Um momento difícil ♡ Capítulo 17
— Sério? A noite de vocês foi muito interessante e teve muita comida. A festa boa é assim! — Alex falou animado, esperando mais detalhes sobre as comidas. — Poderíamos ter ido de penetra.
O garoto suspirava, encarando o vidro à nossa frente.
— Sim, tudo exatamente assim, e tinha salgadinhos mexicanos, uma delícia. — Sinto um sorriso surgir em meus lábios. — Com uma pimenta doce... A noite foi magica, foi tão boa e... — Expliquei, ainda impressionada.
Com o milk-shake no final, o doce excessivo da cobertura me causava arrepios; com certeza, comidas salgadas são as melhores.
— Vejamos, você está feliz e sorrindo mostrando os dentes. Ora, Joanne, isso é uma coisa muito boa, o que mais aconteceu? — Ele parecia estar rindo da minha cara.
—Vou contar...
Apesar da dose alta de risadas, sei que posso acreditar que o Alex está feliz com minhas barreiras derrubadas. Após alguns dias da noite de gala, minha rotina voltou ao normal: padaria, curso e fofoca com meus amigos. Hoje, Alex me aguardou na porta da galeria, segundo ele, estava com muita saudade de sua melhor amiga e precisava me ver com urgência. Alice viajou novamente às pressas e me fez contar tudo por telefone na mesma noite quando cheguei em casa. Sinto sua falta, mas seu pai não dá moleza, diz que ela não pode ficar parada antes da faculdade.
O dia está ensolarado e frio, o vento brando balança as árvores lentamente e a brisa leva pequenas folhas secas para longe. Sentados no Bell's , esperávamos nossa comida com ansiedade. Ele aparenta estar feliz por meus momentos com Gustavo e pretende me contar tudo que houve entre ele e Alice nas noites atrás.
— Ei eu já falei tudo e você... Quando vai começar a falar? — Encarei seus olhos verdes brilhantes, dispersos.
Ele devorava seu cookie com gotas coloridas sem pressa, uma das suas comidas preferidas no mundo. Nada o fazia parar de comer, nada.
— Preciso comer para poder falar qualquer coisa. E hoje será um dia totalmente nosso? — Ele sorriu, e pensei como negar algo a essa carinha doce.
Ele abaixou a cabeça, deglutiu seu suco e pegou minha mão, massageando-a.
— Sabe que ninguém vai ter seu lugar na minha vida, não é? — Sussurrei. — Serei sempre sua pessoa... — Completei, apertando sua mão, que era muito maior que a minha.
Alex consentiu, sem parecer estar abalado.
— Eu sei, ficar dias longe de você é estranho, mas sei que está com o Gustavo. Ou ficando com ele, sei lá.— Revirei os olhos, fazendo-o sorrir. — Se não está agora, vai ficar. É nítido como vocês se olham, ninguém é bobo. Conversei com ele e quero que se dê uma chance de ser feliz o quanto antes, é serio. — Sua declaração me fez sorrir.
A cada dia que passa, torna-se inegável que o Baker está mexendo comigo, por mais que eu tenha lutado contra isso. Basicamente, está tudo fora de controle.
— Não importa com quem eu estou, não importa o dia que não nos veremos. Você está no pacote e fim. — Sussurrei, fazendo-o sorrir.
Nossas tortas chegaram, macias e doces. Melhores da vida, mesmo precisando de um litro de água após essa refeição, valia a pena. Senti as palavras do Alex com o coração, e também senti o seu receio em me ter longe.
Encaro a paisagem à frente do vidro e lembro-me da noite de gala. Faz dias que não saem da minha cabeça todas as palavras e gestos, logo um Mustang preto passa a toda velocidade e, por um momento, penso ser o imbecil correndo, mas segundo ele, um carro daquele porte precisa de cuidados nas rodas.
Quase todas as vezes que estamos juntos, ele entra em assunto de carros, finjo entender tudo, mesmo não sabendo nada do que ele fala.
