Três meses + tarde ♡ Capitulo 68

Olhar para o céu, vê-lo azul, límpido e brilhante. Fechar os olhos e sentir o vento tocar o rosto, o calor do sol aquecer a pele, e ao fundo ouvir o canto suave de alguns pássaros. Deitada na grama, sobre uma toalha clara, eu sentia meus sentidos despertos e uma paz profunda. Pela primeira vez em muito tempo, minha mente se permitia um descanso genuíno, longe de problemas e de soluções, apenas se aquietando.

Fazendo uma retrospectiva, percebo que o final do ano está a poucos dias de distância. Lembro que, ao terminar o colégio, prometi a mim mesma que tiraria um ano sabático, um ano de descanso. Sabe o que não aconteceu neste ano? Descanso. Em outros tempos, ou se eu ainda fosse a mesma de antes, talvez estivesse me lamentando agora. Teria reclamado por não ter conseguido descansar, por Harvard não ter sido uma opção, pela cicatriz no meu ombro, por estar indo para uma faculdade diferente dos meus amigos ou por qualquer outra pequena frustração. Confesso que nunca fui a pessoa mais otimista do mundo; na verdade, eu não era otimista.

Virei a cabeça e olhei para a mesa de madeira maciça dos Baker, cheia de pessoas e repleta de comida.

Tudo isso de fato aconteceu, mas não houve lamento — estou feliz. Olhando para trás, vejo uma vida antes vazia de emoções, monótona e cansativa. Agora estamos quase no Natal novamente, mais precisamente no Dia de Ação de Graças, e algumas coisas não saíram como planejado. A começar pelo parto da minha mãe, que foi adiantado, fazendo com que meus irmãos nascessem com oito meses. No fim, ficou tudo bem.

Desde o nascimento deles, passaram-se três meses, e o julgamento de Augustos foi adiado várias vezes devido à complexidade dos casos e das provas encontradas — graças ao pai do ruivo e ao próprio réu, que frequentemente se contradizia. Afinal, havia um crime no passado e muitos no presente. O carro em que Augustos estava, no acidente com meu irmão, foi levado a um ferro-velho, e a polícia o procurou incessantemente, na esperança de encontrar algo que ajudasse no processo, e encontraram o carro, mas ainda não sabem se isso contribuirá em algo.

Mesmo tentando não ocupar minha mente com essas questões, a pedido da minha mãe, ouvi algumas coisas. Um crime não é apenas um julgamento e uma sentença, é um processo longo, com idas e vindas ao tribunal, advogados e muita investigação. O caso de Augustos precisou ser analisado e dividido em partes diversas vezes. Mas, nesses três meses, também aconteceram coisas interessantes e até divertidas. 

Um ponto importante foi a retirada da minha tipoia, passei exatos sessenta dias com o braço imobilizado e precisarei de avaliações quatro vezes ao ano, por um ano. Agora consigo mover o braço normalmente, embora ainda sem muita força, e ganhei uma cicatriz no ombro — uma marca que não pretendo cobrir.

Após o nascimento dos gêmeos, passamos semanas recebendo visitas. Eles saíram do hospital no tempo certo, sem problemas, e rapidamente se tornaram o centro das atenções. Meus amigos e Gustavo se apegavam cada vez mais aos bebês, que já estavam tão acostumados com nossos braços que quase não usavam os berços. Nos fins de semana, minha casa ficava cheia, e minha mãe podia finalmente descansar enquanto eu e meus amigos cuidávamos dos pequenos. Levávamos eles para tomar banho de sol, passeávamos com os carrinhos e, a cada mês, eu ganhava a missão de fazer um bolo para comemorar.

Entre esses momentos fofos, também tivemos Emma e Alex, que, após muita ansiedade, finalmente receberam suas cartas de aceitação nas faculdades. Iriam juntos em busca de seus sonhos e objetivos, com o apoio das famílias. Embora diferentes e, por vezes, de humores opostos, o jeito tranquilo de Alex acalmava a gestante Emma, que, mesmo nas brigas, acabava sorrindo nos braços dele. Com nossas cartas em mãos, todos nos matriculamos em nossas faculdades. Fui com Gustavo até Tulane, para a alegria de seu pai, conhecemos o campus, nossas salas e nos demos conta de que aquele lugar seria nossa casa pelos próximos quatro anos — e, depois disso, mais alguns na residência, como sempre sonhamos. Claro, não fomos sozinhos, pois somos um grupo inseparável de cinco, explorando cada novo passo juntos.

