Natal outra vez. ♡ 71

— A árvore está cheia de presentes. O amigo oculto não pode começar logo? E, de nada, isso é comum no Brasil. Espero que façamos sempre. — Com uma rabanada na boca, Alice olhava curiosa, claramente ansiosa para saber quem havia tirado. — Tomara que o meu seja o maior presente.

Estávamos na noite de Natal, com todos reunidos em minha casa, como mandava nossa tradição. Algumas semanas haviam se passado desde o julgamento de Augustos. Após chorar durante toda a noite seguinte nos braços do meu pai, finalmente acordei com o peito mais leve, pronta para recomeçar.

Augustos, condenado a muitos anos atrás das grades, não demonstrou surpresa ou arrependimento. O mesmo não podia ser dito sobre seus pais, que também estavam presentes. Seu pai, que perdeu o cargo na polícia, cumpriu alguns meses em regime fechado e passaria para o semiaberto por ter cooperado com a justiça desde o início. 

Meu pai, por outro lado precisou de alguns dias para si mesmo, resolveu ir pescar sozinho. Ele voltou diferente, com planos. O senhor Clark decidiu reformar a padaria, modernizá-la... Era evidente o alívio que sentia, como se um grande peso tivesse saído de suas costas, embora ainda precisasse conviver com a dor de perder um filho, sua alma parecia mais tranquila.

Nas semanas seguintes, me reuni com meus amigos em algumas ocasiões. Compartilhamos refeições e ajustamos os últimos detalhes da nossa viagem para a América do Sul, marcada para os próximos dias. Inicialmente, ficaríamos dois meses, mas concordamos em reduzir para um mês. Cada um de nós tinha mudanças importantes pela frente.

Sentada ao lado de Gustavo no sofá, com nossas mãos entrelaçadas, percebia que havia se passado exatamente um ano desde a noite em que conversamos na cozinha sobre marcas de sapatos. Hoje, eu o amava mais do que tudo, ele estava tão elegante quanto naquela ocasião, vestindo um terno impecável, o cabelo modelado pelo gel e novamente, o sapato de sola vermelha. Eu também me sentia especial, vestindo um presente de Mary: um vestido branco até os joelhos, com delicadas flores estampadas na barra. Nos pés, um salto com solado vermelho que Gustavo me dera, garantindo que não quebraria no meio da festa desta vez. — Sorri ao lembrar da vergonha que passei no passado.

Estávamos rodeados por aqueles que amávamos. Alice, que este ano estava sem sua família, pois haviam ido para a fazenda. Alex e Emma estavam com seus avós, usando toucas de Papai Noel feitas por Emma e sua mãe. Ao lado deles, as duas crianças riam enquanto corriam pela sala e Gustavo estava acompanhado de seu pai junto a Amy.

Observei Nicholas, que estava sentado ao lado da sua namorada, Amy. Ele trajava algo simples, mas elegante, e ambos conversavam enquanto tomavam suco de uva em caixinhas, um presente trazido pelos irmãos de Emma. Era nítido o quão Nicholas estava mais sorridente, não que precisássemos de alguém para ser felizes, mas ter alguém com quem nos sentimos bem para dividir a vida, pode ser fascinante.

Minha casa, agora mais colorida e cheia de vida com o cheiro de bebê, havia passado por pequenas mudanças: os móveis estavam dispostos de forma diferente, o que deixava a sala mais ampla e convidativa. Meu pai em um gesto simbólico, comprou uma nova árvore de natal, a enfeitamos e a acendemos como se estivéssemos reacendendo nossas próprias luzes. 

Começamos finalmente, a viver sem o coração dominado pela raiva ou a tristeza constante. A saudade dele permanecia conosco, mas agora era um sentimento sereno, que trazia sorrisos e boas lembranças. Por onde quer que fossemos, levávamos sua memória não com dor, mas com um carinho que nos fazia reviver os momentos mais felizes.

— O seu mal não era fome? Coma sua rabanada e se acalme... — Alex disse, lançando um olhar divertido para Alice. Ele segurava Lizzie, vestida de Mamãe Noel, mostrando para ela as luzes brilhantes da árvore. — Nunca passei um Natal que me lembre fora desta casa.

Estávamos todos espalhados confortavelmente pela sala. A mesa de centro transbordava de comidas e doces, após um jantar farto meu pai colocou músicas natalinas, e a conversa fluiu acompanhada de petiscos. Emma estava sentada no chão, com Blake dormindo tranquilamente em seu colo, apoiado na barriga dela. Mesmo assim, ela continuava comendo, enquanto Hannah crescia saudável e cheia de energia.

— No Natal passado, a Joanne surtou. Ela quase enlouqueceu, isso me rendeu risadas! — Minha mãe comentou, sorrindo de lado. — Não foi, filha?