— Podemos ir para minha casa ver um filme? — Alex fala, me tirando dos pensamentos distantes. — Meu avô está melhor dos ossos...
O Sr. James passou um tempo com problemas nos ossos e ficou impossibilitado de trabalhar ou fazer quase todas as atividades. Mesmo sendo um idoso muito saudável e ativo, a idade chega para todos, o que nos deu preocupações durante semanas.
— Vamos sim, acaba logo sua comida. Olha as fotos que tirei hoje na aula, como nunca usei as sombras assim? — Entreguei minha câmera nas mãos sujas de bolo do Alex. — Não suja a câmera, imundo! — Sussurrei, fazendo-o me encarar.
Uma das nossas missões nas aulas é captar paisagens e pessoas. Como quase ninguém permite tirar fotos suas, resolvemos usar nossos parceiros, e foi o ideal. Peat é muito paciente e me ajuda bastante, visto que já tem experiência na área.
— Quem é esse japonês? Os olhos dele são bonitos, e por que tem fotos dele? — Alex, intrigado, passa as fotos devagar e me encara fixamente.
— Tailandês, ele é descendente de tailandês e ele se chama Peat é aquele meu amigo do curso, você o conheceu no lago. Ele tira fotos minhas e eu dele, para praticar. Ele é lindo, não é? — Declarei por fim, fazendo-o rir.
— Ele é bonito, mas não sabia que achava os asiáticos bonitos, mas me perdi nos seus gostos... Está até saindo com um dos intocáveis do colégio. — Alex murmurou, mas ainda assim escutei.
Nunca sei se ele vai ou não com a cara do Baker; é contraditório como sempre.
— Vamos, levanta. Para casa agora, temos algo para fazer e você está começando com implicância novamente. — Puxei-o pelo braço e ele levantou-se com dificuldade, sendo arrastado por mim. — Facilita, Alexander.
Arrastando-o, ele tentava resistir.
— POR FAVOR, NÃO, NÃO QUERO. — Alex gritava, fazendo com que todo o ambiente nos olhasse.
Mandei sorrisos a algumas pessoas que nos encaravam com julgamento, e Bell sorriu em nossa direção, afinal, nos conhece há anos.
— Cala a boca. — Apertei seu braço com toda a força que consegui, sem causar dor. — Que vergonha, olha isso. — Suas risadas fizeram com que eu lhe desse alguns tapas na cabeça.
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Andando pelas ruas arborizadas, conversávamos sobre a noite com a Alice. Sua expressão não era muito animada, o que me deixava triste.
— Peguei-a em casa e nós saímos... Fomos até a galeria, estava um clima muito bom e leve. Comemos, rimos, brincamos e até rolou uns momentos românticos. — Alex suspirou e balançou a cabeça negativamente.
Se tudo estava bem, onde deu errado? — Apertei meus olhos, disfarçando minha decepção.
— E... O que houve afinal? Vocês sempre se deram tão bem, eu achei que... Sabe? — Agarrei seu braço com euforia e continuamos a andar sob o sol de fim de tarde.
Alex contou mais sobre como a conheceu, sobre ela ser uma menina que já passou por muitas coisas e permanece firme na vida.
— Nós íamos nos beijando... Mas ela recuou e pediu desculpas. Depois as palavras sumiram, continuamos olhando as artes como se nada tivesse quase acontecido. — Um sorriso no canto de sua boca tentou sair, mas tornou-se sério novamente. —E acho que não me sinto tão confortável, ela era a pessoa que meu amigo amava, ele não iria me perdoar. Devemos está tentando algo que não vai acontecer...
Essa devia ser a parte em que eu falaria algo para ajudar, mas não sei o que dizer. A única razão que vejo seria os sentimentos dela em relação ao meu irmão, uma cicatriz em seu peito que nunca fechou. A vida poderia ser igual àqueles filmes, assim saberíamos que tudo ficaria bem no final. Às vezes, eu só quero que as pessoas sejam felizes, mas quem somos nós para julgar as dores alheias? Quero que tudo fique bem e que ambos não sofram.