Viajamos para Nova Orleans, onde nos encantamos com a cidade, suas flores, sua música e uma cultura diferente e vibrante. Depois, fomos para Boston, onde Emma e Alex estudariam, ainda que em faculdades distintas, Emma entraria após dar à luz a Hannah, com o benefício da licença-maternidade que lhe garantiria tempo para se adaptar à nova fase.

É claro que aproveitamos a visita a Boston para assistir a um jogo dos Celtics contra os Lakers — um sonho realizado ao lado dos meus amigos. Mesmo sendo torcedora dos Lakers, todos nos vestimos de verde e seguramos grandes trevos de quatro folhas em homenagem ao meu irmão, que amava o time. Foi engraçado torcer para os Lakers e os Celtics ao mesmo tempo, comemorando cada cesta dos dois lados. — Sorri, de olhos fechados.

Nas últimas semanas, fizemos várias viagens, para o desespero de Nicholas Baker, que acabou perdendo uma reunião importante na França porque não chegamos a tempo com seu avião. E também para o meu bolso, confesso! Gastei minhas economias sem pena, e por um tempo foi bom me sentir rica.

Por fim, fomos para Nova York, onde passamos alguns dias a mais. Foi um dos lugares mais lindos que já visitei, só perdendo para Aspen... Vivi um verdadeiro sonho ao comemorar meu aniversário lá com meus amigos, tiramos fotos lindas, ganhei um bolo incrível, experimentamos comidas de rua, visitamos várias lojas e brindamos juntos. E naquela viagem algo aconteceu,  meio da Times Square, Gustavo me fez uma surpresa: ele me presenteou com um anel de compromisso, enquanto um músico, por coincidência (ou destino), tocava nossa música ao violino, foi um dos momentos mais lindos da minha vida. Meu aniversário de dezoito anos entrou para a história, e nossos amigos foram cúmplices, ajudando a fazer o público ao nosso redor aplaudir. 

Eu estava exatamente onde queria estar, com as pessoas certas ao meu lado. — Levantei a mão, admirando o anel simples de prata contra o céu. Era o mesmo anel que Nicholas deu a Madeline quando começaram a namorar, o que tornava o gesto ainda mais significativo e carregado de responsabilidade.

E  claro que acompanhamos Alice na inscrição para a Columbia, seus desenhos foram muito elogiados, e ela ganhou uma bolsa integral, incluindo moradia no campus que ela abraçou com entusiasmo. Visitamos seu quarto e, pela primeira vez, vi em seus olhos uma felicidade plena, o que me deixou genuinamente emocionada. Alice era talentosa e criativa, e seu trabalho, finalmente, estava sendo reconhecido. Graças aos céus, pude ver seu pai se orgulhando, gabando-se dela, e pela primeira vez vi um sorriso verdadeiro em seu rosto.

Nossa viagem ao Brasil precisou ser adiada para depois do Natal, fizemos nossa inscrição nas faculdades no outono, como as cartas instruíam, mas as aulas só começariam na primavera, no início do ano. Decidimos, todos juntos, que só viajaríamos após o julgamento de Augustus, mas, como ele foi adiado, nossas férias acabaram ficando mais curtas. Ainda assim, sentimos que isso nos permitiria encerrar um ciclo importante e abrir espaço para um novo começo.

Nesses três meses, nos fortalecemos ainda mais como família e como indivíduos. A mãe da Emma, aos poucos, se reaproximava da filha durante os fins de semana, e juntas organizavam a mudança para Boston. O plano era que Hannah ficaria em casa com a vovó Ross enquanto Emma estivesse nas aulas, e elas iam acertando todos os detalhes, um passo de cada vez. Enquanto isso, meus pais tiveram uma longa conversa com os pais de Gustavo sobre a ideia de morarmos juntos em New Orleans. A decisão final foi deixada com eles, já que, sendo ainda tão jovens, entendemos que a moradia era só um detalhe.

Hoje era um dia especial para todos nós: Dia de Ação de Graças, e estávamos reunidos. Nicholas havia transformado o jardim, com uma enorme mesa de madeira e uma área de churrasco que meu pai ajudou a montar. A piscina estava repleta de boias e itens coloridos, e finalmente estávamos prestes a ter uma festa na piscina. Mary, que aprendeu com minha mãe a organizar duas festas em um dia, planejou o almoço de Ação de Graças para a tarde, enquanto a festa na piscina se desenrolava pela manhã. Meus irmãos dormiam tranquilamente em seus carrinhos, minha mãe, ao lado de Alice, tentava aprender o segredo de um bom churrasco brasileiro, o que conquistou todos — era difícil parar de comer.