Ela claramente estava prestes a me expor, mas preferi ignorá-la, fingindo desinteresse.

— Ela quase saiu voando como um foguete! — completou, rindo.

Gustavo não perdeu a chance de rir também, e eu o encarei, semicerrando os olhos, tentando disfarçar o sorriso que insistia em aparecer.

Observei Alex de longe, ele parecia ainda mais feliz, completamente encantado por Lizzie e Blake. Agora, com o nascimento de Hannah se aproximando, ele estava visivelmente ansioso, mas garantiu que o medo tinha ficado para trás.

— É verdade, tia. Cheguei aqui preocupado, ela estava nervosa e tão irritada. — Alex comentou com um sorriso, enquanto todos o encaravam com curiosidade. — Ela pisava tão forte no chão que parecia que a casa ia desabar!

Gustavo me lançou um olhar, arqueando as sobrancelhas com aquele ar de quem já sabia exatamente o motivo. E sim, era por causa dele. Um ano atrás, eu não suportava a ideia de tê-lo por perto, muito menos dentro da minha casa.

— Eu não surtei, só me estressei um pouco — murmurei, tentando me justificar, mas fui recebida por risadas irônicas ao meu redor. — Não queria ele aqui, gente. A verdade é que não nos dávamos bem — acrescentei, sorrindo enquanto apontava para Gustavo, que mantinha sua expressão provocadora. — Olha só essa cara de petulante!

Ele riu, e eu percebi que, apesar de tudo, aqueles momentos e memórias agora faziam parte de quem éramos.

Alex, no meio da sala, fez questão de explicar para todos como me comportei ao saber que Gustavo passaria o Natal conosco. Ele contou, rindo, que passei horas andando em círculos no quarto, furiosa com meu pai. Para piorar minha situação, ele entregou Lizzie para minha mãe, levantou-se e começou a me imitar.

Com a mão na cintura e gesticulando exageradamente, Alex caminhava pela sala reproduzindo minha indignação com perfeição.

— Pelo amor dos céus, era só o que me faltava! — disse, afinando a voz para me imitar, enquanto fazia uma expressão emburrada.

Meu pai já vermelho de tanto rir, tentava conter as lágrimas. Emma, do lado, abria um sorriso largo ao assistir à imitação do namorado.

— Gustavo Baker passando o Natal na minha casa! — Alex completou com um olhar divertido, parando para me encarar antes de soltar uma risada.

Eu apenas suspirei, cruzando os braços enquanto tentava disfarçar a gargalhada que ameaçava escapar.

— Ah, é assim agora? Me entregando? — retruquei, sorrindo enquanto fingia ameaçar Alex com uma tapa. Ele riu, deu um beijo rápido na minha bochecha e saiu correndo antes que eu pudesse alcançá-lo.

Gustavo observava a cena com um sorriso satisfeito, claramente se divertindo. Ele aproveitou o momento para se gabar.

— Ela já sabia que não ia resistir a mim — declarou, arrancando mais risadas de todos, inclusive minhas. — Quando a cumprimentei pela primeira vez, ela me deu um fora de cara... e ainda me cheirou!

Eu o encarei abismada, enquanto meu pai gargalhava sem parar. Amy, que já conhecia a história, apenas balançava a cabeça com um sorriso. Minha mãe aproveitou a deixa para detalhar como nos olhávamos na época, com aquele olhar que não deixava dúvidas. No fim, tive que admitir: não foi nada fácil resistir aos encantos dele.

Mas eu não ia deixar barato.

— Uma família normal, né, Amy? — provoquei, com um olhar travesso. — O Alex já paquerava sua namorada nos tempos de escola, sabia disso? Eu sempre percebi e ele se negava a admitir que a achava bonita!

Todos se viraram para Alex, que me lançou um olhar de pura incredulidade.

— Ele disfarçava mal! As vezes encarava a Emma nos corredores pois seus armários eram frente a frente e, claro, assistia a todos os jogos de basquete na primeira fila, ironicamente perto das lideres de torcida, mas sempre negava tudo. —Completei.

Emma ficou boquiaberta, alternando o olhar entre Alex e eu, enquanto o resto da sala explodia em risadas.

— Não acredito que você nunca me contou isso! — Emma finalmente exclamou, tentando conter um sorriso.

Alex suspirou, rendido, mas com um sorriso tímido no rosto.

—Claro que eu te achava linda, você era uma das meninas mais bonitas dali. —Alex confessou e Emma se gabou, fingindo o ignorar.

Alex se aproximou de mim com um donut e o encostou em minha boca a sujando, mas todos gostaram da historia que de um jeito ou outro havia dado certo no final, ou estava caminhando para continuar certo.