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Na voz de Alex:
Senti a preocupação na voz da Anne e me arrependi de ter sido tão sincero naquela hora. Ela nos deu os convites com a melhor das intenções, mas não foi como eu imaginei. Talvez, no fundo, eu soubesse que não seria fácil para nós.
— Você gosta do Gustavo? — Perguntei, fazendo-a me encarar com rapidez.
Joanne me encarou, e desviou o olhar.
— Eu não ouso pensar nisso agora, amigo. — Sua resposta seca não me deu espaço para perguntar mais nada. — Estou assumindo o risco de ser magoada e o pior é que estou muito bem com isso.
A encarei confuso, então ela gostava mesmo dele?
— Entendi, eu acho. — Coloquei um fim no assunto e seguimos quase o caminho todo em um completo silêncio. — Se está bem, não dará errado.
Caminhamos em silêncio até chegarmos em minha casa e logo meus avós me chamaram para conversar. Pelo olhar deles, não devia ser nada bom, então Joanne subiu para o quarto para escolher o filme, contudo fiquei a sós com meus avós na sala.
— Meu amor, sabemos que você está ocupado, mas precisamos conversar com você. — Minha avó se sentou ao meu lado, com um tom calmo.
Ela, segurando sua cesta de crochê, começou a me explicar sobre as medidas judiciais relacionadas ao acidente dos meus pais, um evento que aconteceu quando eu era apenas uma criança. Ao longo dos anos, eles me falaram sobre isso, mas a dor de ouvir nunca me deixou saber tudo.
— Filho, a empresa do jatinho em que seus pais estavam finalmente assumiu a responsabilidade e só agora após anos, vai pagar uma indenização às famílias das vítimas após os culpados serem responsabilizados.
Meu mundo congelou ao ouvir aquilo, eu sabia que um dia isso aconteceria, mas não tinha mais esperanças após tantos anos. Meus ombros caíram e encarei o chão com as mãos na cabeça.
— Vô, sinceramente, para que eu quero dinheiro? Não me interessa... Perdi meus pais por falta de manutenção do avião. Isso não tem volta, sinceramente... Não quero um dólar. — Minha voz tremia. — Pode dizer que, ao menos, que meus pais voltem vivos por essa porta; outra coisa eu recuso.
Senti minha avó acariciar minhas costas de forma lenta e carinhosa. Queria poder agir de uma forma mais calma para que eles não sentissem a dor que eu estava sentindo.
— Sabíamos que você diria isso e concordamos com você, mas não funciona assim e esse dinheiro é para o seu futuro, e talvez até um dia você possa ajudar pessoas que precisam. Pense sobre isso e precisamos que venha conosco até Boston para assinar os papéis... — Sussurrou meu avô, e eu engoli seco, com a cabeça doendo. — Ninguém sabe como você se sente e não deixarei ninguém te julgar.
Respirei fundo, consentindo.
— Tudo bem, pensarei a respeito e agora só preciso... — Apontei para cima e ele assentiu. — Subir...
Levantei-me do sofá, sem paciência. Viajar para o outro lado do país para resolver questões que não quero enfrentar e provavelmente encontrar parte da minha família que não desejo ver. Meus avós são por parte do meu falecido pai; a família da minha mãe mora em algum lugar do país que não sei. Após a morte deles, nunca recebi um telefonema dos meus outros avós ou tios. Realmente, vê-los é a última coisa que quero.
— Vamos te avisar o dia, não se preocupe. Você já sofreu o bastante... — Disse minha avó, encerrando o assunto.
Subi para o quarto quase correndo. Minha cabeça girava e me sentia pesado. Joanne, entretida com um jogo no celular, não percebeu minha entrada.
— Eu escutei, está tudo bem. Deita aí, respira e não chora. — Ela falou e pulei na cama, fervendo em raiva.
Um misto de fúria e revolta me invadiu, e senti vontade de gritar com o rosto completamente escondido pelo travesseiro.