Emma, exibindo orgulhosamente a barriguinha de seis meses, tomava sol em uma espreguiçadeira à beira da piscina, enquanto seus irmãos se divertiam na água com Alex. Amy, que também foi convidada, estava sentada à mesa e com seu jeito calmo e sorriso gentil, ela cativou a todos, especialmente depois de ter cuidado tão bem de Andrew e de mim durante a recuperação. 

O jardim dos Baker estava alegre, barulhento e dominado pelo aroma tentador de carne assada.

Gustavo se aproximou e se deitou ao meu lado, em um momento de simplicidade que fugia ao seu habitual ele usava roupas leves, pés descalços e cabelo levemente bagunçado, estava diferente, mais descontraído. Ele deitou bem próximo e deu um leve tapinha em seu braço, me convidando a deitar apoiada nele.

— Por que está aqui sozinha? — Ele perguntou enquanto olhávamos para o céu, e sorri em resposta. — Você tem sorrido mais, é bom ver isso — ele sussurrou, virando o rosto para me encarar.

Levantei um pouco minha saída de banho e percebi que ele olhou para minha barriga.

— Comi demais, a Alice fez tantas comidas boas que tive que deitar aqui um pouco antes de entrar na piscina — comentei, abaixando a roupa novamente. 

Gustavo levantou a mão em direção ao céu, e olhei para o anel em seu dedo, combinando com o meu.

— Seu pai disse algo? Comigo ele não falou nada, mas estamos prestes a completar um ano juntos e ele confia em mim, e nossas alianças são lindas.

Ele nunca admitiria, mas suspeito que ele quis que usássemos alianças porque viu Emma e Alex fazendo o mesmo. Não me importava o motivo; eu amei a ideia. Nunca tinha usado um anel de compromisso antes, e isso me fazia sentir especial — além de finalmente parar com as pessoas flertando com Gustavo bem na minha frente.

— Meu pai pediu minha mãe em casamento quando ela tinha dezesseis. Ele, mais do que ninguém, entende que quando amamos alguém, o tempo, a idade, todas essas coisas são detalhes. E não vamos casar, são alianças de compromisso... — comentei, esticando minha mão ao lado da dele e observando como sua mão era grande comparada à minha.

— Concordo plenamente — ele disse, me encarando com aquele sorriso calmo. — Minha casa é realmente linda... — brincou, enquanto eu ajeitava alguns fios de sua sobrancelha.

— Claro que é, nem imagino o valor de uma casa assim — provoquei, rindo junto com ele.

— O valor dela não pode ser calculado... — ele respondeu, tentando conter o riso.

Ele me puxou pela cintura, nos aproximando ainda mais.

— Toda casa tem um valor, mesmo que seja pequena — dei de ombros, brincando, e ele balançou a cabeça, rindo enquanto olhava para mim com um olhar terno.

— Você é minha casa, pequena menina lerda! — Gustavo murmurou, me puxando para um abraço apertado.  

Sempre que ele dizia coisas assim, era como se o mundo ao nosso redor desaparecesse. Dizem que palavras são apenas palavras, mas as dele sempre aqueciam meu coração e me faziam sentir segura. Já fazia muito tempo desde a última vez que me senti sozinha, ou que tive uma crise de ansiedade... talvez ele quem realmente fosse minha casa.

— Com certeza sou mais cara que essa mansão... — respondi baixinho, sorrindo.

De repente, Alex berrou nosso nome de longe, várias e várias vezes, até minha mãe ameaçar que ele ficaria sem sobremesa se acordasse os bebês. Gustavo se levantou, puxando minha mão com um sorriso, nos guiando até a piscina, onde Alex e a namorada nadavam juntos. Passamos a manhã brincando na água, jogando vôlei de piscina e futebol na grama, como crianças felizes. Emma, mesmo grávida, não ficava de fora. Ela participava de tudo que não a machucasse, mostrando cada vez mais seu jeito divertido e, de vez em quando, usando sua vaidade para nos ensinar coisas a mim e a Alice.

— Vão vir ou não? — Alex chamou, exibindo o abdômen trincado como se fosse um troféu.

Eles queriam nossa companhia, assim como havíamos feito durante toda a manhã.

— Já vamos, deixa a Moore terminar ali — apontei para Alice, que mexia algo com uma colher de madeira, concentrada.

Alex voltou a abraçar Emma na piscina, enquanto caminhamos até a grande mesa repleta de pessoas. Meu pai bebia com Nicholas, o padrasto de Emma, enquanto o pai de Alice explicava sobre o funcionamento da fábrica que ele gerenciava.