— Soube que a Katy ainda pode ter filhos. Quando vão ter mais? — O pai de Gustavo cutucou meu pai, que prontamente apontou para os bebês.

— Meu querido amigo, faz tempo que não sei o que é dormir. A fábrica fechou, acabou! — Ele indicou Blake e Lizzie com um gesto e sacudiu a cabeça em negação. — Paramos por aqui.

Minha mãe concordou, suspirando, enquanto afirmava que suas olheiras estavam disfarçadas com muita maquiagem.

Alex, que estava sentado ao lado de Emma, entregou a ela mais alguns doces. A loira, carinhosa, limpou a boca dele, suja de açúcar, e o beijou de leve. Enquanto isso, Alice andava pela sala tirando inúmeras fotos a pedido da minha mãe, que queria registrar cada momento.

Foi nesse instante que Blair desceu as escadas lentamente, equilibrando-se nos saltos agulha.

— Desculpem a demora. Quando chega a hora deles... — disse, referindo-se aos filhos, enquanto se aproximava com um sorriso no rosto. — O que perdi?

Blair havia subido para colocar os mais novos para dormir. Depois do jantar, o sono sempre vencia os pequenos. Agora que ela estava de volta, finalmente poderíamos começar a tão aguardada troca de presentes, uma novidade este ano. Foi uma ideia de Alice semanas atrás, e todos haviam concordado com entusiasmo.

— Perdeu algumas revelações — respondeu minha mãe com um sorriso. — Mas, Blair, por que seu marido não veio? E onde está a Mary?

Minha mãe fez espaço para que Blair se acomodasse no tapete, enquanto todos esperávamos pelas respostas.

Uma das pessoas mais importantes da família não estava entre nós nesta noite de Natal. Como em todos os anos, Mary provavelmente estava com sua tia idosa, que, segundo Gustavo, "sempre estava para morrer". Sentíamos sua falta. Sua animação e carinho iluminavam qualquer ambiente, e ela tinha um jeito especial de tornar tudo mais aconchegante.

Mary era muito mais que uma amiga próxima da família; era essencial. Depois de ser escolhida como madrinha dos meus irmãos, sua importância cresceu ainda mais. Ela sempre ajudava minha mãe quando necessário, fazia visitas frequentes aos gêmeos, e nunca vinha de mãos vazias, trazendo presentes que pareciam sair diretamente de uma loja mágica. Mesmo sendo tão dedicada à família Baker, Mary raramente tirava um tempo para si, pois amava seu trabalho e a todos nós incondicionalmente.

— Meu esposo foi passar o Natal com a família na Alemanha. A mãe dele está bem doente... — explicou Blair, com um sorriso compreensivo. — Eles precisavam desse tempo juntos.

— Entendemos perfeitamente e sentimos muito. — Meu pai respondeu com genuína empatia, e Blair retribuiu com um sorriso gentil.

Nicholas, que estava sentado próximo, pegou alguns cupcakes decorados com granulados vermelhos e parecia animado.

— Dei à Mary uma viagem de cruzeiro para o Natal e o Ano Novo. Ela vai passear por metade da Europa. — Ele anunciou com orgulho, arrancando sorrisos de todos. — Ela está conosco há anos, e depois de tudo o que passamos este ano, senti que era o momento certo para uma viagem longa com muito descanso. Mary sempre recusa viajar, mas desta vez, consegui convencê-la com ajuda da Amy. — Ele riu, satisfeito consigo mesmo, e estendeu a mão para um high five com Alice.

— Sim, ela nos mandou fotos lindas! Quem sabe ela não volta namorando algum senhor europeu elegante? — Gustavo brincou, arrancando risadas e acenos de concordância de todos na sala.

Alice continuou com a mão esticada e meu sogro a olhava intrigado. Ela estava maquiada, com seus cabelos soltos e um batom vermelho lindo, a mesma estava ainda mais animada e esperançosa. Após cada sessão da sua terapia, ela me contava tudo e sempre encontrávamos algo para fazer, como aumentar minha parede de fotos. 

-Também passei por muita coisa tio, cadê minha viagem por a metade da Europa? –Ela sorriu e ele brincou ao dá uma tapa em sua mão. –Não gostei, mas futuramente quando contratar meus serviços cobrarei com confiança. –Ela enfiou um brigadeiro na boca e todos rimos com sua estratégia.

Meu sogro era extremamente generoso com todos à sua volta e nunca negava algo a quem precisasse e também mandou revisar o seu avião maior, que era próprio para viagens internacionais para nossa viagem, o jatinho não teria combustível suficiente. Nicholas também contou sobre alguns planos futuros e afirmou que contaria com a arquitetura da Alice, o que a deixou animada.