— Acham que podem... pagar e ficará tudo bem? — Sussurrei, com a voz abafada.
Joanne deitou ao meu lado e me abraçou.
— Não podem, estou aqui com você... Assim que ficar calmo, eu vou para casa e você pensa com calma em tudo. Sei que precisa de um momento sozinho, mas ainda quer ver o filme? — Joanne deu leves tapinhas em minhas costas e eu me sentei de imediato, logo consentindo.
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Na voz de Joanne:
Consegui acalmá-lo antes que o choro começasse. Os pais do Alex trabalharam para uma grande empresa multinacional por muito tempo, e anos atrás, por falta de manutenção, o jatinho em que estavam acabou caindo, resultando em um acidente fatal. A empresa negou a culpa por anos, e o processo ficou rodando de mão em mão, provavelmente até esta semana.
Todos nós sempre sofremos com algumas perdas, mas a perda dele foi total. Essa é a maior marca de sua vida, e vez ou outra ele desaba em choro e com o tempo construir táticas para acalma-lo, e a mais original de todas era mudar de assunto.
Coloquei um filme sobre um ninja, pois sei que ele adora, e olhos não saíam da tela do notebook.
— Esse ninja é mais lento que todos os que morreram, podia ter morrido agora. — Ele falou em voz baixa e apontou. — Olha isso, pula rápido cara! — Ele vibrou com uma cena lotadas de ninjas em cima de um arranha-céu.
— Não entendo a história, ele está lutando para proteger a princesa de quem? — Prendi meu cabelo, o que fez ele me olhar de canto.
— Ele está lutando contra a família da princesa, ninguém os apoia. — Explicou calmamente. — Mas na vida tem dessas, se ama alguém tem que lutar por ela. A vida não entrega nada de mão beijada, muito menos o amor. — Completou, fazendo eu dar de ombros.
Depois de uma notícia não muito boa, o filme o ajudou bastante a não pensar no assunto. Assistimos a um filme de um tipo de ação com romance, segundo o menino ao meu lado. Mesmo com minha cabeça distante, acompanhei o filme inteiro e discutimos sobre o final.
— Um final feliz era previsível, Alex, ele não ia lutar à toa e morrer no fim. — Ele parecia não muito surpreso com o filme, sua cara de tédio encarava a tela preta.
Alex bufou, negando.
— Isso é errado, porque nem sempre temos um final feliz. Às vezes vivemos uma relação boa que acaba e fim. — Disse ele, dando de ombros.
Ele tem razão.
— Eu sei, digo para mim mesma não romantizar, mas a pessoa fala como se mandasse no coração. Quer dizer, precisamos tentar ser felizes. Mesmo que o final não seja tão feliz assim, quem vai prever? — Declarei, fazendo ele bater palmas, empolgado.
Entre minhas explicações, percebi que ele estava sonolento, como era esperado. À noite, por emoções fortes, sei que ele perdeu o clima para o filme. Confesso que não seria tão forte como ele, passei as mãos em seus cabelos ondulados e o senti respirar fundo.
— Eu já vou, tudo bem? — Disse em tom baixo.
Alex consentiu, sorrindo em minha direção.
— Obrigado por vir, estava com saudade. — Alex me abraçou e beijou minha testa.— Você é a melhor, sério.
《♡》
Minha cabeça ecoou enquanto eu passava pela sala, eu encarei porta-retratos que revelavam uma família feliz. Os pais do Alex eram, de longe, as melhores pessoas que conheci. Estávamos com cerca de dez anos quando o trágico acidente aconteceu e chocou toda a cidade, o Alex nunca mais foi o mesmo após aquilo. Meu amigo tornou-se mais ríspido e fechado para o mundo, mas talvez com a chegada de novos amigos ele esteja melhorando isso.
Fechei a porta da casa com cuidado, e a brisa fria me fez arrepiar assim que eu sair da casa dos Ross. Meu celular vibrou, avisando sobre uma nova mensagem.
Desde aquela noite que não te vejo, saudades.