— Vem aqui, meu amor... O tio Alex acordou vocês foi? — peguei Lizzie dos braços da minha mãe, que agradeceu com um sorriso. — O leite da mamãe está te deixando uma bolinha, né? — beijei a bochecha rechonchuda dela, e Gustavo se aproximou, arrancando um sorriso da bebê.

Com apenas três meses, meus irmãos começavam a desenvolver seus sentidos. Estavam ficando gordinhos, mais espertos, aprendendo a sorrir, esticar as mãozinhas para quem queriam e a segurar as perninhas com firmeza. Ambos tinham cabelos escuros e cheios como os meus e os do Andrew, mas apenas Blake herdara os olhos azuis intensos como o mar. Lizzie era a mais ativa, e com seus cabelos presos em dois lacinhos, conquistava a todos ao seu redor. Blake, por outro lado, era mais sério, se frustrando facilmente quando não conseguia o que queria, mas adorava os gritos animados de Alice, segundo Alex, só Blake apreciava isso.

— Vem aqui com o tio, está tão linda com essa roupinha de estrelinhas! — Gustavo pegou Lizzie dos meus braços sem nem pedir permissão, e minha mãe sorriu. — Quem é a menina mais linda do mundo? — Ele começou a encher a bebê de beijos, roubando-lhe um sorriso. — Vamos ver os pássaros? Ou prefere procurar formigas? — Lizzie observava Gustavo com os olhos brilhantes e apertava sua orelha.

Gustavo parecia ter conquistado todos ao meu redor: meus amigos, meus pais, e agora, meus irmãos, que claramente preferiam seu jeito carinhoso e brincalhão. Ele balançava Lizzie com cuidado, conversando com ela como se ela entendesse perfeitamente sobre as formigas na grama.

— Não sabia que você gostava tanto de bebês, Baker — minha mãe comentou, ajeitando o lacinho da Lizzie com um sorriso. — Minha amorinha gosta desse menino lindo, é? — brincou, acariciando a filha.

Gustavo riu, mexendo nos cabelinhos espetados de Lizzie, sem se incomodar com a baba que agora estava em sua mão.

— Vou roubar você para mim, Lizzie — Gustavo brincou, olhando para minha mãe enquanto abraçava a bebê, que sorria animada. Meu pai, ao passar por nós, negou com a cabeça, mas riu da cena. — Quando crescer, vamos todos para a Disney ver as princesas — Gustavo prometeu, arrancando mais risadas de Lizzie, que parecia já entender a diversão.

Enquanto isso, o senhor animado estava ocupado com o churrasco, mas largava tudo ao primeiro sinal de choro dos bebês.

— Dê licença, não vai roubar nada. Faça uma para você, daqui a alguns anos! — meu pai disse, pegando Lizzie dos braços de Gustavo, que lhe fez uma careta. — Esses bebês lindos são meus, vamos com o papai buscar seu irmão bravo — comentou, enquanto o choro de Blake ressoava pelo jardim.

Gustavo, fingindo querer subir no meu colo, me abraçou apertado. De longe, meu pai observava a cena e balançava a cabeça com um sorriso.

— A mais velha já é minha mesmo, Albert... — Gustavo provocou, o que fez meu pai lançar-lhe um olhar de advertência, mesmo com os dois bebês gordinhos nos braços. — Seu pai mandou eu fazer uma bebê. Tem que ser com você, vamos? Sabe que com nosso DNA, vai ser o bebê mais lindo do mundo, né?— Gustavo falou em voz alta, provocando meu pai. 

Eu e minha mãe nos divertíamos com as brincadeiras de Gustavo com meu pai, mesmo sabendo que, no fundo, eles se davam bem.

— Gustavo... não abusa! — advertiu minha mãe, mas Gustavo sorriu, negando.

— Nicholas, vou pegar seu filho pelo pescoço — meu pai comentou, com uma risada, enquanto se dirigia à mesa com Lizzie e Blake nos braços. Nicholas, que estava próximo, riu e pegou Blake, aliviando meu pai do peso.

Era um Dia de Ação de Graças cheio de risadas, provocações e amor, e eu sabia que esses momentos ficariam guardados para sempre.

— Que garoto mais lindo — elogiou Nicholas, segurando Blake nos braços, mas o bebê fez um pequeno bico, quase chorando, o que arrancou risadas de todos. — Mas, Gustavo, nada de bebês agora! — Nicholas apontou para o filho, e Gustavo apenas deu de ombros, debochado.

