hospitais, na cidade do Rio de Janeiro, em São Paulo, e entrou em desespero, se sentindo culpada. Otto sorria debochado quando ela levantou o rosto e o encarou sentado de cabeça para baixo.

Você não pode fazer nada. Tem que ficar do meu lado e me ajudar a acabar com esse planeta bonito. — disse sorrindo.

O grito de uma vítima chegou aos ouvidos de Alana e ela seguiu o som chegando quando um estuprador rasgava sua roupa. Furiosa, a entidade avançou no abdome do homem e tirou sua espinha colando na parede do beco para onde arrastara sua vítima. O corpo, sem ossos, caiu sobre a adolescente que ainda gritava no chão.

O olhar furioso de Otto fez que com Alana sentisse que estava no caminho certo.

Elas vão prosperar o seu lugar do outro lado! — Alana avisou e entrou em um galpão ultrapassando a parede.

O próximo líder do caos teve sua alma sugada pelos olhos ficando apenas a capa de pele e osso no chão.

Ao fazer aquilo, Alana viu que sugava também toda a maldade que havia no criminoso. Passou a encarar um misto de sensações na sua terceira vítima.

Otto ria debochando da ação fracassada dela, que sorriu também quando chegou perto dele, cravou suas unhas na parte de baixo do queixo dele e o arrastou de lá, mostrando o quão forte estava. O demônio se debatia tentando se soltar, mas Alana apenas saltava pelas ruas com ele na mão.

Sua confiança está na Valentina. Eu sei que sim. — Alana desafiou e despertou a fúria de Otto, que conseguiu se largar da forte mão da cúmplice.

Os dois iniciaram uma briga corporal, o demônio precisava tirar Alana de seu caminho, ela não podia se aproximar de Valentina. Usando um par de braços extras, ele tentou segurá-la para prendê-la longe do alcance de seus objetivos. Ele não queria perder o controle das almas perdidas e ela não queria que a terra fosse destruída.

Otto só não contava com o tamanho da força e poder de Alana, que para se desvencilhar dele usou seus próprios truques. Cresceu fisicamente tornando-se monstruosa e quebrando os braços extras da entidade maligna. A jovem empurrou o demônio e saiu voando em alta velocidade.

Valentina trabalhava sem parar. Sua recompensa pelo ofício tão bem executado estava sendo rios de dinheiro em sua conta bancária.

Quando encontrou com Otto naquele elevador e ele descobriu, ao ler sua mente, que o único foco de verdade na vida dela era ser muito rica com a profissão, ele conseguiu o que tanto queria: alguém forte e sem escrúpulos que o representasse ali.

Alana chegou ao apartamento de Valentina.

Otto foi procurar o possível ponto fraco de Alana além da mãe. Chegou ao manicômio judiciário e viu Inácia na cama. Precisava atingir Alana de alguma forma.

A mulher tinha os olhos abertos, olhava o teto, mas via pouco de lá, apesar de a luz estar apagada, estava com o início de uma cegueira sem explicação. Sentia muitas dores quando estava de pé. Sentia também a presença das larvas andando por baixo de sua pele enquanto se alimentavam de seu corpo.

A cada estágio da decomposição a dor causada era descomunal, arrancando gritos desesperados e urros de fúria. Os médicos não tinham o que fazer e optaram por mantê-la longe dos demais detentos, tendo contato apenas com funcionários sempre acompanhados e vestidos de forma adequada para lidar com ela.

Levantou-se subitamente da cama ao sentir uma presença no quarto. Forçou a visão e viu a silhueta de Otto na parede.

— Quem está aí? — perguntou e tateou a parede até chegar ao interruptor e acender a luz.

A mulher abriu a boca e arregalou os olhos ao ver aquela criatura horrenda na parede muito perto do teto. Sabia que se gritasse não seria ouvida por ninguém, pois aquilo era alguma idiotice de Alana, pensou e tentou ignorar a entidade. Voltou para a cama e ficou ali como se nada tivesse acontecido, tentando acalmar suas dores terríveis que aumentaram com o movimento brusco.

O demônio observou o estado da mulher e levantou a cabeça rapidamente ao ouvir um grito, sumiu dali sendo atraído para o apartamento de Valentina. Ao chegar viu o sorriso de Alana, que estava com a mulher içada pelo pescoço no alto da parede.

Eu posso só ir embora e deixá-la viva se você vier comigo e desfizer tudo o que fez ou posso ir adiante com isso. — ameaçou.

Cheio de fúria, Otto avançou na direção dela e foi contido por uma mão apenas. Alana soltou Valentina, que caiu no chão desacordada e desceu alguns andares do prédio segurando o demônio pelo pescoço e pela virilha até ultrapassar a camada terrestre chegando até um local escuro, fétido e muito quente.

Os gritos agudos de Otto proporcionavam um imenso prazer a Alana, que o jogou em restos de uma árvore morta com tronco de pontas afiadas. Com o corpo completamente perfurado pelos restos daquela árvore, Otto não se deu por vencido e resolveu usar o mesmo truque de antes para acabar com aquilo de vez.

Adeus, Alana! — disse e a pegou pelo pescoço puxando-a para um abraço mortal.

Alana foi puxada para cima, escapando rapidamente das quatro mãos diabólicas de Otto. Ana Maria orava desesperada, pois não vira a filha nas últimas horas.

Alana ficou ao lado da mãe. Mas seu lado obscuro sempre a atraía para perto de alguém que aparecia morto ou simplesmente carregando um grande trauma.

Inácia foi completamente isolada, depois de passar por exames médicos. A detenta atacou a zeladora plantonista, causou sua morte e deixou alguns dentes em seu pescoço.

Seus dedos coçavam muito e ao coçar arrancava partes junto com as unhas. Os gemidos roucos quase inaudíveis ainda ecoavam pelos corredores.

Sem acreditar no estado da amante, o enfermeiro entrou no quarto e viu a mulher, resolveu apenas fazer seu trabalho. Mesmo vestido de forma adequada e seguindo as recomendações dos seus superiores, ele ultrapassou os limites e chegou perto da detenta. Ardilosa, Inácia fingiu inércia e o esperou se aproximar o suficiente para conseguir puxá-lo pela roupa e atacá-lo.

O homem foi encontrado com a carótida exposta, já sem vida. A mordida no pescoço, foi fatal. A condenada foi amarrada na cama para não atacar mais ninguém.

Alana visitou a assassina e mostrou um sorriso vitorioso. Deixando-a fora de si.

Tomada por um grande ódio e força fora do comum, Inácia ­– cadavérica, de pele mumificada, de dentes expostos e olhos cinzentos – se levantou da cama subitamente se livrando de suas amarras.

Alana abriu um sorriso de satisfação, enquanto Inácia anunciava sua fúria com um grito pavoroso.

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