Uma mensagem de Gustavo me fez sorrir. Após alguns dias sem nos vermos, confesso também senti saudade.
Saudades também, já faz uns dias... Por que não foi entregar na padaria?
Meu chefe mudou a rota, senti vontade de jogar os sacos de café nele.
Minha risada foi instantânea. Às vezes, ele se deixa levar por seu jeito arisco e mimado.
Ainda não perdeu o costume de jogar coisas, via suas brigas na escola Gustavo.
Estou tentando mudar Joanne, mas as pessoas não facilitam em nada a minha vida.
A maioria de suas suspensões na escola era por conta de alguma coisa quebrada ou danificada.
Enquanto caminhava pela rua vazia e escura com passos rápidos até minha casa, um barulho estranho me fez olhar para todos os cantos de forma desconfiada. De longe, avistei um carro preto com os vidros fechados e sem ninguém por perto. Alguns metros depois, enquanto me aproximava de casa, senti uma mão puxar meu casaco por trás e meu corpo gelou de imediato.
— ME SOLTA! — Gritei assustada e golpeei a pessoa com meu cotovelo de forma rápida e brusca, empurrando-a para longe, logo senti minhas pernas tremerem e minhas mãos gelarem.
Gustavo caiu no chão e seu celular voou na grama ao lado. Meu golpe, combinado com impulso e medo, o machucou e logo o rapaz franziu a testa, admitindo dor, e apalpou a barriga ainda deitado no chão.
— Você é louco, como faz isso? Olha, essa rua escura. — O ajudei a levantar com dificuldade pelo seu peso e senti-me culpada. —Me desculpa, sério!
Franzindo a testa, ele parecia incomodado com a cotovelada e levantou sem buscar minha ajuda.
— Você é louca, que dor. Era pra ser uma cena de romance, mas quase fui assassinado. — Gustavo limpou sua roupa molhada e sentou-se no degrau em frente à minha porta.
Peguei seu celular, o limpei e o guardei no bolso do casaco. Ainda nervosa, sentei-me ao seu lado e ele ainda resmungava, massageando a barriga.
— Desculpa de novo, não conheci o carro. Aliás, esse não é seu carro. — Apontei para o carro e abaixei a cabeça, colando-a nos meus joelhos... se vergonha matasse, eu estaria morta.
Senti seu braço passar por minhas costas e ele me puxou para seu lado em um abraço. Em um gesto de carinho, depositou um beijo em meus cabelos e escutei sua risada seguida de um gemido de dor.
— Esse é meu carro, um dos. — Olhei-o sem acreditar, com naturalidade, ele sorriu.
Quantos carros o herdeiro do café tem? E para quê mais de um?
—Alguns, eu gosto de carros. — Ele sorriu, sem graça.
— Entendi, muitos carros. — Resmunguei.
Gustavo levantou a camisa sem se importar e observava o local da cotovelada, e eu preocupada acabei observando junto estrago que causei. Ele não tinha um abdômen totalmente sarado, mas tinha vestígios de que um dia já havia sido um dia, era bonito.
— Depois de encarar meu abdômen, pode pegar gelo para minha costela? Desculpa a visita sem avisar, gosto de andar à noite. —Gustavo sorriu, ainda segurando a camisa levantada.
O encarei, pasma.
— Encarar seu abdômen? Seu ego é realmente no céu, e nem tem tanto tanquinho assim. —Falei, encarando a rua e ele resmungou. — Não se desculpe pela visita, vamos entrar e eu pego gelo. Meus pais estão em casa, mas não tem problema, eu pego a bolsa de gelo e a gente vai para meu quarto. Apenas faça silêncio, ou vai ter que falar com meu pai. — Pego sua mão e o puxo, fazendo-o levantar contra sua vontade.
Com seus cabelos recém molhados pela chuva fina, a cor branca lhe caindo muito bem, ele vestia uma camisa branca com detalhes vermelhos e uma calça preta básica, e o menino sempre bem confiante, parecia não ser tão confiante assim para entrar na minha casa.