— Tudo certo para a viagem? Um mês lá? — A mãe da Emma falou calmamente. — Vão quando? Do que precisam?

Blair era igualmente prestativa e parecia bem mais próxima da filha, ela nos contou que foi ao encontro do ex-marido e quebrou todo o seu escritório, e ainda seu um soco em seu rosto o rendendo um olho roxo, pois se deixou tomar pela raiva. Emma a convenceu a não gastar mais energias com isso, afinal Flinn já estava pagando por tudo que fez com a solidão. 

— Tudo certo, mãe, a parte burocrática já está pronta. — Emma suspirou, explicando que, às vezes, faltava um pouco de ar. — A médica também disse que estou bem para viajar, e as despesas iremos dividir. — Ela resumiu tudo e consentimos.

Conversamos muito sobre a viagem, e estava chegando a hora de trocarmos os presentes. As crianças não estavam participando, mas todos ganharam presentes, sendo o maior de um dos irmãos da Emma, que havia perdido uma pista de corrida.

Combinamos que não poderiam ser presentes caros, então cada um foi até a árvore e pegou o seu. Estávamos começando uma tradição nova, que nos deixava empolgados por não saber quem nos daria o presente. Isso era uma coisa que acontecia no Brasil, e Alice achou que seria divertido para nossa nova e imensa família.

Meu pai pediu para começar e ficou de pé.

— Então, irei presentear uma pessoa que conheço há muitos anos, que é um ser bondoso e prestativo. Já me socorreu muitas vezes e, sinceramente, o amo. É o meu pai legal e amoroso que mora ao meu lado! — Ele esticou a mão para o senhor James, e ficamos animados.

O senhor James, com um sorriso no rosto, abriu seu presente e viu algo que o deixou animado. Ele ganhou o acessório que mais usa na vida: um suspensório de couro. O idoso ficou visivelmente feliz, e percebemos que, por mais simples que fosse o presente, ele realmente o agradou. Alice nos explicou que, agora, o avô de Alex entregaria o próximo presente.

— Eu tirei o Albert. — Sem fazer muito suspense, o senhor não hesitou. Ele não havia entendido completamente a dinâmica e Alex explicou que ele teria que falar um pouco sobre a pessoa. — Me desculpem, falar desse homem é fácil. Ele é meu filho, o vi crescer, casar, ser pai, e tenho orgulho de você, filho. — O senhor James, com sua inocência e sinceridade, fez um longo "own" ecoar na sala, e tivemos que começar novamente. Meu pai ganhou um perfume que usava anos atrás, e ele adorou. Se perfumou na hora.

Minha mãe levantou antes que decidíssemos quem seria o próximo a presentear e começou a elogiar a pessoa.

— Essa pessoa emana uma luz, alegra os ambientes, é doce e conquistou corações rapidamente. É uma pessoa que eu gostaria de ter conhecido antes, mas a vida sabe o que faz. — Ela fez um suspense e sorriu. — Eu a amo como se fosse minha filha.

Tudo em mim estava vibrando. O suspense estava bom, nos fazendo prestar atenção no que cada um de nós tinha a dizer sobre o outro.

Minha mãe caminhou até Alice, e ela se levantou feliz. Alice a abraçou e a balançou. Estava visivelmente emocionada e abriu seu presente, pulando como uma criança. Ela ganhou um kit de maquiagem, algo que havia falado por semanas, já que tinha talento para maquiagem e amou o presente.

— Ganhei o melhor presente, e vocês que chorem! — Ela saltou para o centro da sala, fazendo todos sorrirem. — Eu tirei uma pessoa horrorosa, chata, com o pior senso de moda que já vi. Eu não gosto dessa pessoa e, sinceramente, não sentirei saudade de conviver com seu fedor. — Ela arqueou as sobrancelhas e todos a olhavam sem entender.

Como assim ela tirou uma pessoa que não gosta? De quem a Moore não gosta aqui?

Alice caminhou até Gustavo e entregou-lhe um presente mediano, mas, segundo ela, delicado. Ela o abraçou, e ele a abraçou de volta. Por fim, a menina sorriu e continuou a falar.

— Gente, às vezes, no Brasil, falamos o contrário. — Ela sorriu, fazendo todos sorrirem. — Você é o oposto de tudo isso, Baker. Você é incrível e poderia existir vários pelo mundo.

Gustavo pegou seu presente, que parecia ser um quadro, e abriu um sorriso seguido de uma lágrima, o que fez Alice sorrir de volta. Ainda encarando seu presente, ele voltou a abraçar Alice. Gustavo nos mostrou um quadro com um desenho feito por ela, no qual ele aparecia abraçando os pais com a idade atual. A cacheada explicou que havia pedido a Mary uma foto e trocado a versão de Gustavo pequeno pela atual. 