Enquanto caminhávamos para a piscina, Alice se aproximou com energia, segurando uma colher e, sem aviso, enfiou uma porção de algo em minha boca e na do Gustavo. Ele limpou a boca, confuso, mastigando devagar enquanto Alice nos olhava, esperando ansiosamente. O sabor era salgado e ligeiramente úmido, uma espécie de farinha que tinha um gosto diferente.

— Provem isso antes de entrar na piscina. É farofa, um dos pratos principais em um churrasco lá da minha terra. — explicou, sorrindo radiante. — Então, DIGAM SE ESTÁ BOM, MANÉS!

Alice nos encarava, esperando uma resposta. Gustavo riu e respondeu:

— Como não provar se enfiou na nossa boca com tanto afinco? — brincou ele. — Mas está ótimo, quero mais! — Ele pegou o pote da mão dela, sem cerimônia, e eu também me animei.

— Essa culinária é muito boa, me dá mais! — Peguei a tigela das mãos de Gustavo, enquanto Alice se despia para pular na piscina.

— Se comer puro, pode engasgar! Venham, o dia está passando — disse ela, com um sorriso travesso, antes de se lançar à água com um salto.

Com sua cintura fina e o bronzeado natural, Alice exalava uma energia que era difícil não admirar. Gustavo e eu levamos a tigela de farofa de volta à mesa, onde os pais conversavam animadamente, lembrando-se de histórias do passado, com risadas e vozes misturadas.

Olhei para Gustavo dei um sorriso e sem aviso corri em direção à piscina, deixando-o para trás. Em um salto, mergulhei e afundei na água. Ainda sem muita força no braço, nadei um pouco sob a superfície, observando Emma na beira da piscina, com Alex acariciando sua barriga. Subi rápido para tomar fôlego, encontrando Gustavo bem à minha frente.

— Vá com calma, o braço — ele advertiu, preocupado. 

Mas ignorei e nadei em sua direção, o abraçando. 

— Não se preocupe, estou bem — sussurrei, e ele sorriu, segurando-me um pouco mais forte.

-Sua sunga é muito sexy, é muito animadora. Porém ela deixa muita coisa explicita, marca demais não acha? –Apertei sua bunda grande o fazendo bufar. –Vamos fazer uma competição de nado? Mas você finge que está com o braço machucado também, gostosão.

Tentei convencer Gustavo a nadar no meu ritmo e o mesmo se negava, mas de qualquer forma Alice cortou o clima romântico ao jogar água nos chamando. Emma e Alex se aproximaram e o moreno se pendurou em meu pescoço.

— Você está se amostrando com a sua aliança? — Alex sussurrou, mostrando a dele também, com um sorriso travesso. — Somos muito comprometidos, quem diria.

Alice deu uma olhada em nós e fez uma cara de tédio, mas na realidade sem parecer desconfortável. Ela brincava, mas sempre afirmava amar estar entre os casais,  logo nos contando estava bem assim, e sentia que um dia, poderia dar espaço para alguém entrar em sua vida de forma plena, mas no seu tempo.

— Vamos sentar ali na piscina rasa, as crianças foram comer — Emma sugeriu, apontando para a outra extremidade da piscina. Nadamos até lá, e Emma parou no meio do caminho e cutucou seu namorado. — A Hannah gosta de folia e está bem animada, amor.

Ela pediu que tocássemos sua barriga, que mexia freneticamente debaixo da água, e todos nós paramos para observar, curiosos. Alice tocou com hesitação, e Gustavo sempre protetor, colocou a mão e retirou rapidamente.

— Oi, Hannah, como você está aí? Sou a tia Anne!— Emma segurou minha mão com um sorriso gentil, e eu apertei seus dedos sem medo. — Não machuca?

Ela negou com a cabeça, e Gustavo ainda olhava com um olhar atento, mais curioso que preocupado.

— Dá agonia, mas é legal — Alice comentou, rindo com vergonha, e Alex como sempre, aproveitou a deixa para jogar água nela.

— Dá medo de machucar, que fofo! — Gustavo sussurrou com um sorriso malicioso, e Emma riu, sem se incomodar.

— Bobões, ela realmente gosta de sentir a mãe de divertindo, por isso está animadinha... — Alex respondeu, ajeitando o cabelo de Emma, com carinho.

O que nos chamou a atenção foi o quanto o cabelo de Emma havia crescido. Loira e brilhante, suas madeixas quase chegavam ao meio das costas agora. Uma mudança pequena, mas que nos fez perceber como o tempo estava passando.