Ao entrarmos em minha casa, Gustavo passou o olhar por tudo e me seguiu até a cozinha, quase colado em mim.
— Vai ter que cuidar de mim, se responsabilize. — Ele sussurra com seus lábios rosados. —E tomara que seu pai não acorde, ficarei mais machucado.
O garoto de olhos castanhos se apoiou na ilha da cozinha e me seguiu com o olhar.
— Você não manda em mim, mas irei me responsabilizar, o gelo está aqui. Vamos ao quarto, é só passará isso e depois vai embora. — O fitei com o olhar mais sério que consegui, e ele deu de ombros, esticando o braço para que eu passasse à sua frente.
Subimos para meu humilde e pequeno quarto e passos silenciosos, entramos e logo Gustavo fechou a porta cuidadosamente, passando os olhos por todo o ambiente, se aproximando da minha parede de fotografias.
— Nossa, isso é... — Ele me olha e sorri, apontando para a foto em que ele está incluído, no lago. — Incrível. — Completou.
Merda, não era para ele ver isso.
— Obrigada, é legal mesmo. — Forço um sorriso e sento-me na cama, deixando-o ver tudo.
O garoto apontou para minha penteadeira arrumada e sorriu em minha direção, me deixando confusa.
— Aquela rosa murcha ali na água ainda é a que eu te dei? — Meu rosto corou, afirmando sua pergunta. — Está vermelha, é sim.
Gustavo se aproximou e sentou ao meu lado e senti minha garganta seca ao deglutir; na pior das horas, prevejo minha crise de ansiedade sem explicação alguma. Sem porque ou quando, ela chega em aviso prévio, me deixando sem estribeiras. Eu sentei em minha cama e o rapaz que percebeu minha fisionomia, sentou ao meu lado.
— Você está estranha, o que houve? — Diz Gustavo em tom baixo, fazendo círculos com o polegar em minha perna. — Não quero incomodar, sabe...
Meus sentimentos bagunçados, pensamento acelerado. Minhas mãos suando, meu coração frenético, a sensação de um liquidificador em meu estômago e um martelo em minha mente, era assim que me sentia.
— Nada, Gustavo, está tudo bem. — Aponto a bolsa de gelo branca em sua direção, e ele pega sem entender minha reação mais fria que o próprio gelo.
Ele não podia ver aquilo, não podia passar aquele momento tão turbulento em sua companhia. Mas a verdade é que meus sentimentos estão bagunçados, o medo me invade a cada momento que eu imagino algo dando errado. Ao olhar seu rosto, sinto-me uma presa fácil, uma presa gostando de estar ali mesmo sabendo que tudo pode ser uma armadilha.
Gustavo brincava com as pulseiras de couro, enquanto a bolsa de gelo dentro de sua roupa aliviava sua dor. O silêncio tomava conta do pequeno quarto, somente com nossas respirações.
— Gustavo, não dá. Vamos parar com isso agora, para o nosso bem. Isso aqui — apontei para nós dois —Isso não pode acontecer, não passará de uma amizade.
Buscando ar, eu o encarava. Nunca o vi me olhar daquela forma, uma interrogação presente em sua face me deixava arrasada, e meu desespero de tentar segurar algo que não conseguiria se tornava maior.
— Joanne, o que tá acontecendo? Até outra noite estava tudo bem, tudo estava acontecendo aos poucos... — Ele tirou a bolsa de gelo e a colocou na cama.
Seus olhos revelavam a frustração e angústia de não saber o que estava acontecendo.
— Para pra pensar, somos diferentes. De mundos diferentes, pessoas diferentes. Isso nunca dará certo, tenho milhões de defeitos. Sou sem graça, tenho crises de ansiedade após perder meu irmão, sou tímida, chata e muitas coisas. Isso não bate, não acontece, não dá. Eu vou sofrer, estou sen... — Antes que pudesse terminar de falar, senti seus braços ao redor do meu corpo.