Ele agradeceu, e todos ficaram emocionados com o presente, incluindo Nicholas, que sorriu abertamente, e Amy que se mostrou comovida.

— Nem sei o que falar, nossa. Esse é um presente mais que especial, feito por uma pessoa mais que  especial que mora no meu coração há anos. Eu amei, vou ter uma foto com minha mãe novamente, Moore. Vou falar, se não vou chorar... — Ele respirou fundo, e Alice voltou a se sentar, enquanto Gustavo, com sua caixinha, começou a falar.

Gustavo era sempre muito direto e simples em suas falas. Será que um dia eu conseguiria olhá-lo sem admirá-lo? — Sorri ao vê-lo sorrindo.

— Vou ser direto. Meu presente vai para uma pessoa que me apoiou em um dos meus piores momentos. Essa pessoa poderia ter virado as costas para mim e não fez isso. É alguém que tinha tudo para não gostar de mim, e hoje posso dizer que é meu melhor amigo homem. Na próxima vida, bem que poderíamos vir irmãos, o que acha?

Sorri feliz da vida ao vê-lo esticar a mão para Alex, que levantou saltitante agradecendo. Meu amigo ganhou uma caixinha com palhetas instrumentais douradas de ouro puro, com suas iniciais. Eram lindas e agradaram a Alex de cara que pulou na sala como uma criança, ele disse que queria isso há muito tempo, e Gustavo afirmou saber disso por Emma.

Tudo estava indo bem, e o ambiente estava divertido e tranquilo. As comidas cheiravam bem, e os bebês rodavam de braço em braço.

— Eu tirei uma pessoa linda, inteligente, brava, vivida e mãe. Uma pessoa que cuidou de mim e me deu todo o amor do mundo. Ela é de longe a pessoa mais querida do universo, e eu te amo além do universo, vó. — Alex foi até a avó, que o abraçou.

Com certeza, as palavras que ouvimos hoje estavam carregadas de bons sentimentos e amor. Todos falavam um pouco e pareciam acertar os presentes.

A avó de Alex levantou com cautela, por conta de sua coluna travada, e com seus cabelos brancos e alinhados, suspirou. A senhora Ahn ganhou um porta-retratos lindo com uma foto de Alex com Emma e uma foto da ultrassom de Emma. A idosa admirou a bisneta na ultrassom, e um longo "own" ecoou na sala.

— Minha neta não é linda, gente? Isso vai ficar no meu quarto. Eu te amo, meu filho, e amo vocês. — A senhora encarou Emma, que sorriu. — Você cresceu muito bem, seus pais estão orgulhosos.

A senhora pegou seu presente e abraçou-o com carinho.

— Bom, eu conheço pouco essa pessoa, mas sei que é um ser de luz e linda por dentro, como é por fora. Ela cuidou muito bem das nossas crianças, de todos nós, e estou feliz por conhecê-la. — A senhora Ahn entregou uma caixa a Amy, que levantou sorridente e a abraçou.

Amy estava entrando aos poucos para a família e participando das comemorações. Ela abriu o vestido azul marinho e percebeu que cabia perfeitamente.

— Senhora Ross, nem sei como agradecer, é minha cor preferida. — Ela analisou o vestido e aquilo nos comoveu. Ela pediu que Nicholas segurasse sua caixa e pegou seu presente. — Usarei em um momento especial. — A avó de Alex sorriu satisfeita. — Sei que sou nova por aqui, mas essa pessoa lembro de ver mais nova... É uma menina linda, estilosa, tem um sorriso que ilumina a escuridão e será uma mamãe incrível, eu tenho muito orgulho de como lutou pela Hannah, de como foi forte e hoje construiu uma vida linda, Emma... — Amy sorriu para a loira, e Emma bateu palmas animada. — Levante devagar, moça. — Amy pediu

Todos percebemos que o jogo se armou de um jeito interessante, pessoas que se conheciam pouco, acabavam se tirando e mostrando o que perceberam ao longo dos meses. Me sentia cada vez mais ansiosa e Gustavo dividia comigo um donut, por querer provar todos.

Amy entregou a Emma uma caixa grande embalada junto a uma pequena, Emma estava sorridente e feliz com aquilo tudo. Ela afirmava que iria amar e foi isso que aconteceu, sendo por os hormônios ou não, Emma desabou a chorar quando retirou da caixa seus presentes. Ela havia ganhando uma bota cano alto sem salto e Hannah ganhou mini botinhas idênticas as da mãe. Aquilo me fez sorrir como nunca, não eram os preços dos presentes mas a forma com que eles eram escolhidos por todos. 