Entramos finalmente na piscina rasa, ideal para as crianças. Sentamos em círculo, com todos animados, a água era refrescante e o tempo estava lindo.

— Será que nossa viagem vai dar certo? O Will e o Josh estavam perguntando — Emma perguntou, quebrando o silêncio com uma preocupação leve.

— Vai sim, o que atrasou foi aquele idiota ruivo. Até preso ele é um incômodo! — Gustavo respondeu, claramente irritado.

O julgamento final estava marcado novamente para o início de dezembro, e então passaríamos o Natal em família. O Ano Novo, por outro lado, seria na América do Sul.

— Vai dar tempo, mas ao invés de dois meses... — Alice começou, contando nos dedos. — Passaremos um mês e meio. As aulas começam em março mas precisamos voltar antes pois temos mudança para fazer.

Alex nos explicou que a mãe de Emma estava pensando em comprar um apartamento pequeno para eles em Boston, com o objetivo de economizar o aluguel. Ambos estavam de acordo, mas queriam algo sem luxo. Afinal, depois de formados, queriam que Hannah crescesse em uma casa com espaço para brincar ao ar livre. Então, após a viagem, eles realmente se mudariam e aguardariam as aulas começarem e a chegada da filha.

— Eu também preciso ir para Nova Iorque antes das aulas começarem — Alice disse, animada, fazendo uma dancinha. — Preciso arrumar o dormitório e conhecer a cidade. Já ouviram falar das baladas lá? São incríveis.

A animação de Alice era contagiante e fazia todos ao redor sorrirem.

— Nossos pais ainda não nos deram a resposta, mas, caso eles não deixem, vamos para os dormitórios também. Já reservamos nossa vaga, não vamos esquentar a cabeça com isso — expliquei, e Gustavo assentiu, concordando.

Não estávamos preocupados com a decisão dos nossos pais, sabíamos que morar juntos não era uma brincadeira de casinha, como meu pai sempre dizia. Quando minha mãe cogitou a ideia e Gustavo concordou, passei várias noites em claro pensando em como seria dividir tudo com ele. Em minha mente, não via nada dando errado, mas confiava na sabedoria da minha mãe, que sempre me dizia que nem tudo seria flores.

— Continuem assim, já passamos por muita coisa. Vocês irão morar na mesma faculdade de qualquer forma, então vai dar no mesmo — Alice disse, e todos concordamos.

— Acho que depois de hoje, vamos nos reunir novamente no dia do julgamento, não é? — Gustavo sussurrou, e Alex respondeu jogando água em seu rosto, balançando a cabeça como um cachorro.

— Sim, provavelmente. Não está longe... E, Alice fala mais sobre o Brasil! —Alex pediu, já animado.

Alice então começou a nos contar sobre a cultura do Brasil, sobre as comidas e como ficaríamos na casa de sua mãe no nordeste. Ela mencionou que viajaríamos para outras cidades do país, o que me deixou um pouco aflita, principalmente porque eu não sabia nada do idioma. 

Mas, parte da família de Alice falava o nosso idioma, já que haviam morado aqui por muitos anos.

— Nada, nada de roupa de frio. Apenas roupas de verão, biquínis, vestidos e essas coisas leves, estilo  Califórnia — Alice explicou com entusiasmo. — Coloquem protetor solar, óculos, chapéus, e meninas, lá compramos os biquínis. Os daqui são... — Ela fez uma careta, e os garotos a interrogaram.

— Por que comprar lá? — Alex e Gustavo perguntaram em uníssono, curiosos.

Alice abriu um sorriso largo e arrumou seus cachos longos.

— Quanto menor o biquíni, melhor o bronze, entendem? — ela sorriu, e todos nós nos animamos. Emma bateu palmas e apertou as bochechas de Alex, que olhava desconfiado.

Alex e Gustavo se olharam e deram de ombros juntos, já aceitando a explicação.

— Os corpos são de vocês, entretanto... — Gustavo sussurrou com um sorriso travesso, e eu retribuí o sorriso. — Nós certificaremos de usar sungas pequenas, não é, Alex? — Eles sorriram juntos, e Alice revirou os olhos, já acostumada com as piadas dos dois.

—Nada de sunga pequena para o meu Alex, eu hein. —Emma negou, logo sendo abraçada.

Logo decidimos que nada seria pequena.

— Hora do vôlei, vamos! — Alice se levantou, jogando água em todos nós. — Precisamos aproveitar essa piscina de rico, gente. Chega de conversinha fofa e blá blá blá!