Minhas lágrimas escorreram lentamente e seus braços me acolhiam, por mais que eu lutasse para me soltar. Não sabia o que se passava em sua mente, seus braços cada vez mais apertados me faziam tremer.
— Não me importo com todas as diferenças. Não me importo com pessoas olhando, falando ou achando. Eu fui um imbecil no passado, e mudei porque quis, não pra me aproximar de você. Por você, eu posso continuar mudando, mudo até a rotação da Terra. — Ele falou baixo, me fazendo suspirar. — Isso é uma crise de ansiedade? Isso agora, é uma crise?
Suas palavras me faziam soluçar. O medo do que estava por vir me invadia, quando sentimentos novos me invadem, as crises chegam.
— Sim, e você não precisa ter pena. Tenho crises de ansiedade desde que meu irmão morreu, é uma luta constante. Sou uma menina diferente de todas as que você já teve, por favor, é melhor parar agora, Gustavo. — Sinto meu coração apertado, meu estômago embrulhado, e minhas mãos o seguram.
Ele me soltou, arrumou meus cabelos e segurou meu rosto.
— Olha pra mim, Joanne. — Seu tom ríspido e sério me faz o encarar. Ele enxugou minhas lágrimas com sua mão macia e fechou mais meu casaco. — Segure as lágrimas por dois minutos apenas e me ouça!— Ele gesticulou com dois dedos em minha direção, e tentei.
Por que ele está fazendo isso? A cada atitude sua, meu eu se prende a ele de uma forma brutal.
— Gustavo, você não entende... — Sussurrei e seu olhar me faz pausar as palavras.
Ele segurava minhas bochechas com delicadeza e seus olhos escuros pareciam invadir minha alma.
— Eu sei que tem defeitos e problemas, sei que é diferente, doida e bate nas pessoas pela rua. Eu sei que tem medo, tenho também. Tenho medo de muita coisa, choro e quebro as coisas, brigo comigo mesmo e sou um completo confuso em muitos sentidos. — Suas palavras desenfreadas me fizeram pausar o choro. —Mas eu não sou confuso quando o assunto é você.
Gustavo falava sério, sem pausas e respirava fundo.
— E se nós estivermos nos enganando? — Perguntei, o fazendo sorrir.
— Sinceramente, a essa altura não me importo de ser enganado por você, por mais louco que seja falar isso. — Soltei uma tapa em sua perna, fazendo-o gemer. — Podemos ir com calma, tá bom? Se não quiser, não falo com seu pai.
Talvez tenha sido isso que me causou medo, estão acontecendo coisas pela primeira vez de uma vez só. O medo me adentra e não há nada que o faça ir embora, mas por algum motivo, aquele menino me fez acalmar.
— Não fugiu, gosta do perigo por acaso? — Gustavo me abraçou novamente, e me senti segura ao apoiar minha cabeça em seu ombro largo.
— Nunca vou fugir, e nem te deixar fugir. — O soltei e levantei sua blusa, colocando o gelo novamente, fazendo-o sorrir. — Tenho partes sensíveis, cuidado. — O olhei de canto, fazendo negar. — Apenas cócegas.
Gustavo me fez sorrir após algumas lagrimas derramadas, meu coração estava voltando os seus batimentos normais.
— Essas crises acontecem quando menos espero. Minha mente entra em pane, acho que fiquei muito traumatizada com coisas acontecendo inesperadamente, não sei. — expliquei.
Ser encarada por ele com meu rosto inchado e vermelho era vergonhoso.
— Ninguém está correndo aqui, e hoje não quis te assustar. Vamos trabalhar em suas inseguranças; afinal, eu sou segurança bonitão e sexy te protegendo. — Minha risada foi inevitável.
Levantei-me da cama e ele me seguiu com os olhos.
—Vou ao banheiro, não vá embora ou bisbilhote por ai.
Entrei no banheiro sem esperar uma resposta dele e encarei o espelho. Meu reflexo mostrava um rosto vermelho e olhos inchados, como previ. Joguei água gelada em meu rosto e respirei o mais fundo que consegui.