Limpei a boca do meu namorado e o mesmo me mandou olhar para Alex.

— Os olhos dele estão brilhando. — Gustavo sussurrou. — Nunca vi alguém olhá-la assim. Acredite, ela merece demais isso. — Concordei.

Emma observava os detalhes do seu presente com sua mãe, e todos elogiavam Amy pela escolha linda. Alex a encarava de longe e, de fato, seus olhos pareciam admirá-la.

— Esse é o olhar do amor. — Sussurrei, e Gustavo concordou.

Vê-lo assim não tinha preço, não havia palavras que descrevessem o que meu coração sentia.

— Me aguentem falar um pouco. — Emma segurava uma caixa mediana, que parecia pesada, e foi ao centro do ambiente, levando com ela nossa atenção. — Diariamente, sou grata por isso tudo. Faz tempo que esqueci como é ser triste e tenho mudado pouco a pouco, deixando para trás quem um dia fui. — Ela sorriu e deu de ombros. — Quando puxei aquele papel e dei de cara com um nome, não soube o que senti. Foi um misto de medo, gratidão, talvez arrependimento. Não sinto orgulho da pessoa que fui com essa pessoa, mas sinto orgulho da relação que construímos hoje, e sou grata por ter sido acolhida como se o passado nunca tivesse existido.

Emma mudou sua fala e contou como agia de uma forma grosseira no colégio. Ela se mostrou ressentida por tudo, e acreditamos...

– Ainda não conheço essa pessoa tão bem como a maioria de vocês, a ponto de saber totalmente seus gostos, e quis fazer tudo sozinha, ou melhor, seguindo minha intuição. Pensei muito em um presente simples e tentei. Joanne, tirei você. – Seus olhos verdes me encararam, e minha boca abriu, fazendo as pessoas rirem. – Mas antes de te dar isso, quero agradecer por não guardar mágoas, por aceitar a mim e acreditar na minha mudança, por sempre me ajudar e, todos os meses, fazer um álbum da minha barriga, de graça. – Ela sorriu e me fez chorar.

Está bem, eu sei que choro com facilidade, mas suas palavras me tocaram. Minha relação com Emma nunca existiu, e quando nos encontramos, não foi nada bom. Tivemos diferenças, brigas e rancor mas aos poucos, a vida foi se mexendo, e fomos para caminhos iguais. Percebi que Emma era apenas uma vítima da sua história, logo quando o relacionamento dela com meu amigo começou, não consegui julgar, apenas sabia que Alex tinha visto algo nela que ninguém mais viu, e de fato isso aconteceu.

Aos poucos ela foi adentrando a família, nos deu Hannah, que já era uma criança muito amada, e nós nos aproximamos bastante ao ponto sairmos juntas para comprar coisas para a bebê. Ela, eu e Alice, combinamos de todos os meses fazermos o seu ensaio de gravidez que Emma insisti em querer pagar e eu nunca aceito. Nossos ensaios estavam ficando lindos, e conversávamos muito sobre a vida quando nos encontramos. – Levantei e fui até ela, dando-lhe um abraço caloroso.

Todos bateram palmas, vendo a nossa emoção, e Emma me entregou o presente pesado. Gustavo me encarava sorridente, e Alex sussurrava gritos. 

Abri a embalagem e vi uma espécie de livro grosso, preto e branco, escrito Lembranças dos Acasos. Todas as folhas eram decoradas com espaços para fotos, dedicatórias e o que tinha acontecido em cada foto. O livro era preto e branco por fora e colorido por dentro, cada página era desenhada e pintada à mão, folha por folha.

– Uau, é lindo. Nossa... – Perdi as palavras, e ela sorriu. – Isso é incrível, Emma, não tenho nada parecido. As cores, os desenhos, tudo é lindo. – Meu coração vibrava a cada página que folheava. – Você pintou tudo isso?

Minha boca travou em um sorriso, e ela sorria de volta. Todos estavam curiosos para entender o que, de fato, era.

– Sim, isso era um livro vazio que eu transformei. A capa é em preto e branco porque o Alex uma vez contou que você nunca consegue escolher entre as duas cores. As páginas eram brancas e foram decoradas por mim com canetinhas, transformei em um álbum de fotos. Você poderá colar as fotos, falar sobre elas e enfeitar mais, se quiser. Dei esse nome porque você sempre diz que todos nós somos acasos do coração. – Ela deu de ombros e sorriu.

A abracei novamente e mostrei a todos meu presente. Aquilo me animou e me deu várias ideias de fotos. Alice deu várias sugestões, e o livro circulou por toda a sala, recebendo muitos elogios. Emma se dedicou por dias, segundo Alex, e eu afirmei que tudo aquilo tornava o presente ainda mais especial.