Gustavo sorriu, contagiado pela energia dela como sempre, e nós nos levantamos também, prontos para o jogo. Alice já estava nadando em direção ao outro lado da piscina, impaciente e animada, enquanto Emma e Alex seguiam logo atrás, entre risadas.

S2

Sentados à mesa, posta cuidadosamente para toda a família, estávamos vestidos a rigor para o almoço de Ação de Graças em estilo festa na piscina. Era o dia em que nos reuníamos para agradecer por tudo de bom que tinha acontecido ao longo do ano e pedir por coisas ainda melhores para o próximo. Depois de uma manhã na piscina, todos, exceto os gêmeos, estavam com o rosto corado de tanto sol e de brincar juntos na grama.

A mesa estava farta no jardim, o almoço já estava posto e todos aguardávamos o pai de Gustavo iniciar.

— Fazia tempo que eu não me divertia assim, minha casa está mais colorida e eu realmente estou amando. — Nicholas sorriu, e rimos com ele. — Vou fazer nossa oração, e depois cada um poderá falar pelo que é grato. — Ele se levantou, e nós fizemos o mesmo.

Demos as mãos em volta da mesa, Gustavo segurou a minha mão e a mão de seu pai e Nicholas segurava a mão da Amy, Alex estava com os avós, Emma e sua mãe estavam acompanhadas pela família, assim como meus pais, eu e Mary. Alice segurava a mão de seu pai, e também do secretário de Nicholas, que fazia parte da família.

— Senhor Deus, estamos reunidos hoje para agradecer por todas as graças que o Senhor nos concedeu. Somos gratos pela vida de cada um dos familiares e amigos que estão aqui hoje, e por aqueles que não puderam estar presentes. — Nicholas sorriu e respirou fundo. — Obrigado pela dádiva de acordar a cada novo dia, pelo nosso trabalho, pelo pão de cada dia, pelo teto e por um lar seguro para nossos filhos, netos e bisnetos.

Em seguida, ele passou a palavra para Mary, que sorriu.

— Nem sei por onde começar, meu Deus, tantas coisas aconteceram que nos fizeram essa família. Agradeço pelas vidas que temos aqui, pelas que foram salvas, pelas que chegaram e pelas que ainda vão chegar. Agradeço pela nossa família, por esse amor e por essa união. — Ela então passou a palavra para Gustavo.

Ele sorriu, envergonhado, e consentiu.

— Agradeço pelas mesmas coisas que eles, para encurtar. — Gustavo fez todos rirem. — Agradeço por minha nova família, por nossa vida após tudo o que passamos, pelos meus sobrinhos, pelos meus amigos incríveis, por meu pai transformado, por minha namorada estar viva e pelo meu sonho em Tulane.

Depois de Gustavo, os agradecimentos seguiram de forma aleatória, e todos se emocionavam. Os mais velhos foram se pronunciando, cada um dizendo algo bonito, e percebemos o quanto gostávamos de estar juntos à mesa.

— Agradeço pela minha filha, por ter o Alex em minha vida, por ter sido acolhida, por ter ganhado uma família e por ter resgatado a minha. Sou grata pelos seus amigos incríveis, que me tiraram da escuridão, e pela chance de ser tão feliz... — Emma falou, emocionada.

Alex agradeceu de forma semelhante à Emma, mencionando sua filha e minha vida, o que fez meu coração acelerar. Ele resumiu nossa infância e agradeceu aos meus pais por todo o amor que recebeu deles.

— Agradeço por terem me acolhido tão bem, agradeço a Deus por novas amizades e por voltar a tentar ser feliz. — Amy disse, e todos olharam para o pai de Gustavo, que a observava sem discrição.

Estava claro que havia algo acontecendo entre eles, e todos percebiam, mas ninguém se atrevia a perguntar. Meus pais agradeceram, a mãe de Emma falou por vários minutos, o pai de Alice e os avós de Alex também expressaram sua gratidão, e, por fim, quando chegou a minha vez, Dylan, o irmão mais novo de Emma, pediu para falar. Ele era esperto e cheio de opinião.

— Agradeço pela minha mãe e meu irmão, pela minha irmã Emma. — Ele apontou para Emma, que sorriu. — Pelo meu pai e por aquela piscina grandona. — Nicholas riu, orgulhoso. — E pelo bolo de chocolate da tia Mary também.

Rimos com a inocência de Dylan, e finalmente chegou a minha vez.