— Estou bem, ansiedade não é mais forte que eu. Não vai me dominar, não hoje. — Repeti encarando meu reflexo, já mais calma.
Prendi meu cabelo em um coque e coloquei uma calça xadrez vermelha de moletom com uma blusa do Guns N' Roses. Ao sair do banheiro, vejo Gustavo sentado em minha cama com as pernas esticadas por cima do edredom, encarando fixamente o celular e bem a vontade.
— Ficou bem à vontade, Baker? Suas meias estão limpas? — Apontei para suas meias brancas, e ele levantou os pés.
O garoto levantou-se, sentando na cama, e me analisou dos pés à cabeça.
— Nossa, quando achei que não podia ficar mais bonita, você aparece de pijama dessa banda maravilhosa. — Gustavo bateu palmas silenciosas e me seguiu com o olhar. — Minhas meias estão limpas, está melhor?
Como uma pessoa tagarela, ele fala tudo muito rápido e faz muitas perguntas de uma única vez.
— Você sempre diz isso, fingido. Estou melhor, como está a costela? — Sentei-me ao seu lado e encostei na cabeceira da cama também.
Nem acredito que Gustavo Baker está à vontade no meu quarto.
— Ela está bem, eu também. Gostei daqui, é aconchegante e tem a sua cara. — Apontou para pequenas luzes piscando ao redor da parede de fotografias. — Está melhor mesmo?
Então, meu quarto é bonito ou bagunçado?
— Obrigada, e você já me perguntou isso. Eu estou melhor... — Seu braço passou por trás do meu pescoço e, em um movimento único, ele me puxou, fazendo-me colar em seu corpo quente.
Com a cabeça em seu peito, sentia-me sem jeito. Minha orelha rente ao seu peito me deixava ouvir as batidas do meu coração, que há pouco tempo descobri que ele tinha.
— Respira fundo e relaxe. Acabei de pesquisar em um site de psicologia, lá diz que respirar fundo ajuda nas crises. Você também pode meditar e ouvir música que goste, ou deitar no peito de um bonitão! — Senti sua mão acariciar minha cabeça lentamente.
Ele me fez sorrir novamente e nem pude discordar de nada, ele havia me deixado surpresa por sua atitude de ir procurar na internet como me ajudar. Ele parece saber o que se passa em minha mente antes que eu possa falar.
— Obrigada por isso, por pesquisar e me fazer companhia. — Sussurrei, sem o encarar, levantando-me.
— Quietinha, apoia a cabeça aqui. Eu não mordo, a menos que você peça. — Chutei sua perna, fazendo-o soltar uma risada engraçada.
Quem pede para ser mordido? Logo me deitei novamente, e as batidas do seu coração faziam acalmar o meu.
— Você é mandão demais, corta essa. Estou encostada porque eu quero mesmo, se eu quiser também te jogo da janela. — Sua risada rouca fez eco no quarto e eu o encarei seriamente.
— Ri alto demais?
Sim, você riu. Mas, gosto da sua risada.
— Não, pode rir. — Falei, sem encará-lo. —O quarto dos meus pais é no final do corredor, eles não escutam nada.
Gustavo consentiu, e aparecia mais tranquilo.
— Não duvido que me jogue, mas me encara de novo pra você ver o que acontece. — Levantei a cabeça rapidamente para o encarar e senti seus lábios quentes tocarem os meus, em seguida, ele tocou minha testa de modo carinhoso.
Seus olhos encontram os meus, um sorriso brotou em meus lábios, o fazendo sorrir também. O menino de cabelos castanhos puxou o edredom, colocou por cima das minhas pernas ficando de fora. Encostada em seu peito, era um lugar novo para mim e me sentia.
O sinto lendo minhas cicatrizes, e entrando em meu coração.
《♡》
Um capítulos com coisas tensas e momentos difíceis em?
Mas o que seria de nós sem momentos ruins para valorizamos os bons.
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