– Minha filha é tão talentosa. – Blair abraçou a filha e sorriu. – Quero um desses, raio de sol.

– Eu amei, Emma, é incrível, você acertou em tudo. As cores, o presente... tudo! – Falei, e minha mãe segurou o presente enquanto eu pegava o meu.

Peguei minha modesta caixa e caminhei com meus saltos altos demais até o centro da sala, sentindo-me um pouco envergonhada e nervosa. Acho que levei a sério demais quando disseram que o presente deveria ser simples.

– Gente, passei semanas pensando no que comprar para uma pessoa que tem tudo. Foi bem difícil, mas também quis usar o meu coração. – Sorri sem graça, e Gustavo perguntou se o presente era para ele novamente. – Tirei uma pessoa que tem o coração enorme, é simples, leal, sincero e agora compra as roupas mais coloridas das lojas. Sogro, meu presente é simples, mas... – Nicholas levantou alegremente e me abraçou com força.

Nicholas parecia feliz antes mesmo de abrir a caixa, ele me agradeceu muitas vezes e mostrou às pessoas como eu estava da mesma altura que ele, por conta do salto. Havia mandado fazer um copo térmico personalizado para tomar café, com a frase: Sou o melhor sogro quase careca do mundo. Nicholas abriu o presente e, ao ver a frase, caiu na risada.

Sua risada estranha fez todos sorrirem, e Alice teve uma crise de riso ao ouvi-la. Ela batia palmas ao ler a frase.

– Minha nora é uma figura! E isso eu ainda não tinha. O copo vai ficar em minha mesa, adorei! Foi certinho para mim, mas vou fazer um implante capilar futuramente. – Ele me abraçou, e fiquei vermelha. – Você é incrível, Anne, e as coisas simples que escolhemos com o coração tendem a ser as mais especiais.

Minha escolha tinha dado certo, todos elogiaram minha criatividade, e Gustavo concordou com a frase.

– Se não fizer o implante, vai começar a parecer pai da sua namorada. – Gustavo cutucou o pai, e ele sorriu.

– Te bato Gustavo, sou novo e alinhado ainda. – Ele sorriu, e Amy concordou, agarrando seu braço.

De fato, apesar de quase careca, ele era realmente novo. Nicholas se lembrou de que ainda não havia entregue seu presente e levantou-se às pressas. Pegou uma caixa enorme e a segurou como um bebê.

– Me perdoem, Amy me ajudou, mas não sei se segui a regra do algo barato. – Todos já sabiam disso e ele sorriu. – Tirei uma pessoa vaidosa que conheço há anos e senti saudade. Minha amiga Blair, que bom que está de volta.

A loira elegante levantou, e entregou Blake a minha mãe afim de pegar seu presente. Nicholas a abraçou e a entregou uma caixa branca, que a animou.

– Meu amigo, que bolsa linda! E realmente parece bem cara. – Ela retirou a bolsa de dentro do papel e seus olhos brilharam. – Acertou demais, ainda não tenho essa, velho Nick. – Eles se abraçaram, e o senhor sorriu.

Pela lógica, todos sabiam que Blair tinha tirado no sorteio dos nomes, e minha mãe foi ao seu encontro sem suspense, ala pegou da árvore um envelope dourado e minha mãe olhou curiosa, quando Blair brincou:

– Como sabem, tirei a mãe dos bebês mais fofos do mundo. Katy sei que não nos conhecemos muito bem, mas também sei que é uma mulher linda, forte, dedicada, vaidosa, uma mãe incrível, e espero que possamos nos conhecer ainda melhor.

A mãe de Emma era falante e divertida. Ela entregou o envelope à minha mãe, que o abriu, retirando um papel de dentro.

– Nem acredito! Isso é o sonho de toda mãe? – Minha mãe sorriu, e nos olhamos intrigados. – Eu amei, Blair! Também espero te conhecer bem melhor, e você é uma mãe incrível.

Emma colocou uma rabanada entre os dentes e começou a bater palmas. Todos nós estávamos felizes com a reação de minha mãe.

– Tia, conta! O que é? Milhões de dólares? – Alice perguntou animada, e minha mãe negou.

– Algo muito melhor! Ganhei cinco finais de semana em um SPA em Boston, para eu ir ao longo do ano que vem! – Minha mãe sorriu, e todos ficamos boquiabertos. – A mamãe aqui acabou de ganhar descanso de beleza e folgas! – Ela abraçou Blair e vibrou, dançando.

– Isso mesmo, querida, ficarei com os bebês. – Meu pai comemorou, e ela sorriu feliz da vida. – Que presente luxuoso!

– Toda mulher, e principalmente mãe, precisa de descanso e um tempo para si. Você gerou e deu a luz a gêmeos recentemente, precisa descansar e relaxar. – Blair sorriu, e todos concordamos.