— Sou a pessoa que mais tem motivos para agradecer, ainda bem que sou a última. Agradeço por tudo, tanto as coisas boas quanto as ruins. As coisas boas são vocês: meus irmãos, minhas famílias, minha faculdade, meu namorado corajoso, meus amigos, minha sobrinha que está chegando, minha vida. — Suspirei e sorri. — Eu vi a morte de perto, e hoje acordo todos os dias grata por estar viva. Por minha vida, por meus defeitos, pelo meu namorado, minha sobrinha. Sou grata por quem me tornei depois de tudo... — Sorri, e todos aplaudiram enquanto nos sentávamos.

Colocamos para fora tudo pelo qual éramos gratos, comemos muito e tomamos o melhor vinho que Nicholas tinha. Passamos horas na mesa, os bebês acordavam e foram para o braço de todos até dormirem novamente. Rimos, brincamos e antes que pudéssemos levantar, Nicholas avisou a data do julgamento novo e que daria tudo certo. 

A tarde foi passando com comidas, doces e conversas.

— Quero falar algo que precisei ensaiar muito. Confesso que estou nervoso. — O pai de Gustavo respirou fundo, e meu namorado riu. — Eu e a senhorita Amy estamos nos conhecendo melhor... a vida acabou nos dando essa oportunidade. — Envergonhado, ele a olhou.

Sorri, assim como Mary e os demais.

— Finalmente, pai, graças a Deus! — Gustavo levantou as mãos, fazendo todos rirem. — Todo mundo já tinha percebido. Estou muito grato por isso, por você ter se dado uma chance de ser feliz de novo. Seja bem-vinda, Amy. — Gustavo olhou para ela e sorriu.

Ele estava feliz, e seu sorriso era sincero. Gustavo frequentemente se perguntava por que seu pai não tentava ser feliz novamente.

— Obrigada, Gustavo, e obrigada a todos. — Amy sorriu e respirou fundo. — Assim como Nicholas, também fiquei viúva muito cedo. Estamos enfrentando nossos medos juntos, não é fácil, mas resolvemos nos dar essa chance e estamos feliz. — Ela sorriu, e eu sorri junto.

Meu sogro estava tentando ser feliz de novo ao lado de alguém que compreendia perfeitamente seus sentimentos e questionamentos, e percebi que a vida parecia ter orquestrado tudo perfeitamente. Amy contou que perdeu o marido ainda jovem e que não havia se envolvido com ninguém desde então, ficamos sabendo que ainda estavam se conhecendo, saindo juntos e enfrentando, juntos, o medo da perda.

— TÁ NAMORANDO, TIO! — Alice bateu palmas, deixando Nicholas vermelho. — Desencalhou antes de mim! — Ela cobriu o rosto e fingiu chorar, arrancando risadas de todos.

O pai de Alice a cutucou, mas ela não se importou em nos fazer rir. Nicholas e Amy não confirmaram nem negaram o relacionamento, apenas riram juntos.

— Faz ele tirar mais folgas, Amy...  essa missão é sua agora. — Gustavo apontou para ela, e ela assentiu com um sorriso. —Vão viajar, curtir e tal. 

— Isso mesmo! Eu cuido de tudo por aqui! — apoiou Mary.

— Estamos tentando deixar o vício chamado trabalho e prometemos que iremos viver mais a vida, mas desde já, quero que saiba que não estou aqui para ocupar o lugar de sua mãe, Gustavo!— explicou Amy, fazendo Gustavo e Nicholas arquearem as sobrancelhas. — Sei que, para você, pode ser difícil no começo por eu ser a primeira madrasta...

Ela era calma e reservada,  e obviamente queria conquistar o enteado, mal sabendo que aquela relação era tudo o que ele desejava.

— Não é difícil, não. Eu estou bem feliz, estou tranquilo e gosto muito de você, Amy!— respondeu Gustavo com um sorriso para Amy. — Quero que você tenha seu lugar na vida do meu pai e sejam felizes para sempre e saiba que minha mãe está feliz com isso, onde quer que ela esteja. Daqui a alguns meses estarei na faculdade, e realmente fico contente por esse namoro e espero que venha logo para essa casa e coloque mais cor nos lugares e paredes!

Nicholas, emocionado ao ouvir tudo aquilo do seu filho, tomou um gole de vinho e propôs um brinde a tudo aquilo. Todos levantamos nossos copos, celebrando juntos. Ser gratos era essencial, mas aproveitar ao máximo cada momento também era. Sabíamos que seriam essas lembranças que nos trariam saudade e alegria no futuro.

Este capítulo longo e feliz, hein? — mas se não fosse longo, o livro já teria o dobro do tamanho de Harry Potter! 😂😂😂😂😂

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