Blair estava certa, era exatamente o que minha mãe precisava após tudo.

Como já havia percebido, cada um de nós tirou um tempo para pensar no que o outro precisava, ou no que estivesse desejando, como foi o caso do presente de Gustavo para Alex. Outros apostaram no talento e fizeram presentes criativos, como Alice e Emma. Alguns de nós optaram pelos mais simples, como meu pai e eu, mas o importante é que chegamos ao coração uns dos outros. Era Natal outra vez, o clima estava mais frio, as casas enfeitadas, e as famílias unidas para desejar um ano melhor, cheio de conquistas.

Olhando para o hoje, percebíamos que tínhamos tudo o que queríamos, e iríamos atrás de mais realizações, sonhos, profissões e diversão. Em pouquíssimos dias, embarcaríamos em um avião para nossas merecidas férias de verão – em um verão de outro país, claro. E assim que voltássemos, cada um iria para o seu caminho, conquistar sua vida. Estávamos felizes, garantimos e prometemos que passaríamos todos os Natais assim, juntos.

Alex sentou ao nosso lado e suspirou.

– Fazia tempo que nosso Natal não era tão cheio. Quem fez aqueles bolinhos com recheio de morango? – Alex encostou a cabeça no meu ombro e sorriu.

– Essa casa nunca viu tanta gente junta e eu que fiz, estão bons? – Falei, orgulhosa. Minha mãe repôs os doces na mesa, e Emma bateu palmas.

Fiz uma parte das comidas, Mary mandou outras, e meus pais prepararam algumas também.

– Estão incríveis, mas aquele recheado com marshmallow que você mergulha no chocolate quente está divino. – Gustavo lambeu os dedos e suspirou.

Emma concordou de longe e apontou com o polegar.

– Estou comendo como se não existisse amanhã, mas, claro, existe. – Ela acariciou a barriga e sorriu. – A Hannah parece amar doces.

– Coma, coma muito. Te darei mais para levar, engorde minha sobrinha. – Falei, e Amy concordou.

Gustavo pegou Lizzie e a sentou em seu colo, arrumando os laços da minha irmã e beijando sua bochecha.

– Vamos provar um doce escondido? Ninguém precisa saber... Se você não contar, eu não conto. – Lizzie sorriu, e ele limpou a boca dela, que estava babada, com um paninho.

Alex me mostrou a cena e admirei como Gustavo mimava meus irmãos, e eles adoravam o cunhado e ficavam felizes com suas brincadeiras. 

Alice chegou perto do Alex e estapeou sua perna para ele dar espaço.

– Chega para lá, comi demais. – Ela suspirou e sorriu em minha direção. – Por favor, me manda comida toda semana? – Alice me pediu e sorri.

Alex levantou-se às pressas e deu espaço para Alice sentar ao meu lado.

– Vou ao banheiro, comi demais! – Ele sussurrou baixinho, e Alice riu alto.

– Isso, apodreça o banheiro dos Clark e não o nosso. – Emma pediu, fazendo-o bufar.

– Exagerou no doce, agora vai assar essa bunda murcha, comeu com os olhos. – Ela provocou, e Alex mostrou o dedo do meio.

Arregalei os olhos, e Gustavo sussurrou:

– Ele aprendeu isso com você, Moore. Ele não fazia isso. Corrompeu a criança educada. – Gustavo bufou, e Emma revirou os olhos.

– Irei comer mais, quem quer? Esse bolo de carne está dos Deuses! – Alice pegou um pedaço de bolo de carne com creme de alho.

Eu precisava admitir, minha culinária estava ótima. 

– Você não estava cheia? – Falei, mordendo um doce – Doce com salgado, isso vai dar ruim Alice.

Alice negou, entregou um doce a Emma e saiu distribuindo vários de mão em mão.

– Comam, iremos nos mudar e só teremos outros doces assim no próximo natal. Se não comerem agora, vão se arrepender. – Ela fez todos ao nosso redor sorrirem e concordarem. – Vai dar ruim se eu me arrepender amanhã.

Gustavo encostou a cabeça no meu ombro, e eu toquei seus cabelos. Ele sempre gostava que acariciasse sua cabeça, e assim fiz.

 A noite passou com muita conversa, teorias, planos e histórias, mais uma vez, era natal. Havia se passado um ano, e estávamos cheios de memórias dele. Eu que pensei que seria apenas mais um ano pacato e normal... Sorri, balançando a cabeça ao ver meu pai dançando com minha mãe.

E agora? Bom, eu estava oficialmente ansiosa e empolgada para todos os nossos natais.

S2

Da para acreditar que passou 1 ano? O coração autora como?

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